Acórdão Nº 0001985-53.2005.8.24.0141 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 30-06-2022

Número do processo0001985-53.2005.8.24.0141
Data30 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0001985-53.2005.8.24.0141/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0001985-53.2005.8.24.0141/SC

RELATOR: Desembargador GILBERTO GOMES DE OLIVEIRA

APELANTE: MARCKAL TRANSPORTES LTDA (AUTOR) ADVOGADO: ESTEVÃO RUCHINSKI FILHO (OAB SC020928) ADVOGADO: ESTEVAO RUCHINSKI (OAB PR025069) APELANTE: BANCO DO BRASIL S.A. (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de recursos de apelação, interpostos por ambas as partes, da sentença, proferida pelo Juízo da Vara Regional de Direito Bancário da comarca de Rio do Sul, Dr. Eduardo Felipe Nardelli, que, nos autos da ação de revisão contratual (abertura de crédito e outras avenças), ajuizada por Marckal Transportes Ltda. em face do Banco do Brasil S.A., julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, para:

(a) determinar que o(s) contrato(s) observe(m) o resultado da revisão judicial ora efetuada, notadamente: i) os juros remuneratórios devem ser readequados à taxa média de mercado, salvo se a taxa efetiva aplicada ao contrato for mais vantajosa; ii) deve ser afastada a capitalização de juros, em qualquer periodicidade; iii) deve ser afastada a cobrança da comissão de permanência e da multa moratória, pois ausente prova da contratação; iv) a cobrança das tarifas deve ser afastada, porquanto ausente prova da contratação expressa.

(b) declarar o consumidor em mora, em razão da ausência de depósito do valor incontroverso; e,

(c) determinar a compensação/restituição, na forma simples, dos valores exigidos a maior, de acordo com a revisão ora efetuada, observando os encargos referidos na fundamentação.

Em suas razões recursais, o demandante sustentou as seguintes teses:

(a) a incidência de correção monetária a contar dos respectivos reembolsos e juros de mora de 1% desde a citação;

(b) a aplicação da menor taxa de mercado divulgada pelo Bacen quanto aos contratos não juntados aos autos.

O banco demandado, por sua vez, defendeu:

(a) a declaração expressa de que a revisão operada deve respeitar a prova documental produzida nos autos;

(b) a validade dos juros remuneratórios pactuados;

(c) a legalidade da capitalização de juros;

(d) a legalidade da comissão de permanência;

(e) a caracterização da mora;

(f) a legalidade das tarifas bancárias; e

(g) a fixação da verba honorária com base no valor atribuído à causa.

Foram apresentadas contrarrazões (eventos 286 e 287).

É o relatório.

VOTO

I. Tempus regit actum

Sentença proferida em 22.06.2020.

Portanto, à lide aplica-se o CPC/15, na forma do enunciado administrativo nº 3: "Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC".

II. Tempestividade e preparo recursal

Constata-se que os recursos de apelação são tempestivos e que ambas as partes comprovaram o recolhimento do respectivo preparo recursal.

III. Caso concreto

III.I Apelo do demandante

(a) atualização monetária

Inicialmente, a parte demandante requer a incidência de correção monetária a contar dos respectivos reembolsos e juros de mora de 1% desde a citação.

Com razão.

Isso, porque, em se tratando de demanda revisional, o termo inicial da correção monetária deve ser a partir da data do desembolso dos respectivos valores a restituir.

Ademais, por aplicação do disposto no artigo 405 do Código Civil, os juros de mora incidem a partir da citação.

Sendo assim, dá-se provimento ao apelo no ponto.

III.II Tópicos comuns às partes

(a) juros remuneratórios

Acerca da temática concernente à fixação de juros remuneratórios em contratos bancários, tal como a hipótese dos autos, a Súmula n. 382 do Superior Tribunal de Justiça assentou entendimento de que "a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade".

