Acórdão Nº 0001842-92.2012.8.10.0049 do TJMA. Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, 3ª Câmara Criminal, 2023

Ano2023
Classe processualApelação Criminal
Órgão3ª Câmara Criminal
Tipo de documentoAcórdão


Gabinete Desembargadora SÔNIA AMARAL

TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001469-16.2013.8.10.0085

APELANTE:DIONNYS CARTNEY ALLEN SANTANA

ADVOGADO:DEFENSORIA PÚBLICA ESTADUAL

APELADO:MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL

RELATORA:DESEMBARGADORASÔNIAMARIAAMARALFERNANDES RIBEIRO

REVISOR:DESEMBARGADOR SEBASTIÃO JOAQUIM LIMA BONFIM

EMENTA

PENAL. PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. LESÃO CORPORAL SEGUIDA DE MORTE. PLEITO DESCLASSIFICATÓRIO PARA LESÃO CORPORAL CULPOSA. POSSIBILIDADE. AUTORIA E MATERIALIDADE DEMONSTRADAS. DOLO ESPECÍFICO NÃO CONFIGURADO. CONDUTA QUE SE AMOLDA À MODALIDADE CULPOSA DO DELITO. APLICAÇÃO DE MULTA DO ART. 265, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA INJUSTIFICADA. APELO PROVIDO.

I – As concausas aparecem como concurso de fatores que, em paralelo ao comportamento do agente, são capazes de influir no curso natural do resultado. São, portanto, fatores externos à vontade do agente, mas que aderem à sua conduta e a convergem para o resultado. Desta feita, podem ser consideradas causas dependentes ou independentes. As primeiras são aquelas que, sozinhas, não são capazes de direcionar os fatos até o resultado, de forma que precisam coexistir na linha do tempo com a prática delituosa do agente. Já as independentes são aquelas que, sozinhas, são capazes de produzir o resultado, podendo ainda desdobrar-se de acordo com a sua origem na linha do tempo dos fatos. E, na inteligência do art. 13, §1º, do Código Penal, “a superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produziu o resultado; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou”.

II – Indubitável que a imprudência e negligência perpetrada no primeiro atendimento médico dado à vítima levou ao não tratamento devido pelos cortes sofridos. E, consequentemente, à evolução do quadro clínico para o pneumotórax hipertensivo/pneumotórax hipertensivo que acarretou o óbito da vítima. O desenrolar dos fatos corrobora a tese de que, em verdade, o resultado morte se deu por causa superveniente relativamente independente, portanto, que não pode ser imputada ao apelante.

III – Deve-se excluir a imputação do resultado morte ao apelante, subsistindo apenas a lesão corporal perpetrada contra a vítima. E, quanto a esta, entendo prosperar o pedido de desclassificação arguida pela defesa para a modalidade culposa do crime (art. 129, § 6º, CP). Isto porque tanto o apelante quanto às testemunhas, em juízo, demonstraram que os cortes foram frutos de uma “brincadeira” entre ambos, sem qualquer animosidade. Não apenas no contexto da “brincadeira”, mas anteriormente a ela: todos em uníssono argumentam a amizade nutrida por ambos. Não há nenhum suporte fático-jurídico a sustentar que o apelante golpeou a vítima com a intenção de verdadeiramente ofender a integridade corporal e/ou sua saúde.

IV - O advogado Samir Santos Pereira de Amorim (OAB/MA 11.305), não obstante ter sido devidamente intimado (ID 17888064) para apresentação das Razões Recursais, não protocolou tal peça processual, conforme se pode verificar na Certidão de ID 18545345. Tampouco justificou a sua ausência do causídico, o que resultou na oneração do Estado, com a nomeação de Defensor Público para atuação no feito. Assim, aplico a multa processual do art. 265, do Código de Processo Penal, ao advogado, no patamar de 10 (dez) salários mínimos.

V – Apelo conhecido e parcialmente provido

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, acordam os Desembargadores que integram a Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, por unanimidade, e em desconformidade com o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, em conhecer e dar provimento parcial ao apelo para reformar a sentença, desclassificando o delito e condenando o apelante como incurso na conduta típica do art. 129, §6º, do Código Penal, nos termos do voto da Desembargadora Relatora, e, por maioria, negar provimento ao apelo quanto a imposição de multa processual ao patrono do apelante, nos termos do voto do Desembargador Gervásio Protásio dos Santos Junior, acompanhado pelo Desembargador Sebastião Joaquim Lima Bonfim, contra o voto da Desembargadora Relatora.

Participaram do julgamento esta relatora e os senhores Desembargadores Gervásio Protásio dos Santos Júnior (Presidente) e Sebastião Joaquim Lima Bonfim (Revisor).

Sala das sessões virtuais da Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, em São Luís-MA, julgamento finalizado aos sete dias de agosto de Dois Mil e Vinte e três.

Desembargadora SÔNIA Maria AMARAL Fernandes Ribeiro

Relatora

1 Relatório

Trata-se de apelação interposta por DIONNYS CARTNEY ALLEN SANTANA, condenado à pena de 1 (um) ano de detenção em regime aberto pelo incurso na conduta típica do art. 129, §3º (lesão corporal seguida de morte), do Código Penal, com a pena privativa de liberdade substituída por pena restritiva de direitos de prestação de serviços à comunidade, pelo tempo da pena privativa imposta, à razão de uma hora de tarefa por dia de condenação, facultado ao apelante cumpri-la em tempo menor, desde que nuncainferiorà metade da pena.

Consta na denúncia que o apelante, no dia 09/10/2012, por volta das 13h, no alojamento do canteiro de obras da empresa de construção civil Amauri Coutinho, localizado na Estrada de Ribamar, o apelante fez alguns gestos com uma pequena serra em direção à vítima, em resposta a uma brincadeira,acaboupor atingi-la na região do peito e do abdome.

Ato contínuo, o apelante levou a vítima ao Hospital Socorrão II. Depois de atendida e medicada, a vítima recebeu alta e atestado médico de 15 (quinze) dias, tendo retornado ao canteiro de obras, oportunidade em que o apelante comprou-lhe os remédios receitados.

Após, a vítima foi para casa e passou a reclamar de dor e falta de ar, tendo sido levada ao Hospital Centro Médico, onde veio a falecer na manhã do dia seguinte por insuficiência respiratória decorrente de pneumotórax hipertensivo esquerdo e pneumotórax direito em consequência do ferimento provocado pelo apelante.

Após instrução criminal e apresentação de alegações finais pelas partes, foi prolatada a referida sentença condenatória. Irresignado, o acusado interpôs o presente recurso de apelação.

1.1 Argumentos da apelante

1.1.1 Aduz que causa efetiva do resultado é considerada um evento imprevisível ao apelante, que sai da linha de desdobramento causal então existente, haja vista que as lesões causadas não resultaram na morte da vítima, que foi causada pelo manejo desastroso do tratamento médico;

1.1.2 Pugna-se pela desclassificação para o delito constante do art. 129, §6° (lesão corporal culposa)do Código Penal.

1.2 Argumentos do apelado

1.2.1 A causa relativamente independente superveniente só exclui a imputação, se, por si só, causou o resultado, o que restou afastado pelo laudo de exame cadavérico, que atestou como causa da morte ferimento no tórax “produzido por objeto perfuro-cortante”.

1.2.2 A materialidade do delito, igualmente, está demonstrada pela certidão de óbito, relatórios de atendimento médico e laudo de exame cadavérico, que atestou como causa da morte insuficiência respiratória decorrente de pneumotórax hipertensivo esquerdo e pneumotórax direito, consequente a ferimento de tórax.

1.3Autos à Procuradoria-Geral de Justiça, estes retornaram sem manifestação (ID 25729431).

É o que cumpre relatar.

VOTO DESEMBARGADORA SÔNIA MARIA AMARAL FERNANDES RIBEIRO

2 Linhas argumentativas do voto

Uma vez preenchidos os requisitos recursais intrínsecos e extrínsecos, conheço do apelo.

2.1 Da causalidade adequada (art. 13, §1º, do Código Penal)

Cumpre a mim, de plano, tecer alguns comentários necessários ao deslinde no que tange à teoria da causalidade adequada, adotada por nosso ordenamento jurídico.

O Código Penal brasileiro considera a causa como sendo uma conduta típica e adequada à produção do resultado. Nestes termos, é necessário que o agente pratique o núcleo do tipo de forma indispensável para o seu desdobramento de forma adequada ao seu perfazimento integral.

Nesse esteio, as concausas aparecem como concurso de fatores que, em paralelo ao comportamento do agente, são capazes de influir no curso natural do resultado. São, portanto, fatores externos à vontade do agente, mas que aderem à sua conduta e a converge para o resultado. Desta feita, podem ser...

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