Acórdão Nº 0002602-71.2017.8.24.0018 do Segunda Câmara Criminal, 20-07-2021

Número do processo0002602-71.2017.8.24.0018
Data20 Julho 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 0002602-71.2017.8.24.0018/SC



RELATORA: Desembargadora HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHO


APELANTE: RUDINEI DA SILVA MACHADO (ACUSADO) ADVOGADO: MARIZETE PAIN CECHIN (OAB SC050394) ADVOGADO: MICAELSON GEHLEN (OAB SC048007) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Denúncia (Evento 9 dos autos originários): o Ministério Público ofereceu denúncia em face de Rudinei da Silva Machado, nos autos n. 0002602-71.2017.8.24.0018, dando-o como incurso nas sanções do artigo 121, § 2.º, incisos II e IV, do Código Penal, em razão dos seguintes fatos:
No dia 15 de janeiro de 2017, durante a madrugada, em horário a ser melhor precisado durante a instrução criminal, na residência localizada na Rua Leopoldo Sander, nº 42, bairro Alvorada, nesta cidade de Chapecó/SC, o denunciado Rudinei da Silva Machado, de forma consciente e voluntária, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, agindo com evidente animus necandi, matou a vítima Antonio Marcos de Lima, golpeando-a com uma arma branca (faca), causando-lhe "anemia aguda" por "ferimentos vasculares e torácicos", causa eficiente da sua morte.
Conforme apurado no caderno indiciário, nas circunstâncias de data e local acima descritos, o denunciado Rudinei da Silva Machado encontrava-se na companhia da vítima Antonio Marcos de Lima, no interior da residência desta, onde ingeriam juntos bebida alcoólica, quando houve um breve desentendimento entre ambos. Neste momento, o denunciado, reagindo de inopino, sacou uma faca que portava (não apreendida) e desferiu pelo menos 4 (quatro) golpes na vítima, atingindo-a na região do tórax e cervical (pescoço), o que ocasionou sua a morte por anemia aguda, ainda no local.
Infere-se que o homicídio foi cometido por motivo fútil, em razão de uma "discussão" anterior porque a vítima não permitiu que o denunciado pernoitasse em sua residência3 , motivo este totalmente desproporcional à agressão sofrida.
Ademais, o crime foi praticado mediante recurso que dificultou a defesa do ofendido, porquanto o denunciado agiu de forma inesperada, surpreendendo com golpes de faca a vítima, a qual estava embriagada4 , desprevenida e desarmada, sem qualquer chance de esboçar reação ao ataque.
Sentença de pronúncia (Evento 64 dos autos originários): O Juiz de Direito de Primeiro Grau julgou admissível a denúncia e pronunciou Rudinei da Silva Machado, dando-o como incurso nas sanções do artigo 121, § 2º, incisos II e IV, do Código Penal, para ser submetido a julgamento pelo Tribunal de Júri da comarca de Chapecó.
Recurso em sentido estrito de Rudinei da Silva Machado (Evento 87 dos autos originários): a defesa interpôs recurso em sentido estrito, no qual sustentou, preliminarmente, a nulidade do interrogatório perante a autoridade policial, porquanto o recorrente é analfabeto e não tinha conhecimento do conteúdo do documento que assinou, sequer estando acompanhado de defensor.
No mérito, pugnou, em síntese, pela impronuncia do denunciado, nos termos do artigo 414 do Código de Processo Penal, ao argumento de que o conjunto probatório não foi suficiente para apontar os indícios mínimos de autoria.
Em caráter subsidiário, sustentou o decote das qualificadoras da prática homicida mediante recurso que dificultou e/ou impossibilitou a defesa da vítima, no caso, a surpresa, bem como do motivo fútil, tendo em vista que o entendimento da defesa é, também, de que a prova não dá sustento às suas admissões.
Contrarrazões do Ministério Público (Evento 91 do presente feito): a acusação impugnou as razões recursais e postulou pela manutenção da sentença de pronúncia na íntegra.
Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça (Evento 136 do presente feito): o Excelentíssimo Senhor Procurador de Justiça Dr. Genivaldo da Silva opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso.
Este é o relatório

