Acórdão Nº 0002622-05.2011.8.24.0008 do Segunda Câmara de Direito Civil, 19-11-2020

Número do processo0002622-05.2011.8.24.0008
Data19 Novembro 2020
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0002622-05.2011.8.24.0008/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0002622-05.2011.8.24.0008/SC

RELATOR: Desembargador JOÃO BATISTA GÓES ULYSSÉA

APELANTE: ASSOCIAÇÃO CATARINENSE DE DEFESA DOS CIDADÃOS, DOS CONSUMIDORES E DOS CONTRIBUINTES ¿ ACC/SC ADVOGADO: DANIELA TAMANINI PETERMANN (OAB SC021233) APELANTE: CONDOMINIO CIVIL PRO-INDIVISO DO SHOPPING CENTER NEUMARKT BLUMENAU ADVOGADO: RENATO BARREIROS (OAB SC049062A) ADVOGADO: EDUARDO BARBATO CORTES (OAB SC051468) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA RÉU: OS MESMOS

RELATÓRIO

Associação Catarinense de Defesa dos Cidadãos, dos Consumidores e dos Contribuintes ACC/SC e Condomínio Civil Pró Indiviso do Shopping Center Neumarkt Blumenau interpuseram Apelações Cíveis contra a sentença que, proferida nos autos da Ação Civil Pública n. 008.11.002622-2, proposta pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina, julgou parcialmente procedentes os pedidos para determinar que o Condomínio Civil Pró Indiviso do Shopping Center Neumarkt Blumenau promova o fracionamento do período adicional do valor do estacionamento para trinta minutos, correspondente a metade do valor previsto para a utilização do serviço por uma hora, além de condenar a parte ré apenas ao pagamento de metade das custas processuais.

Em suas razões, a Associação Catarinense de Defesa dos Cidadãos, dos Consumidores e dos Contribuintes ACC/SC sustentou, que: (a) o fornecedor dos serviços considerados, em parte, abusivos na sentença deve ser condenado de forma genérica ao ressarcimento dos danos materiais que os consumidores sofreram e não atingidos pela prescrição; (b) deve ser observada a possibilidade de liquidação e execução da condenação na forma dos arts. 82 e 100 do CDC, pois é representante dos consumidores atingidos e está habilitada nos autos; (c) aplica-se o instituto da reparação fluida, entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça; (d) por força do princípio da causalidade, a Ré deve ser condenada ao pagamento dos honorários sucumbenciais nos termos do art. 85 do CPC; e (e) a verba honorária será destinada ao patrono que a representou judicialmente como litisconsórcio ativo.

O Condomínio Civil Pró Indiviso do Shopping Center Neumarkt Blumenau alegou, que: (a) a cobrança de tarifas de estacionamento de shoppings centers já foi exaustivamente discutida nos Tribunais; (b) legislações estaduais e municipais e decisões judiciais evidenciam interferência do Estado de Santa Catarina em matéria de competência da União, por tratar-se de questão de direito de propriedade, ou seja, direito civil e não consumerista; e (c) o Supremo Tribunal Federal já declarou a inconstitucionalidade formal e material das leis estaduais e municipais que determinavam a cobrança proporcional do tempo utilizado nos serviços de estacionamento privado.

O Réu/Apelado apresentou contrarrazões suscitando inovação recursal ao pedido de legitimar os consumidores prejudicados para efetuar a execução do suposto prejuízo material; e, no mérito, pleiteou a manutenção da sentença.

A Autora/Apelada também juntou as contrarrazões, requerendo a manutenção da sentença e desprovimento do recurso da empresa Ré.

A representante do Ministério Público de primeiro grau asseverou, em contrarrazões, a possibilidade de condenação genérica em ação coletiva, nos termos do art. 95 do Código de Defesa do Consumidor, concordando, em parte com a ACC/SC, além de pleitear, ao final, o desprovimento do recurso do shopping center.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer do Exmo. Sr. Dr. Murilo Casemiro Mattos, sustentou a condenação genérica do Réu, como o desprovimento do recurso deste.

VOTO

Objetivam os Apelantes a reforma da sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais formulados pelo Ministério Público de Santa Catarina, nos autos da Ação Civil Pública promovida contra o Condomínio Civil Pró Indiviso do Shopping Center Neumarkt Blumenau.

1. Contrarrazões. Inovação recursal. Não ocorrência.

Sustenta o Condomínio Civil Pró Indiviso do Shopping Center Neumarkt Blumenau, em sede de contrarrazões, que o pedido de legitimação dos consumidores do estacionamento para promover a execução de eventual condenação de restituição de valores desembolsados, configura inovação recursal pois sequer foi suscitado na inicial e discutido no processo.

Sem razão. A tese sustentada pela litisconsorte ativa, Associação Catarinense de Defesa dos Cidadãos, dos Consumidores e dos Contribuintes ACC/SC, nas razões do apelo tem relação direta com o pedido do Ministério Público na petição inicial, qual seja, a indenização dos consumidores lesionados pela prática de preços abusivos supostamente praticados pela Ré e que foi afastada pela sentença.

