Acórdão Nº 0001714-75.2010.8.24.0074 do Sétima Câmara de Direito Civil, 29-10-2020

Número do processo0001714-75.2010.8.24.0074
Data29 Outubro 2020
Tribunal de OrigemTrombudo Central
ÓrgãoSétima Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão



Apelação Cível n. 0001714-75.2010.8.24.0074

Relator: Desembargador Carlos Roberto da Silva

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM PERDAS E DANOS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA.

INSURGÊNCIA DO DEMANDADO.

PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA. ALEGAÇÃO DE QUE A OBRIGAÇÃO DE TRANSFERIR A TITULARIDADE DO BEM SERIA DA EMPRESA GARAGISTA QUE EFETIVAMENTE RECEBEU A POSSE DA MOTOCICLETA. INACOLHIMENTO. BEM LITIGIOSO NEGOCIADO ENTRE AS PARTES. AUTOR QUE OUTORGOU PROCURAÇÃO EM CAUSA PRÓPRIA AO DEMANDADO. CONCESSÃO DE EXPRESSOS PODERES PARA O RÉU TRANSFERIR A TITULARIDADE DO BEM PERANTE O ÓRGÃO DE TRÂNSITO ESTADUAL. EXISTÊNCIA DE PERTINÊNCIA SUBJETIVA DA LIDE RELATIVA AOS EVENTUAIS PREJUÍZOS ADVINDOS DO DESCUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO. PREFACIAL AFASTADA.

MÉRITO. TESE DE INEXISTÊNCIA DE OBRIGAÇÃO DE TRANSFERIR A TITULARIDADE DA MOTOCICLETA E DE ARCAR COM PERDAS E DANOS. ARGUMENTO DE AUSÊNCIA DE POSSE DO BEM. MOTOCICLETA QUE TERIA SIDO ENTREGUE DIRETAMENTE À REVENDA DE AUTOMÓVEIS. REJEIÇÃO. MANDATO EM CAUSA PRÓPRIA OUTORGADO AO DEMANDADO. CONCESSÃO DE AMPLOS PODERES AO RÉU NO TOCANTE AO DOMÍNIO DO BEM. DOCUMENTO HÁBIL A COMPROVAR A NEGOCIAÇÃO E A TRADIÇÃO DA MOTOCICLETA. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 685, 1.226 E 1.267, DO CÓDIGO CIVIL. OBRIGAÇÃO DO DEMANDADO DE PROVIDENCIAR A TRANSFERÊNCIA DO BEM JUNTO AO DETRAN. RESPONSABILIDADE DO RÉU PELOS TRIBUTOS E ENCARGOS INCIDENTES SOBRE O VEÍCULO APÓS A TRADIÇÃO. SENTENÇA MANTIDA.

FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS. ART. 85, §§ 2º E 11, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. SENTENÇA PUBLICADA APÓS A VIGÊNCIA DO ATUAL DIPLOMA PROCESSUAL CIVIL. MAJORAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA QUE SE IMPÕE. EXIGIBILIDADE SUSPENSA. AUTOR BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA. APLICAÇÃO DO DISPOSTO NO ART. 98, § 3º, DO MESMO DIPLOMA LEGAL.

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0001714-75.2010.8.24.0074, da comarca de Trombudo Central (1ª Vara) em que é Apelante Gilmar Lemes e Apelado Osmar Hasse.

A Sétima Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento e, em consequência, majorar os honorários de sucumbência em favor do patrono da parte apelada. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, o Exmo. Des. Álvaro Luiz Pereira de Andrade, presidente com voto, e a Exma. Desa. Haidée Denise Grin.



Florianópolis, 29 de outubro de 2020.

Carlos Roberto da Silva

RELATOR










RELATÓRIO

Gilmar Lemes interpôs recurso de apelação contra sentença (fls. 114-118) que, nos autos da ação de obrigação de fazer cumulada com perdas e danos ajuizada por Osmar Hasse, julgou procedentes os pedidos iniciais.

Para melhor elucidação da matéria debatida nos autos, adota-se o relatório da sentença recorrida:

Osmar Hasse ajuizou ação de obrigação de fazer c/c ação cominatória, perdas e danos e tutela antecipada contra Gilmar Lemes, por meio da qual aduziu ter alienado uma motocicleta ao acionado, que deixou de transferir a sua propriedade no órgão de trânsito respectivo e de quitar o licenciamento anual e o seguro DPVAT.

Pugnou, a título de antecipação de tutela e, posteriormente, como tutela final, seja o réu compelido a transferir a propriedade da motocicleta para si, além de condenado ao pagamento de indenização por perdas e danos.

Tutela antecipada indeferida, determinou-se a citação do réu (fls. 14/17).

Citado, o réu apresentou contestação às fls. 21/25, instante em que, à guisa de preliminar, levantou a sua ilegitimidade passiva "ad causam" e, no mérito, rebateu os argumentos iniciais, ao mesmo tempo em que pugnou pela condenação do autor nas penas decorrentes da litigância de má-fé.

Houve réplica (fls. 38/41).

Designou-se audiência de instrução e julgamento (fl. 47), sendo colhido o depoimento pessoal do réu e ouvidas quatro testemunhas arroladas por este último, sendo uma delas comum às partes (fls. 54/57, 77/80 e 98/100).

O réu apresentou alegações finais (fls. 105/112), enquanto o autor permaneceu silente (fl. 113).

