Acórdão nº 0002745-97.2016.8.11.0037 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Segunda Câmara de Direito Privado, 05-05-2021

Data de Julgamento05 Maio 2021
Case OutcomeProvimento em Parte
Classe processualCível - APELAÇÃO CÍVEL - CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Privado
Número do processo0002745-97.2016.8.11.0037
AssuntoContratos Bancários

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO


SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO


Número Único: 0002745-97.2016.8.11.0037
Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198)
Assunto: [Contratos Bancários]
Relator: Des(a).
SEBASTIAO DE MORAES FILHO


Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO DE MORAES FILHO, DES(A). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, DES(A). MARILSEN ANDRADE ADDARIO]

Parte(s):
[VERONICA FERREIRA DE SOUZA - CPF: 047.756.781-91 (APELADO), ANDRESA MARTIGNAGO DE SOUZA - CPF: 012.925.510-62 (ADVOGADO), ANDREA MARIA LACERDA PLAVIACK - CPF: 617.238.001-04 (ADVOGADO), BANCO BMG SA - CNPJ: 61.186.680/0001-74 (APELANTE), TAYLISE CATARINA ROGERIO SEIXAS - CPF: 175.904.358-30 (ADVOGADO), DIOGO IBRAHIM CAMPOS - CPF: 924.085.671-49 (ADVOGADO)]

A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
SEBASTIAO DE MORAES FILHO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO.

E M E N T A

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANOS MORAIS – CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO – FALHA NO DEVER DE INFORMAÇÃO CORRETA, CLARA, PRECISA E OSTENSIVA (CDC, ART. 31) – CONSUMIDOR QUE, ACREDITANDO ESTAR CONTRATANDO EMPRÉSTIMO CONSIGNADO, ADERIU A NEGÓCIO JURÍDICO DIVERSO – VÍCIO DE CONSENTIMENTO – NULIDADE CARACTERIZADA – CONVERSÃO DA OPERAÇÃO À MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO – JUROS REMUNERATÓRIOS ABUSIVOS – NECESSIDADE DE READEQUAÇÃO À TAXA MÉDIA DE MERCADO PREVISTO PELO BACEN PARA O PERÍODO – DESCONTOS INDEVIDOS DIRETAMENTE EM FOLHA DE PAGAMENTO DANO MORAL – NÃO CARACTERIZADO– MERO DISSABOR NÃO INDENIZÁVEL - REPETIÇÃO DE INDÉBITO NA FORMA SIMPLES - READEQUAÇÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAS - SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

1- Considerando que a autora, na qualidade de servidora pública, tinha ao seu alcance modalidade de empréstimo (consignado, com desconto em folha) com juros bem mais baratos do que os praticados por cartões de crédito, que, como cediço, é o mais caro do mercado, não haveria motivo sóbrio, capaz de justificar sua opção pela realização de saque no crédito rotativo do cartão de crédito.

2- A relação jurídica havida entre instituição financeira e o cliente é de natureza consumerista, regulamentada pelas normas do CDC (STJ, Súmula nº 297), exigindo-se, então, do fornecedor que dê informação adequada e clara da relação negocial (CDC, art. 6º, III), com especial cuidado e transparência quando o serviço se refira à outorga de crédito (CDC, art. 52), além de que, em todo caso, havendo margem para dúvida, as cláusulas serão sempre interpretadas de modo mais favorável ao consumidor (CDC, art. 47), e, no mais, tem-se a garantia técnico-processual de inversão do ônus da prova (CDC, art. 6º, VIII) e a responsabilidade objetiva do fornecedor por falha na prestação de serviço (CDC, art. 14).

2- Tratando-se de título contratual cuja redação é confusa, ambígua e enganosa, porque, ao fazer expressa referência às duas modalidades de contratação, deixa a situação imprecisa, como se a definição da natureza do negócio ficasse entregue ao modo operacional adotado pelo Banco para fazer a concessão do crédito, há de se reconhecer que o negócio em questão não guarda a clareza mínima necessária à adequada compreensão do serviço a ser contratado e disponibilizado.

3- “A falta de transparência e clareza do serviço bancário oferecido enseja à sua modulação para a espécie de empréstimo manifestada pela consumidora, devendo ser tratado como típico Contrato de Empréstimo Consignado, mediante juros remuneratórios de conformidade com as taxas praticadas no mercado à época da disponibilização”. (TJMT - Primeira Câmara de Direito Privado - RAC nº 1036200-19.2019.8.11.0041, Rel. Desª. Nilza Maria Possas De Carvalho, julgado em 29/07/2020, publicado no DJE 03/08/2020).

4- Não há dano moral indenizável no caso concreto, haja vista a inexistência de comprovação do dano real sofrido pela parte, já que a autora teve a clara intenção de contratar um empréstimo consignado. Logo, a simples cobrança indevida, por si só, não configura situação vexatória nem abalo psíquico, tratando-se, na verdade, de mero dissabor.

