Acórdão nº 0002278-12.2011.8.11.0032 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, 25-04-2023

Data de Julgamento25 Abril 2023
Case OutcomeNão-Provimento
Classe processualCível - APELAÇÃO CÍVEL - CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Público e Coletivo
Número do processo0002278-12.2011.8.11.0032
AssuntoObrigação de Fazer / Não Fazer

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO

SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO


Número Único: 0002278-12.2011.8.11.0032
Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198)
Assunto: [Efeitos, Obrigação de Fazer / Não Fazer, Sistema Remuneratório e Benefícios, Contrato Temporário de Mão de Obra L 8.745/1993]
Relator: Des(a).
MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO


Turma Julgadora: [DES(A). MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, DES(A). LUIZ CARLOS DA COSTA, DES(A). MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA]

Parte(s):
[MUNICIPIO DE JANGADA - CNPJ: 24.772.147/0001-68 (APELANTE), MUNICIPIO DE JANGADA - CNPJ: 24.772.147/0001-68 (REPRESENTANTE), ALUISIO CLAUDIO VIEIRA DOS ANJOS - CPF: 378.717.811-20 (APELADO), MONICA HELENA GIRALDELLI DERZE - CPF: 933.714.701-72 (ADVOGADO), EDMILSON VASCONCELOS DE MORAES - CPF: 690.343.541-72 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)]


A C Ó R D Ã O


Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: A UNANIMIDADE, NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO.

EMENTA:


APELAÇÃO CÍVEL – RECLAMAÇÃO TRABALHISTA – PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO BIENAL – AFASTADA – CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA – RENOVAÇÕES SUCESSIVAS – VIOLAÇÃO DAS HIPÓTESES PREVISTAS NO ARTIGO 37, § 2°, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E NO ARTIGO 2°, DA LEI MUNICIPAL N° 90/1992 – NULIDADE DA CONTRATAÇÃO RECONHECIDA – FÉRIAS ACRESCIDAS DO TERÇO CONSTITUCIONAL E DÉCIMO TERCEIRO SALÁRIO – TEMA 551 DO STF (RE N.° 1.066.677) – RECOLHIMENTO DO FGTS – ARTIGO 19-A, DA LEI N.° 8.036/1990 – TEMA N.° 916, DO STF (RE 765.320) – CABIMENTO – REPERCUSSÃO GERAL – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO NÃO PROVIDO.

1. Os contratos regidos pelo regime jurídico-administrativo não estão sujeitos à prescrição bienal, prevista no artigo 7°, inciso XXIX, da Constituição da República, pois se submetem às disposições do Decreto-Lei n.° 20.910/32.

2. As sucessivas pactuações indicam desvirtuamento da finalidade do contrato de trabalho temporário, evidenciando que a contratação do servidor visou a suprir necessidade de mão de obra habitual e não eventual, desrespeitando a norma constitucional acerca do preenchimento dos cargos públicos mediante concurso público, o que torna tais instrumentos nulos.

3. Consoante a tese firmada pelo Supremo Tribunal Federal, no RE n.° 765.320 (Tema n.° 916), nos casos em que há evidente desvirtuamento da contratação temporária pela Administração Pública, em razão de sucessivas e reiteradas renovações e/ou prorrogações, o servidor faz jus ao recebimento de todos os salários do período trabalhado e ao levantamento do FGTS.

4. No Julgamento do RE n.° 1.066.677 (Tema 551), o Supremo Tribunal Federal firmou a tese no sentido de que o servidor temporário, comprovado o desvirtuamento da contratação temporária pela Administração Pública, em razão de sucessivas e reiteradas renovações ou prorrogações, faz jus ao 13º (décimo terceiro salário) e férias remuneradas, acrescidas do terço constitucional.

5. Assim, o servidor indicado na inicial faz jus ao recebimento dos salários do período trabalhado, ao levantamento do FGTS referente a este período - Tema n.° 916, do STF, bem como ao recebimento do 13º (décimo terceiro) salário e férias remuneradas acrescidas de 1/3 (um terço) - Tema n.° 551, do STF.

RELATÓRIO:


Egrégia Câmara:


Trata-se de RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL, interposto por MUNICÍPIO DE JANGADA, MT, contra a sentença proferida pelo Excelentíssimo Juiz de Direito, Dr. Diego Hartmann, nos autos de n.° 0002278-12.2011.811.0032, em trâmite perante a Vara Única de Rosário Oeste, MT, que julgou parcialmente procedentes os pedidos, nos seguintes termos (ID. 153376080):

“Trata-se de Reclamatória Trabalhista proposta por Aluísio Cláudio Vieira dos Anjos em face do Município de Jangada/MT, todos devidamente qualificados.

Narra a inicial que o autor prestou serviços ao requerido por meio de contrato de trabalho temporário, exercendo a função de odontólogo, entre o período de 01.01.2002 a 31.12.2008, mediante jornada de trabalho que durava das 07h:00min às 11h:00min e das 13h:00min às 17h:00min, e remuneração no montante de R$ 2.550,00 (dois mil quinhentos e cinquenta reais).

