Acórdão Nº 0001824-89.2017.8.24.0022 do Segunda Câmara Criminal, 06-10-2020

Número do processo0001824-89.2017.8.24.0022
Data06 Outubro 2020
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 0001824-89.2017.8.24.0022/SC



RELATOR: Desembargador NORIVAL ACÁCIO ENGEL


APELANTE: ROBSON DA FONSECA ADVOGADO: Felipe Perroni de Souza (OAB SC038081) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Na Comarca de Curitibanos, o Ministério Público ofereceu Denúncia contra Robson da Fonseca, dando-o como incurso nas sanções do artigo 155, §§1º e 4º, inciso II, do Código Penal, em razão dos fatos assim descritos (evento 17 dos autos de origem):
[...] No dia 3 de março de 2016, durante a madrugada, em depósito da empresa Rika nesta cidade de Curitibanos, o denunciado Robson da Fonseca, aproveitando-se de que exercia a função de vigilante na empresa, agindo com abuso de confiança, subtraiu para si cerca de 150kg (cento e cinquenta quilogramas) de alho, saindo do local na posse tranquila dos bens.
Encerrada a instrução, foi julgada procedente a Exordial, para condenar Robson da Fonseca ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime aberto, além do pagamento de 13 (treze) dias-multa, cada qual no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário vigente à época dos fatos, substituída a reprimenda corporal por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e pecuniária, por infração ao disposto no artigo 155, §§1º e 4º, inciso II, do Código Penal (evento 59 dos autos de origem).
Irresignada, a Defesa interpôs Recurso de Apelação (evento 68 dos autos de origem), em cujas Razões (evento 78 do feito de origem), busca a absolvição por atipicidade material da conduta, em razão do princípio da insignificância.
Subsidiariamente, requer o reconhecimento da excludente de ilicitude do estado de necessidade ou, caso mantida a condenação, a diminuição da reprimenda, inclusive aquém do mínimo legal.
Apresentadas as Contrarrazões (evento 82 do processo de origem), os autos ascenderam ao Segundo Grau, oportunidade em que a Douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer de lavra do Exmo. Dr. Raul Schaefer Filho, manifestou-se pelo conhecimento e provimento do recurso, para que se reconheça a atipicidade material da conduta (evento 13).
Este é o relatório

