Acórdão Nº 0001938-35.2011.8.24.0023 do Primeira Câmara Criminal, 20-02-2020

Número do processo0001938-35.2011.8.24.0023
Data20 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemCapital
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Criminal n. 0001938-35.2011.8.24.0023, da Capital

Relator: Desembargador Paulo Roberto Sartorato

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES DE ROUBO CIRCUNSTANCIADO PELO EMPREGO DE ARMA E RESTRIÇÃO DE LIBERDADE DA VÍTIMA (ART. 157, § 2º, INCISOS I [NA REDAÇÃO ANTERIOR À LEI N. 13.654/18] E V, DO CÓDIGO PENAL) E EXTORSÃO (ARTIGO 158, § 1º, DO CÓDIGO PENAL). RECURSO DEFENSIVO. ARGUIDA NULIDADE DO RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO. SUPOSTA DESOBEDIÊNCIA AO ARTIGO 226 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. PROCEDIMENTO QUE CONSTITUI MERA RECOMENDAÇÃO LEGAL. PREFACIAL AFASTADA. MÉRITO. PLEITO ABSOLUTÓRIO. INSUBSISTÊNCIA. MATERIALIDADE E AUTORIA DEVIDAMENTE COMPROVADAS PELOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS CONSTANTES NOS AUTOS, EM ESPECIAL O RELATO DA VÍTIMA E RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO REALIZADO POR ELA. PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO INAPLICÁVEL. ABSOLVIÇÃO INVIÁVEL. CONSUNÇÃO, ADEMAIS, INADMISSÍVEL EM RAZÃO DA INEXISTÊNCIA DE ELO DE INTERDEPENDÊNCIA ENTRE AS CONDUTAS DELITUOSAS. MOMENTOS CONSUMATIVOS DIVERSOS. DELITOS AUTÔNOMOS CARACTERIZADOS. DOSIMETRIA. PRIMEIRA FASE. REQUERIDO O AFASTAMENTO DOS MAUS ANTECEDENTES. IMPOSSIBILIDADE. PRESENÇA DE CONDENAÇÕES TRANSITADAS EM JULGADO QUE SERVEM PARA FINS DE VALORAR OS MAUS ANTECEDENTES. POSSIBILIDADE DE SE UTILIZAR PARTE DELAS PARA AGRAVAR A PENA POR REINCIDÊNCIA E AS DEMAIS POR MAUS ANTECEDENTES. BIS IN IDEM NÃO CONFIGURADO. CONTUDO, AFASTA-SE, DE OFÍCIO, DUAS DAS QUATRO CONDENAÇÕES UTILIZADAS PARA FUNDAMENTAR OS MAUS ANTECEDENTES, SEM ALTERAÇÃO DA REPRIMENDA. CONDENAÇÕES TRANSITADAS EM JULGADO PELA PRÁTICA DE FATO POSTERIOR. TERCEIRA FASE. PRETENDIDO O AFASTAMENTO DAS CAUSAS DE AUMENTO DO EMPREGO DE ARMA DE FOGO (ARTS. 157, § 2º, INCISO I, E 158, § 1º, AMBOS DO CÓDIGO PENAL). INVIABILIDADE. APREENSÃO E PERÍCIA DO ARTEFATO PRESCINDÍVEIS. REQUERIDO, TAMBÉM, O AFASTAMENTO DA MAJORANTE DE RESTRIÇÃO DE LIBERDADE DA VÍTIMA. IMPOSSIBILIDADE. ACUSADO QUE MANTÉM A VÍTIMA SOB SEU CONTROLE E DOMÍNIO DURANTE TODA A AÇÃO CRIMINOSA. MAJORANTES MANTIDAS. FRAÇÃO DE AUMENTO FIXADA NO PATAMAR DE 3/8 (TRÊS OITAVOS) EM RAZÃO DE DUPLA MAJORAÇÃO, NO CRIME DE ROUBO, QUE TAMBÉM SE MOSTRA ADEQUADA. MAGISTRADA QUE DECLINA A MOTIVAÇÃO PARA A MAIOR EXASPERAÇÃO DA PENA AO LONGO DO DECRETO CONDENATÓRIO. PLEITO DE AFASTAMENTO DA REGRA DA CONCURSO MATERIAL ENTRE OS CRIMES PATRIMONIAIS. REQUERIDA A APLICAÇÃO DA CONTINUIDADE DELITIVA OU CONCURSO FORMAL. IMPOSSIBILIDADE. REQUISITOS DO ARTIGO 69 DO CÓDIGO PENAL PLENAMENTE PRESENTES. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