Após, vieram os autos conclusos.

É o relatório.

Da parte dispositiva do decisum, extrai-se a síntese do julgamento de primeiro grau:

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados por Osmar Hasse nesta ação de obrigação de fazer c/c ação cominatória, perdas e danos e tutela antecipada movida contra Gilmar Lemes e, em consequência:

a) DETERMINO que o réu, transitada em julgado a presente sentença, efetue a transferência da motocicleta Honda XL 250, placa MAM-1837, para o seu nome, perante o órgão de trânsito, sob pena de supressão da sua declaração de vontade e expedição de ordem ao DETRAN/SC para que assim o faça, cabendo ao autor, como contraprestação, fornecer a documentação necessária e efetuar o pagamento dos tributos correspondentes.

b) CONDENO o réu ao pagamento de R$ 1.144,85, sobre o qual deverá incidir correção monetária pelos índices divulgados pela Egrégia CorregedoriaGeral da Justiça a contar do vencimento de cada parcela e juros de mora de 1% ao mês a partir da citação válida (12-1-2011, fl. 20).

Condeno o réu ao pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios, estes que fixo em R$ 1.500,00, nos moldes do art. 85, §8º, do Código de Processo Civil, suspensa, contudo, a exigibilidade, pois neste instante defiro-lhe os benefícios da justiça gratuita.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Transitada em julgado, observadas as cautelas de praxe, arquivem-se.

Em suas razões recursais (fls. 121-127v) o réu argui, preliminarmente, a ilegitimidade passiva ad causam, pois substabeleceu a procuração que lhe foi outorgada pelo demandante para a revenda Sandri Veículos Ltda.

No mérito, defende que, embora tenha recebido do autor a motocicleta Honda XL250, placas MAM 1837, como forma de pagamento pela venda do automóvel GM/MONZA, placas LYI 7468, foi imposta ao comprador a condição de que o primeiro bem fosse transferido para a empresa Sandri Veículos Ltda., já que a intenção do insurgente "era adquirir outro carro em bom estado e jamais uma motocicleta" (fl. 123).

Alega que em 3-5-2006 o autor outorgou-lhe procuração e o automotor foi entregue para referida empresa. No dia seguinte, 4-5-2006, o instrumento procuratório foi substabelecido pelo demandando para José Hélio dos Santos, representante legal do comércio de veículos.

Aduz que por não ter ficado na posse da motocicleta, não pode ser compelido à obrigação de transferir o bem, e nem ao pagamento dos encargos relativos ao ato junto ao Departamento de Trânsito.

Certificado o decurso do prazo sem apresentação de contrarrazões (fl. 141), ascenderam os autos a esta Corte de Justiça.

Este é o relatório.


VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença que julgou procedentes os pedidos inaugurais.

Porque presentes os pressupostos de admissibilidade, conhece-se da apelação interposta.

De início, destaca-se que a decisão recorrida foi publicada quando já vigente o novo Código de Processo Civil (6-4-2016 - fl. 119), motivo pelo qual a referida norma norteará a presente decisão, por incidência do princípio tempus regit actum (teoria do isolamento dos atos processuais), nos moldes do art. 1.046 do atual Código de Ritos.

Tem-se como fato incontroverso, porque não impugnado pelas partes, que a motocicleta Honda XL250, placas MAM 1837, foi recebida pelo apelante como forma de pagamento pela venda ao apelado do veículo GM/MONZA, placas LYI 7468.

Igualmente inconteste que por ocasião da negociação, o recorrido outorgou procuração ao recorrente para transferir a motocicleta, instrumento que no dia seguinte à sua confecção foi substabelecido ao representante legal da empresa Sandri Veículos Ltda.

A controvérsia, portanto, cinge-se em averiguar preliminarmente a legitimidade passiva do apelante, e no mérito examinar o dever do insurgente de arcar com a obrigação de transferir a motocicleta para o seu nome, assim como com o pagamento dos débitos e encargos do ato de transferência.

Sobre tais pontos, então, debruçar-se-á a presente decisão.

Adianta-se, desde já, que o apelo não comporta provimento.

I – Da preliminar de ilegitimidade passiva:

Rejeita-se a proemial de ilegitimidade passiva arguida pelo insurgente, na medida em que o documento de fl. 10 revela que o apelado outorgou ao apelante procuração em causa própria, a fim de que promovesse a transferência do bem litigioso para o seu nome.

Ainda que no dia seguinte a motocicleta tenha sido negociada pelo recorrente com a empresa Sandri Veículos Ltda., com a formalização de substabelecimento do instrumento procuratório ao representante legal da revendedora de veículos, não se exclui a atuação ativa do apelante na avença firmada com o recorrido, que originou a presente contenda, razão pela qual possui legitimidade para responder por eventuais prejuízos decorrentes do descumprimento da obrigação de transferência do bem.

Portanto, afasta-se a aventada ilegitimidade passiva.

II - Dos pleitos cominatórios:

A tese de improcedência dos pedidos cominatórios formulados pelo apelante não merece guarida.

Com efeito, nos termos do art. 123, I, § 1º, do Código de Trânsito Brasileiro, incumbe ao proprietário providenciar, no prazo de 30 (trinta) dias, a transferência do veículo, com a expedição do novo documento.

Tal responsabilidade, no caso em comento, foi transferida ao apelante na forma do instrumento de procuração de fl. 10, tendo sido cedido amplos...

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