Acórdão nº 0001753-77.2019.8.14.0028 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 1ª Turma de Direito Penal, 11-12-2023

Data de Julgamento11 Dezembro 2023
Órgão1ª Turma de Direito Penal
Year2023
Número do processo0001753-77.2019.8.14.0028
Classe processualAPELAÇÃO CRIMINAL
AssuntoEstelionato

APELAÇÃO CRIMINAL (417) - 0001753-77.2019.8.14.0028

APELANTE: WILLIAN TAVARES LEMOS DA SILVA

APELADO: JUSTIÇA PUBLICA

RELATOR(A): Desembargadora ROSI MARIA GOMES DE FARIAS

EMENTA

EMENTA: RECURSO DE APELAÇÃO PENAL. CRIME DE ESTELIONATO EM CONTINUIDADE DELITIVA. ARTIGO 171, CAPUT, C/C ARTIGO 71, AMBOS DO CÓDIGO PENAL BRASILEIRO.

1. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. ATIPICIDADE DA CONDUTA E INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. ARTIGO 386, INCISO VII, DO CPP: IMPOSSIBILIDADE.

1. Na hipótese, a conduta fraudulenta perpetrada pelo ora apelante restou comprovada através dos depoimentos colhidos durante a fase policial, reprisados em Juízo, em especial pela palavra dos ofendidos, corroborada pela prova documental acostada aos autos, que, de maneira harmônica, indicam a ocorrência dos fatos nos moldes delineados na denúncia.

2. O depoimento do ofendido, proprietário da empresa “Casa da Roça”, cuja sede fica localizada em Marabá/PA, foi corroborado pelo depoimento de informante, e pelo relato das testemunhas de acusação, os quais forma uníssonos em afirmar que o ora apelante, aproveitando-se de sua função de vendedor externo do estabelecimento comercial “Casa da Roça”, recebia pagamentos de clientes, em espécie ou em cheque, os quais retinha para si, além de vender e faturar produtos em nome de clientes, entregando-os a terceiros, alterando seus cadastros no sistema da empresa a fim de evitar futura cobrança, no intuito de continuar perpetrando as ações fraudulentas que geraram a vítima um prejuízo de, aproximadamente, R$ 800.000,00 (oitocentos mil reais).

3. Neste contexto, conclui-se que o ora apelante, com claro intuito de ludibriar a vítima, causou-lhe efetivo prejuízo e, em contrapartida, obteve para si vantagem ilícita, em continuidade delitiva, mostrando-se inviável a absolvição do apelante por atipicidade da conduta.

4. Condenação mantida.

2. PEDIDO DE REFORMA DA DOSIMETRIA DA PENA. DISPENSA OU REDUÇÃO DA PENA PECUNIÁRIA. EXCLUSÃO DA OBRIGAÇÃO PECUNIÁRIA: PARCIAL ACOLHIMENTO.

1. No presente caso, observo que o Juízo singular incidiu em valorou escorreitamente as circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, apresentando fundamentação idônea na ponderação negativa dos vetores culpabilidade, circunstâncias e consequências do crime, em estrita obediência ao princípio do dever de motivação dos pronunciamentos judiciais, e ao teor da Súmula nº 17/2016, deste Eg. TJ/PA.

2. Por este motivo, compreendo que o ora apelante que a aferição negativa de 03 (três) circunstâncias judiciais, de maneira motivada, autoriza a exasperação da reprimenda acima do patamar mínimo legal. Inteligência da Súmula nº 23, deste Eg. TJ/PA. PRECEDENTES.

3. Quanto ao pedido isenção ou redução da pena de multa, sob a alegação de que o ora apelante não possui condições econômicas favoráveis, tenho que não merece agasalho.

4. Necessário ressaltar que a pena de multa integra o preceito secundário do tipo penal pelo qual o apelante foi processado e condenado, assim, a pena privativa de liberdade e a de multa devem ser aplicadas cumulativamente sendo, portanto, de imposição obrigatória. Precedentes.

5. Quanto ao pedido de exclusão do efeito da condenação de reparação do dano causado pelo delito, fixado pelo Juízo a quo no valor de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), com fulcro no artigo 91, inciso I, do Código Penal, entendo que merece prosperar a pretensão recursal.

6. Como bem apontado pela combatente defesa, a fixação de indenização civil por danos materiais e morais, a par de se tratar de mecanismo que busca a solução célere do conflito, não se afeiçoa ao trato de ofício pelo magistrado.

7. É imprescindível, pois, que haja pedido expresso na inicial, inclusive indicando os parâmetros pretendidos, para que a parte adversa, no caso o réu da ação penal, possa exercer seu garantido direito constitucional ao contraditório e à ampla defesa.

8. Destarte, verifica-se dos autos que não há pedido na peça acusatória, tampouco nas Alegações Finais, acerca da reparação de danos e não foi requerida pelo ofendido em momento algum no processo.

9. A fixação da reparação apresenta-se arbitrária ao ser estipulada pelo juiz em surpresa à defesa, sem obedecer ao devido processo legal, tão somente com base nas cópias de cheques e depoimento da vítima, sem que tenha sido permitido ao ora apelante as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa. Assim, deve ser expurgada do decreto condenatório.

10. PRECEDENTES DO STJ.

RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO, DIVERGINDO, EM PARTE, DO RESPEITÁVEL PARECER MINISTERIAL. UNANIMIDADE.

ACÓRDÃO

Vistos etc.