1. Não havendo qualquer mácula capaz de invalidar o reconhecimento do acusado, o qual apresenta evidente eficácia probatória, entende-se que não merece guarida a argumentação preliminar de nulidade suscitada.

2. Se do conjunto probatório emergem incontestes a materialidade e a autoria delitivas, revela-se correta a decisão condenatória.

3. Não há falar em absorção do delito de roubo pelo delito de extorsão quando resta comprovado que os crimes foram consumados em momentos distintos, inexistindo elo de interdependência entre as referidas condutas.

4. Havendo diferentes condenações transitadas em julgado, nada obsta que parte delas sirva para fins de reincidência - respeitado o prazo depurador do art. 64, inciso I, do Código Penal -, e outra(s) para fins de caracterização dos maus antecedentes, sendo tal procedência medida que atenta ao princípio da individualização da pena, de modo que agentes que demonstrem reiterado desrespeito ao ordenamento jurídico devem ser apenados de forma diferenciada.

Por outro lado, condenações referentes a fatos posteriores àqueles apurados na ação penal não podem servir de fundamento para elevar a pena-base.

5. Evidenciado o emprego de arma de fogo, é inviável o afastamento das causas especiais de aumento previstas no art. 157, § 2º, incisos I, e art. 158, § 1º, ambos do Código Penal.

6. Se comprovado que o agente ao praticar o assalto, restringiu a liberdade da vítima por considerável lapso temporal, resta correta a incidência da causa de aumento prevista no art. 157, § 2º, inciso V, do Código Penal.

7. No caso de roubo circunstanciado pelo emprego de arma e restrição da liberdade da vítima, plenamente possível a majoração da pena em 3/8 (três oitavos), desde que devidamente fundamentado o aumento em elementos concretos presentes nos autos e apontados no decisum, em atenção ao enunciado sumular n. 443 do Superior Tribunal de Justiça, o que não se verificou na hipótese.

8. Ocorre concurso material de crimes (art. 69 do Código Penal) quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais delitos, idênticos ou não.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0001938-35.2011.8.24.0023, da comarca da Capital 2ª Vara Criminal em que é Apelante Mário César Thomé e Apelado Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

A Primeira Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso, rejeitar a preliminar e, no mérito, negar-lhe provimento. De ofício, afasta-se duas condenações transitadas em julgado, por fatos posteriores, utilizadas na exasperação da circunstância judicial referente aos antecedentes do agente, sem alteração na dosimetria, nos termos da fundamentação. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Des. Carlos Alberto Civinski, com voto, e dele participou o Exmo. Des. Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva.

Funcionou na sessão pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Dr. Lio Marcos Marin.

Florianópolis, 20 de fevereiro de 2020.

Assinado digitalmente

Desembargador Paulo Roberto Sartorato

Relator


RELATÓRIO

O representante do Ministério Público, com base no incluso Inquérito Policial, ofereceu denúncia em face de Mário César Thomé, devidamente qualificado nos autos, dando-o como incurso nas sanções dos artigos 157, § 2º, inciso I (na redação anterior à Lei n. 13.654/18), e 158, § 1º, na forma do art. 69, todos do Código Penal, pelos fatos assim narrados na peça exordial acusatória, in verbis (fls. 01/03):

