Acórdão Nº 0001856-41.2020.8.24.0038 do Primeira Câmara Criminal, 04-02-2021

Número do processo0001856-41.2020.8.24.0038
Data04 Fevereiro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão










Agravo de Execução Penal Nº 0001856-41.2020.8.24.0038/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0001856-41.2020.8.24.0038/SC



RELATORA: Desembargadora ANA LIA BARBOZA MOURA VIEIRA LISBOA CARNEIRO


AGRAVANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA AGRAVADO: CARLOS JARDEL CORREA ADVOGADO: PAOLO ALESSANDRO FARRIS (OAB SC017050)


RELATÓRIO


Trata-se de recurso de agravo em execução penal interposto pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina em face da decisão proferida pelo juízo da 3ª Vara Criminal da Comarca de Joinville/SC que, nos autos do PEC n. 0024126-45.2009.8.24.0038, não reconheceu a prática de falta grave, consistente no cometimento de fato previsto como crime doloso no decorrer do cumprimento da pena, por entender que, à luz do princípio da presunção de inocência, "não há elementos probatórios suficientes, ao menos para a convicção deste Juízo, que indiquem, sem sombra de dúvidas, a autoria e materialidade da prática dos crimes pelo apenado" (Evento 818).
Em suas razões (Evento 1 dos autos n. 0001856-41.2020.8.24.0038), o Órgão Ministerial afirma que o reeducando incorreu na prática de falta grave porquanto cometeu fatos previstos como crimes dolosos no curso da execução da pena em afronta ao disposto no art. 52 da Lei n. 7.210/1985 (Lei de Execuções Penais).
Aduz que o enunciado da Súmula n. 526, do egrégio Superior Tribunal de Justiça, é firme ao apontar que "o reconhecimento de falta grave decorrente do cometimento de fato definido como crime doloso no cumprimento da pena prescinde do trânsito em julgado de sentença penal condenatória no processo penal instaurado para apuração do fato", razão pela qual inexiste necessidade de condenação definitiva para a sua configuração.
Acrescenta que o apenado, mesmo sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, em audiência de justificação, não logrou afastar a prática da infração disciplinar.
Aponta que o recorrido está sendo processado pelo cometimento dos supostos crimes nos autos da Ação Penal n. 0010970-02.2017.8.24.0008, em trâmite na 3ª Vara Criminal da Comarca de Blumenau/SC e que, ao contrário do que foi decidido pelo magistrado da execução, existem elementos sólidos acerca da materialidade e autoria delitivas.
Por essas razões, postula o reconhecimento da falta grave com a consequente manutenção no regime mais severo, a modificação da data-base para o alcance dos benefícios penais e a perda dos dias remidos na fração máxima de 1/3 (um terço), nos termos da fundamentação do parecer que acompanha o recurso.
Contrarrazões pela defesa do apenado pela manutenção incólume do decisum recorrido (Evento 11 dos autos n. 0001856-41.2020.8.24.0038).
O magistrado singular ratificou a decisão recorrida por seus próprios fundamentos (Evento 12 dos autos n. 0001856-41.2020.8.24.0038).
Nesta instância, o Exmo. Sr. Dr. Procurador de Justiça Odil José Cota emitiu parecer pela Procuradoria-Geral de Justiça, no qual pugnou pelo conhecimento e provimento do recurso interposto (Evento 15).
Este é o relatório

VOTO


1. Da Admissibilidade
De início, convém salientar que o presente recurso é cabível, são legítimas as partes, bem como houve interesse em recorrer da decisão, haja vista a sucumbência do agravante.
O agravo foi interposto de forma regular e tempestiva, uma vez que o recorrente foi intimado da decisão no dia 29 de julho de 2020 (Evento 822), tendo apresentado sua irresignação nesse mesmo dia, conforme faz prova o protocolo eletrônico contido na página inicial do recurso (Evento 1 dos autos n. 0001856-41.2020.8.24.0038), ou seja, dentro do prazo legal de 5 (cinco) dias estipulado no enunciado da Súmula n. 700 do egrégio Supremo Tribunal Federal.
Assim, presentes os pressupostos legais de admissibilidade, conheço do agravo e passo ao exame do pleito recursal.
2. Do Mérito
Pretende o Representante do Ministério Público Estadual a reforma da decisão objurgada para que seja reconhecida a falta grave e, em decorrência disso, seja mantido o regime mais severo, alterada a data-base para benefícios penais e decretada a perda dos dias remidos na fração máxima de 1/3 (um terço).
O recurso, adianta-se, merece acolhimento.
2.1 Do Reconhecimento da Falta Grave
Cumpre assinalar que o juízo da execução penal "tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado" (art. 1º da Lei de Execuções Penais).
Para isso, a legislação traz regras bem definidas a serem seguidas tanto pelo Estado, em prol da humanização das penas e a almejada ressocialização, quanto pelos apenados, a fim de seja mantida à ordem e o regular cumprimento das reprimendas.
Assim, com o intuito precípuo de coibir comportamentos que destoam da finalidades perseguidas pelo Estado, a Lei de Execuções Penais, por meio dos seus artigos 49 e seguintes, especificou condutas consideradas nocivas e elaborou um regime de faltas disciplinares, classificando-as em leves, médias e graves, objetivando posterior sancionamento administrativo e/ou judicial.
Nesse viés, extrai-se da referida legislação que "a prática de fato previsto como crime doloso constitui falta grave" (art. 52, caput, da LEP) e poderá ensejar a regressão do regime prisional (art. 118, inc. I, da LEP), a alteração da data-base para novos benefícios (art. 112, § 6º, da LEP), bem como revogação de "até 1/3 (um terço) do tempo remido, observado o disposto no art. 57, recomeçando a contagem a partir da data da infração disciplinar" (art. 127 da LEP).
Sobre a temática, é assente o entendimento sumulado pelo egrégio Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que: "O reconhecimento de falta grave decorrente do cometimento de fato definido como crime doloso no cumprimento da pena prescinde do trânsito em julgado de sentença penal condenatória no processo penal instaurado para apuração do fato" (Súmula n. 526).
Desta feita, considerando que sobreveio a informação de que o apenado Carlos Jardel Correa teria sido preso pela suposta prática dos delitos descritos no art. 2º, §§ 2º, 3º e 4º, inc. I e IV, da Lei 12.850/2013 (Lei de Organizações Criminosas) e art. 35 da Lei n. 11.343/2006 (Lei Anti-Drogas) no decorrer do cumprimento da pena, era esperado que o magistrado da execução penal, após a audiência de justificação, assegurado o contraditário e a ampla defesa, e ressalvada a hipótese de circunstância idônea ao afastamento da penalidade, reconhecesse a falta grave e decretasse as consequentes sanções judiciais cabíveis.
O juízo a quo, no entanto, pautado pelo princípio da presunção de inocência, afastou o reconhecimento da falta grave, acrescentando, ainda, como uma das razões de decidir, que inexistem elementos probatórios suficientes a comprovação da autoria e da materialidade dos novos delitos.
Tal posicionamento, como bem apontam as razões recursais do Ministério Público, merecem ampla reforma.
Primeiro porque, conforme já citado, o reconhecimento da infração disciplinar de natureza grave consistente na prática de fato previsto como crime doloso é aferível pelo simples registro do seu...

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