Acórdão Nº 0002032-12.2010.8.24.0057 do Segunda Câmara de Direito Público, 22-03-2022

Número do processo0002032-12.2010.8.24.0057
Data22 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0002032-12.2010.8.24.0057/SC

RELATOR: Desembargador SÉRGIO ROBERTO BAASCH LUZ

APELANTE: GERTI SEHNEM GOMES (AUTOR) APELADO: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por GERTI SEHNEM GOMES contra a sentença (evento 333 dos autos na origem) que, na "Ação de Obrigação de Fazer" em desfavor do ESTADO DE SANTA CATARINA, extinguiu o feito sem resolução de mérito, nestes termos:

Ante o exposto, julgo extinto o processo, sem resolução do mérito, com fundamento no artigo 485, IV, do CPC.

Condeno a parte autora ao pagamento das custas e honorários advocatícios que fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), suspensa a exigibilidade em virtude da concessão da justiça gratuita.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

A parte insurgente sustenta em síntese, a procedência do recurso com a reforma da sentença, para anular a sentença que extinguiu o processo sem resolução de mérito e determinar que o ente estadual forneça os medicamento indicados na análise do perito judicial (evento 339 dos atos na origem).

Ausência de contrarrazões (evento 341/343).

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer exarado pelo Excelentíssimo Senhor Rogê Macedo Neves, manifestou-se pelo provimento do recurso de apelação, bem como pelo imediato restabelecimento da tutela de urgência inicialmente deferida (evento 12).

VOTO

Busca a parte apelante - GERTI SEHNEM GOMES o provimento judicial a fim de que o Estado de Santa Catarina seja compelido à obrigação de fazer consistente no fornecimento dos medicamentos " bromazepan 3mg, naturetti 400mg , luftal gel 125 mg, fixa cal 600 mg, vitamina E 400mg, estreva gel, donaren 50mg, tylex 500mg e oslistate 120mg," à autora que é acometida em suma: dorsalgia, dor lombar baixa, transtorno depressivo recorrente, transtorno de ansiedade generalizada, gastrite, transtorno funcionais do intestino, coxartorse de quadril bilateral, gonartrose nos joelhos (M54.8, M54.5, F33, F41.1, k 59.9, M 16.9, M 17), sendo que, dentre os medicamentos postulados, alguns são fornecidos pelo SUS e outros não são padronizados pelo Sistema Único de Saúde - SUS.

Acerca da legitimidade passiva, sabe-se que o funcionamento do Sistema Único de Saúde - SUS é de responsabilidade solidária da União, Estados-membros e Municípios.

A Suprema Corte, em sede de repercussão geral - Tema 793, havia reafirmado sua jurisprudência no sentido de que "O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente" (RE 855178 RG, Rel. Min. Luiz Fux, j. 05/03/2015).

Porém, nos embargos de declaração então opostos, fixou-se a tese de que "Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro" (RE n. 855.178 RG, Rel. Min. Edson Fachin, j. em 23/5/2019). Na oportunidade, em aprofundamento da tese, assentou-se que "Se o ente legalmente responsável pelo financiamento da obrigação principal não compuser o polo passivo da relação jurídico processual, compete a autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro, sem prejuízo do redirecionamento em caso de descumprimento;" e que, "Se a pretensão veicular pedido de tratamento, procedimento, material ou medicamento não incluído nas políticas públicas (em todas as suas hipóteses), a União necessariamente comporá o polo passivo".

Diante disso, nas palavras do eminente Des. Francisco Oliveira Neto, "em observância à tese estabelecida pelo Supremo Tribunal Federal [...] a União deverá ser incluída no polo passivo das causas que versarem sobre tratamento, material e/ou medicamento não padronizado pela rede pública (STA n. 175)" (AC n. 0302590-13.2014.8.24.0010, de Braço do Norte, j. 31/1/2020).

Nesse sentido:

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. FORNECIMENTO DO MEDICAMENTO RANIBIZUMABE. ENFERMO PORTADOR DE DEGENERAÇÃO MACULAR RELACIONADA À IDADE. DIREITO À SAÚDE. EXEGESE DOS ARTS. E 196, DA CF/88. OBRIGAÇÃO SOLIDÁRIA ENTRE OS ENTES FEDERADOS. PRODUTO NÃO PADRONIZADO PELAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE DO SUS PARA A MOLÉSTIA DO PACIENTE. APLICAÇÃO DO TEMA N. 793 DO STF. OBRIGATORIEDADE DE INCLUSÃO DA UNIÃO NO POLO PASSIVO DA LIDE. POSTERIOR REMESSA DOS AUTOS À JUSTIÇA FEDERAL. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. APELO DO MUNICÍPIO PARCIALMENTE PROVIDO. "Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro" (Tema 793 - STF, RE 855178-ED, rel. Min. Luiz Fux. Rel. P/ acórdão Min. Edson Fachin). Conforme determinado pelo Supremo Tribunal Federal (ED no RE nº 855.178 - Tema 793), "(...) se a pretensão veicular pedido de tratamento, procedimento, material ou medicamento não incluído nas políticas públicas (em todas as suas hipóteses), a União necessariamente comporá o polo passivo, considerando que o Ministério da Saúde detém competência para a incorporação, exclusão ou alteração de novos medicamentos, produtos, procedimentos, bem como constituição ou a alteração de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica (art. 19-Q, Lei 8.080/90), de modo que recai sobre ela o dever de indicar o motivo da não padronização e eventualmente iniciar o procedimento de análise de inclusão, nos termos da fundamentação" (AC n. 0300205-43.2019.8.24.0002, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Jaime Ramos, Terceira Câmara de Direito Público, j. 23-02-2021).

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. PROVISÃO DE MEDICAMENTOS PERTENCENTES AO "GRUPO 1B", CUJA AQUISIÇÃO SE DÁ POR MEIO DOS ESTADOS, COM TRANSFERÊNCIA DE RECURSOS FINANCEIROS PELO MINISTÉRIO DA SAÚDE, NA MODALIDADE FUNDO A FUNDO. APLICABILIDADE DO TEMA N. 793 DO STF. NECESSIDADE DE INCLUSÃO DA UNIÃO NO POLO PASSIVO DA PRESENTE ACTIO. HIPÓTESE DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. SOLIDARIEDADE ENVOLVENDO OS ENTES DA FEDERAÇÃO NAS DEMANDAS PRESTACIONAIS NA ÁREA DA SAÚDE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM. "Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro" (Tema 793 - STF, RE 855178, rel. Min. Luiz Fux, tese firmada em 23.05.2019) (TJSC, Apelação n. 0306083-82.2017.8.24.0045, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Carlos Adilson Silva, Segunda Câmara de Direito Público, j. 09-02-2021).

Aliás, o próprio TRF da 4ª Região, por meio de sua 3ª Seção, em 15/12/2020, ao não admitir a instauração do IRDR n. 5051304-03.2020.4.04.0000/RS, em voto do eminente Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, assentou que a "UF é litisconsorte necessário se a pretensão veicular pedido de tratamento, procedimento, material ou medicamento não incluído nas políticas públicas (em todas as suas hipóteses). A consequência é que se a União não for citada, a ação deve ser extinta por ilegitimidade passiva". O aresto carrega a seguinte ementa:

DIREITO DA SAÚDE. INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS. LEGITIMIDADE E DO LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO DA UNIÃO PARA PARA AÇÕES SOBRE FÁRMACOS E PRESTAÇÕES NÃO REGISTRADAS NA ANVISA E/OU NÃO INCORPORADAS AO SUS. EXISTÊNCIA DE PRECEDENTE DO STF FIRMADO EM REPERCUSSÃO GERAL. IRDR INADMITIDO. A questão da legitimidade e do litisconsórcio passivo necessário da UF, tanto para ações sobre fármacos e prestações não registradas na Anvisa e/ou não incorporadas ao SUS, com nas demais, restou pacificada nos temas 500 e 793, já decididos pelo STF, inviabilizando o trânsito do IRDR, nos termos do art. 976, § 4º, do CPC (TRF4 5051304-03.2020.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator para Acórdão PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 18/12/2020).

Mais recentemente ainda, a Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do TRF da 4ª Região alterou seu anterior entendimento e passou a adotar a posição de, nestes casos, reconhecer o litisconsórcio passivo necessário da União e, assim, fixar a competência da Justiça Federal:

DIREITO DA SAÚDE. FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS NÃO INCLUÍDOS EM POLÍTICAS PÚBLICAS E DE MEDICAMENTOS INCLUÍDOS EM POLÍTICAS PÚBLICAS QUE SEJAM FINANCIADOS PELO ENTE FEDERAL. ALCANCE DA SOLIDARIEDADE. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO DA UNIÃO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. PRECEDENTES DO STF. TEMAS 500 E 793. 1. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 855.178 ED, estabeleceu a seguinte tese em regime de repercussão geral: "os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro". 2. A referida solidariedade, que diz respeito à tutela da saúde de modo genérico, deve ser lida a partir da repartição das competências e atribuições legalmente atribuídas aos entes que compõem o Sistema Único de Saúde - SUS, observado o princípio da...

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