Acórdão Nº 0002539-94.2018.8.24.0023 do Quinta Câmara Criminal, 02-04-2020

Número do processo0002539-94.2018.8.24.0023
Data02 Abril 2020
Tribunal de OrigemCapital
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão

Apelação Criminal n. 0002539-94.2018.8.24.0023, da Capital

Relator: Des. Luiz Cesar Schweitzer

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES CONTRA A INCOLUMIDADE PÚBLICA. POSSE IRREGULAR DE ARMA DE FOGO E MUNIÇÕES DE USO PERMITIDO E DE OUTRO CARTUCHO DE UTILIZAÇÃO RESTRITA (LEI 10.826/2003, ARTS. 12 E 16, CAPUT). SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA, COM A ABSORÇÃO DO ILÍCITO POR PRIMEIRO MENCIONADO PELO REMANESCENTE. INSURGIMENTO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA.

PRETENSO AFASTAMENTO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO, COM A CONSEQUENTE CONDENAÇÃO DO RÉU POR AMBOS OS INJUSTOS. ANÁLISE PREJUDICADA. NECESSÁRIA DESCLASSIFICAÇÃO DA SEGUNDA INFRAÇÃO PARA O CRIME PREVISTO NO ART. 12 DO ESTATUTO DO DESARMAMENTO. SUPERVENIÊNCIA DO DECRETO 9.847/2019, QUE PASSOU A CONSIDERAR DE USO PERMITIDO A MUNIÇÃO DE 9 MILÍMETROS APREENDIDA NA RESIDÊNCIA DO ACUSADO. RETROATIVIDADE DA NORMA BENÉFICA. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 2º, PARÁGRAFO ÚNICO, DO DIGESTO REPRESSIVO E 5º, LX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.

PRONUNCIAMENTO REFORMADO. RECURSO PREJUDICADO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0002539-94.2018.8.24.0023, da comarca da Capital (1ª Vara Criminal), em que é apelante o Ministério Público do Estado de Santa Catarina e apelado Alexandro Santos:

A Quinta Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, desclassificar, de ofício, a conduta perpetrada pelo réu para o crime previsto no art. 12 da Lei 10.826/2003, readequando-se a correlata reprimenda para um ano e dois meses de detenção e pagamento de dez dias-multa, cada qual arbitrado no mínimo legal, mantidas as demais cominações da sentença vergastada e prejudicada a análise da matéria recursal. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado no dia 2 de abril de 2020, os Exmos. Srs. Des. Luiz Neri Oliveira de Souza e Antônio Zoldan da Veiga.

Representou o Ministério Público o Exmo. Sr. Procurador de Justiça Pedro Sérgio Steil.

Florianópolis, 3 de abril de 2020.




Luiz Cesar Schweitzer

PRESIDENTE E RELATOR


RELATÓRIO

O representante do Ministério Público do Estado de Santa Catarina com atuação perante o Juízo de Direito da 1ª Vara Criminal da comarca da Capital ofereceu denúncia em face de Alexandro Santos, dando-o como incurso nas sanções dos arts. 12 e 16, caput, ambos da Lei 10.826/2003, em concurso formal, pela prática dos fatos delituosos assim narrados:

No dia 17 de fevereiro de 2018, por volta das 19h30min, policiais militares realizavam ronda pela Estrada Anarolina Silveira Santos, bairro Vargem do Bom Jesus, comunidade 'Vila União', nesta Capital, quando avistaram o denunciado Alexandro Santos, de apelido "Leco", já conhecido da guarnição por pesar contra si mandado de prisão em aberto (fls. 33), o qual estava em atitude suspeita, tentando se evadir da guarnição.

Diante de tal fato, os policiais militares realizaram uma perseguição, ingressando na residência onde o denunciado Alexandro tentou, de forma frustrada, esconder-se, sendo que no local procederam uma busca domiciliar e lograram encontrar e apreender: 01(um) revólver, marca Taurus, numeração JI21710, calibre .38, com 05 (cinco) munições, além de outras 04 (quatro) munições, sendo 03 (três) de calibre .38 e 01 (uma) de calibre 9mm.

A arma de fogo e os projéteis, de uso permitido e restrito, o denunciado Alexandro Santos possuía e mantinha sob sua guarda, sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar (sic, fls. 64-65).

