Acórdão nº 0002726-02.2015.8.11.0078 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Primeira Câmara de Direito Privado, 02-03-2021

Data de Julgamento02 Março 2021
Case OutcomeProvimento
Classe processualCível - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL - CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Privado
Número do processo0002726-02.2015.8.11.0078
AssuntoEfeito Suspensivo / Impugnação / Embargos à Execução

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO

PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO


Número Único: 0002726-02.2015.8.11.0078
Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198)
Assunto: [Efeito Suspensivo / Impugnação / Embargos à Execução]
Relator: Des(a).
JOAO FERREIRA FILHO


Turma Julgadora: [DES(A). JOAO FERREIRA FILHO, DES(A). NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, DES(A). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS]

Parte(s):
[FRANCISCO DORS - CPF: 125.496.149-68 (APELADO), GENI DORS - CPF: 369.334.739-53 (APELADO), BRUNO DE SOUZA SCHMIDT - CPF: 037.518.979-33 (ADVOGADO), BANCO DAYCOVAL S/A - CNPJ: 62.232.889/0001-90 (APELANTE), SANDRA KHAFIF DAYAN - CPF: 227.162.868-76 (ADVOGADO), FRANCO ARIEL BIZARELLO DOS SANTOS - CPF: 937.874.800-72 (ADVOGADO), JULIANA VIEIRALVES AZEVEDO CAMARGO - CPF: 074.577.217-03 (ADVOGADO)]

A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO.

E M E N T A

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE EMBARGOS À EXECUÇÃO – VIOLAÇÃO À COISA JULGADA – INOCORRÊNCIA – AUSÊNCIA DE TRÍPLICE IDENTIDADE DAS DEMANDAS – CÉDULA DE PRODUTO RURAL – ENDOSSO DO TÍTULO A TERCEIRO DE BOA-FÉ – NATUREZA CAMBIAL DA OPERAÇÃO – PRINCÍPIO DA CARTULARIDADE – OBRIGAÇÃO A SER CUMPRIDA JUNTO AO PORTADOR DA CÁRTULA – INEFICÁCIA DE QUITAÇÃO DADA POR AQUELE QUE NÃO É TITULAR DO CRÉDITO – PRINCÍPIO DA AUTONOMIA – INOPONIBILIDADE DAS EXCEÇÕES PESSOAIS AOS TERCEIROS DE BOA-FÉ – TÍTULO REPRESENTATIVO DE OBRIGAÇÃO CERTA, LÍQUIDA E EXIGÍVEL – EXCESSO DE EXECUÇÃO – AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO VALOR DEVIDO E ACOMPANHADO DE MEMÓRIA DE CÁLCULO – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. 1. A imutabilidade gerada pela coisa julgada material atinge apenas o dispositivo decisório, a solução dada à lide, isto é, a norma concreta sobre o caso, não tornando imutáveis os fundamentos ou as razões decisórias adotadas à formação do pronunciamento judicial (CPC, art. 504), e, nessa perspectiva, constitui óbice apenas a novo enfrentamento do mérito da questão na hipótese da presença de tríplice identidade entre as causas. 2. A CPR é espécie de título de crédito, regulada pelas normas de direito cambiário, com base nos princípios da carturalidade, literalidade e autonomia, este último que se desdobra em dois subprincípios, o da abstração e o da inoponibilidade das exceções pessoais aos terceiros de boa-fé, que, em essência, ditam que o direito exercido pelo possuidor do título de boa-fé é desvencilhado das relações existentes entre emitente, beneficiário e endossante. 3. O registro/averbação do endosso da CPR não é pressuposto de validade do ato, afinal, a lei de regência nada dispõe nesse sentido, exigindo apenas que o endosso seja completo (Lei nº 8.929/94, art. 10, I), sendo formalidade que visa garantir a eficácia do negócio contra terceiros (Lei nº 8.929/94, art. 12), tornando certa e conhecida a situação jurídica em que se encontra o título ante o escopo de publicidade ínsito aos registros públicos. 4. O recibo de quitação emitido por quem não detém a cártula e nem a titularidade do crédito não produz efeitos jurídicos em relação à obrigação contida na CPR. 5. Não cabe conhecer da arguição de excesso de execução que vem desacompanha da indispensável indicação do valor que entende correto e da respectiva memória do cálculo (CPC/73, art. 739, §5º).

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO

PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO

RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002726-02.2015.8.11.0078 - CLASSE 198 - CNJ - COMARCA DE SAPEZAL

R E L A T Ó R I O

O Exmº. Sr. Des. JOÃO FERREIRA FILHO (Relator)

Egrégia Câmara:

Recurso de APELAÇÃO CÍVEL interposto pelo BANCO DAYCOVAL S.A. contra a sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 1ª Vara única da comarca de Sapezal /MT, que nos autos da ação de “Embargos à Execução” (Proc. nº 0002726-02.2015.8.11.0078 – Código 86784), ajuizada pelo apelante contra FRANCISCO DORS e GENI DORS, julgou o pedido procedente, “para reconhecer a satisfação do crédito perseguido na execução (Código 85992), a qual deve ser extinta”, pois, segundo apreciação do magistrado, “não ocorrida a averbação do endosso (da CPR) no registro do título, e tendo em vista que a notificação dos embargantes ocorreu apenas em 20/12/2007, deve a transferência ser tida como ineficaz até essa data, e, portanto, o pagamento realizado ao credor original deve ser reputado como válido para cumprimento da obrigação” (cf. Id. nº 71877005).