Acordam as Excelentíssimas Senhoras Desembargadoras componentes da 1ª Turma de Direito Penal, por unanimidade, em CONHECER do presente recurso e, no mérito, DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO, nos termos do voto da Relatora.

Sessão Ordinária do Plenário de Julgamento da 1ª Turma de Direito Penal do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, realizada em onze de dezembro de dois mil e vinte e três.

Julgamento presido pela Excelentíssima Senhora Desembargadora Kédima Pacífico Lyra.

Belém/PA, 11 de dezembro de 2023.

Desembargadora ROSI MARIA GOMES DE FARIAS

Relatora

RELATÓRIO

RELATÓRIO

Trata-se de Recurso de Apelação Penal interposto em favor de WILLIAN TAVARES LEMOS DA SILVA, sob o patrocínio da Defensoria Pública Estadual, objetivando reformar a r. decisão proferida pelo MM. Juízo de Direito da 2ª Vara Criminal de Marabá/PA, que julgando procedente a pretensão punitiva estatal, o condenou à pena de 05 (cinco) anos de reclusão, a ser cumprida inicialmente em regime semiaberto, além do pagamento de 306 (trezentos e seis) dias-multa, a fração unitária de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente no país à época dos fatos, pela prática do crime de estelionato em continuidade delitiva, nos moldes do artigo 171, caput, c/c artigo 71, ambos do Código Penal Brasileiro.

Narrou a denúncia, ID 15972145, pág. 02-06, que foi apurado através dos autos do Inquérito Policial nº 184/2018.100805-4, que nos anos de 2017 e 2018, o denunciado Willian Tavares Lemos da Silva, ora apelante, praticou o crime de estelionato, em continuidade delitiva, em face da empresa “Casa da Roça”, cuja sede fica localizada no município de Marabá/PA.

Infere-se dos autos que no dia 09 de abril de 2018, compareceu à empresa a vítima Edson Raimundo Alvarenga, informando que queria quitar um débito. Ao ser encaminhado ao setor de cobrança, foi constatado que de fato havia um débito, mas houve acerto com o ora apelante no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). No entanto, Willian não repassou o cheque para a empresa, além de uma nota promissória no valor de R$ 19.000,00 (dezenove mil reais), que Edson nega ter realizado a compra, tampouco recebeu as mercadorias.

Verificou-se que a nota foi faturada e houve a retirada da mercadoria do estoque, mas não houve o repasse para o pretenso comprador.

Consta do depoimento do nacional Domingo Borges da Silva, que no mês de janeiro de 2018 realizou compras na “Casa da Roça” situada em Nova Ipixuna, totalizando o montante de R$ 3.080,00 (três mil e oitenta reais) e tomou conhecimento que sua dívida estava totalizando quase R$ 9.000,00 (nove mil reais), no entanto, negou o débito do referido valor. Esclareceu mais ainda que sempre comprava produtos a vista e repassava o dinheiro nas mãos do ora apelante, o qual não emitia nota fiscal, afirmando que há mais de dois anos que realizava tal procedimento com o ora apelante.

O ofendido Edilson Raimundo Alvarenga, informou em sede policial que também era cliente da “Casa da Roça”, e que o ora apelante lhe vendia produtos agrícolas. Ficou sabendo através de terceiros que Willian estaria realizando gastos extravagantes, bancando time de futebol da cidade. Por conta disso, lembrou que havia realizado pagamentos em cheques para o ora apelante, sendo que repassou seis cheques pré-datados: 01 (um) no valor de R$ 3.900,00 (três mil e novecentos reais), 01 (um) no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), e 04 (quatro) cheques no valor de R$ 4.819,00 (quatro mil, oitocentos e dezenove reais).

Diante do temor, procurou a empresa a fim de averiguar a quitação do débito, e tomou conhecimento que foi dado entrada apenas de quatro cheques, ato que em que os de valores R$ 5.000,00 (cinco mil reais) e R$ 3.900,00 (três mil e novecentos reais) não constava no caixa da empresa. Foi lhe mostrado notas, e que uma delas teria assinatura falsa de 50 (cinquenta) baldes de veneno agrícola em seu nome.

Por sua vez, a vítima Helmo Fernandes de Araújo, aduziu que realizou compras na “Casa da Roça”, no valor de R$ 16.000,00 (dezesseis mil reais) em produtos e depositou o referido valor na conta pessoal do ora apelante. Narrou que vendeu uma casa no valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) para o ora apelante, que foi lhe pagando com produtos: venenos, capim, fosbol 40, adubo e arame, totalizando o valor de R$ 12.000,00 (doze mil reais). Narrou que também o ora apelante lhe entregou o valor de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) e um carro Voyage no valor de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais). O restante da dívida ficou acordado que Willian lhe repassaria 10 (dez) bolas de arame, 10 (dez) sacos de fosbol 40 e 05 (cinco) tambores de veneno campidé. Declarou, por fim, que o ora apelante recebeu a quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) do nacional “Zé Dilson”, referente a compra de venenos, mas este nunca recebeu os produtos.

Ao ser interrogado em sede policial, o ora apelante negou os fatos, narrando que era vendedor autônomo, vendendo produtos que não havia na empresa. Confessou que sua atividade consistia em faturar produtos em nome de um determinado cliente e repassando a mercadoria para outro, agindo desta forma para aumentar sua renda financeira.

Diante dos fatos, a representante do Ministério Público de 1º Grau pugnou pela condenação do ora apelante como incurso nas sanções punitivas do artigo 171, caput, c/c artigo 71, ambos...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT