Acórdão Nº 0001910-77.2017.8.24.0081 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 17-11-2022

Número do processo0001910-77.2017.8.24.0081
Data17 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0001910-77.2017.8.24.0081/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO

APELANTE: ANCILA MARIA BALDISSERA PALUDO (AUTOR) APELANTE: ARODIVALDO ANTONIO PALUDO (AUTOR) APELADO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL (RÉU) APELADO: MASSA FALIDA DE KAZZATEK CONSTRUTORA E INCORPORADORA LTDA. (RÉU)

RELATÓRIO

ANCILA MARIA BALDISSERA PALUDO e ARODIVALDO ANTONIO PALUDO interpuseram recurso de apelação da sentença proferida nos autos da "ação de conhecimento" proposta contra MASSA FALIDA DE KAZZATEK CONSTRUTORA E INCORPORADORA LTDA. e CAIXA ECONOMICA FEDERAL, em curso perante o juízo da 1ª Vara da Comarca de Xaxim, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na petição inicial, nestes termos:

Trata-se de ação de conhecimento ajuizada por ANCILA MARIA BALDISSERA PALUDO e ARODIVALDO ANTONIO PALUDO em face de KAZZATEK CONSTRUTORA E INCORPORADORA LTDA (massa falida) e CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, em virtude de contrato de permuta de imóvel.

Aduziram os autores a propriedade do imóvel matrícula 1.136 do CRI de Chapecó, o qual foi objeto de permuta por 8 unidades autônomas de apartamentos construídos em sistema de incorporação imobiliária pela primeira ré, além de R$ 50.000,00 em espécie. Mediante aditivo, especificaram as unidades que seriam objeto da permuta: apartamentos 502 e 504 do Bolo "E", e apartamentos 403, 404, 503, 504, 603 e 604 do Bloco "C". Em virtude da legislação de regência da incorporação imobiliária, não foi possível registrar a permuta, sendo registrada a compra e venda, não obstante não tenha havido pagamento pela parte ré, visto que deveria fazer a entrega dos apartamentos após o término da construção. Com a extinção do do condomínio sobre o imóvel e negócio firmado com a ré, o negócio passou a constar da matrícula nº 89.142. Diante da paralisação das obras em decorrência da falência da ré Kazzatek, a CEF acionou o seguro e passou a executar a obra através de outra construtora. No entanto, os apartamentos objeto da permuta foram requeridos pela CEF como dação em pagamento, visando assim, a conclusão da obra, notadamente os apartamentos 502 e 504 do Bloco "E". Diante desses fatos, requereu o reconhecimento do negócio jurídico de permuta firmado com a ré Kazzatek, de forma que seja compelida a entrega das unidades objeto do negócio jurídico. O reconhecimento da obrigação da CEF pela entrega dos apartamentos, tendo em vista o patrimônio de afetação, contrato de abertura de crédito com garantia hipotecária e seguro garantia. Ainda, o recebimento dos apartamentos 502 e 504 do Bloco "E" independente de pagamento de numerários pelos autores.

Citada, a Massa Falida de Kazzatek Construtora e Incorporadora Ltda apresentou defesa na forma de contestação (ev. 1, contestação 297-305). Em sede preliminar requereu o deferimento da gratuidade da justiça; a incompetência do juízo, tendo em vista a prevalência do juízo falimentar; e a ilegitimidade passiva para o feito. No mérito, afirmou que o negócio jurídico firmado com os autores foi registrado como compra e venda, tendo desconhecimento o administrador judicial de contrato de permuta, aduzindo possível fraude, visto inexistir vedação legal ao registro da permuta. Destacou que o escritório de advocacia no qual a procuradora legal dos embargantes labora é o mesmo que representa os falidos. Ao final, requereu a improcedência da ação.

A ré Caixa Econômica Federal apresentou contestação no ev. 1 (contestação 307-310). Em sede preliminar aduziu sua ilegitimidade passiva para o feito. No mérito, asseverou a impossibilidade das partes virem a juízo visando regularizar negócio jurídico dotado de nulidades, notadamente por usurpar a competência do juízo falimentar. Asseverou sua condição de mera credora mutuante, e que a cláusula securitária visou garantir a continuidade do empreendimento. Ao final, requereu o julgamento de improcedência da ação.

Houve réplica (ev. 1, réplica 319-324).

Reconhecida a incompetência da 1ª Vara Federal de Chapecó, o processo foi remetido ao juízo falimentar. Suscitado conflito de competência, foi reconhecida a competência do juízo falimentar (ev. 15).

Oportunizado às partes especificarem as provas que pretendiam produzir, a CEF promoveu a juntada de documentos extraídos do processo de falência (ev. 26), enquanto a parte autora a produção de prova testemunhal e pericial (ev. 29).

É o relatório necessário.

É o breve relatório.

Passo a fundamentar e decidir.

Em que pese ter sido oportunizado às partes indicarem eventuais provas a produzir, a hipótese comporta julgamento antecipado, na forma do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil, pois a matéria agitada nos autos é de direito, não havendo necessidade de dilação probatória.

I - Preliminar

Em sede preliminar, aduziu a Caixa Econômica Federal sua ilegitimidade passiva para o feito.

