Acórdão Nº 0002109-69.2013.8.24.0104 do Sexta Câmara de Direito Civil, 13-04-2021

Número do processo0002109-69.2013.8.24.0104
Data13 Abril 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSexta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0002109-69.2013.8.24.0104/SC

RELATOR: Desembargador ANDRÉ CARVALHO

APELANTE: VALDIR ODELLI APELANTE: MIRIAM KREMER ODELLI APELANTE: CESAR KREMER APELADO: OSLIN EBERT APELADO: ELRITA NEUMANN EBERT

RELATÓRIO

Adoto, por economia processual e em homenagem à sua completude, o relatório da sentença:

OSLIN EBERT e outro, devidamente qualificados nestes autos, por seu procurador, ajuizou AÇÃO DE MANUTENÇÃO DE POSSE contra VALDIR ODELLI e outros, igualmente qualificados, visando, diante da alegada turbação praticada pelos Réus, ser mantidos da posse de imóvel em que há suposta existência de servidão para passagem pela única estrada de acesso à propriedade dos Autores.Concluso os autos, indeferiu-se a liminar ante a ausência de comprovação dos requisitos exigidos na legislação para o seu deferimento (fl. 52).Em audiência de justificação prévia foram inquiridas testemunhas (fls. 49/51).Citados (fl. 22), os Réus apresentaram defesa em forma de contestação (fls. 81/95), alegando, em síntese, não haver comprovação da turbação por parte dos Réus, bem como a inexistência de servidão na estrada referida na inicial.Juntaram documentos (fls. 101/112).Os Autores reportaram aos autos com novo pedido de deferimento da liminar, acostando novos documentos (fls. 150/169).Às fls. 170/171 deferiu-se a liminar, determinando-se a abstenção dos Réus de impedir a passagem dos Autores pela passagem mencionada na exordial.Diante do deferimento da liminar, houve a interposição de Agravo de Instrumento pelos Réus, o qual restou negado o pedido liminar (fls. 233/235).Conclusos estes autos para sentença desde 27/06/2016, foram encaminhados a este magistrado para julgamento, em regime de mutirão de sentenças, pelo Programa Permanente de Julgamento Prioritário a "CGJ APOIA".

A parte dispositiva da sentença é do seguinte teor:

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos contidos na inicial para, confirmando a liminar de fls. 170/171, que os Réus se abstenham de impedir o livre trânsito dos Autores pela passagem referida na inicial, bem como que procedam à retirada de todo e qualquer obstáculo que impeça ou limite o trânsito livre dos Autores pela passagem referida na inicial, que dá acesso à BR-470, no prazo de 48 horas, sob pena de multa diária no importe de R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais).Condeno os Réus ao pagamento de despesas processuais e honorários advocatícios, fixados em R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais), a teor do disposto nos arts. 85 §2º e 86, § único, ambos do CPC. Fica suspensa a exigibilidade das verbas sucumbenciais e custas em razão da assistência judiciária gratuita deferida ao Autor.Defiro o pedido de justiça gratuita formulado pelos Réus. (fl. 261; grifo no original).

Inconformados, os Demandados interpuseram o presente recurso de Apelação Cível sustentado, em preliminar, (i) a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, pois sonegou o direito à prova testemunhal, a prova pericial, a inspeção judicial, a ouvida dos Autores para depois dizer que os Réus não comprovaram a alegação da inexistência de servidão de passagem sobre a estrada que conduz ao domicílio do requerido Valdir Odelli; (ii) a inépcia da inicial, diante da ausência do pressuposto de constituição e de desenvolvimento valido e regular do processo, qual seja, o requisito da turbação.