VOTO


Cuida-se de recurso em sentido estrito interposto por Rudinei da Silva Machado contra a sentença que o pronunciou a julgamento perante o Tribunal do Júri pelo suposto cometimento do crime previsto no artigo 121, § 2º, incisos II e IV, do Código Penal.
1. Do juízo de admissibilidade
O recurso preenche os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual é conhecido.
2. Da preliminar de nulidade do interrogatório extrajudicial
Apontou a defesa que o interrogatório do recorrente perante a Autoridade Policial encontra-se eivado de nulidade, uma vez que negou ter dado o depoimento constante no Evento 2, INQ22, aduzindo que, por ser analfabeto desconhecia o conteúdo daquilo que assinou na Delegacia de Polícia.
Razão, adianta-se, não lhe assiste.
Inicialmente, compulsando os autos originários, não se verificou qualquer evidência capaz de macular o interrogatório do acusado, prestado perante a autoridade policial, ainda que o acusado tenha se declarado analfabeto.
Sabe-se que qualquer irregularidade no depoimento extrajudicial somente poderia ser reconhecida em circunstâncias de abuso ou falso praticado pelas autoridades policiais, fazendo incluir no depoimento algo que o acusado não relatou, induzindo-o, por conseguinte, a assinar o termo. No caso, a defesa não logrou trazer à baila qualquer indício de ilegalidade que não o mero inconformismo.
Aliás, consoante bem analisado pelo Promotor de Justiça, subscritor das contrarrazões de Evento 91, do teor do depoimento prestado pelo acusado na Delegacia de Polícia, nota-se que ele forneceu diversos detalhes acerca do crime, informações estas que se encontram em perfeita harmonia com as demais provas constantes nos autos, especialmente pelo exame em local cadavérico e pelos depoimentos dos policiais militares.
Vê-se, portanto, que ao contrário do que aduz a Defesa, não há nenhum elemento nos autos que sinalize que a confissão operada por Rudinei tenha sido prestada sob indevida pressão, tendo ela se revestido de legalidade durante o interrogatório, momento em que todas as garantias constitucionais foram devidamente respeitadas.
Outrossim, verifica-se igualmente improcedente o reclamo do recorrente, quanto à nulidade do processo, em consequência da ausência de defensor na Delegacia de polícia.
Isso porque, o inquérito policial, por sua própria natureza administrativa e inquisitiva, dispensa o contraditório e a ampla defesa, que são obrigatórios durante a instrução criminal, não se exigindo, portanto, que o suspeito seja interrogado na presença de advogado, principalmente se devidamente cientificado de suas garantias constitucionais e mesmo assim não indica um defensor.
A jurisprudência pátria já é assente nesse sentido:
[...] Prosseguindo-se na análise do reclamo, no tocante à alegada nulidade do interrogatório policial pela ausência de advogado durante o ato, o recurso não merece prosperar. É certo que o "investigado ou indiciado possui direitos fundamentais que devem ser observados mesmo no curso da investigação, entre os quais o direito ao silêncio, à preservação de sua integridade física e o de ser assistido por advogado." (RHC 342.000/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, DJe 2/3/2016). No caso em exame, verifica-se do Termo de Interrogatório que o então investigado, ora recorrente, foi cientificado de seu direito de permanecer em silêncio e de ter assistência de um advogado, não se manifestando pela presença do profissional para acompanhar o ato (e-STJ, fl. 16). Assim, não se mostra razoável querer, agora, alegar a nulidade do ato sob o argumento de que seu patrono não o acompanhou durante a realização. Ademais, "esta Corte acumula julgados no sentido da prescindibilidade da presença de um defensor por ocasião do interrogatório havido na esfera policial, por se tratar o inquérito de procedimento administrativo, de cunho eminentemente inquisitivo, distinto dos atos processuais praticados em juízo" [...] (STJ - REsp: 1657241 PR 2017/0045060-8, Relator: Ministro RIBEIRO DANTAS, Data de Publicação: DJ 08/05/2018)
Ademais, "[...] o recebimento da denúncia pelo juiz de primeiro grau em desfavor do paciente torna prejudicado o exame da alegada nulidade do inquérito policial. Eventuais irregularidades ocorridas na fase investigatória, cuja natureza é inquisitiva, não contaminam, necessariamente, o processo criminal, no...

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