Acórdão nº 0001646-45.2017.8.14.9100 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 3ª Turma de Direito Penal, 06-03-2023

Data de Julgamento06 Março 2023
Órgão3ª Turma de Direito Penal
Número do processo0001646-45.2017.8.14.9100
Classe processualAPELAÇÃO CRIMINAL
AssuntoFurto Qualificado

APELAÇÃO CRIMINAL (417) - 0001646-45.2017.8.14.9100

APELANTE: FRANCISCO FERREIRA DOS SANTOS, WERISON BRUNO REGO MENDONCA
ADVOGADO DATIVO: WENDERSON PESSOA DA SILVA

APELADO: JUSTIÇA PUBLICA

RELATOR(A): Desembargador JOSÉ ROBERTO PINHEIRO MAIA BEZERRA JUNIOR

EMENTA

Processo n° 0001646-45.2017.8.14.9100

Órgão Julgador: 3ª Turma de Direito Penal

Recurso: Apelação Criminal

Comarca: Monte Dourado - Almeirim/PA

Apelante: Werison Bruno Rego Mendonça e Francisco Ferreira dos Santos

Relator: José Roberto Pinheiro Maia Bezerra Júnior

EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO QUALIFICADO. ART. 155, § 4° I E IV DO CP. SENTENÇA CONDENATÓRIA. MÉRITO PREJUDICADO. AUSÊNCIA DE ALEGAÇÕES FINAIS. FALTA DE DEFESA. NULIDADE ABSOLUTA. SÚMULA 523 DO STF.

1) A fase das alegações finais é essencial às partes do processo, isso porque, é nesta fase que poderão expor suas teses, contestar as provas produzidas em juízo e suscitar qualquer nulidade da instrução antes do proferimento da sentença. Desta forma, a ausência de apresentação das alegações finais em favor dos réus representa falta de defesa, o que viola os princípios constitucionais do contraditório e ampla defesa.

2) O fato dos réus terem sido declarados revéis em audiência não afasta a imprescindibilidade das alegações finais, uma vez que a revelia não gera dispensa da defesa técnica, a qual impõe-se até o final do processo. Afinal, para que seja preservada a ampla defesa a que se refere a Constituição Federal, a defesa técnica, além de necessária e indeclinável, deve ser plena e efetiva. Assim, obrigatoriamente, deve o defensor atuar em benefício do acusado, ainda que revel, sob pena de se considerá-lo indefeso.

3) Apesar de os recorrentes não terem apontado a referida nulidade em sede recursal, julgo que o tema ainda não se encontra fulminado pela preclusão, na medida em que se trata de hipótese de nulidade absoluta e, portanto, pode ser declarada a qualquer tempo, inclusive de ofício pelo juiz.

4) Não conhecimento da Apelação Criminal e, de ofício, declarada a nulidade do feito a partir das alegações finais da defesa, em razão dos réus estarem indefesos.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Componentes da 3ª Turma de Direito Penal deste Egrégio Tribunal de Justiça do Pará, 4ª Sessão Ordinária do Plenário Virtual, ocorrida entre os dias 06/03/2023 e 13/03/2023, à unanimidade, em NÃO CONHECER do Recurso, porém, de ofício, declarar a nulidade do julgamento dos réus, nos termos do voto do Relator.

Julgamento presidido pelo Exmª Srª Desª Kédima Pacífico Lyra.

Belém (PA), 20 de março de 2023.

JOSÉ ROBERTO PINHEIRO MAIA BEZERRA JÚNIOR

DESEMBARGADOR RELATOR

RELATÓRIO

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Criminal interposta por WERISON BRUNO REGO MENDONÇA e FRANCISCO FERREIRA DOS SANTOS objetivando reformar sentença proferida pelo Juízo da Vara Distrital de Monte Dourado - Almeirim/PA, nos autos da ação penal n° 0001646-45.2017.8.14.9100, que o condenou nas sanções previstas no art. 155, §4°, I e IV do CP, fixando a pena final, de ambos os réus, em 02 (dois) anos e 09 (nove) meses de reclusão e 53 (cinquenta e três) dias-multa, substituindo a pena privativa de liberdade por 02 (duas) restritivas de direito (prestação de serviços à comunidade e pena pecuniária).

Em suas razões recursais (Num. 9250572 – Pág. 1/5), os recorrentes asseveram que as provas inicialmente produzidas na esfera inquisitória, devem, necessariamente, ser confirmadas na instrução criminal, por se sujeitarem ao contraditório diferido.

No entanto, sustentam que o órgão acusatório não se desincumbiu do ônus probandi, eis que, durante a instrução criminal, não foi apurado, de forma clara e inconteste, a eventual prática do ilício penal, bem como a participação dos acusados.

Assim, defende a fragilidade probatória constante dos autos a fim de fundamentar a condenação, pelo o que requerem sua absolvição, nos termos do art. 386, VII do CPP.

Em sede de contrarrazões (Num. 9250575 – Pág. 1/3), o Ministério Público requereu o conhecimento e, no mérito, o improvimento do recurso, para que a sentença seja mantida em todos os seus termos

Nesta instância superior, a Procuradoria de Justiça do Ministério Público, por meio da Dra. Dulcelinda Lobato Pantoja, se pronunciou pelo conhecimento do recurso e, no mérito, pelo desprovimento, com manutenção, in totum, da sentença condenatória (Num. 10053244 – Pág. 1/5).

É o relatório que submeto à revisão.

Sugiro a inclusão em pauta de julgamento no Plenário Virtual.

