Acórdão Nº 0001796-56.2017.8.24.0076 do Primeira Câmara Criminal, 28-06-2022
Número do processo | 0001796-56.2017.8.24.0076 |
Data | 28 Junho 2022 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça de Santa Catarina |
Órgão | Primeira Câmara Criminal |
Classe processual | Recurso em Sentido Estrito |
Tipo de documento | Acórdão |
Recurso em Sentido Estrito Nº 0001796-56.2017.8.24.0076/SC
RELATORA: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO
RECORRENTE: VANUSA FORNAZA SILVESTRE (ACUSADO) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)
RELATÓRIO
No Juízo da Vara Única da Comarca de Turvo, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia em face Vanusa Fornaza Silvestre, pela prática, em tese, da infração penal contra a vida prevista no art. 121, § 2º, II e IV, c/c art. 14, II, ambos do Código Penal, em razão dos fatos assim narrados na inicial acusatória (evento 45, PET126):
Em fevereiro de 2017, a denunciada Vanusa Fornaza Silvestre, com então 32 anos, e Nazareno Cardoso, com então 38 anos, iniciaram um namoro.
Ocorre que, em meados do ano de 2017, Nazareno decidiu pôr fim ao relacionamento.
Desde então, inconformada com o fim da união, a denunciada Vanusa passou a enviar diversas mensagens telefônicas a Nazareno, algumas com promessas de causar-lhe mal injusto e grave, afirmando que se "tu não fores meu, não serás mais de ninguém".
Assim foi que, no dia 26 de dezembro de 2017, em uma terça-feira, por volta das 14h40min, a denunciada Vanusa dirigiu-se à casa de Nazareno, na Rua Professora Carolina Duarte Fernandes, Centro, em Timbé do Sul (SC), onde, na frente da casa, chamou por Nazareno, o qual foi atendê-la.
Foi então que, com a aproximação do ex-namorado, a denunciada Vanusa, dizendo "se tu não é meu, não é de ninguém", de forma inopinada, sacou de um revolver calibre 381 e, com animus necandi, desferiu um disparo contra o peito de Nazareno, o qual, dada a surpresa do ataque, ficou impossibilitado de se defender, até porque, naquelas circunstâncias, nem sequer imaginava que poderia sofrer tal agressão.
Veja-se que a denunciada Vanusa somente não efetuou um segundo disparo contra Nazareno porque este, ao ser atingido pelo primeiro tiro, caiu ao chão e perdeu os sentidos, fazendo com que ela imaginasse que já havia alcançado êxito no seu intento homicida.
O homicídio não se consumou também porque a Nazareno, embora atingido em região de vitais funções - o projétil entrou na região supraclavicular direita, transfixou e saiu na região escapular esquerda -, foi socorrido e, mesmo diante de um quadro de hemorragia na cavidade pleural direita , conseguiu, devido à intervenção medico-cirúrgica, resistir ao grave ferimento.
Por fim, de se dizer que o crime foi praticado por motivo frívolo, egoístico, fútil, pois a denunciada Vanusa, diante da não aceitação do fim de um simples namoro que havia mantido com Nazareno, decidiu ceifar a vida deste.
Encerrada a instrução processual e apresentadas alegações finais pelas partes, sobreveio decisão de pronúncia, que acatou a pretensão acusatória para submeter o ré a julgamento Popular pelo suposto cometimento da tentativa de homicídio descrita na peça vestibular. A deliberação contou com o seguinte dispositivo (evento 187, SENT1):
Por todo o exposto, na forma do art. 413, §1° do CPP, PRONUNCIO VANUSA FORNAZA SILVESTRE, dando-a incursa nos art. 121, §2°, incisos II e IV c/c art. 14, inciso II, ambos do CP.
Inconformada com o decisum, a acusada interpôs o presente recurso, almejando, em suma: a) a desclassificação da tentativa de homicídio para o crime de lesão corporal em razão do arrependimento eficaz e ausência de animus necandi; b) o afastamento das qualificadoras; c) o reconhecimento da causa de diminuição do homicídio privilegiado, preceituada no art. 121, § 1º, do Código Penal; e d) a aplicação da atenuante da confissão espontânea (evento 191, RAZRECUR1).
