Acórdão Nº 0002809-36.2015.8.24.0052 do Segunda Turma Recursal, 25-08-2020

Número do processo0002809-36.2015.8.24.0052
Data25 Agosto 2020
Tribunal de OrigemPorto União
ÓrgãoSegunda Turma Recursal
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão



ESTADO DE SANTA CATARINA

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA

Segunda Turma Recursal



Apelação n. 0002809-36.2015.8.24.0052, de Porto União

Relator: Juiz Marco Aurélio Ghisi Machado

APELAÇÃO CRIMINAL. DESTRUIR VEGETAÇÃO SECUNDÁRIA, EM ESTÁGIO MÉDIO DE REGENERAÇÃO, DO BIOMA MATA ATLÂNTICA (ART. 38-A DA LEI DOS CRIMES AMBIENTAIS). SENTENÇA ABSOLUTÓRIA DIANTE DA INEXISTÊNCIA DE PROVA PERICIAL A COMPROVAR A MATERIALIDADE DELITIVA. ART. 386, VII, DO CPP. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. MATERIALIDADE DELITIVA E AUTORIA DEVIDAMENTE COMPROVADAS COM BASE NA NOTÍCIA DE INFRAÇÃO PENAL AMBIENTAL, CROQUI, AUTO DE CONSTATAÇÃO AMBIENTAL, RELATÓRIO DE VISTORIA, ALÉM DA PROVA TESTEMUNHAL E DA CONFISSÃO DO ACUSADO. PRESCINDIBILIDADE DE LAUDO PERICIAL DIANTE DAS OUTRAS PROVAS QUE CORROBORAM A OCORRÊNCIA DO DANO AMBIENTAL. CONDENAÇÃO QUE SE IMPÕE. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL NA MODALIDADE RETROATIVA. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. CONHECIMENTO DE OFÍCIO. LAPSO PRESCRICIONAL TRANSCORRIDO ENTRE A DATA DO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA E O PRESENTE ACÓRDÃO CONDENATÓRIO. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. "[...] PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL NA MODALIDADE RETROATIVA NO QUE CONCERNE AO DELITO PREVISTO NO ART. 38-A DA LEI N. 9.605/98. TRANSCURSO DE LAPSO TEMPORAL SUPERIOR A 4 (QUATRO) ANOS ENTRE O RECEBIMENTO DA DENÚNCIA E O PRESENTE ACÓRDÃO CONDENATÓRIO. EXTINÇÃO, EX OFFICIO, DA PUNIBILIDADE NA FORMA DOS ARTS. 107, IV, E 109, V, E 110, § 1º, TODOS DO CÓDIGO PENAL. [...] (TJSC, Apelação Criminal n. 0010299-56.2015.8.24.0005, de Balneário Camboriú, rel. Sidney Eloy Dalabrida, Quarta Câmara Criminal, j. 04-06-2020)." RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.


Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n. 0002809-36.2015.8.24.0052, da comarca de Porto União Vara Criminal, em que é Apelante Ministério Público do Estado de Santa Catarina, e Apelado Clecio Antonio Baum:

A Segunda Turma Recursal decidiu conhecer o recurso e dar-lhe provimento, a fim de condenar o réu ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de detenção, em regime aberto, substituída por restritivas de direito, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária, em razão da prática do delito previsto no art. 38-A da Lei n. 9.605/98, declarando-se, de ofício, a prescrição da pretensão punitiva na modalidade retroativa.

Sem custas e honorários advocatícios.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Juízes de Direito Margani de Mello e Vitoraldo Bridi.



Florianópolis, 25 de agosto de 2020.




Marco Aurélio Ghisi Machado

Relator





RELATÓRIO


Com base no art. 46 da Lei n. 9.099/95, art. 63, § 1º, do Regimento Interno das Turmas Recursais de Santa Catarina e Enunciado 92 do FONAJE, dispensa-se o relatório.


VOTO


Presentes os requisitos de admissibilidade, o presente recurso deve ser conhecido.

Na sentença recorrida, o acusado restou absolvido na forma do art. 386, II, do Código de Processo Penal, uma vez que não houve prova pericial a fim de comprovar a materialidade do delito.

Todavia, consoante as razões recursais, a decisão da juíza a quo merece reforma.

Trata-se de ação penal pública ajuizada pelo Ministério Público em face de Clesio Antonio Baum, imputando-lhe a prática do seguinte crime ambiental:

"Art. 38-A. Destruir ou danificar vegetação primária ou secundária, em estágio avançado ou médio de regeneração, do Bioma Mata Atlântica, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção:

Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente."

