Acórdão Nº 0001940-36.2012.8.24.0066 do Terceira Câmara de Direito Público, 14-09-2021

Número do processo0001940-36.2012.8.24.0066
Data14 Setembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0001940-36.2012.8.24.0066/SC

RELATOR: Desembargador SANDRO JOSE NEIS

APELANTE: FLAVIO BALDISSERA (Representado, Espólio) ADVOGADO: Ricardo Antônio Cavalli (OAB SC014244) ADVOGADO: MARCOS GROKOSKI (OAB SC031451) ADVOGADO: RAFAEL ZANARDO TAGLIARI (OAB SC037207) REPRESENTANTE LEGAL DO APELANTE: ARLETE AMALIA PASIN BALDISSERA (Representante, Inventariante) APELADO: ESTADO DE SANTA CATARINA

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de Apelação Cível interposto pelo espólio de Flávio Baldissera contra sentença proferida pelo MM. Juiz da Vara Única da Comarca de São Lourenço do Oeste que, nos autos dos Embargos à Execução Fiscal n. 0001940-36.2012.8.24.0066 (066.12.001940-5) ajuizados pelo ora recorrente em desfavor do Estado de Santa Catarina, julgou extinto o feito, com fulcro no art. 16, § 1º, da Lei n. 6.830/1980, ante a ausência de garantia, e indeferiu o benefício da justiça gratuita, por não ter havido a comprovação do estado de miserabilidade.

Argumenta o Embargante, em síntese, que a insuficiência de penhora não impediria o conhecimento dos embargos, conforme jurisprudência dos Tribunais, razão pela qual o feito deveria retornar ao Primeiro Grau para, "em homenagem ao preceito constitucional do direito à ampla defesa, [...] ser recebidos, autuados e julgados".

Sustenta, ainda, que além de o benefício da justiça gratuita ter sido indeferido sem a oportunidade de comprovação da hipossuficiência, não houve a apreciação sequer das matérias de ordem pública, motivo pelo qual reeditou todas as teses lançadas na exordial do embargos, pugnando pela concessão do benefício da justiça gratuita e, ao final, a reforma da sentença prolatada, com a consequente inversão do ônus sucumbencial.

Foram apresentadas contrarrazões (Evento 111, PROCJUDIC1; fls. 125-137).

Neste grau de jurisdição, determinou-se que o Apelante comprovasse, por meio de documentos, a alegada hipossuficiência para concessão do benefício da justiça gratuita (Evento 111, PROCJUDIC1;fl. 146), o que restou atendido no "Evento 111", às fls. 150-197.

Declinada a competência pelo eminente Relator antes designado (Evento 111, PROCJUDIC1; fls. 199-201), os autos foram recebidos e conclusos.

É o relatório.

VOTO

A princípio, convém esclarecer que, como a sentença foi publicada ainda na vigência do antigo Código de Processo Civil (10-10-2013; Evento 111, PROCJUDIC1; fl. 82), o processo será analisado sob o regramento do Código de Processo Civil de 1973, frente ao que prevê o Enunciado Administrativo n. 2 do Superior Tribunal de Justiça, ressalvadas eventuais normas de aplicação imediata.

Assim, tem-se que o recurso merece ser conhecido, pois tempestivo e satisfeitos os demais pressupostos de admissibilidade, conforme abaixo se analisará.

Da justiça gratuita

Objetiva o Embargante, em sede de apelação, a reforma da sentença em relação ao indeferimento da justiça gratuita, sob o argumento de que o espólio não possui condições de arcar com as despesas do processo e não fora intimado para comprovar sua real necessidade.

Da análise, constata-se que restou acostado aos autos: (a) a declaração de hipossuficiência do Espólio (Evento 111, PROCJUDIC1; fl. 49); (b) documentos que apontam que a inventariante Arlete Amálisa Pasin Baldissera recebe, a título de pensão por morte, o valor líquido de R$ 998,00 (novecentos e noventa e oito reais) por mês, e (c) certidão do DETRAN em que informa a inexistência de bens móveis em nome do espólio (Evento 111, PROCJUDIC1; fls. 195-196);

Além disso, o Espólio é detentor de apenas 1 (um) bem imóvel, matriculado sob o n. 11.998, e penhorado em diversas execuções fiscais (Evento 111, PROCJUDIC1; fls. 185), inclusive na presente demanda, e que também seria considerado o único bem da família.

O processo de inventário (atual n. 0006013-89.1998.8.24.0018; antigo n. 018.98.006013-0) encontra-se arquivado desde maio de 2018, em razão da ausência de bens passíveis de penhora e da existência de várias demandas buscando bens ainda não constritados.

Diante do mencionado contexto probatório e inexistindo indícios de que haja patrimônio líquido imediato para arcar com as custas e despesas processuais, a concessão da justiça gratuita ao Apelante se mostra adequada.

