Acórdão Nº 0001806-13.2017.8.24.0008 do Quinta Câmara Criminal, 19-04-2022

Número do processo0001806-13.2017.8.24.0008
Data19 Abril 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão
Recurso em Sentido Estrito Nº 0001806-13.2017.8.24.0008/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ NERI OLIVEIRA DE SOUZA

RECORRENTE: GILMAR CORREIA DA SILVA (ACUSADO) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na comarca de Blumenau, o representante do Ministério Público ofereceu denúncia em face de GILMAR CORREIA DA SILVA, dando-o(a) como incurso nas sanções do art. 121, § 2º, IV, c/c art. 14, II, ambos do Código Penal, conforme os seguintes fatos descritos na inicial acusatória, in verbis:

No dia 18 de junho de 2016, por volta da 8h30min, o denunciado Gilmar Correia da Silva dirigiu-se, na carona de uma motocicleta conduzida por um indivíduo ainda não identificado, até a Rua Botuverá, Bairro Itoupavazinha, nesta cidade e comarca, quando, nas proximidades de uma borracharia, desceu do veículo e se dirigiu até a vítima Dilson Pinto.

Ato contínuo, imbuído de manifesto animus necandi, o denunciado efetuou cinco disparos de arma de fogo em direção à vítima, não se consumando o crime por circunstâncias alheias à vontade do agente, porquanto acertou apenas dois dos tiros disparados, ao passo que a vítima foi socorrida a tempo e encaminhada ao nosocômio mais próximo, sendo constatada a ocorrência das lesões descritas no Laudo Pericial de fl. 30.

Cumpre destacar que, agindo de tal forma, Gilmar utilizou-se de recurso que dificultou a defesa da vítima, qual seja, surpresa, uma vez que ela se encontrava em frente ao referido estabelecimento comercial aguardando tranquilamente pelo atendimento a seu veículo, no momento em que o denunciado a atacou de inopino com os disparos (ev. 21 - 00018061320178240008).

Apresentadas as alegações finais (eventos 87 e 90) a autoridade judiciária a quo julgou admissível a denúncia e pronunciou GILMAR CORREIA DA SILVA pela suposta prática do crime previsto no art. 121, §2º, inciso IV, c/c art. 14, inciso II, ambos do Código Penal, determinando o seu julgamento perante o Tribunal do Júri (ev. 98).

Inconformado(a), o(a) acusado(a), por intermédio de Defensor Público, interpôs recurso em sentido estrito (ev. 104).

Em suas razões, em resumo, postula: 1. A absolvição sumária do acusado ante a comprovação de que ele não foi autor do crime narrado na inicial acusatória. Entende que, "ao longo da instrução processual, restaram dúvidas no que tange a autoria do crime, ora imputado à GILMAR CORREIA DA SILVA, impossibilitando sua imputação de forma cabal"; 2. Subsidiariamente, a impronúncia por insuficiência de indícios mínimos de autoria. Argumenta que, no seu entender, "a instrução ficou demasiadamente vaga, ou seja, não se conseguiu apontar elementos de autoria delitiva por parte do acusado GILM AR CORREIA DA SILVA"; 3. Caso mantida a decisão, a exclusão da qualificadora prevista no artigo 121, § 2º, incisos IV, do Código Penal, ao argumento de que "os elementos fornecidos pela acusação são por demais frágeis e não possuem sequer o condão de fazer surgir dúvida acerca da qualificadora - o que ensejaria a remessa da dúvida ao Conselho de Sentença - e, em razão disso, deverá ser, de plano, afastada" (ev. 104).

Nas contrarrazões, o Ministério Público defendeu o desprovimento do recurso (ev. 113).

Em juízo de retratação, a autoridade a quo manteve a decisão combatida (ev. 115).

A Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer lavrado pelo Excelentíssimo Procurador de Justiça Dr. Lio Marcos Marin, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso (ev. 98).

Este é o relatório.

VOTO

Presentes os pressupostos legais de admissibilidade, conhece-se do recurso.

1. É sabido que a decisão de pronúncia se destina a filtrar a imputação, exercendo a função de encaminhar à apreciação do Tribunal Popular tão somente os casos que detenham provas mínimas a gerar dúvida razoável no espírito do Magistrado, em obediência ao princípio in dubio pro societate, como juízo de admissibilidade da acusação.