No entanto, considerando que a CEF é financiadora do imóvel, credora hipotecária, e inclusive no processo de falência manifestou interesse por dois apartamentos perseguidos pelos autores nesses autos (art. 502 e 504 do Bloco E), sua legitimidade passiva encontra-se presente.

Superada a preliminar aventada, passo à análise do mérito.

II - Do mérito

A presente lide cinge-se sobre a existência de relação contratual de permuta entre os autores e a ré Kazzatek, bem como, em razão da existência de patrimônio de afetação, da obrigação da CEF em promover a entrega dos apartamentos indicados no contrato de permuta em favor dos autores.

Compulsando os autos, infere-se a existência de contrato de permuta do imóvel matrícula 1.136 do CRI de Chapecó, do qual os autores eram proprietários, com 08 unidades autônomas da obra a ser executada sobre o imóvel, além do valor de R$ 50.000,00. Já no aditivo da permuta, houve a especificação das unidades autônomas conferidas aos autores: 02 unidades no Bloco E, apartamentos 502E e 504E, e 06 unidades no Bloco C, 403C, 404C, 503C, 504C, 603C, e 604C, (cláusula segunda, parágrafo primeiro, ev1, informação 32)

Referido contrato contou como partes os autores e a ré Kazzatek (ev. 1, informação 19-29), e datado de 12/11/2009, com a presença de duas testemunhas.

Não obstante a massa falida tenha manifestado possível fraude na relação contratual, deixou de trazer elementos que derruíssem a força probatória do contrato.

O fato de constar averbado na matrícula do imóvel contrato de compra e venda entre os autores e a Kazzatek (ev. 1, informação 47) não possui força suficiente para derruir os efeitos do contrato antecedente, posto sequer ter apresentado o contrato que gerou a averbação, ou ainda, comprovado o pagamento dos valores ajustados.

Destaca-se o princípio geral de direito no qual a boa-fé se presume, ao passo que a má-fé requer prova concreta da intenção dolosa da autora, ônus que incumbia à ré Kazzatek quanto a relação jurídica trazida à lume pela autora - contrato de permuta.

Depreende-se inclusive, que os apartamentos indicados no contrato de permuta indicados aos autores não haviam sido vendidos a terceiros, o que confere presunção de veracidade às informações trazidas na exordial (apartamentos 502 e 504 do Bloco E.

O contrato de permuta firmado entre os autores e a ré Kazzatek está composto dos requisitos enumerados no art. 104 do Código Civil quanto a validade do negócio jurídico, não havendo arguição de vícios de consentimento.

Não bastasse, de acordo com o art. 219 do Código Civil, "as declarações constantes de documentos assinados presumem-se verdadeiras em relação aos signatários."

Desta forma, reconheço a existência e validade do contrato de permuta firmado entre os autores e a ré Kazzatek, para que produza seus efeitos jurídicos entre estes.

Considerando que os dois apartamentos não foram registrados em nome dos autores, e que inclusive, diante do depósito realizado pela CEF no processo de falência (0301365-02.2015.8.24.0081) para a reparação de danos da construtora perante credores, devem os autores buscar a responsabilidade da massa falida quanto à eventual reparação de danos.

Noutro vértice, em relação à Caixa Econômica Federal não é possível adotar idêntico entendimento, notadamente para produzir o efeito pretendido na exordial, qual seja, a responsabilidade de Caixa Econômica Federal pela entrega dos aludidos apartamentos, sem ônus, para os autores. Isso porque, ao deixarem de averbar o contrato de permuta firmado entre as partes, a CEF, terceira interessada, deixou de tomar conhecimento do negócio jurídico, posto que ausente a devida publicidade.

Outrossim, depreende-se que a ocultação da permuta e o efetivo registro de compra e venda induziram a ré CEF em erro, posto que aprovou financiamento da obra sob a ciência de que o imóvel pertencesse à Kazzatek, quando em verdade, ainda haviam pendências de valores significativos a serem por esta cumpridos para a quitação do bem, entrega de 08 (oito) unidades imobiliárias.

Portanto, em relação à CEF, ante a ausência de publicidade do contrato de permuta, esse não é apto a produzir efeitos, sendo guarnecida de eventual responsabilidade decorrente da obra do Residencial Érico Veríssimo.

É o que se depreende o art. 1.245 do Código Civil ao estabelecer que somente o registro transfere a propriedade do imóvel, sendo apto a produzir efeitos perante terceiros.

Isso porque, de acordo com Leonardo Brandelli "a presunção de conhecimento gerada pela publicidade registral agrega certa eficácia ao ato jurídico, tornando-o oponível a terceiros (em cuja esfera jurídica esse ato pode repercutir), sem que tenham estes sido parte naquele". (Registro de Imóveis, eficácia material, Editora Forense, 2016, p. 74)

Ademais, convém destacar que a CEF não possui responsabilidade pela entrega do imóvel para os autores, ainda que houvesse o registro de compra e venda, visto que atua somente como agente financeiro da obra, com garantia hipotecária.

Por sua vez, consoante destacado pelos autores, infere-se a existência de instituição de patrimônio de afetação, tratando-se de incorporação imobiliária quanto a construção do empreendimento Érico...

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