A propósito já decidiu esta Corte:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. JUSTIÇA GRATUITA. DECISÃO QUE INDEFERIU A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. DECLARAÇÃO DE CARÊNCIA ECONÔMICA DOS AGRAVANTES, ALIADA A OUTRAS CIRCUNSTÂNCIAS, QUE COMPROVAM A HIPOSSUFICIÊNCIA. PEDIDO QUE SE IMPUNHA DEFERIDO. CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE QUE NÃO SE CONSTITUI EM PRESSUPOSTO PARA O DEFERIMENTO DA BENESSE. RECURSO PROVIDO. 1. É assente, na jurisprudência, que a afirmação da parte de que não tem condições de arcar com as custas do processo e com os honorários advocatícios, sem prejuízo próprio ou de sua família, desde que confortada em elementos dos autos, permite a concessão da assistência judiciária. 2. Na hipótese, a agravante e os demais herdeiros do espólio agravante comprovaram a impossibilidade de arcar com as custas processuais sem prejudicar o seu sustento e o de sua família. Com efeito, cuida-se de agravante com renda mensal bruta no valor de R$ 1.506,00 (um mil, quinhentos e seis reais), sendo que os demais herdeiros do espólio requerente foram qualificados na ação de inventário como auxiliar administrativo, técnico eletrônico e assistente de cobrança. 3. Nos casos de "assistência judiciária gratuita - [...], não se exige, como seu pressuposto, a miséria absoluta, podendo ser outorgada a quem tem até certos bens, uma vez que a lei não reclama seu sacrifício em benefício dos ônus processuais. Não obstante, nada impede a sua condenação por força da sucumbência, a qual restará suspensa por 5 (cinco) anos, para que se encontrem recursos que a satisfaça" (Ap. Cív. n. 49.750, de Tijucas, rel. Des. Amaral e Silva). (TJSC, Agravo de Instrumento n. 2013.048905-5, de Navegantes, rel. Carlos Adilson Silva, Primeira Câmara de Direito Público, j. 03-06-2014).

Diante do contexto, tendo em vista que não é preciso que o pleiteante do benefício em questão seja miserável, mas somente que o pagamento das custas processuais afete de forma significativa o seu próprio sustento e de sua família, e sendo esta a situação dos autos, o provimento do recurso é medida que se impõe.

Assim, a concessão da referida benesse ao Espólio se mostra adequada, razão pela qual o reclamo deve ser provido nesse ponto.

Do recebimento dos embargos

Sustenta o Apelante, quanto ao mérito em si, que o recebimento dos embargos à execução não estaria condicionado à existência de prévia garantia do juízo.

Menciona o art. 16, § 1º, da Lei n. 6.830/1980:

Art. 16 - O executado oferecerá embargos, no prazo de 30 (trinta) dias, contados:

I - do depósito;

II - da juntada da prova da fiança bancária ou do seguro garantia;

III - da intimação da penhora.

§ 1º - Não são admissíveis embargos do executado antes de garantida a execução.

[...]. (grifo nosso).

Já decidiu a Corte da Cidadania, sob o rito dos repetitivos (Tema 526), que, "Em atenção ao princípio da especialidade da LEF, mantido com a reforma do CPC/73, a nova redação do art. 736, do CPC dada pela Lei n. 11.382/2006 - artigo que dispensa a garantia como condicionante dos embargos - não se aplica às execuções fiscais diante da presença de dispositivo específico, qual seja o art. 16, §1º da Lei n.6.830/80, que exige expressamente a garantia para a apresentação dos embargos à execução fiscal." (REsp 1272827/PE, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/05/2013, DJe 31/05/2013).

E também já se pronunciou o Superior Tribunal de Justiça, sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 260) que, " 'Caso o devedor não disponha de patrimônio suficiente para a garantia integral do crédito exequendo, cabe-lhe comprovar inequivocamente tal situação. Neste caso, dever-se-á admitir os embargos, excepcionalmente, sob pena de se violar o princípio da isonomia sem um critério de discrímen sustentável, eis que dar seguimento à execução, realizando os atos de alienação do patrimônio penhorado e que era insuficiente para garantir toda a dívida, negando ao devedor a via dos embargos, implicaria restrição dos seus direitos apenas em razão da sua situação de insuficiência patrimonial. Em palavras simples, poder-se-ia dizer que tal implicaria em garantir o direito de defesa ao "rico", que dispõe de patrimônio suficiente para segurar o Juízo, e negar o direito de defesa ao "pobre", cujo patrimônio insuficiente passaria a ser de pronto alienado para a satisfação parcial do crédito. Não trato da hipótese de inexistência de patrimônio penhorável pois, em tal situação, sequer haveria como prosseguir com a execução, que restaria completamente frustrada.' (Leandro Paulsen, in Direito Processual Tributário, Processo Administrativo Fiscal e Execução Fiscal à luz da Doutrina e da Jurisprudência, Ed. Livraria do Advogado, 5ª ed.; p. 333/334)." (REsp 1127815/SP, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/11/2010, DJe 14/12/2010).

Na hipótese, verifica-se que o Exequente requereu a penhora de valores ou bens no rosto do inventário do Executado (Evento 114, ANEXO2; dos autos n. 0001776-71.2012.8.24.0066; fl.129), porém, nada lhe foi apontado como disponível, em razão do único bem imóvel discriminado no rol de bens a partilhar ter sido considerado como bem de família.

Além disso, tal qual acima esposado, comprovou o Apelante fazer jus ao benefício de justiça gratuita, pois trouxe documentos capazes de afirmar a impossibilidade atual de arcar com as custas processuais, sem prejudicar o seu sustento e o de sua família.

Assim, comprovada a insuficiência patrimonial e a carência financeira do Embargante, viável o recebimento dos embargos à execução excepcionalmente sem o devido...

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