Acórdão Nº 0002639-04.2015.8.24.0072 do Segunda Câmara Criminal, 21-09-2021

Número do processo0002639-04.2015.8.24.0072
Data21 Setembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0002639-04.2015.8.24.0072/SC

RELATORA: Desembargadora SALETE SILVA SOMMARIVA

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELADO: NIKOLAS DOS SANTOS GONCALVES (ACUSADO)

RELATÓRIO

O magistrado José Adilson Bittencourt Junior, por ocasião da sentença (evento n. 219), elaborou o seguinte relatório:

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA ofereceu denúncia contra NIKOLAS DOS SANTOS GONCALVES, qualificado nos autos, dando-o como incurso nas sanções do art. 121, § 2º, inc. I e IV, c/c art. 14, inc. II, do Código Penal, em razão dos seguintes fatos (evento 49):

No dia 9 de agosto de 2015, por volta das 3 horas, na boate Garden, situada na Rua Coronel Izidoro, centro, município do Tijucas/SC, o denunciado NIKOLAS DOS SANTOS GONÇALVES, de forma consciente e voluntária, conhecedor da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, agindo com manifesta intenção de matar (animus necandi), por motivo fútil e utilizando-se de meio que dificultou a defesa da vítima, deu início a um homicídio duplamente qualificado, desferindo na vítima vários golpes com uma faca - de 15 cm de lâmina, conforme termo de exibição e apreensão de fl. 18 e laudo pericial de fls. 232-234 -, que atingiram a região posterior da cabeça, braço e ante braço esquerdo, peitoral esquerdo e quadrante superior esquerdo do abdômen, somente não logrando êxito no seu intento homicida por circunstancias alheias a sua vontade.Consta do incluso caderno investigativo que, momentos antes dos fatos, o denunciado foi retirado da casa noturna pela vítima, a qual prestava serviços de segurança no local. No ato, o denunciado informou a vítima que estava armado e que voltaria para matá-los.Na sequência, munido do canivete, o denunciado partiu para cima da vítima, golpeou-a várias vezes com o canivete, pegando-a de surpresa.O crime foi praticado por motivo que dificultou a defesa da vítima, vez que o denunciado surpreendeu José Roberto com golpes de canivete, de modo a tornar difícil reação por parte da vítima.O crime de tentativa de homicídio também foi cometido por motivo fútil, em razão de contenda anterior entre a vítima e o denunciado, com absoluta desproporção entre a motivação delituosa e a ação homicida.O resultado morte não ocorreu por circunstâncias alheias à vontade do denunciado, eis que os golpes não atingiram a vítima fatalmente, e que terceiros intervieram e imobilizaram o denunciado.

Ao final, após regular processamento da ação, pleiteou a pronúncia do acusado, para que seja submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri desta comarca.

A denúncia foi recebida em 30-4-2019 (evento 51).

Citado, o réu apresentou resposta à acusação (evento 59).

Afastada a hipótese de absolvição sumária, foram designadas audiência para oitiva de uma testemunha e de instrução e julgamento (evento 72).

Durante a instrução processual foram ouvidas oito testemunhas e interrogado o réu (eventos 154 e 205).

Em suas alegações finais, a acusação requereu a pronúncia do réu pelo crime descrito no art. 121, § 2º, inc. I e IV, c/c art. 14, inc. II, do Código Penal (evento 210).

A defesa, por sua vez, postulou a impronúncia do réu, "[...] por ausência das qualificadoras, posto que em nenhum momento foi demonstrada a presença de motivo fútil ou desproporcionalidade, surpresa ou emboscada que tenha resultado em qualquer dificuldade de defesa por parte da vítima" (evento 214).

Acrescente-se que a denúncia foi julgada parcialmente procedente para desclassificar a imputação dirigida contra o acusado para crime não doloso contra a vida, afastando, por via de consequência, a competência do Tribunal do Júri.

O Ministério Público interpôs recurso de apelação (evento n. 223). Em suas razões, pleiteou a reforma do decisum para que o réu seja pronunciado nos termos da inicial acusatória, sob o argumento de que há indícios suficientes quanto à caracterização do dolo em ceifar a vida da vítima na conduta perpetrada.

Contrarrazões da defesa (evento n. 234).

A Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer do Dr. Humberto Francisco Scharf Vieira (evento n. 9 dos autos da apelação), manifestou-se pelo desprovimento do recurso.

Documento eletrônico assinado por SALETE SILVA SOMMARIVA, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 1374495v7 e do código CRC 79a9e796.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): SALETE SILVA SOMMARIVAData e Hora: 3/9/2021, às 10:21:21





Apelação Criminal Nº 0002639-04.2015.8.24.0072/SC

RELATORA: Desembargadora SALETE SILVA SOMMARIVA

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELADO: NIKOLAS DOS SANTOS GONCALVES (ACUSADO)

VOTO

Para que o réu venha a ser pronunciado e tenha seu julgamento submetido ao Tribunal do Júri, é necessário apenas a existência de elementos que comprovem a materialidade do delito e indícios suficientes de autoria, prescindindo, nesta fase, de absoluta certeza quanto ao responsável pela prática ilícita e as peculiaridades que o crime possa envolver.

A propósito, leciona Fernando da Costa Tourinho Filho:

Dês que haja prova da materialidade do fato e indícios suficientes de que o réu foi o seu autor, deve o Juiz pronunciá-lo. A pronúncia é decisão de natureza processual, mesmo porque não faz coisa julgada, em que o Juiz, convencido da existência do crime, bem como de que o réu foi seu autor (e procura demonstrá-lo em sua decisão), reconhece a competência do Tribunal do Júri para proferir o julgamento. (Código de processo penal comentado. 15.ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, v. 2, p. 80).

Assim sendo, nesta fase processual, deve-se apenas perquirir se o conjunto probatório é suficiente para que se justifique a suspeita em desfavor do denunciado. Confirmada tal hipótese, a pronúncia revela-se imperiosa.

É que, ainda que remanesçam versões antagônicas acerca dos fatos, é cediço que não cabe ao magistrado singular a escolha de qual delas é cabível ao caso, porquanto, na hipótese de haver elementos de prova conflitantes acerca da intenção do agente, eventuais incoerências deverão ser averiguadas pelo Conselho de Sentença, juiz natural da causa, de modo a privilegiar o caráter popular e democrático dos veredictos em situações que se viole o bem jurídico vida.

Por outro lado, embora seja vedado ao magistrado fazer incursão demasiada na prova produzida na primeira etapa processual, se a instrução revela, de modo inequívoco, a ausência de animus necandi, correta será a decisão que desclassificar o delito, com a remessa dos autos ao juiz competente, nos ditames do art. 419 do Código de Processo Penal, vedada a definição da nova classificação jurídica, sob pena de invadir a esfera de competência do juízo monocrático e proferir um prejulgamento dos fatos.

Em comentário ao referido dispositivo, Guilherme de Souza Nucci destaca:

[...] é a decisão interlocutória simples, modificadora da competência do juízo, não adentrando o mérito, tampouco fazendo cessar o processo. Ensina Tornaghi que desclassificar é "dar-lhe nova enquadração [sic] legal, se ocorrer mudança de fato, novos elementos de convicção ou melhor apreciação dos mesmos fatos e elementos de prova" (Compêndio de processo penal, t. I, p. 323)...

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