Ademais, no que tange à possibilidade de revisão da taxa pactuada, o Superior Tribunal de Justiça, em julgamento de Recursos Especiais Repetitivos (REsp. n. 1.112.879 e REsp. n. 1.112.880), firmou o seguinte entendimento:

Nos contratos de mútuo em que a disponibilização do capital é imediata, o montante dos juros remuneratórios praticados deve ser consignado no respectivo instrumento. Ausente a fixação da taxa no contrato, o juiz deve limitar os juros à média de mercado nas operações na espécie, divulgada pelo Bacen, salvo se a taxa cobrada for mais vantajosa para o cliente.

Em qualquer hipótese, é possível a correção para a taxa média se for verificada abusividade nos juros remuneratórios.

(REsp. n 1.112.879/PR. Relª. Minª. Nancy Andrighi, j. em 12.05.2010).

Com efeito, a jurisprudência admite a revisão da cláusula que estabelece o percentual dos juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que aplicável o Código de Defesa do Consumidor ao caso e a exista abusividade no pacto, nos termos do entendimento fixado pelo o Superior Tribunal de justiça, em julgamento de Recurso Especial, afeto ao rito dos recursos repetitivos:

a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade;

c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02;

d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto.

(REsp. N. 1.061.530/RS. Relª Minª Nancy Andrighi, j. em 22.10.2008).

Colhe-se do teor do aludido acórdão os esclarecimentos acerca dos parâmetros a serem utilizados pelo julgador ao apreciar a questão atinente à revisão da cláusula contratual dos juros remuneratórios:

[...] conclui-se que é admitida a revisão das taxas de juros em situações excepcionais, desde que haja relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, §1º, do CDC) esteja cabalmente demonstrada.

Necessário tecer, ainda, algumas considerações sobre parâmetros que podem ser utilizados pelo julgador para, diante do caso concreto, perquirir a existência ou não de flagrante abusividade.

Inicialmente, destaque-se que, para este exame, a meta estipulada pelo Conselho Monetário Nacional para a Selic - taxa do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - é insatisfatória. Ela apenas indica o menor custo, ou um dos menores custos, para a captação de recursos pelas instituições que compõem o Sistema Financeiro Nacional. Sua adoção como parâmetro de abusividade elimina o 'spread' e não resolve as intrincadas questões inerentes ao preço do empréstimo.

Por essas razões, conforme destacado, o STJ em diversos precedentes tem afastado a taxa Selic como parâmetro de limitação de juros. Descartados índices ou taxas fixos, é razoável que os instrumentos para aferição da abusividade sejam buscados no próprio mercado financeiro. Assim, a análise da abusividade ganhou muito quando o Banco Central do Brasil passou, em outubro de 1999, a divulgar as taxas médias, ponderadas segundo o volume de crédito concedido, para os juros praticados pelas instituições financeiras nas operações de crédito realizadas com recursos livres (conf. Circular nº 2957, de 30.12.1999).

As informações divulgadas por aquela autarquia, acessíveis a qualquer pessoa através da rede mundial de computadores (conforme http://www.bcb.gov.br/?ecoimpom - no quadro XLVIII da nota anexa; ou http://www.bcb.gov.br/?TXCREDMES, acesso em 06.10.2008), são segregadas de acordo com o tipo de encargo (prefixado, pós-fixado, taxas flutuantes e índices de preços), com a categoria do tomador (pessoas físicas e jurídicas) e com a modalidade de empréstimo realizada ('hot money', desconto de duplicatas, desconto de notas promissórias, capital de giro, conta garantida, financiamento imobiliário, aquisição de bens, 'vendor', cheque especial, crédito pessoal, entre outros).

A taxa média apresenta vantagens porque é calculada segundo as informações prestadas por diversas instituições financeiras e, por isso, representa as forças do mercado. Ademais, traz embutida em si o custo médio das instituições financeiras e seu lucro médio, ou seja, um 'spread' médio. É certo, ainda, que o cálculo da taxa média não é completo, na medida em que não abrange todas as modalidades de concessão de crédito, mas, sem dúvida, presta-se como parâmetro de tendência das taxas de juros. Assim, dentro do universo regulatório atual, a taxa média constitui o melhor parâmetro para a elaboração de um juízo sobre abusividade.

Como média, não se pode...

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