Em contrarrazões, o Ministério Público propôs a manutenção incólume da sentença recorrida (evento 203, PROMOÇÃO1).
Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Dr. Procurador Lio Marcos Marin, que se manifestou pelo conhecimento e desprovimento do recurso (evento 41, PROMOÇÃO1).
Este é o relatório.
VOTO
Trata-se de Recurso em Sentido Estrito interposto Vanusa Fornaza Silvestre contra decisão do Juízo da Vara Única da Comarca de Turvo que, ao julgar admissível o pedido formulado na denúncia, prolatou sentença de pronúncia, a submetendo a julgamento perante o Tribunal do Júri em razão da prática, em tese, do delito contra a vida disciplinado no art. 121, § 2º, II e IV, c/c art. 14, II, ambos do Código Penal.
1. Dos fatos
Consta da peça vestibular, sinteticamente, que a recorrente, na data de 26-12-2017, inconformada com o término do relacionamento, depois de encaminhar mensagens com promessas de causar mal injusto e grave a seu ex-companheiro, dirigiu-se até a residência da vítima, chamou-a pelo nome e, quando estavam próximos, de forma repentina, sacou um revólver calibre .38 e, imbuída de manifesto animus necandi, deflagrou disparo contra o peito do ofendido.
Segundo a pretensão acusatória, a acusada somente não desferiu outros tiros por ter imaginado que havia alcançado seu intento homicida, o qual, todavia, não restou consumado por circunstâncias alheias à sua vontade, precisamente porque, embora o disparo tenha atingido região de vitais funções, a vítima recebeu eficaz atendimento médico.
Por tais razões, o Ministério Público ofereceu denúncia em desfavor de Vanusa Fornaza Silvestre, dando-a como incurso na sanção do art. 121, § 2º, II e IV, c/c art. 14, II, ambos do Código Penal.
Devidamente instruído o presente feito, sobreveio decisão de pronúncia, que acatou o pedido formulado na exordial acusatória para submeter a ré a julgamento perante o Conselho de Sentença, pela suposta prática do homicídio qualificado tentado descrito na denúncia.
Irresignada, a acusada manejou a presente insurgência.
2. Da admissibilidade
O recurso preenche os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual comporta conhecimento.
3. Mérito
3.1 Do pedido de desclassificação da tentativa de homicídio para lesão corporal
A defesa sustenta que o substrato probatório demonstra que a ré, no percurso executório da infração penal, arrependeu-se de sua conduta e interrompeu a continuidade do ato criminoso.
Alega que a recorrente, motivada por violenta emoção, discutiu previamente com a vítima, desferiu-lhe um disparo e saiu do local somente quando visualizou a vítima levantar-se, incidindo, na espécie, o instituto do arrependimento eficaz previsto no art. 15, do Código Penal.
Pondera que a ré poderia ter efetuado mais disparos contra o ofendido, contudo, não possuía intenção homicida.
Por tais razões, postula a desclassificação da tentativa de homicídio atribuída na peça vestibular, para o crime de lesão corporal, reconhecendo-se que a ré agiu motivada por violenta emoção, nos termos do art. 129, § 4º, do Estatuto Repressor.
O pedido, adianto, não merece acolhimento.
De saída, relativamente à pronúncia, assim dispõe o caput e o parágrafo primeiro do art. 413 do Código de Processo Penal:
Art. 413. O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação.
§ 1o A fundamentação da pronúncia limitar-se-á à indicação da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, devendo o juiz declarar o dispositivo legal em que julgar incurso o acusado e especificar as circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento de pena.
Consoante se infere do dispositivo destacado, a pronúncia encerra simples juízo de admissibilidade da acusação, exigindo-se para a sua prolação somente prova da materialidade e indícios suficientes da autoria delitiva. Com efeito, não há espaço para uma averiguação exaustiva do substrato probatório angariado, realiza-se apenas uma análise perfunctória, a fim de verificar se existem elementos para submeter o acusado a julgamento perante o Conselho de Sentença.