5-Com relação à repetição de indébito, a jurisprudência do STJ pacificou o entendimento de que a devolução em dobro dos valores cobrados indevidamente somente tem procedência se caracterizada má-fé do fornecedor do serviço. Sem que exista nos autos qualquer indicativo a imputar a má-fé, a restituição deve ocorrer de forma simples.

6- No que se refere à verba de sucumbência, tendo em vista a modificação de parte da decisão hostilizada, e verificando que ambas as partes forem vencidos e vencedores, o ônus sucumbenciais devem ser rateados em 50% entre as partes, sendo que cada litigante arcará com os honorários de seu patrono.

R E L A T Ó R I O

Egrégia Câmara:

Trata-se de Recurso de Apelação Cível interpostos por BANCO BMG S/A, contra a sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da Vara Única da Comarca de Primavera do Leste/MT, na ação declaratória de inexistência de Débito c/c indenização por danos morais e material nº 0002745-97.2016.8.11.0037, que restou assim consignado:

“Ante o exposto e por tudo o mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTE EM PARTE o pedido, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil, para: 1) DECLARAR a inexistência de débito entre as partes, referente ao empréstimo de n9AA1165149083 ( Termo defls. 81/82),- 2) CONDENAR a parte requerida ao pagamento de RS 5.000,00 (cinco mil reais) a titulo de indenizatório por danos morais acrescidos de correção monetaria pelo INPC, e juros simples de 1% ao mês a contar da prolação desta sentença; 3) CONDENAR a parte requerida a devolver as valores indevidamente descontados a partir de Janeiro de 2016 até 05 dias atuais no beneficio da requerente, na forma simples, acrescido de juros e correção monetária a partir da citação. Condeno a parte requerida ao pagamento das custas processuais e honorarios advocaticios, os quais fixo em RS 1000,00(mil reais), nos termos do artigo 85, §29, do Cédigo de Processo Civil. Após o trânsito em julgado, aguarde—se o decurso do prazo do artigo 611 da CNGC/MT e, nada sendo requerido, remetam-se os autos a CAA para arquivamento definitivo, com as baixas e anotações de estilo. Publique-se. Registre-se. intimem-se. Cumpra-se, expedindo o necessário, com as cautelas de estilo.

Em suas razões de recurso (id- 76080033 - Pág. 1 ), o BANCO BMG ora apelante, pugna pela reforma da sentença a quo, para tanto, (i) Defende a existência e validade da contratação do serviço de cartão de crédito pela autora/apelada, discorrendo sobre a legalidade da modalidade de cartão de crédito consignado; (ii) Fala que a parte autora/apelada contratou um cartão de crédito consignado, vinculado à sua conta corrente, tendo sido depositados R$ 6.086,00 (seis mil, oitenta e seis reais), e, além do saque comprovadamente realizado, fora ofertado o cartão de crédito BMG Card apto a ser utilizado em todo o comércio por meio da bandeira Mastercard;(iii) Sustenta que é incabível a condenação indenizatória por danos morais, que agiu no exercício regular de seu direito, visto que não cometeu qualquer ilícito ou falha na prestação de serviço, à ensejar qualquer obrigação reparatória”, e, depois, porque inexiste mínima prova do dano alegado, uma vez que “a parte Recorrida (não) produziu uma prova sequer de que os fatos narrados foram capazes de atingir o patrimônio e valores imateriais”. Alternativamente, pela redução do quantum

Contrarrazões apresentadas (id- 76080040 - Pág. 1), pugnando pelo desprovimento do recurso ora interposto.

É o relatório

V O T O R E L A T O R

Egrégia Câmara:

Conforme relatado, trata-se de Recurso de Apelação Cível interpostos por BANCO BMG S/A, contra a sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da Vara Única da Comarca de Primavera do Leste/MT, na ação declaratória de inexistência de Débito c/c indenização por danos morais e material nº 0002745-97.2016.8.11.0037, que julgou parcialmente procedente, a presente lide.

Inicialmente, a cerne da questão gira em torno de discussão quanto à validade do contrato de cartão de crédito consignado firmado entre partes e instrumentalizado por meio do “Termo de Adesão à Consignação em Folha de Pagamento para Empréstimo e Cartão de Crédito - Autorização para Desconto em Folha de Pagamento”, registrado sob o nº 2288615, que contém completa qualificação dos dados pessoais da autora e a sua assinatura ao final do documento, e, com a previsão de taxa de juros remuneratórios de 4,8% a.m. e 75,52% a.a. (Id. nº 76079965 - Pág. 1).

O fundamento central que alicerça a pretensão declaratória de nulidade deduzida...

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