O apelante argui preliminar de ofensa à coisa julgada, pois, segundo diz, no julgamento do RAC nº 108536/2013, originado dos autos da ação cautelar (Proc. nº 328-29.2008.811.0078 – Código 32980), envolvendo os mesmos litigantes e discussão em torno da mesma CPR objeto desta lide, a 2ª Câmara de Direito Privado do TJMT já reconheceu a certeza, liquidez e exigibilidade da célula, inclusive reconheceu que o endosso praticado em preto tem como desnecessário a intimação dos emitentes para sua regular validade, assim como consignou que o conjunto probatório deixou clara a confissão dos apelados em relação ao não cumprimento da obrigação prevista na CPR, disposições decisórias simplesmente ignoradas e contrariadas na sentença apelada.

Sustenta, no mérito, que é evidente o ‘error in judicando’ do julgado, (pois), como o Juízo de primeiro grau pode reconhecer como válida a cadeia de endosso praticada antes do vencimento da obrigação, mas, noutro ponto, reconhecer a legitimidade dos endossantes (Solo Vivo e Via Fértil) para outorgar a baixa da cédula? O resultado da sentença é incongruente, pois é impossível e ilegal reputar como válida a autorização de cancelamento da CPR 06/07 pela empresa VIA FERTIL, uma vez que esta não era mais detentora do crédito desde 08.10.2007, e, portanto, não poderia autorizar o cancelamento ou atestar quitação da dívida, por manifesta ausência de legitimidade para o ato, afinal, nessa data, a CPR em questão já havia sido endossada e transferida, por ato jurídico perfeito, em prol do Banco Daycoval, (...) único agente legítimo para autorizar o cancelamento, o que jamais ocorreu.

Argumenta que a ausência do registro do endosso da CPR não retira a validade do ato, uma vez que a legislação específica acerca da Cédula de Produto Rural não prevê a necessidade de averbação do endosso, mas tão somente o registro quando da respectiva emissão, o que ocorreu no caso em tela, e, sendo assim, considerando que era o possuir da cártula e único e exclusivo titular do crédito, pouco importa as causas do cancelamento (emitido pelo endossante), porque não é dotado de eficácia (em face de si), eis que o único ente legítimo para outorga (a quitação ou baixa da cédula)”.

Afirma que, na verdade, foi vítima de colusão entre a empresa/endossante (Solo Vivo), a credora original da CPR (Via Fértil), esta que foi a responsável pelo indevido cancelamento da cédula, e os emitentes/apelados, tendo em vista que eles “forjaram” documento de quitação da obrigação para fins de justificar a baixa da CPR, o que, inclusive, posteriormente, foi admito e confessado pela endossante Solo Vivo, e ratificado pela Via Fértil, em acordo que celebrou com elas no ano de 2009.

Aduz que, em todo caso, se mantida a conclusão sentencial, deve se reconhecer a necessidade de redução da verba honorária sucumbencial, na medida em que os honorários arbitrados no caso em tela estão completamente inflados (...), uma vez que, em termos práticos, superam mais de R$ 200.000,00, sendo tal valor completamente desarrazoado pela própria natureza jurídica da ação, de modo que, dada as particularidades envolvidas no caso, o valor dos honorários devem ser fixados a partir de um juízo de equidade, nos termos do art. 85, §8º, do CPC.

Pede, pois, o provimento do recurso, para seja reformada a sentença e, por conseguinte, dada a total improcedência aos embargos, ou, no mínimo, readequado o valor dos honorários sucumbenciais (cf. Id. nº 71877025 ao 71877041).

Nas contrarrazões, os apelados dão combate às razões recursais e pedem o desprovimento do apelo (cf. Id nº 71877451 ao 71877454).

É o relatório.

Inclua-se o feito na pauta para julgamento.

Cuiabá/MT, 08 de fevereiro de 2021.

Des. JOÃO FERREIRA FILHO

Relator


V O T O

Exmoº. Sr. Des. JOÃO FERREIRA FILHO (Relator)

Egrégia Câmara:

O litigio visto nos autos gira em torno da executibilidade da CPR nº 06/07, emitida pelos embargantes/apelados e, mais tarde, chegando às mãos do embargado/apelante por meio de endosso, envolvendo discussão desde a validade do endosso até a prévia satisfação da obrigação, sendo necessário à exata compreensão e delimitação do litigio traçar o caminho trilado pela CPR até o presente momento.

Em 19.06.2007, os embargantes FRANCISCO e GENI DORS emitiram a Cédula de Produto Rural nº 06/07 em favor da empresa VIA FÉRTIL PRODUTOS AGROPECUÁRIOS LTDA, com a promessa de entrega futura de 975.240kg de grãos de soja até o dia 30.03.2008 (cf. Id. nº 71876999 ao 71877000 - pág. 2), tendo sido devidamente registrada sob o nº 3849 junto ao 1º SRI da comarca de Comodoro/MT (cf. Id. nº 71876952 - pág. 5).

Em 03.08.2007, a VIA FÉRTIL endossou o título à empresa SOLO VIVO INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE FERTILIZANTES LTDA (cf. Id. nº 71877000 - pág. 3 e 4); a operação foi averbada à margem do registro da CPR no dia 14.08.2007 (cf. Id. nº 71876952 - pág. 5).

Em 18.09.2007, a SOLO VIVO endossou o título ao embargado BANCO DAYCOVAL (cf. Id. nº 71877000 - pág. 5). Não houve averbação dessa operação.

Em 08.10.2007, a credora original VIA FÉRTIL encaminhou ao Cartório competente requerimento de baixa da CPR e cancelamento do seu registro, contendo a seguinte declaração: requer o cancelamento do registro de penhor cedular de primeiro grau, formalizado através do título de crédito Cédula de Produto Rural, tendo em vista que o emitente do título de crédito cumpriu com as obrigações (cf. Id. 71876953...

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