O decisum encerra, portanto, "um mero juízo de admissibilidade, onde examinam-se somente indícios de autoria e materialidade do fato. Assim, deve o Magistrado ser comedido ao fundamentá-la, sob pena de invadir a competência do Tribunal do Júri, juiz natural da causa" (STJ, HC n. 170.716/MG, rel. Min. Laurita Vaz, 5ª Turma, j. 28.2.2012).

Destarte, consoante enunciado no artigo 413 do Código Processual Penal, há de ocorrer a pronúncia quando, convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, identifique elementos mínimos para potencial e futura condenação, cabendo a apreciação e resolução de eventuais controvérsias ao juízo natural constitucionalmente instituído.

Por outro lado, o juiz, fundamentadamente, absolverá desde logo o acusado nas hipóteses elencadas ao artigo 415 do Código de Processo Penal, ou ainda, constatada a ausência de elementos bastantes a autorizar a reunião do júri, necessária a impronúncia do agente (artigo 414, Código de Processo Penal).

Ao analisar o caderno probatório, tal qual referido pelo Magistrado a quo, verificam-se as necessárias provas da materialidade delitiva, notadamente através dos elementos angariados no Inquérito Policial 00018061320178240008 (eventos 1, 8 e 16), Laudo Pericial n. 9415.18.1518, que atestou que a vítima Dilson Pinto, "sofreu ferimento por arma de fogo na região cervical direita, inferior ao maxilar e saída em região lateral; outro ferimento com entrada de projetil em região proximal e dorsal de antebraço (sem definição do lado) e saída em região volar (palma da mão)" (evento 16, OFÍCIO29).

Em relação à autoria, existem indicativos suficientes para o encaminhamento do acusado a julgamento pelo Tribunal do Júri. Assim, para referida análise e com o fito de evitar qualquer tipo de redundância, transcrevem-se fragmentos da sentença de pronúncia, as quais utilizo como razão de decidir, in verbis:

Em fase policial, a vítima Dilson Pinto (evento 8, OFÍCIO11) contou que:

"[...] Que confirma os fatos narrados no BO 299.16.3165; Que, era síndico no prédio na Rua Botuverá e era vizinho de Gilmar, que tinha desavenças com o irmão do declarante, de nome Gilson Angelo Pinto, que foi morto há 4 anos; Que, alega que Gilmar e seu falecido irmão eram farinhas do mesmo saco, ou seja, cometiam crimes diversos; Que, acredita que Gilmar ache que o declarante seja uma ameaça, e por isso tentou matar o declarante; Que, quando morava no prédio, já fez denúncias de vários crimes cometidos naquele local e também, por isso as pessoas que lá residem não gostam do declarante; Que, nunca teve antes dos fatos qualquer desavença com Gilmar; Que, os disparos o braço e o rosto do declarante, tendo sido levado ao hospital Santo Antônio, onde foi atendido e logo liberado; Que, não se submeteu a exame pericial na época; Que, não há testemunhas dos fatos."

A vítima Dilson Pinto (evento 84, vídeo 2) contou em juízo que no dia dos fatos, foi trabalhar em uma obra juntamente com seu filho às 04h30min no Posto Nenê. Como chovia no dia, não conseguiu trabalhar no muro do local, assim, foi trocar os pneus de sua caminhonete. Contou que cerca de 07h45min chegou em uma borracharia, e permaneceu ali enquanto o seu filho foi buscar os pneus. Nesse momento, chegou um rapaz a pé, cujo nome descobriu posteriormente ser João, traficante de um dos prédios da região juntamente com o réu. O depoente relatou que disse a seu filho que o rapaz estava "mal intencionado" devido ao jeito que lhe olhava. Contou que o rapaz passou por ele e "se escondeu" atrás de um poste, falando no telefone. Disse que, enquanto o filho buscava os pneus, chegaram Gilmar e outro rapaz - de cujo nome não se recorda, embora conheça o indivíduo - em uma moto. Disse que nunca pensou que o acusado atiraria, pois deu comida aos irmãos do acusado quando eram pequenos. Relatou que o acusado saiu da moto e deu o primeiro disparo, que atingiu a vítima na cabeça. Disse que, devida a problemas na coluna, não pôde correr. Por este motivo, foi "empurrando" Gilmar enquanto ele atirava. Afirmou que o acusado errou três tiros, mas acertou outros dois: um na região do braço e outro que...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT