Acórdão Nº 0001699-56.2017.8.24.0076 do Segunda Câmara Criminal, 22-02-2022

Número do processo0001699-56.2017.8.24.0076
Data22 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0001699-56.2017.8.24.0076/SC

RELATOR: Desembargador NORIVAL ACÁCIO ENGEL

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELANTE: CLARISDINO LOURENCO VIDAL (RÉU) ADVOGADO: ERIVALDO ROCHA PERES (OAB SC013557) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Na Comarca de Turvo, o Ministério Público ofereceu Denúncia contra Clarisdino Lourenço Vidal, dando-o como incurso nas sanções do art. 16, parágrafo único, incisos IV e VI, da Lei n. 10.826/2003, em razão dos fatos assim descritos (evento 33):

[...] No dia 8 de dezembro de 2017, sexta-feira, por volta das 14 horas, Policiais Civis, em cumprimento de mandado de busca e apreensão, dirigiram-se até a residência do denunciado Clarisdino Lourenço Vidal, na Estrada Geral Rodeio D'Areia, em Turvo (SC), onde lograram êxito em apreender uma espingarda calibre 32, marca CBC, cuja numeração de série havia sido destruída mediante raspagem.

Além da referida espingarda, foram apreendidos também munições e apetrechos para recarga de munição: dezenove cartuchos calibre 32 recarregados de forma artesanal; um cartucho calibre 32 já deflagrado; e várias esferas de chumbo.

De se dizer que o denunciado Clarisdino, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, procedeu à recarga artesanal dos dezenove cartuchos e mantinha sob a sua posse a arma de fogo, os apetrechos e a referida munição [...].

Encerrada a instrução, foi julgada procedente a denúncia (evento 104):

[...] CONDENO CLARISDINO LOURENCO VIDAL à pena de 3 anos de reclusão e 10 dias-multa, em regime aberto, pela prática do crime previsto no artigo 16, parágrafo único, inciso IV e VI, da Lei n. 10.826/2003, substituída na forma da fundamentação [...].

A reprimenda corporal foi substituída por 02 (duas) restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e pecuniária.

Irresignados, tanto o Ministério Público quanto a Defesa interpuseram Recurso de Apelação (eventos 109 e 111, respectivamente).

Em suas Razões, o Órgão Ministerial (evento 125), busca, em síntese apertada, a exclusão da consunção operada em Primeiro Grau, argumentando que "além da referida espingarda, foram apreendidos também munições e apetrechos para recarga de munição: dezenove cartuchos calibre 32 recarregados de forma artesanal; um cartucho calibre 32 já deflagrado; e várias esferas de chumbo", sendo inaplicável ao caso o princípio da consunção, já que são objetos jurídicos distintos.

O Apelante/Apelado, por sua vez, apresentou Razões (evento 128), requerendo, em resumo, "a troca das duas penas restritivas de direitos, uma vez que o apelante não possui qualquer condição de realizar a prestação de serviço à comunidade, visto que atualmente possui 74 anos de idade e aliado a isso, o mesmo cuida da sua esposa, que se encontra acamada há muitos anos".

Argumenta, ainda, que "quanto a outra pena restritiva de direito imposta, qual seja, prestação de pena pecuniária equivalente a 1 salário mínimo vigente à época dos fatos, também ressalta que não possui condições de arcar com a pena pecuniária, visto que percebe um salário mínimo mensal e que, atualmente, mal dá para comprar os remédios, pagar as despesas mensais e alimentarem-se".

Apresentadas as Contrarrazões (eventos 133 e 135), os autos ascenderam ao Segundo Grau, oportunidade em que a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. José Eduardo Orofino da Luz Fontes, manifestou-se "no sentido do conhecimento e não provimento do recurso interposto pela acusação, e do não conhecimento do apelo da defesa" (evento 11).

É o relatório.

VOTO

Os Recursos são próprios e tempestivos, merecendo conhecimento.

Do Recurso do Ministério Público.

Busca o Ministério Público, em síntese apertada, a exclusão da consunção operada em Primeiro Grau, argumentando que "além da referida espingarda, foram apreendidos também munições e apetrechos para recarga de munição: dezenove cartuchos calibre 32 recarregados de forma artesanal; um cartucho calibre 32 já deflagrado; e várias esferas de chumbo", sendo inaplicável ao caso o princípio da consunção, já que são objetos jurídicos distintos.

Com razão, o Órgão Ministerial.

Inicialmente, cumpre ressaltar que a Autoridade Judiciária a quo considerou que o Apelado/Apelante infringiu o art. 16, parágrafo único (atual § 1º), incisos IV e VI, da Lei n. 10.826/2003, aplicando, apenas, uma pena, com acréscimo de 1/6 (um sexto) na primeira fase, em razão da recarga artesanal, ou seja, realizou a consunção entre as condutas. Transcreve-se, o essencial para análise do caso concreto (evento 104):

[...] A culpabilidade é normal e inerente ao tipo. Não possui maus antecedentes. Personalidade e conduta social não apuradas, pois demandaria exame clínico. O motivo está ligado ao tipo. Circunstâncias sobrelevaram o comum, uma vez que além de uma espingarda calibre 32, marca CBC, com numeração suprimida, realizou recarga artesanal dos dezenove cartuchos de arma de fogo, merecendo majoração de 1/6 (um sexto). As consequências não foram graves. O comportamento da vítima não influiu para o cometimento do delito. Desse modo, nos termos do art. 59, CP, fixo a pena-base em 3 anos e 6 meses de reclusão e 10 dias-multa.

[...]

Por todo o exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos contidos na Denúncia e CONDENO CLARISDINO LOURENCO VIDAL à pena de 3 anos de reclusão e 10 dias-multa, em regime aberto, pela prática do crime previsto no artigo 16, parágrafo único, inciso IV e VI, da Lei n. 10.826/2003, substituída na forma da fundamentação [...] (grifei).

Pois bem. Cumpre mencionar que o delito previsto no art. 16, parágrafo único (atual § 1º), inciso IV, da Lei n. 10.826/03, pune o agente que:

IV - portar, possuir, adquirir, transportar ou fornecer arma de fogo com numeração, marca ou qualquer outro sinal de identificação raspado, suprimido ou adulterado;

Enquanto o previsto no art. 16, parágrafo único (atual § 1º), inciso VI, da Lei de Regência, pune aquele que:

VI - produzir, recarregar ou reciclar, sem autorização legal, ou adulterar, de qualquer forma, munição ou explosivo.

Neste sentido, constata-se que os objetos jurídicos tutelados são diversos e autônomos (posse de arma de fogo com numeração suprimida; e recarga de munições de forma artesanal), além do que a posse dos artefatos bélicos não constituem fatos anteriores ou mesmo posteriores relacionados e dependentes da recarga de munições, o que afasta a possibilidade de reconhecer o princípio da consunção.

Na mesma direção, já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça, no AgRg no AREsp 672.170/SC, de Relatoria do Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 02/02/2016, DJe 10/02/2016:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ENTREGA DE FILHO MENOR A PESSOA INIDÔNEA. ABANDONO...

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