Acórdão Nº 0002199-37.2020.8.24.0038 do Segunda Câmara Criminal, 03-11-2020

Número do processo0002199-37.2020.8.24.0038
Data03 Novembro 2020
Tribunal de OrigemJoinville
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão


Agravo de Execução Penal n. 0002199-37.2020.8.24.0038, de Joinville

Relator: Des. Sérgio Rizelo

RECURSO DE AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL. DECISÃO QUE RECONHECE FALTAS GRAVES, DECRETA A REGRESSÃO DE REGIME, REVOGA DIAS REMIDOS E ALTERA A DATA-BASE E QUE NÃO RECONHECE FALTA GRAVE. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

1. FALTA GRAVE. FUGA (LEP, ART. 50, II). NÃO RETORNO DE SAÍDA TEMPORÁRIA. REGRESSO ESPONTÂNEO. DIA SEGUINTE. JUSTIFICATIVA. 2. REVOGAÇÃO DOS DIAS REMIDOS. FRAÇÃO. QUANTUM (LEP, ARTS. 57, CAPUT, E 127). 2.1. NOVO DELITO. NATUREZA. TEMPO DE PENA. PESSOA DO FALTOSO. 2.3. FUGA. DURAÇÃO. RECAPTURA POR AÇÃO POLICIAL. FALTAS ANTERIORES.

1. O não retorno de saída temporária no prazo marcado configura evasão, não podendo ser aceita a justificativa do apenado, mesmo que tenha regressado voluntariamente no dia seguinte ao término da saída, no sentido de que assim agiu porque estava decretado (sentenciado com morte) por facção criminosa da qual fazia parte, uma vez que poderia ter procurado a autoridade prisional ou policial para resolver essa questão, que, vê-se, não o impediu de voltar, de modo que deveria ter regressado no dia estipulado.

2.1. A prática de novo fato definido como crime doloso por apenado que se encontra cumprindo pena há cerca de 9 anos e que anteriormente havia cometido três infrações disciplinares graves justifica a imposição da fração máxima de 1/3 para a revogação dos dias remidos; requerida em recurso ministerial a perda de 1/4, limita-se o decote a esse montante.

2.2. É justa a aplicação da fração máxima de 1/3 para revogação dos dias remidos em desfavor daquele que passa cerca de seis meses foragido e somente é recapturado em razão de prisão em flagrante, além de ter praticado infração da mesma natureza anteriormente.

RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Execução Penal n. 0002199-37.2020.8.24.0038, da Comarca de Joinville (3ª Vara Criminal), em que é Agravante o Ministério Público do Estado de Santa Catarina e Agravado Luiz Rodrigo da Silva:

A Segunda Câmara Criminal decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Excelentíssimos Desembargadores Norival Acácio Engel (Presidente) e Hildemar Meneguzzi de Carvalho.

Florianópolis, 3 de novembro de 2020.







Sérgio Rizelo

RELATOR


RELATÓRIO

Trata-se de recurso de agravo de execução penal intentado pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina, não conformado com o teor da decisão proferida no PEP 0017615-26.2012.8.24.0038, por meio da qual o Juízo da 3ª Vara Criminal da Comarca de Joinville reconheceu a prática de duas faltas graves praticadas por Luiz Rodrigo da Silva, decretou a regressão do regime prisional do semiaberto para o fechado e revogou 11% dos dias remidos, bem como não reconheceu uma terceira falta grave (fls. 23-26).

Alega o Agravante, quanto às faltas graves reconhecidas, consistentes em prática de fato previsto como crime doloso no dia 27.4.20 e fuga em 11.10.19, que devem ser revogados, respectivamente, 1/4 e 1/3 dos dias remidos, tendo em vista as circunstâncias do art. 57 da Lei de Execução Penal.

Aponta, quanto ao "não reconhecimento da falta grave consistente na evasão ocorrida" em 21.6.19, que não deve ser acolhida a justificativa do Agravado, pois "os argumentos por ele arguidos [...] não são aptos a afastar a falta grave cometida, razão pela qual ela deve ser reconhecida e, consequentemente, aplicadas as penalidades legais dela decorrentes".

Sob tais argumentos, requer a reforma da decisão resistida para que seja decretada "a perda dos dias remidos na fração de 1/4 para a falta grave consistente no cometimento de novo crime no curso da execução penal", e "na fração máxima de 1/3 para a falta grave consistente na evasão ocorrida em 11-10-2019", bem como seja reconhecida "a prática da falta grave consistente na evasão ocorrida em 21-6-2019 [...] e suas consequências legais, com a manutenção do regime fechado e a perda dos dias remidos na fração máxima de 1/3" (fls. 1-6).

Luiz Rodrigo da Silva ofereceu contrarrazões pelo conhecimento e desprovimento do reclamo (fls. 33-36).

O Doutor Juiz de Direito manteve a decisão resistida (fl. 37).

A Procuradoria de Justiça Criminal, em parecer lavrado pelo Excelentíssimo Procurador de Justiça Luiz Ricardo Pereira Cavalcanti, posicionou-se pelo conhecimento e provimento do agravo (fls. 43-49).

Este é o relatório.


VOTO

O recurso preenche os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, razão pela qual deve ser conhecido.