Em outros termos, nessa etapa do procedimento escalonado, quanto à prova produzida, procede-se a uma operação cognitiva não exauriente, uma vez que não se pode exigir a formação de um juízo de certeza, mas apenas de probabilidade fundada.
A propósito, "[...] Na decisão de pronúncia há mero juízo de prelibação, sem encerrar qualquer ideia de condenação, onde o juiz singular, em decisão monocrática, diz estar "convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes da autoria ou de participação" (art. 413, caput, do CPP), e submete o acusado a julgamento perante o Tribunal do Júri, colegiado que cabe a análise mais aprofundada das provas [...] (TJSC, Recurso em Sentido Estrito n. 0001689-78.2017.8.24.0054, rel. Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva, Primeira Câmara Criminal, j. em 07-03-2019).
Acerca do tema, assinala Renato Brasileiro de Lima:
Assim, se o juiz sumariante estiver convencido da existência do crime e da presença de indícios suficientes de autoria ou de participação, deve pronunciar o acusado, de maneira fundamentada. Há na pronúncia um mero juízo de prelibação, por meio do qual o juiz admite ou rejeita a acusação, sem qualquer valoração acerca do mérito. Julga-se admissível o ius accusationis. Restringe-se à verificação da presença do fumus boni iuris, admitindo todas as acusações que tenham ao menos probabilidade de procedência (Manual de Processo Penal. 4. ed., Salvador: JusPodivm, 2016. p. 1336).
Como decorrência de seu caráter meramente declaratório, naturalmente, é inviável impor a necessidade de prova plena acerca da autoria delitiva, mesmo porque, havendo dúvida razoável a respeito, inevitável o encaminhamento da questão ao juízo natural dos crimes contra a vida, em atenção ao princípio do in dubio pro societate.
É que "[...] A pronúncia não demanda juízo de certeza necessário à sentença condenatória, uma vez que as eventuais dúvidas, nessa fase processual, resolvem-se em favor da sociedade - in dubio pro societate. [...]" (STJ, Quinta Turma, AgRg no AREsp 1726405/RS, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, j. em 23-03-2021).
Relativamente à desclassificação, dispõe o art. 419, caput, do Código de Processo Penal: "Quando o juiz se convencer, em...
RELATORA: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO
RECORRENTE: VANUSA FORNAZA SILVESTRE (ACUSADO) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)
RELATÓRIO
No Juízo da Vara Única da Comarca de Turvo, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia em face Vanusa Fornaza Silvestre, pela prática, em tese, da infração penal contra a vida prevista no art. 121, § 2º, II e IV, c/c art. 14, II, ambos do Código Penal, em razão dos fatos assim narrados na inicial acusatória (evento 45, PET126):
Em fevereiro de 2017, a denunciada Vanusa Fornaza Silvestre, com então 32 anos, e Nazareno Cardoso, com então 38 anos, iniciaram um namoro.
Ocorre que, em meados do ano de 2017, Nazareno decidiu pôr fim ao relacionamento.
Desde então, inconformada com o fim da união, a denunciada Vanusa passou a enviar diversas mensagens telefônicas a Nazareno, algumas com promessas de causar-lhe mal injusto e grave, afirmando que se "tu não fores meu, não serás mais de ninguém".
Assim foi que, no dia 26 de dezembro de 2017, em uma terça-feira, por volta das 14h40min, a denunciada Vanusa dirigiu-se à casa de Nazareno, na Rua Professora Carolina Duarte Fernandes, Centro, em Timbé do Sul (SC), onde, na frente da casa, chamou por Nazareno, o qual foi atendê-la.
Foi então que, com a aproximação do ex-namorado, a denunciada Vanusa, dizendo "se tu não é meu, não é de ninguém", de forma inopinada, sacou de um revolver calibre 381 e, com animus necandi, desferiu um disparo contra o peito de Nazareno, o qual, dada a surpresa do ataque, ficou impossibilitado de se defender, até porque, naquelas circunstâncias, nem sequer imaginava que poderia sofrer tal agressão.
