Acórdão Nº 0002239-47.2018.8.24.0019 do Quarta Câmara Criminal, 21-01-2021

Número do processo0002239-47.2018.8.24.0019
Data21 Janeiro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 0002239-47.2018.8.24.0019/SC



RELATOR: Desembargador SIDNEY ELOY DALABRIDA


APELANTE: VITORIO MARQUEVISKI (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Na comarca de Concórdia, o órgão do Ministério Público ofereceu denúncia em face de Vitório Marqueviski, imputando-lhe a prática dos delitos capitulados nos arts. 306, caput, e § 1º, e no art. 307, caput, ambos da Lei n. 9.503/97, pois, segundo consta na inicial (Evento 15, PET34, fls. 2-3):
No dia 11 de maio de 2018, por volta das 16h35min, na rua Tancredo Neves, bairro São Cristóvão, Município de Concórdia/SC, o denunciado, Vitório Marqueviski, conduziu, em via pública, veículo automotor com a capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool, conforme constatado pelo teste do etilômetro (fl. 05), que indicou a presença de 0,77 miligramas de álcool por litro de ar expelido pelos pulmões (valor considerado 0,70 mg/L - Resolução CONTRAN 432/2013).
Como se não bastasse, o denunciado conduziu seu veículo pelo endereço acima mencionado, violando a suspensão de dirigir veículo automotor que lhe havia sido imposta a partir de 12.03.2018, com validade até o dia 11.05.2018, como condição da suspensão condicional do processo ofertada por ofensa ao mesmo dispositivo legal aqui denunciado (fl. 7).
Finalizada a instrução, o Magistrado a quo julgou procedente o pedido formulado na denúncia, para condenar o réu ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 7 (sete) meses de detenção, em regime inicial aberto, substituída por uma medida restritiva de direitos, consistente em prestação pecuniária, na importância de 2 (dois) salários mínimos, bem como ao pagamento de 11 (onze) dias -multa, no valor unitário mínimo legal, além da suspensão da habilitação para dirigir pelo prazo de 2 (dois) meses e 10 (dez) dias, por infração aos arts. 306, caput e § 1º, I, e 307, caput, ambos da Lei n. 9.503/97, na forma do art. 70 do Código Penal (Evento 67, SENT102, fls. 1-8).
Inconformado com a prestação jurisdicional, o acusado, por intermédio da Defensoria Pública, interpôs apelação criminal, mediante a qual pugnou pela absolvição quanto ao delito descrito no art. 307, caput, da Lei n. 9.503/97, diante da aplicação do princípio da consunção (Evento 94, APELAÇÃO127, fls. 1-6).
Apresentadas as contrarrazões (Evento 98, PET131, fls. 1-5), a douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio do Exmo. Dr. Pedro Sérgio Steil, manifestou-se pela conversão do julgamento em diligência, para que seja oportunizado o oferecimento do acordo de não persecução penal (Evento 12, PROMOÇÃO1, fls. 1-8)

