Acórdão Nº 0002158-21.2015.8.24.0014 do Quinta Câmara Criminal, 14-07-2022

Número do processo0002158-21.2015.8.24.0014
Data14 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0002158-21.2015.8.24.0014/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ CESAR SCHWEITZER

APELANTE: GERSON GURSKE (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

A representante do Ministério Público do Estado de Santa Catarina com atuação perante o Juízo de Direito da Vara Criminal da comarca de Campos Novos ofereceu denúncia em face de Gerson Gurske, dando-o como incurso nas sanções dos arts. 302, caput, e 303, caput, ambos da Lei 9.503/1997, na forma do art. 69, caput, do Código Penal, pela prática dos fatos delituosos assim narrados:

No dia 04 de novembro de 2014, por volta das 04h30min., o denunciado Gerson Gurske conduzia o veículo GM/Astra Sedan, placas HOI-1745, pela BR-282, KM 358, neste Município de Campos Novos/SC, oportunidade em que invadiu a pista contraria, vindo a colidir contra o automóvel GM/Celta, placas MIV-0378, o qual era conduzido na oportunidade por André Valdecir Carvalho Nunes e possuía como passageiros Cledir da Silva e Keli Regina Vieira Assunção.Foi assim que o denunciado praticou homicídio culposo na direção de veículo automotor contra a vítima Cledir da Silva, que veio a óbito em decorrência do acidente por conta de parada cárdio respiratória, femorragia interna torácica e choque hipovolêmico, causados por energia de ordem mecânica (laudo cadavérico de fls. 22-26).Com sua atitude, o denunciado deixou de observar o dever de cuidado objetivo, agindo imprudentemente e sem a cautela necessária no trânsito, trafegando de forma temerosa, invadindo a pista contrária e dando ensejo a acidente automobilístico, causando a morte da vítima acima mencionada.Ressalta-se que André Valdecir Carvalho Nunes e Keli Regina Vieira Assunção sofreram lesões corporais por ocasião do mesmo acidente, conforme registros médicos de fls. 65/69, e representaram o denunciado criminalmente (fls. 32 e 39) (sic, fls. 1 do evento 20.1 da ação penal).

Encerrada a instrução, o Magistrado a quo julgou procedente o pedido formulado na inicial acusatória para condená-lo às penas de dois anos, quatro meses e vinte e quatro dias de detenção, a ser resgatada em regime inicialmente aberto, porém substituída por duas restritivas de direitos, consistentes em prestações pecuniária e de serviços à comunidade, e suspensão da habilitação para dirigir veículo automotor pelo período de um ano e dois meses, por infração ao preceito dos arts. 302, caput, e 303, caput, ambos do Código de Trânsito Brasileiro, na forma do art. 70, caput, do Estatuto Repressivo, além do pagamento de indenização mínima no importe de R$ 10.000,00 à vítima André Valdecir Carvalho Nunes e R$ 15.000,00 à ofendida Kelli Regina Vieira Assunção, a título de reparação dos danos causados, nos termos do art. 387, IV, do CPP.

Inconformado, interpôs o réu recurso de apelação, objetivando sua absolvição ao argumento de que não agiu com culpa no acidente, o qual ocorreu enquanto seguia uma ambulância que transportava sua esposa e filha. Subsidiriamente, requer o afastamento da reprimenda acessória e a redução dos valores determinados a título de indenização às vítimas.

Em suas contrarrazões, o Promotor de Justiça oficiante pugna pela preservação da decisão vergastada.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio de parecer da lavra do eminente Procurador de Justiça Carlos Henrique Fernandes, opinou pelo conhecimento e desprovimento do reclamo.

É o relatório.

VOTO

Presentes os respectivos pressupostos de admissibilidade, conhece-se da irresignação e passa-se à análise do seu objeto.

De plano, constata-se a existência de matéria prejudicial de mérito no tocante ao crime descrito no art. 303, caput, da Lei 9.503/1997, praticado contra as vítimas André Valdeci Carvalho Nunes e Kelli Regina Vieira, consistente na extinção da punibilidade devido ao advento da prescrição da pretensão punitiva do Estado, na modalidade retroativa.