1. O Agravado Luiz Rodrigo da Silva, em 6.6.19, progrediu ao regime aberto e foi autorizado a usufruir de saídas temporárias (fls. 555-560 do PEP).

No dia 21.6.19, não retornou da saída temporária, apresentando-se espontaneamente no dia seguinte (fl. 587 do PEP).

O Juízo da Execução Penal requereu a remessa de Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD) (fl. 596 do PEP), mas a realização não foi possível porque o Agravado evadiu-se novamente em 11.10.19 (fl. 618 do PEP).

Sobreveio a informação de que ele foi preso em flagrante e a prisão convertida em preventiva (fl. 629). Por este último fato, ocorrido em 27.4.20, em sentença do dia 18.9.20, Luiz Rodrigo da Silva foi condenado à pena de 5 anos e 10 meses de reclusão, 8 meses e 26 dias de detenção e 16 dias-multa, por infração aos arts. 16, § 1º, IV, da Lei 10.826/03, 307 e 329, caput, estes do Código Penal. O feito aguarda julgamento do recurso de apelação da Defesa (fls. 784-793 do PEP e autos 5015147-23.2020.8.24.0038 do eproc).

Portanto, em resumo, Luiz Rodrigo da Silva fugiu no dia 21.6.19, retornando espontaneamente em 22.6.19, fugiu novamente em 11.10.19 e retornou por conta de prisão em flagrante no dia 27.4.20. Em tese, assim, praticou três faltas graves, duas fugas e um fato previsto como crime doloso.

Na audiência judicial de justificação, Luiz Rodrigo da Silva assim explicou os fatos:

O primeiro dia que eu voltei depois, estou atualmente morando no bairro Profipo, eu já fui ex-faccionário, fui ex-PGC no caso, hoje em dia eu me encontro decretado, e a rapaziada lá ficou sabendo da minha saída temporária, tudo ali né; e não cometi mais crimes nada e até esse novo crime aí mais para frente vou poder estar falando quem sabe; eles ficaram sabendo do meu retorno ali e me ameaçaram, falaram que iam tá me pegando ali quando eu estivesse voltando ali; então por medo ali eu deixei para voltar no outro dia; eu não relatei nada porque não foi me pedido nenhuma justificativa no dia que eu voltei; a segunda evasão, eu sou decretado pela facção ali; eu sou usuário de drogas, fui usuário de drogas. no caso, dependente químico; contraí uma dívida no semiaberto da PIJ, uma dívida meio alta e daí sem ter dinheiro para pagar alo, não tinha como pagar, eu fiquei com medo de voltar e ser cobrado de alguma coisa né; já passei em várias cadeias e eu já vi o que acontece para quem não paga as dívidas [...] a primeira não retornei porque estava decretado, tem horário marcado, sai e volta todo mundo junto, se encontra ali na frente; no não retorno de outubro e iria para a mesma cela, porque eu estou no semiaberto (mídia da fl. 720 do PEP).

Com relação à primeira fuga, o Magistrado de Primeiro Grau acolheu a justificativa do Agravado e não reconheceu a falta grave sob o seguinte fundamento:

Pois bem, a justificativa apresentada pelo apenado é apta a afastar a falta grave.

Isto porque, além de ser notório a presença de facções criminosas no sistema prisional catarinense, sendo plausível o relato do apenado, este apresentou-se voluntariamente no dia imediatamente seguinte ao previsto para retorno. Ou seja, não teve intenção de evadir-se, mostrando-se desproporcional aplicar falta grave ao caso em tela (fl. 747 do PEP).

Com a devida vênia, a decisão deve ser reformada.

Primeiramente, a motivação para o não reconhecimento da primeira fuga é contraditória com aquela que foi utilizada para o reconhecimento da segunda:

Pois bem, a justificativa apresentada pelo apenado não é apta a afastar a falta grave, isto porque, muito embora relate que tenha tido medo de retornar em razão de dívidas contraídas dentro do sistema prisional, a partir do momento em que se sentisse ameaçado, deveria ter procurado a administração prisional para que esta pudesse promover sua relocação, a fim de resguardar sua integridade. Não o fez.

Assim, a partir do momento em que o apenado tinha conhecimento que deveria retornar após o término dos 7 dias de saída temporária e deixou de regressar, optando pela evasão, este passou a estar em débito com o Poder Judiciário no cumprimento da pena, razão pela qual a falta deve ser reconhecida, com a aplicação dos correspondentes consectários legais (fl. 747 do PEP).

A diferença entre as situações está no tempo de fuga e na forma como deu-se o retorno ao cárcere, mas a explicação de que era decretado por facção criminosa, se não serve como desculpa para uma fuga, não serve para a outra.

Aliás, mesmo quanto à primeira evasão a justificativa não faz muito sentido, porque, se havia realmente um temor à vida, não se compreende a razão de o Agravado ter deixado de retornar da saída temporária no dia certo, mas tê-lo feito no dia seguinte.

Qualquer preso que se sinta ameaçado deve procurar a administração prisional, e não fugir do cumprimento da pena para resolver os seus problemas.

Em votos da minha lavra, esta Segunda Câmara Criminal já deixou de reconhecer a falta grave do art. 50, II, da Lei de Execução Penal quando o apenado atrasou-se por algumas horas e apresentou...

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