Veja-se que a denunciada Vanusa somente não efetuou um segundo disparo contra Nazareno porque este, ao ser atingido pelo primeiro tiro, caiu ao chão e perdeu os sentidos, fazendo com que ela imaginasse que já havia alcançado êxito no seu intento homicida.
O homicídio não se consumou também porque a Nazareno, embora atingido em região de vitais funções - o projétil entrou na região supraclavicular direita, transfixou e saiu na região escapular esquerda -, foi socorrido e, mesmo diante de um quadro de hemorragia na cavidade pleural direita , conseguiu, devido à intervenção medico-cirúrgica, resistir ao grave ferimento.
Por fim, de se dizer que o crime foi praticado por motivo frívolo, egoístico, fútil, pois a denunciada Vanusa, diante da não aceitação do fim de um simples namoro que havia mantido com Nazareno, decidiu ceifar a vida deste.
Encerrada a instrução processual e apresentadas alegações finais pelas partes, sobreveio decisão de pronúncia, que acatou a pretensão acusatória para submeter o ré a julgamento Popular pelo suposto cometimento da tentativa de homicídio descrita na peça vestibular. A deliberação contou com o seguinte dispositivo (evento 187, SENT1):
Por todo o exposto, na forma do art. 413, §1° do CPP, PRONUNCIO VANUSA FORNAZA SILVESTRE, dando-a incursa nos art. 121, §2°, incisos II e IV c/c art. 14, inciso II, ambos do CP.
Inconformada com o decisum, a acusada interpôs o presente recurso, almejando, em suma: a) a desclassificação da tentativa de homicídio para o crime de lesão corporal em razão do arrependimento eficaz e ausência de animus necandi; b) o afastamento das qualificadoras; c) o reconhecimento da causa de diminuição do homicídio privilegiado, preceituada no art. 121, § 1º, do Código Penal; e d) a aplicação da atenuante da confissão espontânea (evento 191, RAZRECUR1).
Em contrarrazões, o Ministério Público propôs a manutenção incólume da sentença recorrida (evento 203, PROMOÇÃO1).
Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Dr. Procurador Lio Marcos Marin, que se manifestou pelo conhecimento e desprovimento do recurso (evento 41, PROMOÇÃO1).
Este é o relatório.
VOTO
Trata-se de Recurso em Sentido Estrito interposto Vanusa Fornaza Silvestre contra decisão do Juízo da Vara Única da Comarca de Turvo que, ao julgar admissível o pedido formulado na denúncia, prolatou sentença de pronúncia, a submetendo a julgamento perante o Tribunal do Júri em razão da prática, em tese, do delito contra a vida disciplinado no art. 121, § 2º, II e IV, c/c art. 14, II, ambos do Código Penal.
1. Dos fatos
Consta da peça vestibular, sinteticamente, que a recorrente, na data de 26-12-2017, inconformada com o término do relacionamento, depois de encaminhar mensagens com promessas de causar mal injusto e grave a seu ex-companheiro, dirigiu-se até a residência da vítima, chamou-a pelo nome e, quando estavam próximos, de forma repentina, sacou um revólver calibre .38 e, imbuída de manifesto animus necandi, deflagrou disparo contra o peito do ofendido.
Segundo a pretensão acusatória, a acusada somente não desferiu outros tiros por ter imaginado que havia alcançado seu intento homicida, o qual, todavia, não restou consumado por circunstâncias alheias à sua vontade, precisamente porque, embora o disparo tenha atingido região de vitais funções, a vítima recebeu eficaz atendimento médico.
Por tais razões, o Ministério Público ofereceu denúncia em desfavor de Vanusa Fornaza Silvestre, dando-a como incurso na sanção do art. 121, § 2º, II e IV, c/c art. 14, II, ambos do Código Penal.
Devidamente instruído o presente feito, sobreveio decisão de pronúncia, que acatou o pedido formulado na exordial acusatória para submeter a ré a julgamento perante o Conselho de Sentença, pela suposta prática do homicídio qualificado tentado descrito na denúncia.
Irresignada, a acusada manejou a presente insurgência.