Aduz que durante o período descrito jamais recebeu férias, 1/3 de férias, 13° salário, horas-extras, adicional de insalubridade, FGTS, dentre outras verbas constitucionalmente previstas, razão pela qual busca a condenação o requerido ao pagamento de R$ 23.990,40 (vinte e três mil, novecentos e noventa reais e quarenta centavos), a título de verbas atrasadas.

A ação foi inicialmente proposta perante a Justiça do Trabalho de Cuiabá, sendo declinada a competência para o Juizado da Fazenda Pública de Cuiabá que também julgou-se incompetente para processar e julgar o feito, vindo os autos em remessa para este juízo.

Nesse interim, o requerido foi citado e apresentou contestação (fls. 79/86-id. 65409723), arguindo preliminar de inépcia da inicial e, no mérito, pugnando pela improcedência dos pedidos iniciais.

Em decisão de fls. 127/128-id. 65409723, o feito foi saneado, sendo afastada a preliminar e fixados os pontos controvertidos.

O requerente pugnou pelo julgamento antecipado da lide (fls. 144-id. 65409723).

Brevemente relatado. Decido.

Inicialmente, verifico que a matéria discutida é unicamente de direito, não demandando, portanto, maior dilação probatória. Por isso, trata-se de hipótese de julgamento antecipado da lide (art. 355, I do CPC).

Observo, desde já, que se encontram prescritas as parcelas devidas anteriores a cinco anos contados do ajuizamento da ação, pois, tratando-se de relação jurídica de caráter continuado, não há falar em prescrição do fundo de direito, devendo-se aplicar a Súmula 85 do STJ, segundo a qual a prescrição atinge apenas as parcelas anteriores ao quinquênio que antecede o pedido.

A parte autora narra que foi admitida pela municipalidade de Rosário Oeste, por meio de contrato de trabalho temporário, para prestar serviços como “Odontólogo”, sob o regime de contratação por tempo determinado para atender necessidade temporária e emergencial de excepcional interesse público (art. 37, IX, da CF/88), a contar da data de 01.01.2002 a 31.12.2008.

Não obstante as alegações, não fez prova da contratação pelo período integralmente alegado, posto que somente foram comprovados por meio de recibo de pagamento os períodos de contratação de dezembro de 2003; dezembro de 2002; maio de 2004; agosto de 2005 e fevereiro de 2005. Igualmente, por meio de contratos de trabalhos juntados comprovou que a contratação ocorreu somente nos períodos de 02.09.2002 a 31.12.2002; de 02.01.2003 a 31.12.2003; de 02.01.2004 a 31.12.2004; de 03.01.2005 a 31.12.2005; de 02.01.2006 a 31.12.2006; de 01.01.2007 a 31.12.2007; de 01.01.2008 a 31.12.2008.

O Município, por sua vez, admitiu a contratação temporária de maneira sucessiva no período comprovado, contudo, alegou que os direitos sociais foram assegurados e devidamente pagos à parte autora.

É de clareza solar a inaplicabilidade dos institutos da Consolidação das Leis do Trabalho ao caso dos autos. O vínculo entre a parte autora e a requerida jamais teve natureza de emprego público, mas sim regime jurídico-administrativo, cuja regulamentação se dá por lei própria de cada ente público, assegurando-se os direitos previstos na Constituição Federal, em seu art. 7º.

Com efeito, o regime da contratação temporária tem previsão no artigo 37, IX, da Constituição Federal:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

IX - a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público;

Exige a norma constitucional dois requisitos para a contratação em foco: a previsão expressa em lei e efetiva existência de interesse público e urgente necessidade.

Em sede de repercussão geral (RE nº 658.026), a Suprema Corte decidiu que para validade da contratação temporária faz-se necessário o atendimento dos seguintes requisitos: a) os casos excepcionais estejam previstos em lei; b) o prazo de contratação seja predeterminado; c) a necessidade seja temporária; d) o interesse público seja excepcional; e) a necessidade de contratação seja indispensável.

A fim de regulamentar o tema, foi promulgada a Lei n° 546/2011, que autoriza a contratação de pessoal por tempo determinado e dá outras providências e prevê em seu art. 4°, que a duração das contratações temporárias deveriam obedecer o interregno de 12 meses, prorrogável por igual período. Todavia, a norma não se aplica à relação firmada entre as partes, haja vista que o fim dos serviços prestados supostamente ocorreu em 31.12.2008.

A norma sobre a qual o Município se apoia para sustentar a contratação temporária é a Lei Municipal n° 90/1992, no entanto, por não ter juntado aos autos o diploma normativo competente, inviável a interpretação das cláusulas contratuais com base na norma, o que não prejudica a análise da legalidade dos contratos.

A despeito da ausência da norma que regulamenta/autoriza a contratação temporária, com as renovações automáticas que duraram aproximadamente seis anos, a parte autora passou a exercer a função de forma duradoura, sem submeter-se a concurso público, o que descaracteriza a excepcionalidade.

As renovações sucessivas de contratos celebrados pela Administração Pública desvirtuam a natureza temporária do instituto e demonstram que a contratação visou suprir a necessidade de mão de obra habitual e não eventual, em afronta aos ditames constitucionais que dispõe acerca da necessidade de preenchimento dos cargos públicos mediante concurso público, tornando tais instrumentos nulos.

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