Acórdão Nº 0001857-29.2019.8.24.0113 do Terceira Câmara Criminal, 28-01-2020

Número do processo0001857-29.2019.8.24.0113
Data28 Janeiro 2020
Tribunal de OrigemCamboriú
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Criminal n. 0001857-29.2019.8.24.0113, de Camboriú

Relator: Desembargador Ernani Guetten de Almeida

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A SAÚDE PÚBLICA. TRÁFICO DE DROGAS (LEI 11.343/2006, ART. 33, CAPUT). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DEFENSIVO.

PRELIMINAR. SUSTENTADA A ILEGALIDADE DA PRISÃO EM FLAGRANTE E NULIDADE DAS PROVAS DECORRENTES. ALEGADA AUSÊNCIA DE INDÍCIOS SUFICIENTES A JUSTIFICAR A ENTRADA NA CASA DO APELANTE SEM O RESPECTIVO MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO. DESPROVIMENTO. DENÚNCIA ANÔNIMA ACERCA DA PRÁTICA DO TRÁFICO DE DROGAS. AGENTES PÚBLICOS QUE, NO ENDEREÇO DO APELANTE, CONSTATARAM FORTE ODOR DE DROGAS E O VISUALIZARAM INDIVIDUALIZANDO ENTORPECENTES. INDICATIVOS DA PRÁTICA DE CRIME PERMANENTE. RELATIVIZAÇÃO DA INVIOLABILIDADE DE DOMICÍLIO JUSTIFICADA. FLAGRANTE DELITO CONFIGURADO. PRELIMINAR RECHAÇADA.

MÉRITO. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO ANTE A FALTA DE PROVAS. INVIABILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. APELANTE PRESO EM FLAGRANTE NA POSSE DE 27,5 KG (VINTE E SETE QUILOS E QUINHENTOS GRAMAS) DE MACONHA, EM 38 (TRINTA E OITO) PORÇÕES, 1,4KG (UM QUILO E QUATROCENTOS GRAMAS) DE "HAXIXE", 200G (DUZENTOS GRAMAS) DE FOLHAS E 122G (CENTO E VINTE E DOIS GRAMAS) DE SEMENTES DE MACONHA, APETRECHOS PARA SUA INDIVIDUALIZAÇÃO E SIGNIFICATIVA QUANTIA EM DINHEIRO. DEPOIMENTOS FIRMES E COERENTES DOS AGENTES PÚBLICOS EM AMBAS AS FASES DA PERSECUÇÃO PENAL. USUÁRIO QUE, NA ABORDAGEM E NA FASE INDICIÁRIA, CONFIRMOU A AQUISIÇÃO DE DROGAS DO APELANTE. VERSÃO DEFENSIVA ANÊMICA (CPP, ART. 156). CONDENAÇÃO MANTIDA.

RECURSO CONHECIDO, AFASTADA A PRELIMINAR E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0001857-29.2019.8.24.0113, da comarca de Camboriú Vara Criminal em que é/são Apelante(s) Saimon Vaz Arce e Apelado(s) Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

A Terceira Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso, afastar a preliminar e negar-lhe provimento.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Des. Leopoldo Augusto Brüggemann e Des. Júlio César M. Ferreira de Melo. Funcionou como Representante do Ministério Público o(a) Exmo(a). Sr(a). Dr(a). Jayne Abdala Bandeira.

Florianópolis, 28 de janeiro de 2020

Desembargador Ernani Guetten de Almeida

Relator


RELATÓRIO

Na Comarca de Camboriú, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia em face de Saimon Vaz Arce pela prática, em tese, da conduta criminosa descrita no art. 33, caput, da Lei 11.343/2006, em razão dos fatos assim narrados (fls. 48-50):

Consta do incluso auto de prisão em flagrante que, no dia 5 de maio de 2019, por volta das 22h10min, Policiais Militares receberam informações de que o denunciado SAIMON VAZ ARCE estava praticando o tráfico de drogas no endereço da Rua Rio Canoinhas, 221, apto. 102, Bairro Rio Pequeno, neste Município de Camboriú e, por tal razão, deslocaram-se ao referido endereço. Chegando ali, os Policiais Militares adentraram no edifício no momento em que uma família estava saindo, deslocando-se ao apartamento do denunciado, que estava com a porta aberta, sendo visualizado o momento em que ele fracionava um tablete de "maconha" no interior do local, pois havia acabado de receber o usuário Felipe Sady Boeri, que tinha consigo a quantia de R$ 472,00 (quatrocentos e setenta e dois reais), que serviria para adquirir o entorpecente, sendo feita a abordagem de ambos.

Ato contínuo, verificou-se que o denunciado SAIMON VAZ ARCE estava na posse de 38 (trinta e oito) porções da substância vulgarmente conhecida como "maconha", pesando cerca de 27,5 kg (vinte e sete quilos e quinhentos gramas), 4 (quatro) porções da substância conhecida como "haxixe", pesando aproximadamente 1,400 kg (um quilo e quatrocentos gramas), 2 (duas) porções de folha de "maconha" embaladas em plástico branco, pesando cerca de 200 g (duzentos gramas), 1 (uma) porção de semente de "maconha" embalada em plástico transparente, pesando aproximadamente 122 g (cento e vinte e dois gramas), além de 1 (uma) balança de precisão branca, 1 (uma) faca de cozinha com cabo laranja, 2 (dois) rolos de papel filme, a quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) e, ainda, papeis com anotações referentes ao tráfico de drogas, conforme consta no rol de objetos e nas fotografias de fls. 3/8, auto de exibição e apreensão de fl. 12 e auto de constatação de fl. 14.