VOTO


O recurso merece ser conhecido, por próprio e tempestivo.
Preliminar - acordo de não persecução penal (art. 28-A, CPP)
Antes de adentrar na análise do mérito recursal, entendo importante fazer a ressalva acerca do instituto do acordo de não persecução penal, uma vez que os demais integrantes deste Colegiado passaram a determinar, desde a sessão do dia 05/05/20, a conversão dos julgamentos em diligência, com o retorno dos autos à origem (todos já com sentença condenatória proferida), para que o Ministério Público de primeiro grau analise a possibilidade de oferecimento do referido acordo, posicionamento ao qual não me filio.
Entendo incabível a aplicação do referido instituto aos processos em andamento, nos quais já foi recebida a Denúncia, como venho me manifestando em diversas oportunidades (Veja-se: Apelação Criminal n. 0001002-28.2017.8.24.0046, de Palmitos, j. 02-06-2020).
Ademais, em casos como o presente, em que a Defesa manifestou-se nos autos em 02/06/20 (evento 78 dos autos de origem), portanto, após a entrada em vigor da Lei 13.964/19 (23/01/20), mesmo os integrantes deste Órgão Fracionário que votam pela aplicação do instituto aos processos em andamento, afastam a possibilidade de oferecimento do acordo, em razão da preclusão, destacando-se recente decisão nesse sentido:
APELAÇÃO CRIMINAL. DESACATO (CP, ART. 331). SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. 1. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL (CPP, ART. 28-A). VIGÊNCIA. MANIFESTAÇÃO. PRECLUSÃO. 2. PROVA DA OCORRÊNCIA MATERIAL E DA AUTORIA DO FATO. PALAVRAS DOS POLICIAIS MILITARES. NEGATIVA. 3. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DO ESTADO EM SUA FORMA RETROATIVA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. 4. CONTRARRAZÕES. HONORÁRIOS (CPC, ART. 85, §§ 1º e 11). PARÂMETROS DA RESOLUÇÃO 5/19-CM DESTE TRIBUNAL. 1. Está configurada a preclusão quando há manifestação do acusado nos autos após a entrada em vigor da medida despenalizadora do acordo de não persecução penal e não há pedido de aplicação do benefício. 2. As declarações preliminares e judiciais de policiais militares, no sentido de que, durante o exercício de suas funções públicas, o acusado os chamou de "porcos", de "bostas", e os instigou a efetuarem disparos de arma de fogo contra ele "se fossem homens", são provas suficientes da prática do delito de desacato, cuja negativa isolada não presta para ocasionar dúvida razoável. 3. Deve ser declarada extinta a punibilidade em decorrência da prescrição da pretensão punitiva quando decorrido o prazo prescricional entre a data do recebimento da denúncia e a da publicação do acórdão condenatório. 4. Faz jus a honorários, nos termos do art. 85, §§ 1º e 11, do Código de Processo Civil, a defensora dativa que apresenta contrarrazões, observados os limites da Resolução 5/19-CM desta Corte de Justiça. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO; DE OFÍCIO, DECLARADA EXTINTA A PUNIBILIDADE DO ACUSADO; E FIXADOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. (TJSC, Apelação Criminal n. 0001069-12.2016.8.24.0051, de Ponte Serrada, rel. Des. Sérgio Rizelo, Segunda Câmara Criminal, j. 09-06-2020).
Assim, passa-se à análise dos pleitos recursais.
Mérito
Anote-se, de início, que a materialidade e autoria delituosas são incontroversas, de sorte que, estando devidamente comprovadas nos autos, e por economia processual, irá se passar diretamente à apreciação dos pontos objetos do recurso.
A Defesa requer a absolvição do Apelante por atipicidade material da conduta, com a incidência do princípio da insignificância. Subsidiariamente, pugna pelo reconhecimento da excludente de ilicitude do estado de necessidade ou a fixação da reprimenda aquém do mínimo legal.
Os pleitos não prosperam. Vejamos.
Quanto à alegada atipicidade, esta Câmara, em observância ao posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, possui entendimento consolidado de que não pode ser considerada insignificante a subtração de bem cujo valor supere 10% (dez por cento) do valor do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos.
Nesse sentido:
APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO. FURTO QUALIFICADO PELO CONCURSO DE PESSOAS (ART. 155, § 4°, IV, DO CÓDIGO PENAL). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DEFENSIVO. (...). REQUISITOS AO RECONHECIMENTO DA BAGATELA, ADEMAIS, NÃO PREENCHIDOS. VALOR DA RES QUE ULTRAPASSA 10% DO SALÁRIO MÍNIMO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. CONDENAÇÃO MANTIDA. (...) RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Apelação Criminal n. 0016568-23.2016.8.24.0023, da Capital, rel. Des. Volnei Celso Tomazini, j. 28-01-2020).
Também:
APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO. FURTO QUALIFICADO EM RAZÃO DO ABUSO DE CONFIANÇA (ART. 155, § 4º, INCISO II, DO CÓDIGO PENAL) SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. PLEITO ABSOLUTÓRIO PELA ATIPICIDADE MATERIAL, COM O RECONHECIMENTO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. IMPOSSIBILIDADE. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. VALOR DA "RES FURTIVA" QUE SUPERA OS DEZ POR CENTO DO SALÁRIO MÍNIMO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. ADEMAIS, ALTA REPROVABILIDADE DO COMPORTAMENTO DA RECORRENTE, EM RAZÃO DO ABUSO DE CONFIANÇA, QUE IMPOSSIBILITA A APLICAÇÃO DO INSTITUTO. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. (...) RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (TJSC, Apelação Criminal n. 0002731-60.2016.8.24.0067, de São Miguel do Oeste, desta Relatoria, j. 28-01-2020).
Por fim:
APELAÇÃO CRIMINAL - FURTOS SIMPLES E TENTADO (CP, ART. 155, CAPUT E ART 155, CAPUT C/C ART. 14, II) - SENTENÇA CONDENATÓRIA - INSURGÊNCIA DEFENSIVA. (...) APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - IMPOSSIBILIDADE - VALOR DOS BENS QUE ULTRAPASSAM 10% DO SALÁRIO MÍNIMO VIGENTE À ÉPOCA DO FATO - RESTITUIÇÃO À VÍTIMA QUE SE MOSTRA IRRELEVANTE - CONDENAÇÕES MANTIDAS. DOSIMETRIA - PENA DE MULTA QUE NÃO SEGUIU O RECONHECIMENTO DA CONTINUIDADE DELITIVA - ADEMAIS, VALOR FIXADO QUE NÃO GUARDA RELAÇÃO COM A REALIDADE ECONÔMICA DA ACUSADA - READEQUAÇÃO DEVIDA - PROVIDÊNCIAS EX OFFICIO - RECURSO DESPROVIDO. (TJSC, Apelação Criminal n. 0007145-34.2015.8.24.0036, de Jaraguá do Sul, rel. Des. Salete Silva Sommariva, j. 26-11-2019).
No caso, conforme o Auto de Avaliação Indireta, a res furtiva (150 quilogramas de alho) foi avaliada em R$2.235,00 (dois mil, duzentos e trinta e cinco reais), o que corresponde a mais que o dobro do valor do salário mínimo vigente à época dos fatos, fixado em R$880,00 (Decreto n. 8.618/15), de modo que não se há de falar em atipicidade material da conduta.
Importante destacar que a restituição da coisa à vítima, ocorrida por circunstâncias alheias à vontade do agente, não descaracteriza a tipicidade material do delito, conforme entendimento desta Câmara.
Nesse sentido, colhe-se da Apelação Criminal n. 0018102-83.2018.8.24.0038, de Joinville, relator designado Desembargador Sérgio Rizelo, julgado em 03-03-2020:
APELAÇÃO CRIMINAL. TENTATIVA DE...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT