Acórdão Nº 0001519-58.2015.8.24.0125 do Segunda Câmara de Direito Civil, 11-03-2021

Número do processo0001519-58.2015.8.24.0125
Data11 Março 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 0001519-58.2015.8.24.0125/SC



RELATOR: Desembargador RUBENS SCHULZ


APELANTE: LEONARDO GOUVEIA FRANCO APELADO: NEVIO FRANCISCO GOUVEIA FRANCO APELADO: NEVIO FRANCISCO GOUVEIA FRANCO JUNIOR APELADO: CRISTIANE MELO FRANCO APELADO: WILCIMAR CALIL MELO FRANCO


RELATÓRIO


Leonardo Gouveia Franco ajuizou esta ação anulatória e indenizatória em face de Névio Francisco Gouveia Franco, Wilcimar Calil de Melo Franco, Névio Francisco Gouveia Franco Júnior, Erick Melo Franco e Cristiane Melo Franco perante o Juízo da 1ª Vara Cível da comarca de Itapema. Alegou que é filho do demandado Névio Francisco Gouveia Franco, com a paternidade biológica reconhecida nos autos da ação de n. 22396-62.2012.8.11.0041, que tramitou no r. Juízo da 4ª Vara de Família da comarca de Cuiabá/MT. Narrou que o primeiro réu, com sua cônjuge, começaram a dilapidar seus bens a fim de frustrar a fração que lhe pertenceria em futura herança. Disse que os primeiros requeridos alienaram ao réu Névio Júnior o imóvel nominado "Fazenda Presente de Deus", com área de 290.000 ha (duzentos e noventa mil hectares) pelo valor de R$ 48.430,00 (quarenta e oito mil, quatrocentos e trinta reais), embora o imóvel tenha preço de mercado de R$ 5.800.000,00 (cinco milhões e oitocentos mil reais). Sustentou que a venda teve a anuência dos demais descendentes, exceto o autor. Arguiu ainda que os fatos foram capazes de causar grave abalo moral, passível de indenização. No ponto, destacou também que o corréu Névio jamais deu suporte material e moral ao autor, razão por que entendeu que o primeiro requerido deve também indenizar o alegado abandono afetivo. Pugnou pela concessão de tutela antecipada a fim de averbar a existência desta ação na matrícula do imóvel, bem como fosse quebrado o sigilo bancário do primeiro requerido; ao final, postulou a declaração da nulidade do negócio jurídico e a condenação a pagar reparação extrapatrimonial.
O Juízo de origem deferiu a gratuidade ao autor, concedeu tutela antecipada parcialmente e determinou a citação (evento 3).
Os réus, cientificados, apontaram preliminarmente que interpuseram agravo de instrumento (evento 31).
Adiante, os requeridos apresentaram contestação arguindo inicialmente preliminares de decadência e de prescrição. No mérito, asseveraram que a venda não foi fraudulenta, que a fração hereditária do autor restou garantida, que ao tempo da celebração do negócio as partes não tinha ciência da filiação do demandante e que o negócio jurídico discutido nestes autos diz respeito à cessão de uma pequena parcela das terras (duzentos e noventa hectares), sendo que o primeiro réu continuou com o domínio de boa parte das terras. Destacaram que a municipalidade em que está o imóvel atribuiu a este valor venal de R$ 48.430,00 (quarenta e oito mil quatrocentos e trinta reais) para fins da tributação de sua competência. Arguiram que os fatos não constituíram dano moral indenizável e pugnaram pela improcedência (evento 38).
Com a manifestação do autor acerca da resposta, o Juízo proferiu a decisão que saneou a lide, rechaçando as questões prejudiciais (evento 50).
Juntada de cópia da decisão proferida nos autos do Agravo de Instrumento n. 2015.043187-8 (evento 73).
Na fase de instrução foi deferida a produção de prova oral e a realização de avaliação do imóvel em questão.
A oitiva das testemunhas também aconteceu por meio de Carta Precatória ao Juízo de Nova Mutum/MT, quando foram colhidos os depoimentos de três testigos (eventos 84 e 104).
Na audiência de instrução realizada na origem foi colhido o depoimento pessoal do autor (evento 107).
Apresentadas as alegações finais, sobreveio a sentença em que a Magistrada singular julgou improcedentes os pedidos iniciais, revogou a tutela antecipada e condenou o autor a pagar as custas e honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa; contudo, suspendeu a exigibilidade em face da gratuidade deferida ao autor (evento 125).
Insatisfeito, o autor interpõe apelação argumentando que a compra e venda do imóvel está retratada por um valor bem abaixo do mercado, que o apelante e o pai mantiveram contato desde o ano 2000, que a paternidade restou reconhecida em 2012, que os apelados não demonstraram o pagamento pela compra realizada, que as testemunhas ouvidas em Juízo tinham relação de intimidade com os réus e que o negócio jurídico nitidamente tem a intenção de prejudicar o direito do autor. Afirma também que nunca fora tratado como filho/irmão pelos demandados, fato jurídico que suficientemente justifica o pedido de indenização por dano moral derivado do abandono afetivo por seus consanguíneos. Pugnou pela reforma do julgamento, com a declaração da nulidade da compra e venda noticiada na peça inicial, bem assim a fixação de indenização por dano moral (evento 137).
Com as contrarrazões, os autos foram encaminhados a este Tribunal de Justiça.
Petição dos demandados comunicando que o ofício registral de Nova Mutum/MT não removeu da matrícula do imóvel a anotação deferida pela tutela antecipada nesta lide. Argumentam que o recurso do autor comporta tão somente efeito devolutivo, razão por que entendem indispensável o levantamento da anotação (evento 146).
Vieram conclusos

VOTO


1 ADMISSIBILIDADE
De início, destaca-se que a apreciação do presente recurso, em detrimento de outros que estão há mais tempo conclusos neste gabinete, não afronta o critério cronológico de julgamento dos processos, previsto no art. 12 do Código de Processo Civil de 2015. Ao revés, valendo-se da interpretação do parágrafo 2º do referido artigo, tratando-se de causa relativamente simples, antecipar o seu julgamento privilegia a celeridade e a economia processual e contribui para o desafogamento do Judiciário, uma das diretrizes da novel legislação.
Assim, presentes os requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conhece-se do recurso, com os efeitos já declarados na interlocutória anterior, e passa-se a sua análise à luz dos dispositivos do atual Código de Processo Civil, pois a sentença foi publicada na sua vigência (31-8-2019).
2 NULIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO
Em sede de recurso, conforme visto no relatório, o autor aduz que é "inegável a existência de negócio jurídico simulado e, portanto, mister é a declaração de nulidade do negócio jurídico, bem como a procedência dos pedidos formulado pelo Apelante, em especial as condenações pelos danos sofridos" (p. 5 da Apelação 288 ).
Pretende, então, que seja este ponto da sentença revisitado por este órgão fracionário, pugnando pela reforma.
Persiste então a pretensão de ver o negócio jurídico anulado pela ocorrência da simulação, assim como indenizados os danos morais supostamente experimentados advindos de tal fato.
Nos pontos, adianto que o apelante não logrou êxito em demonstrar o fato constitutivo do seu direito.
A nulidade da realização de negócio jurídico simulado, com o suposto fim de burlar a igualitária divisão da herança entre os descendentes exige que minimamente se demonstre os pressupostos que estão no art. 167 do Código Civil:
Art. 167. É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma.§ 1º Haverá simulação nos negócios jurídicos quando:I - aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem;II - contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira;III - os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados.§ 2º Ressalvam-se os direitos de terceiros de boa-fé em face dos contraentes do negócio jurídico simulado.
Acerca da simulação do negócio jurídico, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery ensinam:
Consiste na celebração de um negócio jurídico que tem aparência normal, mas que não objetiva o resultado que dele juridicamente se espera, pois há manifestação enganosa de vontade. O propósito daqueles que simulam o negócio jurídico e estão em conserto prévio, é enganar terceiro estranho ao negócio jurídico ou fraudar a lei. O negócio jurídico simulado é produto de uma relação jurídica que não tem conteúdo - inexistente (simulação absoluta) - ou que tem conteúdo diverso do que aparenta (simulação relativa), sempre se constituindo de manifestação de vontades em divergência intencional com as vontades internas. Ele é realizado por acordo de todos os contratantes em emitir declaração de vontade divorciada do que intimamente desejam, com a finalidade de enganar inocuamente (simulação inocente) ou em prejuízo da lei ou de terceiros (simulação fraudulenta ou ilícita) (Novo código civil e legislação extravagante anotados. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, fl. 82).
Não parece ser tarefa simples a demonstração de que certo negócio jurídico, realizado com a forma, a legitimidade e o objeto todos conformes o ordenamento, constitua tão somente máscara para a consolidação de ato atentatório ao direito de outrem.
Sobre o assunto, colhe-se da doutrina:
"[...] a prova da simulação nem sempre se poderá fazer diretamente; ao revés, frequentemente tem o juiz de se valer de indícios e presunções, para chegar à convicção de sua existência" (CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA. Instituições de Direito Civil. Rio de Janeiro: Forense, v. I, p. 369).

"[...] prova da simulação é difícil, pois se deve demonstrar que há um negócio aparente, que esconde ou não outro ato negocial, por isso o Código de Processo Civil, nos arts. 332 e 335, dá, implicitamente, ao magistrado o poder de valer-se de indícios e presunções para pesquisar a...

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