No dia 29.11.2008, por volta das 01h30min, nas imediações do Terminal Rodoviário Rita Maria, na cidade de Florianópolis, Comarca da Capital/SC, o denunciado MÁRIO CÉSAR THOMÉ, mediante grave ameaça, consistente no emprego de arma de fogo, com o intuito de obter vantagem econômica para si, constrangeu a vítima Gervana Aparecida de Lima Medeiros a efetuar um saque no valor de R$ 100,00 em um caixa eletrônico 24 horas localizado em um posto de combustíveis no bairro Rita Maria, cidade de Florianópolis, após ingressar em seu veículo e em companhia da vítima rodar por esta cidade e região metropolitana.

O denunciado, após a obtenção da vantagem econômica indevida, ainda subtraiu para si, da vítima Gernava, mediante grave ameaça exercida com emprego da arma de fogo, tipo pistola, marca Taurus, calibre 380, com numeração raspada, os pertences descritos no Laudo de Avaliação Indireta de fl. 50, evadindo-se do local logo em seguida no veículo Toyota Corolla, placas MEU 9296, também de propriedade de referida vítima.

Na data de 02.12.2008, o denunciado MÁRCIO CÉSAR THOMÉ foi preso em flagrante delito após a prática de roubo contra a Drogaria Catarinense, oportunidade em que se encontra na posse do veículo da vítima Gervana e de seus pertences indicados à fl. 50. (Grifo no original)

O acusado não foi encontrado e, citado por edital, não compareceu aos autos ou constituiu advogado, motivo pelo qual se determinou a suspensão do feito e do prazo prescricional, nos termos do art. 366 do Código de Processo Penal (fl. 100). Após a citação do réu (fl. 125), o processo retomou seu curso regular (fl. 131).

Encerrada a instrução processual, a MMa. Juíza Substituta, por meio da sentença de fls. 207/220, procedeu à emendatio libelli (art. 383 do Código de Processo Penal) e julgou procedente a pretensão punitiva deduzida na denúncia para condenar o acusado ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 14 (catorze) anos, 05 (cinco) meses e 10 (dez) dias de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado, e ao pagamento de 29 (vinte e nove) dias-multa, cada qual no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, pela prática dos delitos descritos nos arts. 157, § 2º, incisos I (na redação vigente à época) e V, e 158, § 1º, ambos na forma do art. 69, todos do Código Penal, concedendo-lhe o direito de recorrer em liberdade.

Inconformado, o acusado interpôs recurso de apelação, por termo nos autos (fl. 254). Nas inclusas razões recursais, por intermédio da Defensoria Pública do Estado, pugnou, preliminarmente, pela ilicitude do reconhecimento realizado pela vítima, tendo em vista a não observância à fórmula contida no art. 226 do Código de Processo Penal. No mérito, pretendeu a absolvição ante a fragilidade probatória. Subsidiariamente, almejou a absorção do delito de roubo pelo de extorsão. No que toca à aplicação da pena, na primeira fase, requereu o afastamento dos maus antecedentes e, na terceira etapa, pugnou pelo afastamento das majorantes referentes ao emprego de arma (art. 157, § 2º, inciso I, e art. 158, § 1º, ambos do CP) e restrição da liberdade da vítima (art. 157, § 2º, inciso V, do CP) ou pela mitigação do quantum fracionário referente à dupla majoração do crime de roubo. Clamou, ainda, pelo afastamento do concurso material e aplicação da continuidade delitiva ou, ainda, concurso formal. Por fim, pretendeu o prequestionamento do art. 5º, incisos LV, LVI, LVII, LVIII e LXIII, da Constituição Fedeal, art. 8º, item 2, 'g', do Pacto de São José da Costa Rica e art. 157 do Código de Processo Penal (fls. 271/289).

Em contrarrazões, o Ministério Público requereu o conhecimento e desprovimento do recurso defensivo (fls. 294/311).

Após, os autos ascenderam a esta Superior Instância, tendo a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Dr. Lio Marcos Marin,...

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