Acórdão Nº 0001501-57.2013.8.24.0044 do Terceira Câmara de Direito Público, 14-12-2021

Número do processo0001501-57.2013.8.24.0044
Data14 Dezembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Tipo de documentoAcórdão
Apelação / Remessa Necessária Nº 0001501-57.2013.8.24.0044/SC

RELATOR: Desembargador JÚLIO CÉSAR KNOLL

APELANTE: INDUSTRIA E COMERCIO DE PLASTICOS ZANINI LTDA APELANTE: JOSE GUILHERME BRUGNARA ZANINI APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA

RELATÓRIO

Perante a 2ª Vara da comarca de Orleans, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina, no uso de suas atribuições, com fulcro nos permissivos legais, ajuizou ação civil pública em desfavor de José Guilherme Brugnara Zanini, da Indústria e Comércio de Plásticos Zanini Ltda. e da Fundação Municipal de Orleans - FAMOR.

Relatou, em apertada síntese, que houve supressão de vegetação situada às margens de um córrego, localizado na propriedade da pessoa jurídica ora demandada, com posterior aterramento da área desmatada.

Informou que foi solicitado vistoria no local, com auxílio da Polícia Militar, quando constatou-se a existência de uma plantação de milho no local.

Disse que restou verificada irregularidades na concessão de licença expedida pela FAMOR, que não observou a legislação ambiental.

Aduziu que o laudo pericial indicou a existência de pelo menos dois cursos d'água, sendo que as obras atingiram diretamente as referidas margens.

Asseverou, ainda, que, apesar de a autorização expedida exigir a preservação de 20 (vinte) metros da vegetação, tanto o Código Florestal vigente à época (Lei n. 4.771/65), quanto o atual (Lei n. 12.651/12), obrigam a conservação de faixas marginais com, no mínimo, 30 (trinta) metros de largura ao longo de qualquer curso d'água.

Destacou, também, "que houve a supressão de vegetação secundária no estágio médio de regeneração e intervenções diretas sobre o curso d'água, assim como abertura de estradas de acesso e supressão de vegetação e aterramento em uma segunda área, interferências que além de 'atingirem diretamente área de preservação permanente, estavam desprovidas de qualquer licenciamento ambiental'"

Postulou a recuperação da área degradada e a revegetação com espécies nativas ou, subsidiariamente, o embargo do terreno, impedindo a continuidade das obras.

A tutela de urgência foi concedida em parte.

Citadas, as demandadas apresentaram contestação, rechaçando os argumentos expostos na peça vestibular.

Houve réplica.

Sobreveio sentença, de lavra da MMa. Juíza Substituta, Dra. Jaqueline Fátima Rover, nos seguintes termos:

Ante o exposto, com fulcro no artigo 269, I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos iniciais para:

a) declarar nula a Autorização de Corte n. 001/2011 (fl. 55), expedida pela Fundação Ambiental Municipal de Orleans - FAMOR em favor de Indústria e Comércio de Plásticos Zanini Ltda..

b) condenar os réus, solidariamente, a promoverem, às suas expensas, a recuperação da área desmatada, por meio da retirada do aterro, obras e tubulações do local, bem como pela revegetação do espaço com espécies nativas, por intermédio da execução de Projeto de Recuperação da Área Degradada (PRAD), elaborado por profissional técnico, a ser aprovado e fiscalizado pelo órgão ambiental estadual, que comporte o restabelecimento das características originais da Área de Preservação Permanente e da vegetação nativa de Mata Atlântica do local (observados os limites descritos na fundamentação).

c) determinar que, no prazo de 30 (trinta) dias contados da aprovação do PRAD pelo órgão ambiental, os réus iniciem a execução do Projeto, com a apresentação de relatórios semestrais, firmados por profissional habilitado, quanto ao andamento da recuperação da área do dano, acompanhados de registro fotográfico, até que a Polícia Militar Ambiental verifique e certifique que o dano tenha sido sanado.

d) determinar que os réus se abstenham de desenvolver quaisquer atividades no local que resultem em degradação ambiental ou interferência na área de preservação permanente do imóvel, atentando-se aos parâmetros lançados na fundamentação.

e) condenar os réus, solidariamente, ao pagamento de indenização pelos danos materiais ambientais provocados à coletividade através de sua conduta, medida compensatória no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), em favor do Fundo Para Reconstituição dos Bens Lesados do Estado de Santa Catarina.

Em consequência, mantenho o embargo judicial da área, nos termos concedidos em liminar (fls. 196/197), até que cumpridas as determinações constantes no itens b, c e e desta decisão), especialmente em razão da declaração de nulidade de autorização de corte n. 01/2011.

Ante a sucumbência recíproca, condeno os réus ao pagamento de 70% (setenta por cento) das custas processuais. De outro lado, deixo de condenar o Ministério Público em aludido encargo, pois não considerado litigante de má-fé, única hipótese em que a imposição teria cabimento em seu desfavor na ação civil pública (REsp 565.548/SP, relª. Minª. Eliana Calmon, Segunda Turma, j. 13.8.13).