Assim, no apelo, a ACC/SC sustentou a necessidade desta indenização ser julgada procedente, e, acaso acolhido o pleito, aplicação dos artigos 82 e 100 do Código de Defesa do Consumidor:

Art. 82. Para os fins do art. 81, parágrafo único, são legitimados concorrentemente:

I - o Ministério Público,

II - a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal;

III - as entidades e órgãos da Administração Pública, direta ou indireta, ainda que sem personalidade jurídica, especificamente destinados à defesa dos interesses e direitos protegidos por este código;

IV - as associações legalmente constituídas há pelo menos um ano e que incluam entre seus fins institucionais a defesa dos interesses e direitos protegidos por este código, dispensada a autorização assemblear.

§ 1° O requisito da pré-constituição pode ser dispensado pelo juiz, nas ações previstas nos arts. 91 e seguintes, quando haja manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido.

[...]

Art. 100. Decorrido o prazo de um ano sem habilitação de interessados em número compatível com a gravidade do dano, poderão os legitimados do art. 82 promover a liquidação e execução da indenização devida.

Parágrafo único. O produto da indenização devida reverterá para o fundo criado pela Lei n.º 7.347, de 24 de julho de 1985.

Nessa senda, inexiste inovação recursal, pois os fundamentos da exordial não são diversos daqueles alegados nas razões do recurso apelatório, motivo pelo qual a pretensão deve ser conhecida.

2. Apelação cível. Inconstitucionalidade. Inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor. Direito Civil. Competência da União. Preclusão. Não conhecimento.

O Ministério Público de Santa Catarina ajuizou ação civil pública contra o Réu/Apelante Condomínio Civil Pró Indiviso do Shopping Center Neumarkt Blumenau, porque os preços por si praticados à oferta do serviço de estacionamento em seu estabelecimento comercial eram abusivos, requerendo, assim, a redução e a indenização dos consumidores lesionados.

A Associação Catarinense de Defesa dos Cidadãos, dos Consumidores e dos Contribuintes ACC/SC foi aceita como litisconsorte ativa pelo juízo a quo.

Após o trâmite normal do feito, com a juntada da contestação e das réplicas, o processo foi julgado, sendo os pedidos iniciais parcialmente acolhidos em sentença, conforme abaixo transcrito (fls. 208-214):

[...]

Ante o exposto, ACOLHO PARCIALMENTE os pedidos formulados pelo Ministério Público de Santa Catarina e Associação Catarinense de Defesa dos Cidadãos, dos Consumidores e dos Contribuintes-ACC/SC contra Condomínio Civil Pró-Indiviso Shopping Neumarkt, para o fim de determinar que o réu promova o fracionamento do período adicional para trinta minutos, com a correspondente cobrança do valor de metade daquele previsto para a utilização do serviço por uma hora. Fica mantida a antecipação de tutela de fls. 59/69. Julgo o processo extinto com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.

Condeno o réu ao pagamento de metade do valor das custas judiciais. Incabíveis honorários advocatícios.

Após o trânsito em julgado, certifique-se e arquivem-se.

[...].

A empresa Ré interpôs apelação cível argumentando somente que a questão discutida nos autos não pode ser regulamentada por leis estaduais e municipais, muito menos por decisão judicial, uma vez que não se aplica o Código de Defesa do Consumidor, mas o Código Civil, já que trata o direito de uso e gozo da propriedade privada, ou seja, matéria de competência exclusiva da União, além da existência de julgados desta Corte e do Supremo Tribunal Federal declarando a inconstitucionalidade de leis que tem por escopo tratar/regulamentar a cobrança de serviços de estacionamentos privados.

Contudo, o apelo da Requerida não deve ser conhecido.

As questões arguidas nas razões do apelo já foram levantadas em sede de Agravo de Instrumento n. 2011.061972-4 por si interposto (fls. 152-168) contra a decisão que deferiu, em parte, a liminar pleiteada na inicial e determinou o fracionamento do período adicional de permanência do veículo do consumidor no estacionamento, tudo com base no Código de Defesa do Consumidor (fls. 59-69):

[...]

Registre-se, desde logo e com vistas a evitar juízos equivocados, que a presente decisão, de modo algum, viola a decisão proferida nos autos do Mandado de Segurança nº 2006.032324-3, impetrado junto ao Tribunal de Justiça pelo réu, já que não está em discussão, nesta demanda, a legalidade ou não da cobrança de valores, pelo requerido, pelo uso de seu espaço destinado a estacionamento. O que se examina, aqui, é se o preço e a forma de cobrança praticados, à luz da legislação, inclusive do consumidor, são ou não abusivos.

[...]

Ante o exposto, concedo em parte a liminar pleiteada, para, em consequência, DETERMINAR ao requerido, que no prazo de 24 horas, contatados da notificação/citação, promova o fracionamento do chamado período adicional, adequando o valor da cobrança para R$ 0,50 (cinquenta centavos) por cado 30...

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