VOTO

VOTO

Os recorrentes, insurgem-se da sentença condenatória, requerendo sua absolvição, com a aplicação do princípio do in dubio pro reo, eis que entendem não ter restado demonstrado nos autos, de forma contundente, a prática delitiva que lhes foi imposta.

Não obstante a isso, de antemão, observo que resta prejudicada a análise do mérito do presente recurso, uma vez que o presente feito não respeitou o devido processo legal.

Vejamos.

O Ministério Público ofereceu denúncia em face dos recorrentes, tendo os mesmos sido citados pessoalmente, declarando não possuírem condições financeiras de constituir advogado particular (Num. 9250402 – Pág. 20 e Num. 9250403 – Pág. 3).

Em razão disso, e considerando que a comarca não tinha Defensor Público Titular ou Substituto (Num. 9250403 – Pág. 14), verifica-se que desde a fase de resposta à acusação os apelantes estiveram assistidos por advogados dativos, devidamente nomeados pelo juízo ‘a quo’.

Observa-se que, no decorrer da instrução processual, o réu Werison Bruno Rego Mendonça não foi localizado quando da intimação para comparecimento na audiência, tendo sido certificado que o denunciado “mudou-se” (Num. 9250411 – Pág. 12). Em contrapartida, o réu Francisco Ferreira dos Santos foi devidamente intimado, conforme extrai-se da certidão de Id. Num. 9250410 – Pág. 13, no entanto, também não compareceu à audiência de instrução e julgamento.

Assim, em obediência ao disposto no art. 367 do CPP, o magistrado, na presença da advogada dativa devidamente nomeada para o ato, decretou a revelia dos denunciados e concedeu prazo sucessivo para a apresentação das alegações finais (Num. 9250412 – Pág. 1).

Ocorre que, após a apresentação das alegações finais escritas pelo Ministério Público, o juízo ‘a quo’ proferiu despacho, nos seguintes termos (Num. 9250563 – Pág. 1):

“(...) Tendo em vista que se encontrando a Comarca sem Defensor Público Titular ou Substituto, e a fim de não mais retardar o processo, e baseado no princípio da DIGNIDADE HUMANA, que confere garantias individuais, tendo por bem maior proteger o ser humano contra qualquer forma de desprezo, nomeio o Dr. Karol Sarges Souza para apresentar a defesa do acusado(a), devendo o(a) mesmo(a) ser intimado(a) imediatamente” – grifo nosso

Ao invés de apresentar alegações finais, o advogado Karol Sarges (OAB/PA n° 13.739), protocolou aos autos petição (Num. 9250564 – Pág. 1/4) nomeada “RESPOSTA À ACUSAÇÃO”, em favor exclusivamente do réu Francisco Ferreira dos Santos, se reservando ao direito de apreciar as questões de mérito no momento da apresentação das alegações finais, limitando-se a fazer os seguintes pedidos:

“DIANTE DO EXPOSTO, REQUER:

1 – RECEBIMENTO DA RESPOSTA A ACUSAÇÃO, nos termos do art. 396 do CPP;

2 – Seja garantido o direito de apresentação do ROL DE TESTEMUNHAS em momento posterior, caso o acusado se apresente na Defensoria antes da audiência de instrução, flexibilizando a preclusão temporal. Requer tal garantia inclusive nos casos em que o primeiro contato entre o acusado e a defesa técnica seja na própria audiência, devendo ser oportunizada a indicação de testemunhas, em respeito às prerrogativas da Defensoria Pública, à ampla defesa e ao contraditório;

3 – Que conste no mandado de intimação da audiência de instrução, que o réu tem direito de levar testemunhas para depor em seu favor sobre os fatos descritos na denúncia, consoante art. 8.2.f da CADH;

4 – A oitiva das testemunhas arroladas pela acusação na denúncia, assegurando-se a possibilidade de substituição posterior, se necessário;”

Note-se, portanto, que a petição apresentada pelo advogado dativo, além de não se referir ao réu Werison Bruno Rego Mendonça, não apresentou qualquer análise meritória ou qualquer argumentação sobre a causa, pelo contrário ela expressamente se reservou ao direito de apreciar as questões do ‘meritum causae’ no momento da apresentação das alegações finais, o que causa fragilidade na defesa e enorme prejuízo aos acusados, gerando nulidade insanável, ferindo os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa.

Veja-se que a fase das alegações finais é essencial às partes do processo, isso porque, é nesta fase que poderão expor suas teses, contestar as provas produzidas em juízo e suscitar qualquer nulidade da instrução antes do proferimento da sentença. Desta forma, a ausência de apresentação das alegações finais em favor dos réus representa falta de defesa, o que viola os princípios constitucionais do contraditório e ampla defesa.

Não se pode esquecer que a falta de defesa gera inequívoco prejuízo ao réu, o que caracteriza nulidade absoluta do feito, conforme se extrai do entendimento sumulado do Superior Tribunal de Justiça:

Súmula nº 523, STF. No processo penal, a falta da defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu.

Ressalta-se que o fato dos réus terem sido declarados revéis em audiência não afasta a imprescindibilidade das alegações finais, uma vez que a revelia não gera dispensa da defesa técnica, a qual impõe-se até o final do processo, constituindo tal inobservância erro grosseiro por parte dos sujeitos processuais.

Afinal, para que seja preservada a ampla defesa a que se refere a Constituição Federal, a defesa técnica, além de necessária e indeclinável, deve ser plena e efetiva. Assim, obrigatoriamente, deve o defensor...

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