E, por se tratar de questão de ordem pública, possível seu conhecimento a qualquer tempo e grau de jurisdição, nos termos do art. 61, caput, do Código de Processo Penal.

Sobre o tema, colhe-se da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

[...]2. De acordo com a jurisprudência desta Corte, "a ocorrência da extinção da punibilidade em virtude da prescrição da pretensão punitiva estatal constitui matéria de ordem pública, que pode ser conhecida de ofício, em qualquer grau de jurisdição, nos termos do art. 61 do CPP" (AgRg no AREsp n. 1.504.204/CE, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 22/10/2019, DJe 30/10/2019). [...] (EDcl nos EDcl no AgRg no AREsp 1.100.946/SP, rel. Min. Antônio Saldanha Palheiro, j. 1º-12-2020).

Dispõe o art. 110, § 1º, do Decreto-lei 2.848/1940 que, após a condenação com trânsito em julgado para a acusação, a prescrição regula-se pela pena aplicada, in casu, seis meses de detenção, tal como estabelecida na sentença. Para essa reprimenda, operar-se-á em três anos, de acordo com o respectivo art. 109, VI.

Em atenção aos marcos interruptivos do art. 117 da Norma Substantiva Penal, observa-se que o recebimento da denúncia ocorreu em 21-9-2017 (evento 23.84) e a sentença condenatória foi publicada em 13-8-2021 (evento 209.1), portanto transcorreu tempo suficiente para determinar a extinção da sua punibilidade.

Em conjuntura semelhante, julgado deste Órgão Fracionário:

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES DE TRÂNSITO E CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE (ART. 306, § 1º, INCISO II, DA LEI Nº 9.503/1997). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DEFENSIVO. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO COM BASE NA TESE DE AUSÊNCIA DE PROVA VÁLIDA DA EMBRIAGUEZ. VERIFICADA, DE OFÍCIO, PREJUDICIAL DE MÉRITO. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA, NA FORMA RETROATIVA. INTELIGÊNCIA DOS ART. 110, § 1º, C/C 109, INCISO VI, E 107, INCISO IV, TODOS DO CÓDIGO PENAL. DECURSO DE LAPSO TEMPORAL SUPERIOR A 3 (TRÊS) ANOS ENTRE O RECEBIMENTO DA DENÚNCIA E A PUBLICAÇÃO DA SENTENÇA CONDENATÓRIA RECORRÍVEL, MESMO DESCONTANDO-SE O PERÍODO EM QUE A AÇÃO FICOU SUSPENSA EM DECORRÊNCIA DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO QUE SE IMPÕE, COM A EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE NOS TERMOS DOS ARTIGOS 110, § 1º, C/C 109, INCISO VI, E 107, INCISO IV, TODOS DO CÓDIGO PENAL. PREJUDICADA A ANÁLISE DA TESE ABSOLUTÓRIA (Apelação Criminal n. 0000446-05.2016.8.24.0032, de Itaiópolis, rel. Des. Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt Schaefer, j. 3-2-2022).

Portanto, é de ser reconhecida ex officio a prescrição da pretensão punitiva estatal em relação ao respectivo injusto, nos termos dos arts. 107, IV, 109, VI, 110, § 1º, 117, I e IV, todos do Código Penal, e art. 61, caput, do Códex Instrumental.

Por conseguinte, extrai-se da jurisprudência que, operada a prescrição, resta prejudicada a análise da questão de mérito, uma vez que ausente o interesse recursal, nos termos do disposto no art. 577, parágrafo único, do Código de Processo Penal.

Nesse diapasão, mutatis mutandis:

PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO. ART. 25 DA LEI N. 7.492/86. GESTÃO FRAUDULENTA E GESTÃO TEMERÁRIA. GERENTES DE AGÊNCIA BANCÁRIA. SUJEITO ATIVO. POSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE PODER DE GESTÃO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. ABSOLVIÇÃO PELA PRÁTICA DO DELITO...

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