Acórdão Nº 0001503-42.2018.8.24.0047 do Terceira Câmara Criminal, 26-04-2022

Número do processo0001503-42.2018.8.24.0047
Data26 Abril 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão
Recurso em Sentido Estrito Nº 0001503-42.2018.8.24.0047/SC

RELATOR: Desembargador LEOPOLDO AUGUSTO BRÜGGEMANN

RECORRENTE: SILMAR DE PAULA (ACUSADO) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na comarca de Papanduva, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Silmar de Paula, dando-o como incurso nas sanções do art. 121, §2º, inciso II, do Código Penal, pela prática da conduta assim descrita na inicial acusatória:

Na data de 8 de dezembro de 2018, após das 18 horas, na rua em frente a casa de nº 8, na Cohab I, nesta cidade de Papanduva, o denunciado SILMAR DE PAULA, com animus necandi, matou a vítima Andersson Rodrigues, ao desferir contra ele chutes, socos e facadas, produzindo-lhe, em consequência disso, os ferimentos descritos no Laudo Pericial Cadavérico n. 9409.2018.8161 , que foram causas eficientes de sua morte por "anemia aguda por traumatismo torácico e traumatismo crânio encefálico".

A dinâmica dos fatos mostra que o crime foi praticado por motivo fútil, visto que teve o denunciado teve uma discussão por motivos banais com a vítima (ev. 10).

Concluída a instrução do feito, na forma do art. 413 do Código de Processo Penal, a denúncia foi acolhida para pronunciar o acusado como incurso na sanção do art. 121, § 2º, II, do Código Penal, bem como para determinar, ipso facto, o seu julgamento perante o Tribunal do Júri. Foi-lhe concedido o direito de apelar em liberdade (ev. 89).

Irresignada, a defesa interpôs recurso em sentido estrito, no qual pugnou pela absolvição sumária de seu defendido, em razão da excludente de ilicitude pela legítima defesa. Subsidiariamente, pleiteou a desclassificação do crime de homicídio qualificado para o de lesão corporal seguida de morte, alegando a inexistência de animus necandi. Por fim, requereu a fixação dos honorários advocatícios ao defensor nomeado (ev. 122).

Juntadas as contrarrazões (ev. 126), ascenderam os autos a esta instância, e a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Francisco Bissoli Filho, opinou pelo parcial conhecimento do recurso e, nessa extensão, pelo seu desprovimento (ev. 11).

Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de recurso em sentido estrito interposto por Silmar de Paula contra decisão que julgou admissível a denúncia e pronunciou-o na sanção prevista pelo art. 121, § 2º, II, do Código Penal.

O recurso é de ser conhecido, porquanto presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade.

Da absolvição sumária pela legítima defesa

Persegue a defesa a absolvição sumária de seu defendido, por ter agido sob a excludente de ilicitude da legítima defesa.

O reclamo deduzido, contudo, não prospera.

É mister lembrar, ab initio, que, para proferir decisão de pronúncia, o juiz deve estar "convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação", conforme preceitua o art. 413 do Código de Processo Penal. Caso o juiz não se convença da presença de tais indícios deve impronunciar o acusado (art. 414).

Assim, a decisão, constitui, em verdade, um juízo de admissão para posterior julgamento pelo Conselho de Sentença, ao qual compete o juízo de culpabilidade, não sendo de bom alvitre, portanto, ao menos nesta fase, incursionar-se demasiadamente na prova recolhida, já que o foro legítimo para tanto é o egrégio Tribunal do Júri.

A absolvição, por ora, somente é possível nas hipóteses ditadas pelo art. 415 do Código de Processo Penal, a saber, quando provada a inexistência do fato, provado não ser o agente o autor ou partícipe do fato, o fato não constituir infração penal ou demonstrada causa de isenção de pena ou de exclusão do crime.

Portanto, ao magistrado só é permitido decretar a absolvição sumária com fundamento na legítima defesa, real ou putativa, se já neste momento processual estiver a circunstância manifestamente comprovada pelo elenco probatório.

Entretanto, não é o caso dos autos.

