Acórdão Nº 0002778-97.2017.8.24.0067 do Terceira Câmara Criminal, 27-10-2020

Número do processo0002778-97.2017.8.24.0067
Data27 Outubro 2020
Tribunal de OrigemSão Miguel do Oeste
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Criminal n. 0002778-97.2017.8.24.0067, de São Miguel do Oeste

Relator: Desembargador Leopoldo Augusto Brüggemann

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A FÉ PÚBLICA. ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR (ART. 311, CAPUT, DO CP). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSOS DEFENSIVOS.

PRELIMINAR ARGUIA PELA DEFESA DE C. AVENTADA NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA, EM VIRTUDE DA CONFECÇÃO DE LAUDO PERICIAL SOMENTE NA FASE INDICIÁRIA. VIOLAÇÃO DO ART. 155 DO CPP. INOCORRÊNCIA. PROVA NÃO REPETÍVEL, CONFORME RESSALVA O PRÓPRIO TEXTO LEGAL. DOCUMENTO REVESTIDO DE PRESUNÇÃO RELATIVA E DOTADO DE FÉ PÚBLICA. ADEMAIS, POSSIBILIDADE DE CONTRADITÓRIO DIFERIDO. CONTUDO, AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DA DEFESA EM MOMENTO OPORTUNO. PRECLUSÃO OPERADA. TESE RECHAÇADA.

Sendo as provas em que se fundamentou a sentença condenatória naturalmente irrepetíveis, haja vista serem documentais pré-constituídas, não haverá se falar em violação da vedação legal disposta no art. 155 do Código de Processo Penal, dada a exceção ali contida. [...]

Se os documentos e o laudo pericial que dão amparo à condenação foram juntados aos autos desde o oferecimento da denúncia pelo órgão ministerial, permitindo o exercício do contraditório diferido, não tendo o acusado se manifestado sobre o acervo probatório por decisão da própria defesa, não há se falar em lesão às garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa. [...] (Apelação Criminal n. 0009341-78.2018.8.24.0033, de Itajaí, rel. Sérgio Rizelo, Segunda Câmara Criminal, j. 26-02-2019).

ANÁLISE CONJUNTA DOS PLEITOS. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO POR AUSÊNCIA DE DOLO E DESCONHECIMENTO ACERCA DA ILEGALIDADE DA CONDUTA. NÃO CABIMENTO. AUTORIA E MATERIALIDADE DEMONSTRADAS. PROPRIETÁRIOS DE VEÍCULO SINISTRADO QUE CONTRATAM SERVIÇO MECÂNICO PARA O SEU CONSERTO. ADULTERAÇÃO DE CHASSI, ATRAVÉS DE PROCEDIMENTO DE IMPLANTE, EFETUADO PELO PROFISSIONAL SOB INEQUÍVOCO CONHECIMENTO DOS DONOS DO AUTOMÓVEL. CONFISSÃO DOS APELANTES, CORROBORADA PELAS DECLARAÇÕES DAS TESTEMUNHAS E PELO LAUDO PERICIAL, O QUAL ATESTA A CONTRAFAÇÃO. AUSÊNCIA DE DOLO NÃO DEMONSTRADA PELOS ACUSADOS. AGENTES COM NÍTIDA CONSCIÊNCIA DO COMETIMENTO DO CRIME. VEÍCULO ALIENADO LOGO APÓS O TÉRMINO DO SERVIÇO. CONJUNTO PROBATÓRIO INCONTESTE. SENTENÇA CONDENATÓRIA MANTIDA.

BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA. PEDIDO FORMULADO POR C. INVIABILIDADE DE ACOLHIMENTO. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICO-FINANCEIRA NÃO VERIFICADA. APELANTE QUE FORA ASSISTIDO POR DEFENSOR CONSTITUÍDO DURANTE O PROCESSO. MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS QUE SE IMPÕE.

RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0002778-97.2017.8.24.0067, da comarca de São Miguel do Oeste Vara Criminal em que são Apelantes Andrei da Silva Furlan e outros e Apelado Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

A Terceira Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer dos recursos e negar-lhes provimento, afastada a preliminar. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado no dia 27 de outubro de 2020, os Excelentíssimos Desembargadores Júlio César M. Ferreira de Melo e Getúlio Corrêa. Atuou pelo Ministério Público o Excelentíssimo Procurador de Justiça. Rui Arno Richter.

Florianópolis, 30 de outubro de 2020

Desembargador Leopoldo Augusto Brüggemann

Relator

RELATÓRIO

Na comarca de São Miguel do Oeste o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Andrei da Silva Furlan, Cristiano Lucas Dalri e Elizeo Dornelis Furlan, dando-os como incursos nas sanções do art. 311, caput, do Código Penal, pela prática da conduta assim descrita na inicial acusatória:

No período compreendido entre fevereiro de 2015 e novembro de 2015, na oficina de propriedade de Cristiano Lucas Dalri e Izabel da Silva Maciel, localizada no município de Paraíso (SC), Andrei da Silva Furlan, Cristiano Lucas Dalri e Elizeo Dornelis Furlan, de comum acordo (liame subjetivo), adulteraram sinal identificador de veículo automotor, por meio do expediente conhecido como implante/transplante, ao seccionarem a superfície suporte contendo a numeração do chassi do automóvel VW/Saveiro, cor branca, placas IJL0512/SC (chassi n. 9BWZZZ376YP512202) e remontando-a em monobloco ("carcaça") oriundo do veículo VW/Saveiro, placas IPW7528/PR, (chassi n. 9BWKB05W3AP016739).

Consta dos autos que o veículo VW/Saveiro, placas IJL0512, de propriedade de Elizeo Dornelis Furlan (mas registrado em nome de Cedenir Gheno Schaefer), esteve envolvido em acidente de trânsito quando conduzido pelo filho de Elizeo, Andrei da Silva Furlan.

Devido aos danos de grande monta, com vistas a reformar o veículo, o mesmo foi levado à oficina de Cristiano Lucas Dalri, pelo que as partes convencionaram em adquirir um monobloco de outro veículo semelhante, a fim de implantarem nele o chassi e outros componentes do veículo sinistrado por Andrei (p. 101-102).

Concluída a instrução do feito, a denúncia foi julgada procedente para condenar os acusados às penas de 3 (três) anos de reclusão, em regime inicial aberto, e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, em seu mínimo legal, por infração ao disposto no art. 311, caput, do Código Penal. A pena privativa de liberdade foi substituída por duas restritivas de direitos, a saber, prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária. Foi-lhes concedido o direito de apelar em liberdade (p. 225-264).

Irresignada, a defesa de Andrei e Elizeo interpôs recurso de apelação e pugnou pela absolvição por ausência de dolo, já que não possuíam conhecimento da ilegalidade (p. 246-250).

Também inconformada, a defesa de Cristiano interpôs recurso de apelação e requereu a anulação da decisão objurgada, ante a violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa, por inexistência de confecção de nova perícia na fase judicial. Subsidiariamente, postulou a absolvição ante a ausência de dolo em sua conduta. Por fim, pugnou a concessão do benefício da justiça gratuita (p. 283-294).

Juntadas as contrarrazões (p. 256-264 e p. 298-309), ascenderam os autos a esta instância, e a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Leonardo Felipe Cavalcanti Lucchese, opinou pelo conhecimento e não provimento dos recursos interpostos (p. 316-321).

Este é o relatório.


VOTO

Trata-se de recursos de apelação interpostos por Andrei da Silva Furlan, Elizeo Dornelis Furlan e Cristiano Lucas Dalri, contra decisão que julgou procedente a denúncia e os condenou às sanções previstas no art. 311, caput, do Código Penal.

Os apelos devem ser conhecidos, porquanto presentes os requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade.

Da preliminar de nulidade

Ab initio, insiste a defesa de Cristiano na nulidade da decisão objurgada, ante a violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa, em virtude da não elaboração de perícia na fase judicial, mas tão somente na etapa investigatória. Argumentou, ainda, que a condenação se baseou exclusivamente em prova oriunda do inquérito policial.

Pleito incabível.

Não se descura da vedação contida no texto legal quanto à fundamentação de sentença exclusivamente feita com fulcro nas provas produzidas na etapa indiciária, a teor do art. 155 do Código de Processo Penal. Contudo, a própria lei ressalva as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas, a exemplo dos exames periciais.

Os laudos periciais confeccionados por expert, os quais permitem, inclusive, o exercício do contraditório diferido, não carecem de repetição, salvo a existência de circunstâncias que demonstrem vício de nulidade, o que não ocorreu no caso concreto.

Nesse sentido, mutatis mutandis, colhe-se desta Corte:

APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO QUALIFICADO TENTADO (CP, ART. 155, § 4º, I, C/C O 14, II) E IDENTIDADE FALSA (CP, ART. 307). SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA DA DENÚNCIA. RECURSO DO ACUSADO. 1. AUTOATRIBUIÇÃO DE FALSA IDENTIDADE. 1.1. PROVA DOCUMENTAL PRÉ-CONSTITUÍDA. NATUREZA NÃO REPETÍVEL. 1.2. DOCUMENTOS E LAUDO PERICIAL. CONTRADITÓRIO DIFERIDO (CPP, ART. 155). 1.3. PROVA DA MATERIALIDADE E DA AUTORIA. DOCUMENTAÇÃO. LAUDO PERICIAL. [...] 1.1. Sendo as provas em que se fundamentou a sentença condenatória naturalmente irrepetíveis, haja vista serem documentais pré-constituídas, não haverá se falar em violação da vedação legal disposta no art. 155 do Código de Processo Penal, dada a exceção ali contida. 1.2. Se os documentos e o laudo pericial que dão amparo à condenação foram juntados aos autos desde o oferecimento da denúncia pelo órgão ministerial, permitindo o exercício do contraditório diferido, não tendo o acusado se manifestado sobre o acervo probatório por decisão da própria defesa, não há se falar em lesão às garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa. [...] (Apelação Criminal n. 0009341-78.2018.8.24.0033, de Itajaí, rel. Sérgio Rizelo, Segunda Câmara Criminal, j. 26-02-2019 - grifou-se).

No caso em tela, infere-se dos autos que o laudo pericial n. 9120.16.0023, agora contestado, foi devidamente produzido no Instituto Geral de Perícias - Núcleo Integrado de Perícias de Fronteira de São Miguel do Oeste, com brasão, selo de autenticidade e assinatura do perito criminal, profissional habilitado e possuidor de fé pública.

Da conclusão do exame, extrai-se:

Diante dos elementos apurados nos exames periciais, foram constatados indícios de implante da superfície suporte contendo a numeração do chassi. Há indícios de que a carcaça seja o veículo baixado 9BWKB05W3AP016739, placas IPW 7528, ou pelo menos partes desta.

Os indícios encontrados durante os exames periciais apontam compatibilidade de uso de peças do veículo IJL 0512 (motor e agregados deste). Não foi possível identificar a quais veículos pertencem a caixa de câmbio e os eixos. Foi possível constatar que o volante possui compatibilidade com o veículo IJL 0512.

Diante dos...

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