No mérito, defendem que (a) o único imóvel que permaneceu sem o devido acesso à BR 470, porque seu proprietário após o desmembramento não negociou com Curt Stanke e nem requereu servidão de passagem como os outros fizeram, foi o imóvel dos Autores; (b) os Autores por comodismo quiseram se aproveitar do caminho que dá acesso à casa de Valdir Odelli e Miriam Odelli que fica no meio do terreno do réu Cesar Kremer; (c) os Autores compraram o imóvel barato porque não existe servidão de passagem, devendo constituir uma servidão nos termos da lei, tentaram esbulhar o imóvel dos Réus, sem existir passagem legalmente constituída, por isso os Autores sempre foram repelidos; (d) os Autores não gozam de proteção possessória do que chamam de caminho/servidão ou outra designação, que se queira dar simplesmente porque o imóvel por onde tentam passar e são repelidos é da propriedade de Cesar Kraemer e da posse fática de Valdir e Miriam; (e) o malfadado caminho nunca foi legalmente constituído em favor dos Autores, portanto, não se trata de servidão de trânsito não titulada aparente; (f) os Autores nunca realizaram obras que pela sua natureza considera-se aparente, e desde que adquiriram o imóvel em 2001 tentam usurpar o imóvel da posse dos Réus, e com isso tentar passar pelo caminho particular que dá acesso à casa de Valdir e Miriam; (g) como a servidão se constitui em regra geral através de livre manifestação de vontade, mediante a expressa declaração do proprietário, e como os proprietários e possuidores sempre foram contra a passagem dos Autores, a servidão não se constituiu, bem como não existe direito sobre o inexistente; (h) os Autores adquiriram o imóvel em 2001, e com eles nunca existiu livre manifestação de vontade sobre o assunto, nunca houve contrato e não se constituiu servidão mediante declaração expressa dos proprietários e pelos demais modos previsto no art. 1.378 do Código Civil; (i) os Autores, à luz de unilateral conveniência, fizeram um Boletim de Ocorrência que em nada demonstra que em algum dia exerceram a posse sobre a área da estrada que conduz ao domicílio de Valdir Odelli, que é a área objeto da ação de manutenção de posse nunca exercida pelos Autores; (j) os Requerentes fizeram um muro e uma cerca na divisa do seu imóvel com o dos requeridos, e bem ao lado da casa do requerido Valdir fizeram também um portão, e então decidiram literalmente passar o trator pela terra dos Requeridos, para ter acesso a BR 470, por cima do caminho que conduz a residência de Valdir, como salta à todos os olhos das fotografias; (k) não existe no mundo jurídico turbação da posse do próprio caminho que conduz ao próprio domicilio porque o possuidor da área do caminho impede terceiros que querem esbulhar a sua posse de transitar pelo seu caminho, pois só tem direito a manutenção de posse quem exerce posse efetiva sobre a área; (l) na audiência de justificação da posse, os Autores não conseguiram provar a posse sobre a área que Valdir exerce a posse e construiu o caminho até a sua residência; (m) as testemunhas ouvidas na justificação prévia foram unânimes em afirmar que os Autores plantavam arroz e posteriormente outras culturas, em imóvel que exigia a passagem pelas terras dos Réus, o que faziam reiteradamente.

Por fim, requerem "a) Que seja admitido, conhecido e provido o presente recurso de apelação para cassar a r. sentença apelada e remeter os autos à 1ª instância para que proceda a instrução de provas, deferindo as provas requeridas pelos apelantes, a saber: a prova pericial, a prova testemunhal, a inspeção judicial e a ouvida dos autores. b) Alternativamente e caso não acolhido o pedido acima, que seja admitido, conhecido e provido o presente recurso para EXTINGUIR o processo sem julgamento de mérito, ante as preliminares suscitadas. c) Alternativamente, caso não acolhidos os pedidos 'a' e 'b' que seja admitido, conhecido e provido o presente Recurso de Apelação para reformar completamente a r. sentença apelada, julgando IMPROCEDENTE a ação de manutenção de posse, do caminho de acesso à casa de Valdir até a BR470 que os autores nunca tiveram posse só detenção. d) Que sejam condenados os autores ora apelados nas penas máximas de litigância de má-fé, e invertido as condenações sucumbenciais." (fls. 288-289).

Foram apresentadas contrarrazões às fls. 293-298, sendo arguindo, em preliminar, a ocorrência de ofensa ao princípio da dialeticidade. No mérito, defenderam a manutenção da sentença de procedência.

Este é o relatório.

VOTO

Considerando que a decisão recorrida foi publicada já na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (27-10-2016; fl. 262), convém anotar que o caso será analisado sob o regramento da novel codificação, em consonância ao Enunciado Administrativo n. 3 do Superior Tribunal de Justiça.

Contrarrazões- Admissibilidade do Apelo

Apontaram os Apelados em contrarrazões que o apelo não merecia ser conhecido por ofensa ao princípio da dialeticidade.

Todavia, melhor sorte não lhe assiste.

Como é cediço, os recursos devem necessariamente ser dialéticos a fim de explicitarem os fundamentos sobre os quais os Apelantes fundamentam a reforma do decisum objurgado.

In casu, da detida análise da Apelação Cível interposta pelos Requeridos denota-se que expôs as razões de sua insurgência, rebatendo os argumentos da sentença, motivo pelo qual deve ser afastada a preliminar aventada pelo recorrido de ofensa ao princípio da dialeticidade.

Isso dito, presentes os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade recursal do apelo interposto pelos Réus, o reclamo merece ser conhecido.



Da preliminar de cerceamento de defesa

Argumentam os Apelantes que a sentença seria nula, por cerceamento de defesa, pois o magistrado singular sonegou o direito à prova testemunhal, a prova pericial, a inspeção judicial, a ouvida dos Autores para depois dizer que os Réus não comprovaram a alegação da inexistência de servidão de passagem sobre a estrada que conduz ao domicílio do requerido Valdir Odelli.

No entanto, a pretensão não merece acolhida.

É cediço que o ordenamento processual confere ao julgador a qualidade de destinatário da prova, cumprindo ao magistrado o indeferimento das diligências desnecessárias à composição da controvérsia, em observância ao princípio do livre convencimento motivado, previsto atualmente nos arts. 370 e 371 CPC/2015:

Art. 370. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito.Parágrafo único. O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente protelatórias.

Art. 371. O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito...

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