2. Da admissibilidade
O recurso preenche os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual comporta conhecimento.
3. Mérito
3.1 Do pedido de desclassificação da tentativa de homicídio para lesão corporal
A defesa sustenta que o substrato probatório demonstra que a ré, no percurso executório da infração penal, arrependeu-se de sua conduta e interrompeu a continuidade do ato criminoso.
Alega que a recorrente, motivada por violenta emoção, discutiu previamente com a vítima, desferiu-lhe um disparo e saiu do local somente quando visualizou a vítima levantar-se, incidindo, na espécie, o instituto do arrependimento eficaz previsto no art. 15, do Código Penal.
Pondera que a ré poderia ter efetuado mais disparos contra o ofendido, contudo, não possuía intenção homicida.
Por tais razões, postula a desclassificação da tentativa de homicídio atribuída na peça vestibular, para o crime de lesão corporal, reconhecendo-se que a ré agiu motivada por violenta emoção, nos termos do art. 129, § 4º, do Estatuto Repressor.
O pedido, adianto, não merece acolhimento.
De saída, relativamente à pronúncia, assim dispõe o caput e o parágrafo primeiro do art. 413 do Código de Processo Penal:
Art. 413. O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação.
§ 1o A fundamentação da pronúncia limitar-se-á à indicação da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, devendo o juiz declarar o dispositivo legal em que julgar incurso o acusado e especificar as circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento de pena.
Consoante se infere do dispositivo destacado, a pronúncia encerra simples juízo de admissibilidade da acusação, exigindo-se para a sua prolação somente prova da materialidade e indícios suficientes da autoria delitiva. Com efeito, não há espaço para uma averiguação exaustiva do substrato probatório angariado, realiza-se apenas uma análise perfunctória, a fim de verificar se existem elementos para submeter o acusado a julgamento perante o Conselho de Sentença.
Em outros termos, nessa etapa do procedimento escalonado, quanto à prova produzida, procede-se a uma operação cognitiva não exauriente, uma vez que não se pode exigir a formação de um juízo de certeza, mas apenas de probabilidade fundada.
A propósito, "[...] Na decisão de pronúncia há mero juízo de prelibação, sem encerrar qualquer ideia de condenação, onde o juiz singular, em decisão monocrática, diz estar "convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes da autoria ou de participação" (art. 413, caput, do CPP), e submete o acusado a julgamento perante o Tribunal do Júri, colegiado que cabe a análise mais aprofundada das provas [...] (TJSC, Recurso em Sentido Estrito n. 0001689-78.2017.8.24.0054, rel. Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva, Primeira Câmara Criminal, j. em 07-03-2019).
Acerca do tema, assinala Renato Brasileiro de Lima:
Assim, se o juiz sumariante estiver convencido da existência do crime e da presença de indícios suficientes de autoria ou de participação, deve pronunciar o acusado, de maneira fundamentada. Há na pronúncia um mero juízo de prelibação, por meio do qual o juiz admite ou rejeita a acusação, sem qualquer valoração acerca do mérito. Julga-se admissível o ius accusationis. Restringe-se à verificação da presença do fumus boni iuris, admitindo todas as acusações que tenham ao menos probabilidade de procedência (Manual de Processo Penal. 4. ed., Salvador: JusPodivm, 2016. p. 1336).
Como decorrência de seu caráter meramente declaratório, naturalmente, é inviável impor a necessidade de prova plena acerca da autoria delitiva, mesmo porque, havendo dúvida razoável a respeito, inevitável o encaminhamento da questão ao juízo natural dos crimes contra a vida, em atenção ao princípio do in dubio pro societate.
É que "[...] A pronúncia não demanda juízo de certeza necessário à sentença condenatória, uma vez que as eventuais dúvidas, nessa fase processual, resolvem-se em favor da sociedade - in dubio pro societate. [...]" (STJ, Quinta Turma, AgRg no AREsp 1726405/RS, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, j. em 23-03-2021).
Relativamente à desclassificação, dispõe o art. 419, caput, do Código de Processo Penal: "Quando o juiz se convencer, em...
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