Acórdão Nº 0002540-36.2014.8.24.0018 do Sexta Câmara de Direito Civil, 20-10-2020

Número do processo0002540-36.2014.8.24.0018
Data20 Outubro 2020
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSexta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 0002540-36.2014.8.24.0018/SC



RELATOR: Desembargador ANDRÉ CARVALHO


APELANTE: MARCIO TREMEL (AUTOR) APELADO: BRADESCO SEGUROS S/A


RELATÓRIO


Adoto, por economia processual e em homenagem à sua completude, o relatório da sentença:
Márcio Tremel ajuizou ação de cobrança de seguro em face de HSBC Seguros S/A.
Relatou que por força de vínculo empregatício possuía seguro de vida em grupo com a requerida, com cobertura para invalidez permanente total ou parcial.
Pretende a condenação da parte ré ao pagamento de indenização securitária, ao argumento de que padece de incapacidade laborativa decorrente de acidente de trânsito.
Citada, a requerida apresentou contestação (p. 42/57). Preliminarmente, suscitou ausência de interesse processual. Como prejudicial de mérito, alegou a prescrição. No mérito, alegou que se constatou que o autor padece de invalidez parcial, razão pela qual defendeu que a indenização devida se da de acordo com a extensão da moléstia.
Houve réplica (p. 120/134).
Na sequência, o feito foi saneado e foi determinada a realização de perícia médica (p. 149/152).
Juntado o laudo (p. 211/218), ambas as partes se manifestaram a respeito (p. 221/237 e 251253).
A parte dispositiva da sentença é do seguinte teor:
Ante o exposto, resolvo o mérito na forma do art. 487, I do Código de Processo Civil para JULGAR PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido de cobrança, a fim de condenar a requerida, ao pagamento da quantia de R$ 2050,00 (dois mil e cinquenta reais), que deverá ser acrescida de correção monetária, calculada com base em índice aplicado pela Corregedoria-Geral de Justiça (INPC-IBGE), a incidir a partir da data da contratação ou, caso haja, da última renovação e de juros de mora a contar da citação, no patamar de 12% ao ano, nos termos do art. 406 do atual Código Civil.
Na inicial, a parte requerente pretendida a integralidade do capital segurado (R$ 8.200,00) e a condenação se deu de acordo com a invalidez (R$ 2.050,00).
Houve SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA (CPC, art. 86, caput), razão pela qual condeno autora e requerida ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, na proporção de 70 % (setenta por cento) para a parte requerente e 30 % (vinte por cento) para a requerida, fixada a verba sucumbencial em 15% (quinze por cento) sobre o valor dado à causa, em razão do baixo valor da condenação (CPC, art. 85, §2º).
No que se refere à parte autora, exigibilidade suspensa em virtude da concessão da justiça gratuita (CPC, art. 98, §3º). (Evento 93, SENT190).
Inconformado, o Autor interpôs o presente recurso de Apelação Cível arguindo, em preliminar, nulidade da sentença por ofensa à disposição do art. 489 do CPC.
No mérito, refere que o Código de Defesa do Consumidor deve ser aplicável ao caso, tanto pela relação de consumo existente entre as partes, quanto pelo caráter adesivo dos contratos de seguro e que, sob tal enfoque, não há qualquer documento que demonstre que o Recorrente tomou conhecimento prévio do conteúdo do contrato e, mesmo que se entenda que a estipulante é quem o realizou, isso por si só não retira do consumidor o direito de informação, até porque caberia ao fornecedor tal prestação. E mais, que nunca recebeu qualquer cópia do documento e que nem mesmo assinou o contrato de seguro ou documento equivalente, o que corrobora a afirmação de que nunca foi cientificado do que exatamente tratavam-se as coberturas contratadas, quais os riscos que estavam excluídos ou ainda que em caso de invalidez parcial poderia receber apenas parte do valor da indenização.
Afirma que a Constituição Federal é soberana, é a lei maior, cuja todas as demais normas infraconstitucionais devem estar em consonância e obediência com ela. E que as cláusulas contratuais devem ser interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor, pois a figura da estipulante não pode ser considerada como fornecedora do serviço, sendo que o fornecedor seria a seguradora e a esta caberia o dever de informação.
Sustenta que da simples leitura do certificado de seguro confere que não há qualquer informação ou sequer citação de que seria o caso de adoção de tabela da SUSEP ou outra qualquer, fazendo com que o segurado acredite naquilo que lhe foi repassado, ou seja, que em caso de invalidez parcial ou total permanente por acidente receberá a indenização prevista.
Por fim, pretende a reforma da decisão recorrida "para que sejam adotadas as normas do Código de Defesa do Consumidor, para reconhecer a existência de violação ao dever de informação prévio quanto as clausulas restritivas/limitativas de direito por parte da seguradora para com o segurado e seja então condenada a ré ao pagamento TOTAL da indenização prevista no contrato de seguro, ou seja, 100% (cem por cento) da cobertura prevista na apólice principal e na apólice em que figura como segurado dependente. Ainda, pretende a reforma da decisão para fixar verba honorários com fulcro no artigo 85, §2º e §11 do NCPC) e subsidiariamente sobre o valor da causa".
Foram apresentadas contrarrazões ( Evento 102, PET198)

VOTO


De início, uma vez que a sentença foi publicada já na vigência do novo Código de Processo Civil (12-11-2019, Evento 95, CERT191), convém anotar que o caso será analisado sob o regramento do Diploma Processual Civil de 2015, em consonância com o Enunciado Administrativo n. 3 do Superior Tribunal de Justiça, com pontual ressalva às disposições que ostentam aplicação imediata.
Isso dito, satisfeitos os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, o recurso merece ser conhecido.
Da preliminar de sentença sem fundamentação
Sustenta o Recorrente, em preliminar, que a decisão recorrida seria omissa e sem fundamentação.
Todavia, a pretensão não merece ser acolhida neste ponto.
Preceitua o art. 489, § 1º, incisos IV e VI, do CPC/2015:
Art. 489. São elementos essenciais da sentença:
[...]
§ 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:
I - se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;
II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso;
III - invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão;
IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;
V - se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos;
VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.
Sobre o tema, Eduardo José da Fonseca Costa doutrina que "é preciso deixar claro que o juiz não está obrigado a enfrentar todos os argumentos trazidos pelas partes, mas apenas aqueles capazes de, em tese, infirmar a conclusão por ele adotada. [...] É importante lembrar a diferença entre fundamento e argumento. Fundamento é razão de decidir; argumento é raciocínio por força do qual, partindo-se de fundamentos fáticos e jurídicos articulados entre si, se extrai uma conclusão decisória. O primeiro é ponto de partida; o segundo, o caminho para o ponto de chegada" (coordenadores Angélica Arruda Alvim... [et al.]. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 594-595; grifo no original).
Verifica-se que o magistrado de primeiro grau, na decisão recorrida, abordou a pretensão invocada pelo Demandante, levando-o inclusive a reconhecer parcialmente o direito pleiteado de forma muito bem fundamentada.
Vale lembrar ainda que "[...] o simples desatendimento à tese defendida pela parte não retira do ato a sua higidez, [...] Inteligência dos arts. 458, inc. II, do CPC/1973; 11, caput, e 489, inc. II e §§ 1º e 2º, do CPC/2015; e 93, inc. IX, da CRFB." (TJSC, Agravo de Instrumento n. 0020100-74.2016.8.24.0000, de São João Batista, rel. Des. Henry Petry Júnior ,Quinta Câmara de Direito Civil, j. 22-08-2016; grifou-se).
Além do mais, em que pese os argumentos do Apelante, é sabido que:
A decisão judicial, que visa exclusivamente a solução de um conflito, deve ser racional, objetiva e direta. Deve se ocupar somente do que é necessário a motivar a solução que se deu ao litígio, fazendo as partes compreender o que levou o Juiz ou Tribunal àquela solução. É o que basta para que se faça a seu respeito o controle de legalidade, revelando às partes o que é necessário para recorrer. Não tem lugar na decisão judicial o exame de argumentos, hipóteses e teses irrelevantes. A decisão judicial não é trabalho acadêmico. É ato de Estado dirigido à pacificação social, mediante a declaração dos fundamentos e razões que levaram o julgador a decidir naquele sentido. "A decisão do juiz se restringe ao objeto do processo. A necessidade de fundamentação (em atenção à congruência) faz com que ele seja obrigado a rebater os argumentos e as questões que sejam necessárias, para poder apreciar este objeto, que é delimitado pelos pedidos do autor. [...] Resumidamente, o juiz está, sim, obrigado pelo art. 93, IX, da CF/1988, a manifestar-se sobre todos os fundamentos levados a julgamento pelas partes. Não está, contudo, obrigado a discorrer a respeito de toda a argumentação utilizada pelas partes para levar a juízo o conhecimento destes pontos e questões. Nas palavras de Cândido Rangel Dinamarco, o essencial é motivar no tocante aos pontos relevantes e essenciais, de modo que a motivação lançada em sentença mostre que o juiz tomou determinada decisão porque assumiu determinados fundamentos com que guarda coerência" [Leonard Ziesemer Schimitz in "Fundamentação das Decisões Judiciais a crise na construção de respostas no processo civil", ed. RT, 2015, p. 286 e 291].
Portanto, não...

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