Encerrada a instrução, o Magistrado a quo julgou parcialmente procedente o pedido formulado na inicial acusatória para condená-lo às penas de três anos e seis meses de reclusão, a ser resgatada em regime inicialmente semiaberto, e pagamento de dez dias-multa, individualmente arbitrados à razão de um trigésimo do salário mínimo vigente à época do fato, por infração ao preceito do art. 16, caput, do Estatuto do Desarmamento.

Inconformado, interpôs o Promotor de Justiça oficiante recurso de apelação, objetivando a exclusão do reconhecimento de crime único, ao argumento de que deve ser aplicada a regra do concurso formal à espécie.

Seguiu-se a intimação do acusado, que ofereceu suas contrarrazões, pugnando pela manutenção da decisão profligada.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio de parecer da lavra do eminente Procurador de Justiça Rogério Antônio da Luz Bertoncini, opinou pelo conhecimento e provimento do reclamo.

Posteriormente, sobreveio petição encaminhada pela Defensoria Pública do Estado de Santa Catarina requerendo a desclassificação da conduta enquadrada no art. 16, caput, da Lei 10.826/2003, para o art. 14, caput, do referido diploma legal.

É o relatório.

VOTO

Presentes os respectivos pressupostos de admissibilidade, conhece-se da irresignação.

Todavia, constata-se ser inviável a análise do pleito recursal diante da existência de conjuntura a ser reconhecida de ofício.

Isso porque, com a edição do Decreto 9.847/2019, em vigor desde 25-6-2019, a munição de calibre 9 milímetros apreendida com o acusado passou a ser considerada de uso permitido.

Assim dispõe o respectivo art. 2º:

Para fins do disposto neste Decreto, considera-se:

I - arma de fogo de uso permitido - as armas de fogo semiautomáticas ou de repetição que sejam:

a) de porte, cujo calibre nominal, com a utilização de munição comum, não atinja, na saída do cano de prova, energia cinética superior a mil e duzentas libras-pé ou mil seiscentos e vinte joules;

b) portáteis de alma lisa; ou

c) portáteis de alma raiada, cujo calibre nominal, com a utilização de munição comum, não atinja, na saída do cano de prova, energia cinética superior a mil e duzentas libras-pé ou mil seiscentos e vinte joules;

Outrossim, o art. 2º, parágrafo único, do Código Penal, disciplina que "A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado".

Nessa toada, o art. 5º, LX, da Constituição Federal prevê que "a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu".

Dessarte, por ser mais benéfica, a mencionada espécie normativa deve retroagir e, considerando que o acusado foi preso em flagrante delito na posse do cartucho em sua residência, conforme restou amplamente demonstrado no curso da instrução processual, a desclassificação da conduta praticada para o crime previsto no art. 12 da Lei 10.826/2003 é medida que se impõe.

Outro não é o entendimento da Corte:

APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS E POSSE DE ARMA DE FOGO E MUNIÇÕES DE USO RESTRITO (ART. 33, CAPUT, DA LEI N. 11.343/06 E ART. 16, CAPUT, DA LEI N. 10.826/03). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSOS DEFENSIVOS.

[...]

SUPERVENIÊNCIA DO DECRETO-LEI N. 9.847/19. NOVATIO LEGIS IN MELLIUS. DESCLASSIFICAÇÃO PARA A CONDUTA PREVISTA NO ART. 12 DA LEI N. 10.826/03. TIPIFICAÇÃO READEQUADA, DE OFÍCIO.

RECURSOS CONHECIDOS E NÃO PROVIDOS (Apelação Criminal n. 0004743-48.2017.8.24.0023, da Capital, rel. Des. Sidney Eloy Dalabrida, j. 19-9-2019).


APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES CONTRA A INCOLUMIDADE E SAÚDE PÚBLICAS. POSSE ILEGAL DE MUNIÇÕES DE USO RESTRITO E TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES NA FORMA PRIVILEGIADA (ART. 16, CAPUT, DA LEI N. 10.826/03, E ART. 33, CAPUT E § 4º, DA LEI N. 11.343/06). SENTENÇA CONDENATÓRIA. INCONFORMISMO DEFENSIVO. EX OFFICIO. CORREÇÃO DE ERRO MATERIAL...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT