Acórdão Nº 0001613-44.2016.8.24.0004 do Segunda Câmara Criminal, 02-03-2021

Número do processo0001613-44.2016.8.24.0004
Data02 Março 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 0001613-44.2016.8.24.0004/SC



RELATOR: Desembargador SÉRGIO RIZELO


APELANTE: RAFAEL OLIVEIRA DA ROSA (RÉU) ADVOGADO: LUIZA ALANO DE ALMEIDA (OAB SC056080) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Na Comarca de Araranguá, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Rafael Oliveira da Rosa, imputando-lhe a prática do crime previsto no art. 155, § 4º, II, do Código Penal, por diversas vezes, nos seguintes termos:
No dia 11 de janeiro de 2016, por volta das 12 horas, no interior da empresa Premel, localizada na Rua Augusto Pereira Fragnani, n. 253, Nova Divinéia, Araranguá/SC, o denunciado Rafael Oliveira da Rosa, com abuso de confiança, valendo-se de funcionário da referida empresa, com ânimo de assenhoramento definitivo, subtraiu, para si, o montante de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais).
Registra-se que o acusado, alguns meses antes, em pelo menos outras 6 (seis) ocasiões, utilizando-se das facilidades de ser funcionário da empresa, subtraiu, aproximadamente, a importância de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais) (Evento 8).
Concluída a instrução, a Doutora Juíza de Direito julgou procedente a exordial acusatória e condenou Rafael Oliveira da Rosa à pena de 3 anos e 4 meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente aberto, e 16 dias-multa, substituída a privativa de liberdade por restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária de valor equivalente ao do salário mínimo, pelo cometimento do delito previsto no art. 155, § 4º, II, c/c o 71, caput, ambos do Código Penal (Evento 76).
Insatisfeito, Rafael Oliveira da Rosa deflagrou recurso de apelação.
Nas razões de insurgência, requer a concessão do benefício da justiça gratuita.
Pugna pela desclassificação de seu agir ao configurador da modalidade simples do delito de furto, ao argumento de que "não demonstrada a confiança plena e irrestrita da vítima em relação ao réu, não há que se falar na presença da qualificadora do abuso de confiança".
Postula, também, a "fixação das penas no mínimo legal", bem como a incidência da benesse prevista no § 2º do art. 155 do Código Penal.
Por fim, a respeito da pena substitutiva, pleiteia a adequação da prestação de serviços à comunidade, "para que a apelante cumpra no máximo uma hora diária" dessa espécie de tarefa (Evento 113).
O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu contrarrazões pelo conhecimento parcial do reclamo, uma vez que o pedido de "fixação das penas no mínimo legal" é genérico, e pelo seu desprovimento (Evento 118).
A Procuradoria de Justiça Criminal, em parecer lavrado pelo Excelentíssimo Procurador de Justiça Ernani Dutra, posicionou-se pelo conhecimento parcial do apelo, porquanto o pedido genérico de "fixação das penas no mínimo legal" ofenderia o princípio da dialeticidade, ao passo que a pretensão referente à justiça gratuita seria carecedora de interesse recursal; e pelo seu desprovimento (Evento 6)

VOTO


1. O recurso comporta conhecimento em parte.
1.1. O Apelante Rafael Oliveira da Rosa requereu a concessão do benefício da justiça gratuita, mas a providência já foi determinada na sentença resistida: "Isento o acusado do pagamento de despesas processuais, eis que foi assistido pela Defensoria Pública/dativa" (Evento 76).
Sendo certo que "não há interesse recursal quando observado que o pedido feito no apelo já foi objeto de acolhimento na sentença" (TJSC, Ap. Crim. 0000174-57.2017.8.24.0167, Rel. Des. Carlos Alberto Civinski, Primeira Câmara Criminal, j. 30.8.18), o apelo não merece conhecimento neste tocante.
1.2. Também não merece conhecimento o pedido de concessão de efeito suspensivo ao recurso, pois a própria legislação processual penal estabelece que, em regra, "a apelação de sentença condenatória terá efeito suspensivo" (CPP, art. 597), o que foi observado na decisão do Evento 106, sendo válido registrar que ao Recorrente foi permitido recorrer em liberdade (Evento 76).
A propósito:
PEDIDO DE RECEBIMENTO DO APELO NO EFEITO SUSPENSIVO. SENTENÇA CONDENATÓRIA QUE NÃO DETERMINOU O CUMPRIMENTO IMEDIATO DA PENA. RÉU QUE SE ENCONTRA EM LIBERDADE. AUSÊNCIA DE INTERESSE. NÃO CONHECIMENTO NO PONTO (TJSC, Ap. Crim. 0000688-21.2017.8.24.0034, Rel. Sidney Eloy Dalabrida, j. 10.9.20).
1.3. No mais, a insurgência preenche os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, razão pela qual deve ser conhecida, inclusive quanto ao pedido genérico de "fixação das penas no mínimo legal".
Não se desconhece que uma parcela da jurisprudência partilha do entendimento segundo o qual "o efeito devolutivo do recurso de apelação criminal encontra limites nas razões expostas pelo recorrente, em respeito ao princípio da dialeticidade que rege os recursos no âmbito processual penal pátrio" (STJ, HC 300.161, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 6.11.14).
Todavia, ousa-se divergir, respeitosamente.
O paradigma constitucional da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e da individualização da pena (art. 5º, XLVI) culmina na inafastável conclusão de que o princípio da dialeticidade recursal não se aplica ao acusado no âmbito do processo penal.
Tal convicção é reforçada pela possibilidade de se instrumentalizar, a qualquer tempo, revisão criminal (CPP, art. 622) e de garantir-se, enquanto direito fundamental, que "o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença" (CF, art. 5º, LXXV).
Nesse contexto, por exemplo, o apenamento injusto e incorreto, mesmo que a diferença seja de apenas um dia, configura encarceramento arbitrário, a ofender, inclusive, o art. 7º, 3, da Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969 (Pacto de San José da Costa Rica), da qual o Brasil é signatário e cujo texto já se encontra incorporado ao ordenamento pátrio, por força do Decreto 678/92.
Bem por isso que a revisão da condenação e do apenamento em sede recursal pode dar-se até mesmo de ofício, quando houver manifesta injustiça ou impropriedade técnica, consoante reiterados precedentes desta Corte de Justiça (desta Segunda Câmara, verbi gratia, citam-se: Apelações Criminais 2014.065697-2, Rel. Des. Getúlio Corrêa, j. 21.10.14; 2014.016950-3, Relª. Desª. Salete Silva Sommariva, j. 14.10.14; e 2014.024047-0, Rel. Des. Volnei Celso Tomazini, j. 2.9.14).
Assim, o pleito...

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