VOTO


1 Da preliminar suscitada pela Procuradoria-Geral de Justiça
O douto Procurador de Justiça opinou pela conversão do julgamento em diligência para que seja oportunizado ao Parquet de Primeiro Grau a análise acerca da possibilidade de propor ao recorrente acordo de não persecução penal, nos termos do art. 28-A do CPP.
Ab initio, importante destacar que o acusado não preenche o requisito descrito no art. 28-A, § 2º, III, do Código de Processo Penal, para a obtenção da benesse, pois, segundo consta na exordial, fora beneficiado, em 1º/3/2018, ou seja, dentro dos 5 (cinco) anos anteriores ao cometimento do delito ora discutido, com a suspensão condicional do processo (art. 89, caput, da Lei n. 9.099/95).
Contudo, ainda que assim não fosse, após a prolação da sentença não há como aplicar o instituto da não-persecução penal, sob pena de restar comprometida a própria finalidade para a qual o modelo negocial de justiça foi concebido.
Apesar do conteúdo híbrido das normas que consagram o novo fenômeno, a sua retroatividade após o esgotamento da jurisdição em primeiro grau encontra-se em total desalinho com os fatores que renderam ensejo à sua instituição, que foi justamente a possibilidade de resolução célere dos casos de reduzido potencial ofensivo.
É que, uma vez proferida a decisão e interposto o recurso, é evidente que a sua aplicação produzirá efeito totalmente inverso ao aspirado, subvertendo-se assim totalmente o sentido teleológico do novo instituto.
Compreenda-se que, nessas circunstâncias, o retorno dos autos à primeira instância para fins de proposição ao acusado do acordo de não persecução penal fará com que a solução definitiva do caso concreto se arraste por significativo período de tempo, uma vez que, em sendo aceito, neste caso pelo denunciado e não pelo investigado, como menciona expressamente a lei, demandará a fluência de todo o prazo para cumprimento das condições ajustadas, ligado que está à pena cominada ao delito.
Logo, fácil é perceber que a operação que se pretende em nome da retroatividade das normas mistas está completamente apartada das premissas que determinaram a criação do novo instituto.
O Superior Tribunal de Justiça já se pronunciou a respeito:
HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. VIA INADEQUADA. NÃO CONHECIMENTO. TRÁFICO DE DROGAS. APLICAÇÃO DO ART. 28-A DO CPP. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL (ANPP). DENÚNCIA JÁ RECEBIDA. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES DESTA 5ª TURMA E DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.
[...]
2. A Lei n. 13.964/2019 (comumente denominada como "Pacote Anticrime"), ao criar o art. 28-A do Código de Processo Penal, estabeleceu a previsão no ordenamento jurídico pátrio do instituto do acordo de não persecução penal (ANPP).
3. O acordo de não persecução penal (ANPP) aplica-se a fatos ocorridos antes da Lei nº 13.964/2019, desde que não recebida a denúncia. (HC-191.464/STF, 1ª TURMA, Rel. Ministro GILMAR MENDES, DJe de 12/11/2020). No mesmo sentido: (EDcl no AgRg no AgRg no AREsp 1635787/SP, Relator Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, Quinta Turma, DJe 13/8/2020 e Petição no AREsp 1.668.089/SP, da Relator Ministro FELIX FISCHER, DJe de 29/6/2020).
4. No caso dos autos, a discussão acerca da aplicação do acordo de não persecução penal (art. 28-A do CPP) só ocorreu em sede de apelação criminal e no momento do recebimento da denúncia não estava em vigência a Lei nº 13.964/2019, o que impede a incidência do instituto.
5. Habeas corpus não conhecido (HC 607.003/SC, Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, j. em 24/11/2020, DJe de 27/11/2020 - grifou-se).
Assim tem decidido este órgão fracionário:
APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME PREVISTO NO ESTATUTO DO IDOSO. APROPRIAÇÃO DE RENDIMENTOS DESVIADOS EM BENEFÍCIO PRÓPRIO (ART. 102 DA LEI N. 10.741/2003). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA.
ABSOLVIÇÃO. ALEGAÇÃO DE QUE A VÍTIMA, EM PLENO GOZO DE SUAS FACULDADES MENTAIS, AUTORIZOU AS OPERAÇÕES BANCÁRIAS REALIZADAS E QUE OS VALORES FORAM APLICADOS EM BENEFÍCIO DA GENITORA. NÃO ACOLHIMENTO. CONJUNTO PROBATÓRIO ROBUSTO NO SENTIDO DE QUE A OFENDIDA POSSUÍA SAÚDE DEBILITADA E, POUCO TEMPO DEPOIS, FOI DIAGNOSTICADA COM DOENÇA DE ALZHEIMER. REALIZAÇÃO DE TRANSFERÊNCIAS DE ELEVADO VALOR PARA CONTA DE TITULARIDADE DA APELANTE E DE ASSOCIAÇÃO DA QUAL PARTICIPAVA. APROPRIAÇÃO DE VALORES PERTENCES À IDOSA E DESVIO DE SUA FINALIDADE PLENAMENTE CONFIGURADO. CONDENAÇÃO MANTIDA.
[...]
PEDIDO DE RETORNO DOS AUTOS PARA FINS DE APLICAÇÃO DO INSTITUTO DA NÃO PERSECUÇÃO PENAL. SENTENÇA CONDENATÓRIA. PROCESSO EM GRAU RECURSAL. DESCABIMENTO.
Uma vez prolatada a sentença, estando o processo na instância superior, é incabível a aplicação do instituto da não persecução penal, sob pena de restar comprometida a própria finalidade para a qual o modelo de justiça negocial foi concebido.
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