Cabe ressaltar que as substâncias apreendidas na posse do denunciado, que ele portava sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, destinava-se ao comércio ilegal, tendo seu uso proibido no território nacional, através da Portaria nº 344, de 12/05/98, da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde, pois podem causar dependência física e/ou psíquica.

Sobreveio sentença em que a Magistrada julgou procedente a peça acusatória oferecida em desfavor de Saimon Vaz Arce a fim de condená-lo, como incurso nas sanções do art. 33, caput, da Lei 11.343/2006, ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 6 (seis) anos, 1 (um) mês e 15 (quinze) dias de reclusão, em regime inicial fechado, e ao pagamento de 562 (quinhentos e sessenta e dois) dias-multa, cada qual no mínimo legal. Por fim, negou-se ao réu o direito de recorrer em liberdade (fls. 290-302).

A defesa de Saimon Vaz Arce interpôs recurso de apelação, onde alegou, preliminarmente, a ilegalidade da apreensão de drogas ante a ausência de mandado judicial ou de fundadas suspeitas acerca da prática do tráfico a relativizar a inviolabilidade do seu domicílio, razão por que as provas decorrentes são nulas e devem ensejar a sua absolvição. No mérito, sustentou a insuficiência de provas a lhe imputar a prática do crime previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/2006, razão por que a absolvição, com fundamento na aplicação do princípio do in dubio pro reo, é de rigor (fls. 317-340).

Contrarrazões às fls. 349-361.

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Paulo Antônio Günther, onde opinou pelo conhecimento do recurso, afastamento da preliminar e seu desprovimento (fls. 371-378).

Este é o relatório.


VOTO

O recurso preenche os requisitos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido.

Preliminar

A defesa de sustenta a ilegalidade de sua prisão ante a ausência de mandado de prisão ou de fundadas suspeitas acerca da prática do comércio espúrio a relativizar a garantia à inviolabilidade de seu domicílio, razão por que as provas decorrentes são nulas, devendo ser absolvido.

Sem razão, no entanto.

Isso porque, conforme se verá, havia informações acerca da prática do comércio espúrio pelo apelante, já que os agentes públicos, nas duas fases da persecução penal, foram uníssonos de que receberam informações dando conta da prática do tráfico de drogas pelo apelante na sua residência e, no local, além de sentirem forte odor de maconha, visualizaram, pela janela, o momento em que ele picotava maconha, ao lado de Felipe.

Como se vê, embora a defesa sustente a ilegalidade da prisão em flagrante e das provas decorrentes, não trouxe nenhum elemento hábil que pudesse afastar o fato de que havia indicativos suficientes a se suspeitar da prática do tráfico de drogas por Saimon (Lei 11.343/2006, art. 33, caput), medida a qual, repisa-se, resultou na apreensão de 27,5 kg (vinte e sete quilos e quinhentos gramas) de maconha, em 38 (trinta e oito) porções, 1,4kg (um quilo e quatrocentos gramas) de "haxixe", 200g (duzentos gramas) de folhas de maconha, 122g (cento e vinte e dois) gramas de sementes de maconha, 1 (uma) balança de precisão, 1 (uma) faca de cozinha, 2 (dois) rolos de papel filme, a quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) e, ainda, papéis com anotações referentes ao comércio espúrio.

Logo, ante as fundadas suspeitas da prática de crime permanente, a entrada no seu domicílio, por ser medida de urgência, não se sujeita à reserva jurisdicional, restando prescindível a expedição de mandado de busca e apreensão, nos termos do art. 5º, XI, da Constituição Federal.

A propósito, colhe-se do Superior Tribunal de Justiça:

1) Habeas Corpus 326.503/RS, Quinta Turma, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, j. em 7.3.2017:

PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO. TRÁFICO DE DROGAS, ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO E PORTE ILEGAL DE ARMAS. CONDENAÇÃO COM TRANSITO EM JULGADO. VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO. HIPÓTESE DE FLAGRANTE EM CRIMES PERMANENTES. DESNECESSIDADE DE MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO OU AUTORIZAÇÃO. PRECEDENTES. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO DO CONTEÚDO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. WRIT NÃO CONHECIDO. [...]

2. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que tratando-se de crimes de natureza permanente, como é o caso do tráfico ilícito de entorpecentes, prescindível o mandado de busca e apreensão, bem como a autorização do respectivo morador, para que policiais adentrem a residência do acusado, não havendo falar em eventuais ilegalidades relativas ao cumprimento da medida (HC 345.424/SC, Rel. Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, j. 18/8/2016, DJe 16/9/2016). [...]

4. Habeas corpus não conhecido.

2) AgRg no RHC 77.687/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Jorge Mussi, j. em 6.6.2017:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO COM A NUMERAÇÃO SUPRIMIDA. PRISÃO EM FLAGRANTE. CRIME DE NATUREZA PERMANENTE. DESNECESSIDADE DE PRÉVIA ORDEM JUDICIAL AUTORIZANDO O INGRESSO NA RESIDÊNCIA DO ACUSADO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CARACTERIZADO. MANUTENÇÃO DA DECISÃO POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. AGRAVO IMPRÓVIDO. 1.É dispensável o mandado de busca e apreensão para o ingresso na residência do suspeito, quando se trata de flagrante de crime permanente, podendo-se realizar a prisão sem que se fale em ilicitude das provas obtidas. Doutrina. Precedentes do STJ e do STF. [...]

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