Sem honorários.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Sentença sujeita a reexame necessário.

Com o trânsito em julgado, arquivem-se.

Irresignados, José Guilherme Brugnara Zanini e Indústria e Comércio de Plásticos Zanini Ltda interpuseram recurso de apelação.

Preliminarmente, arguiram a nulidade da sentença, ante o julgamento antecipado da lide.

No mérito, defenderam a competência da FAMOR para expedir autorização de supressão de corte, tanto nos casos de vegetação secundária, quanto em estágio médio de regeneração.

Sustentaram, ainda, que os córregos mencionados na sentença vergastadas, tratavam-se, na verdade, de esgoto, os quais já se encontram em parte canalizados, inexistindo intervenção em área de APP.

Requereram a reforma do decisum.

Com as contrarrazões, os autos ascenderam à Procuradoria-Geral de Justiça, lavrando parecer o Dr. Carlos Alberto de Carvalho Rosa, o qual opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso de apelação.

Em seguida, o processo foi suspenso para aguardar o julgamento do Tema 1010 pelo STJ (Grupo de Representativos n. 7).

Com o levantamento do sobrestamento, vieram-me conclusos em 09/11/2021.

É o essencial.

VOTO

Porque preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço dos inconformismos.

Cuida-se de reexame necessário e de apelações cíveis, interpostas por José Guilherme Brugnara Zanini e Indústria e Comércio de Plásticos Zanini Ltda, almejando a reforma da sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial.

A demanda trata de reconstituição de área objeto degradação ambiental, bem como de indenização pelos danos ocasionados à coletividade, especificamente no tocante à área de preservação permanente, em razão de proximidade de curso d'água.

Preliminar de cerceamento de defesa

Requereram os apelantes a cassação da sentença e o retorno dos autos à origem, sob a alegação de cerceamento de defesa, ante o julgamento antecipado da lide.

Com efeito, tendo em vista a pretensão deduzida e a matéria controversa, agiu com acerto o Magistrado de primeiro grau ao realizar o julgamento antecipado (art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil - CPC), de modo que não resta configurado o pretenso cerceamento.

Embora os recorrentes tenham enfatizado a necessidade especial de oitiva de testemunhas, tem-se que, levando em conta a natureza técnica da discussão travada em juízo, não se verifica a imprescindibilidade de tal requerimento, assumindo a prova documental anexada aos autos, especial relevância e suficiência para formação da convicção do julgador.

É cediço que o magistrado, na qualidade de presidente do processo e destinatário final dos elementos probatórios nele produzidos, é livre para proferir julgamento com base em prova que entender suficiente para a formação de seu convencimento e, com isso, indeferir diligências que entende desnecessárias, nos termos do que estabelece o CPC, in verbis:

Art. 370. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito.

Parágrafo único. O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente protelatórias.

Nesse sentido:

O STJ possui entendimento de que o magistrado tem ampla liberdade para analisar a conveniência e a necessidade da produção de provas, podendo proceder ao julgamento antecipado da lide, se considerar que há elementos nos autos suficientes para a formação da sua convicção quanto às questões de fato ou de direito vertidas no processo, sem que isso implique qualquer ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa. (...) 4. Agravo interno não provido. (STJ. Rel. Ministro Benedito Gonçalves). [...] (TJSC, Apelação Cível n. 0004086-72.2014.8.24.0036, de Jaraguá do Sul, rel. Pedro Manoel Abreu, Primeira Câmara de Direito Público, j. 29-10-2019 - grifou-se).

De mais a mais, conforme bem observado pela Procuradoria-Geral de Justiça, "na hipótese sob análise, durante o Procedimento Preparatório n. 06.2012.00007218-5, houve realização de laudo pericial, minuciosamente elaborado pelo Instituto Geral de Perícias - IGP (fls. 184-208), que faz parte da Secretaria de Estado de Segurança Pública de Santa Catarina e conta com peritos capacitados a realizar trabalhos de tal porte, elucidando exatamente as questões que pretendiam os recorrentes demonstrar através de prova testemunhal e pericial".

Desse modo, afasto a prefacial levantada.

Mérito

No ponto em questão, a fim de evitar desnecessária tautologia, transcrevo o parecer do Procurador-Geral de Justiça, de lavra do Dr. Carlos Alberto de Carvalho Rosa, que esgotou completamente a matéria, para que faça parte integrante do voto:

"Os recorrentes sustentam a legalidade da autorização de corte expedida pela Fundação Ambiental Municipal de Orleans - FAMOR, ao argumento de que não foi comprovada a inexistência de participação do Conselho de Meio Ambiente Municipal e sob o fundamento de que a FAMOR era competente a fornecer tal autorização.

Acerca da autorização para corte, deve-se inicialmente esclarecer que a análise quanto à legalidade do ato está atrelada à característica da vegetação que existia no local, posto que o...

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