Não há insurgência contra a materialidade e autoria do delito, razão pela qual se considera matéria incontroversa e passa-se diretamente à quaestio tocante à legítima defesa.

Para elucidar tal entendimento pertinente percorrer a prova oral produzida, cujas algumas transcrições, muito bem elaboradas pelo togado, passarão a integrar este voto, evitando desnecessária tautologia. Observe-se:

Com efeito, a informante Sebastiana de Andrade, mãe da vítima Anderson Rodrigues, relatou que no dia dos fatos, já durante a manhã, seu filho foi na casa do senhor Batista, o qual é alcoólatra, sendo que ele, Mário Amaral, João Maria, Valmir e o acusado estavam todos no local e ingeriram grandes quantidades de bebidas alcoólicas, o que provavelmente motivou as brigas ocorridas naquele dia. No começo da tarde, seu filho voltou com a cabeça ensanguentada, afirmando que teria sido empurrado pelo réu e caído nas britas. Então, entregou um pano para que seu filho colocasse na cabeça e pediu que ficasse em casa e não fosse mais beber. Porém, seu filho saiu de casa mesmo assim e retornou para a casa do senhor Batista. Asseverou, contudo, que ele não levou nenhuma faca consigo. Nesse meio tempo, decidiu ir até a casa de seu pai que ficava próxima ao local e, quando voltou no final da tarde, aproximadamente às sete horas, sua prima foi correndo lhe encontrar para avisar que seu filho tinha sido agredido pelo réu. Inicialmente achou que não era nada grave, porém, ao encontrar seu filho, notou que ele já estava praticamente morto. Soube posteriormente aos fatos que seu filho teria desferido dois tapas contra João, o que motivou a confusão e fez com o que o réu o agredisse. Ficou sabendo, também, que antes de agredir a vítima, o réu também teria brigado com o senhor Mário. Asseverou que encontrou seu filho caído na rua bastante ferido e que ele não costumava andar armado. Perguntada, disse que a vítima, seu filho, e o acusado eram amigos desde crianças e que era comum ambos andarem alcoolizados nos finais de semana. Asseverou, contudo, que seu filho nunca foi agressivo e que não tinha inimigos. Afirmou que a faca utilizada no crime não era da sua casa (audiovisual de fl. 154).

Por sua vez, a testemunha Anderson José Portela relatou que estava residindo na casa de Batista há aproximadamente um mês antes dos fatos e era comum homens se reunirem no local para ingerirem bebidas alcoólicas. No dia dos fatos, estavam no local cerca de seis pessoas, incluindo a vítima e o acusado e, acredita que devido a ingestão de bebidas alcoólicas eles acabaram discutindo. Inicialmente, disse que enquanto estava lavando a louça presenciou a vítima e o acusado discutindo, porque a vítima teria feito um comentário acerca da esposa do acusado, momento em que o réu empurrou a vítima, a qual acabou por cair no chão e bater a cabeça. Porém, após este episódio, a vítima pediu desculpas e, aparentemente, ambos já tinham se entendido. Após, viu que a vítima, a qual estava bastante embriagada, discutiu com João Maria Ferreira da Silva, chegando a agredi-lo com tapas. Esclareceu que João é tio do acusado Silmar e que ele teria se queixado ao réu sobre ter sido agredido pela vítima. Disse que viu quando o réu foi tirar satisfação com a vítima, chegando a ouvi-lo falar que não deveria ter agredido João, pois ele era idoso e não teria como se defender, ao que a vítima respondeu negando as agressões. Após estes fatos, decidiu ir para o seu quarto e não presenciou mais qualquer discussão ou agressão naquele dia, apenas conseguiu ouvir algumas discussões. Asseverou que por duas vezes a vítima saiu da casa de Batista e que, após agredir João, retornou à residência e ameaçou João com uma faca. Ouviu a vítima falando que iria esfaquear João, ao que João respondia que ele estava louco e que não deveria fazer aquilo. Esclareceu que nesse momento, o acusado não estava na casa e que após as ameaças, tanto João como a vítima se retiraram do local. Alguns minutos depois, o réu foi até a casa de Batista e lhe perguntou onde estava...

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