Acórdão Nº 0002444-92.2019.8.24.0067 do Primeira Câmara Criminal, 19-11-2020

Número do processo0002444-92.2019.8.24.0067
Data19 Novembro 2020
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0002444-92.2019.8.24.0067/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI

APELANTE: ASLAN ROMIO (RÉU) ADVOGADO: SAMIR MATTAR ASSAD (OAB PR039461) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Denúncia: o Ministério Público ofereceu denúncia em face de Aslan Romio e Cristiano Demossi, dando-os como incursos nas sanções do art. 344 do Código Penal, em razão dos seguintes fatos:

Ato I

Entre os dias 12 de fevereiro e 8 de março de 2019, no interior da Unidade Prisional Avançada de São Miguel do Oeste, neste Município e Comarca de São Miguel do Oeste/SC, o denunciado Aslan Romio, agindo em flagrante demonstração de ofensa à Administração Pública, usou de grave ameaça contra Alexandre de Melo e Lucas Braz dos Santos Luz, com o fim de favorecer interesse próprio na Ação Penal n. 0000857-35.2019.8.24.0067.

Segundo consta, o denunciado declarou no interior da Unidade Prisional, com o fim de que chegasse até o conhecimento das vítimas, que "quem quisesse fazer a cabeça de Alexandre e Lucas ganharia uma BMW ou uma Hornet".

Depreende-se dos autos que as vítimas são testemunhas na Ação Penal acima citada, deflagrada contra o denunciado, e a grave ameaça proferida teve a finalidade de influenciar no testemunho dos referidos testigos.

Ato II

Em datas e horários a serem melhor apurados durante a instrução processual, entre 4 de abril e 19 de junho de 2019, neste Município e Comarca de São Miguel do Oeste/SC, o denunciado Cristiano Demossi, agindo em flagrante demonstração de ofensa à Administração Pública, usou de grave ameaça contra Alexandre de Melo e Lucas Braz dos Santos Luz, com o fim de favorecer interesse alheio na Ação Penal n. 0000857-35.2019.8.24.0067.

Segundo consta, o denunciado encontrou-se com a vítima Alexandre de Melo em via pública, ocasião em que declarou que o denunciado Aslan ofereceu "para quem quisesse fazer a cabeça de Alexandre e Lucas, uma BMW ou uma Hornet", afirmando "vaza que os caras vão te fazer".

Depreende-se dos autos que as vítimas são testemunhas na Ação Penal acima citada, deflagrada contra o denunciado Aslan, e a grave ameaça proferida teve a finalidade de influenciar no testemunho dos referidos testigos (evento 10).

Sentença: o juiz de direito Márcio Luiz Cristofoli julgou parcialmente procedente a denúncia para:

a) condenar Aslan Romio, dando-o como incurso no art. 344 do Código Penal, à pena privativa de liberdade de 4 anos e 1 mês de reclusão, em regime fechado, e ao pagamento de 42 dias-multa, cada qual no valor de 1/20 do salário-mínimo vigente à época dos fatos.

b) condenar o réu Aslan Romio, ainda, ao pagamento de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) em favor de cada vítima, corrigido monetariamente e com incidência de juros de mora a partir do arbitramento, a título de valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração (CPP, art. 387, inciso IV) e ao pagamento das custas processuais.

c) absolver Cristiano Demossi da suposta prática do delito tipificado no art. 344 do Código Penal, forte no art. 386, inciso VII, do Código Penal. Transitada em julgado, intime-se a parte para recolhimento das custas.

[...]

Nego ao réu Aslan o direito de recorrer em liberdade; extraia-se PEC provisório. Nos termos da fundamentação desta sentença, ao defensor dativo nomeado, Dr. Ricardo José de Souza, fixo honorários em R$ 589,60 (quinhentos e oitenta e nove e sessenta centavos); requisite-se pagamento (evento 150).

Trânsito em julgado: muito embora não certificado pelo Juízo a quo, verifica-se que a sentença transitou em julgado para o Ministério Público.

Recurso de apelação de Aslan Romio: a defesa interpôs recurso de apelação, no qual sustentou que:

a) a denúncia é inepta, porque não observou os requisitos do art. 41 do CPP, com destaque para a falta de precisão quanto à data/hora do suposto delito, razão pela qual deve ser declarada a nulidade do feito;

b) não houve fundamentação idônea para manutenção da prisão preventiva por ocasião da sentença condenatória, de maneira que o agente deve ser solto, sem prejuízo da fixação de medidas cautelares diversas;

c) o suposto delito imputado ao agente ocorreu apenas uma vez, porque houve desdobramento da alegada emissão do ato coativo e a posterior "entrega do recado", inexistindo, de outra parte, base probatória suficiente de que realmente houve coação, sobretudo porque o fato em exame ocorreu após a "delação premiada" das ora vítimas que depuseram em feito distinto, sem olvidar que há dúvida acerca do real interesse buscado com os dizeres descritos na denúncia, de maneira que o agente deve ser absolvido;

d) a negativação da culpabilidade foi inidônea, porque a coação supostamente perpetrada do interior da unidade prisional não extrapola os elementos inerentes ao tipo;

e) não há prova técnica a aferir a personalidade do agente, de modo que a negativação de tal vetor deve ser afastada;

f) a negativação das circunstâncias do crime igualmente deve ser rechaçada, porque o fundamento utilizado se confunde com os elementos do próprio tipo;

g) o mero fato de a suposta vítima ter dito que iria vender sua residência em razão dos fatos não é suficiente para configurar a negativação do vetor consequências do crime;

h) com o afastamento de todos os vetores acima mencionados, a pena deve ser reduzida ao seu mínimo legal, com a fixação do regime inicial aberto;

i) a indenização a título moral não comporta fixação em crimes desta natureza, de maneira que a condenação, sob esse aspecto, deve ser reformada, sem prejuízo de, subsidiariamente, revisar o "quantum" arbitrado, porque desarrazoado e desproporcional frente à capacidade econômica do agente.

Requereu o conhecimento e provimento do recurso para declarar a nulidade do feito; subsidiariamente, reformar a sentença, nos termos da fundamentação (evento 8 destes autos).

Contrarrazões do Ministério Público: a acusação impugnou as razões recursais, ao argumento de que a peça acusatória observou os requisitos do art. 41 do CPP, permitindo o exercício do contraditório e da ampla defesa, não havendo falar em absolvição, ante a suficiência do conjunto probatório para sustentar a condenação, tampouco em redução da pena, porque bem observado o critério legal e a jurisprudência, destacando-se, ainda, a possibilidade de arbitramento de dano moral no âmbito criminal.

Postulou o conhecimento do recurso e a manutenção da sentença condenatória (evento 17).

Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça: o procurador de justiça Paulo de Tarso Brandão opinou pelo "conhecimento e parcial provimento do recurso apenas para ajustar a dosimetria, afastando os aumentos da pena arbitrados com fundamento na culpabilidade e personalidade do agente, para fixar o regime inicial semiaberto para o cumprimento da reprimenda e para conceder ao apelante o direto de recorrer em liberdade" (evento 22).

Este é o relatório que passo ao Excelentíssimo Senhor Desembargador Revisor.

Documento eletrônico assinado por CARLOS ALBERTO CIVINSKI, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 378383v5 e do código CRC 3521d262.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): CARLOS ALBERTO CIVINSKIData e Hora: 6/10/2020, às 1:6:44





Apelação Criminal Nº 0002444-92.2019.8.24.0067/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI

APELANTE: ASLAN ROMIO (RÉU) ADVOGADO: SAMIR MATTAR ASSAD (OAB PR039461) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

VOTO

Do juízo de admissibilidade

O recurso preenche os requisitos de admissibilidade, razão pela qual deve ser conhecido.

Das preliminares

Da inépcia da denúncia

Contrariamente ao que foi sustentado pela defesa, não há falar em inépcia da denúncia, sob alegação de insuficiência da descrição temporal do fato imputado, que teria causado impossibilidade de exercício da defesa.

Veja-se como a matéria foi tratada na sentença:

Verifica-se, em detida análise dos autos, que a exordial apresentada pelo Ministério Público cumpre todos os requisitos legais trazidos pelo art. 41 do Código de Processo Penal, in verbis:

Art. 41. A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.

A denúncia traz a narrativa do fato ilícito, a indicação da autoria delitiva e delimita o lapso temporal em que a crime foi cometido, sendo assegurado o acesso pleno à ampla defesa e ao contraditório, tanto que a parte, ao longo do processo, pode se contrapor aos fatos, apresentando extensos arrazoados.

De uma simples análise da denúncia oferecida às fls. 48-52 é possível extrair que o Parquet descriminou quais ameaças haviam sido proferidas pelo réu, a saber: "quem quisesse fazer a cabeça de Alexandre e Lucas ganharia uma BMW ou uma Hornet". Veja-se que não há que se falar em dados vagos, pois a acusação delimita o teor da ameaça proferida por Aslan no interior do sistema prisional. Outrossim, a ausência de indicação precisa quanto à data dos fatos não inviabiliza a compreensão da acusação, tanto é que em seu interrogatório judicial o acusado se defendeu plenamente dos fatos que lhe são imputados.

A propósito:

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE CORRUPÇÃO ATIVA (ART. 333 DO CP). SENTENÇA CONDENATÓRIA. INSURGÊNCIA DA DEFESA. PRELIMINARES. ADUZIDA NULIDADE DO FEITO PELA INOBSERVÂNCIA DAS REGRAS DE CONEXÃO. INSUBSISTÊNCIA. CISÃO DOS PROCESSOS QUE, ALÉM DE FACULTATIVA, MOSTROU-SE ADEQUADA À COLHEITA DAS PROVAS E À OBSERVÂNCIA DA RAZOÁVEL DURAÇÃO DA AÇÃO. EXEGESE DO ART. 80 DO CPP. ADEMAIS, PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO. INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO PAS DE NULLITÉ SANS GRIEF INSCULPIDO NO ART. 563 DO CPP. TESE AFASTADA. ADUZIDA INÉPCIA DA DENÚNCIA POR AUSÊNCIA DE ESPECIFICAÇÃO...

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