A respeito do Bioma da Mata Atlântica, a Lei n. 11.428/06 dispõe:

"Art. 2º Para os efeitos desta Lei, consideram-se integrantes do Bioma Mata Atlântica as seguintes formações florestais nativas e ecossistemas associados, com as respectivas delimitações estabelecidas em mapa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, conforme regulamento: Floresta Ombrófila Densa; Floresta Ombrófila Mista, também denominada de Mata de Araucárias; Floresta Ombrófila Aberta; Floresta Estacional Semidecidual; e Floresta Estacional Decidual, bem como os manguezais, as vegetações de restingas, campos de altitude, brejos interioranos e encraves florestais do Nordeste.

Parágrafo único. Somente os remanescentes de vegetação nativa no estágio primário e nos estágios secundário inicial, médio e avançado de regeneração na área de abrangência definida no caput deste artigo terão seu uso e conservação regulados por esta Lei."

Ainda, de acordo com o art. 4º da Lei n. 11.428/06, a Resolução nº 4 do CONAMA traz a definição de vegetação secundária:

"Art. 2o Vegetação secundária ou em regeneração é aquela resultante dos processos naturais de sucessão, após supressão total ou parcial da vegetação primária por ações antrópicas ou causas naturais, podendo ocorrer árvores remanescentes da vegetação primária."

Quanto à questão de prescindibilidade ou não de prova técnica para definir o crime em questão, por mais que haja divergência jurisprudencial, diante da especificidades dos delitos ambientais, o melhor entendimento é aquele de não haver a necessidade se a materialidade delitiva puder ser extraída de outros elementos contidos nos autos.

Nesse sentido, cita-se do Superior Tribunal de Justiça:

"AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO PENAL. CRIME AMBIENTAL. MATERIALIDADE. LAUDO PERICIAL. PROVA SUPRIDA POR OUTROS MEIOS. AUTORIA. RESPONSABILIDADE PENAL DO SÓCIO ADMINISTRADOR.

1. Resta suficientemente demonstrada a materialidade delitiva com base na notícia de infração penal ambiental, no auto de infração ambiental, no termo de embargo, no levantamento fotográfico, no auto de constatação, bem como nos depoimentos dos policiais militares que evidenciam o corte de arvores nativas do Bioma Mata Atlântica em estágio médio de regeneração, sendo dispensável a elaboração de laudo por perito oficial mormente se os autores provocaram incêndio na floresta para a limpeza do local, comprometendo assim os vestígios deixados pelo delito e impossibilitando ou dificultando a perícia.

2. A responsabilidade penal do sócio-administrador e da pessoa jurídica resta regularmente demonstrada na hipótese em que este concorre para a realização do crime ordenando a limpeza do terreno e mais, sabendo da prática da conduta típica descrita no artigo 38A da Lei nº 9.605/98 pelo seu preposto, deixou de agir quando podia e devia para evitá-la.

3. Agravo regimental improvido." (AgRg no REsp 1601921/SC, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 06/09/2016, DJe 16/09/2016)

No mesmo sentido, menciona-se do Tribunal de Justiça de Santa Catarina:

"Apelação Criminal. cRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE. DESTRUIR OU DANIFICAR VEGETAÇÃO PRIMÁRIA OU SECUNDÁRIA, EM ESTÁGIO AVANÇADO OU MÉDIO DE REGENERAÇÃO, DO BIOMA MATA ATLÂNTICA, com espécies ameaçadas de extinção (ART. 38-A, CAPUT, C/C ART. 53, II, AMBOS DA LEI N. 9.605/1998). SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. RECURSO DA ACUSAÇÃO. PRETENSA CONDENAÇÃO. CABIMENTO. TERMO CIRCUNSTANCIADO DE OCORRÊNCIA AMBIENTAL E RELATO DOS POLICIAIS MILITARES QUE ATENDERAM A OCORRÊNCIA ATESTANDO A DESTRUIÇÃO DE VEGETAÇÃO NATIVA, CONSISTENTE EM 59 ARAUCÁRIAS, AS QUAIS INTEGRAM BIOMA DE MATA ATLÂNTICA, INCLUSIVE, AMEAÇADAS DE EXTINÇÃO. CONFISSÃO DO ACUSADO EM AMBAS AS FASES JUDICIAIS. LAUDO PERICIAL SUPRIDO POR OUTROS ELEMENTOS DE PROVA. PRESCINDIBILIDADE NA HIPÓTESE. MUDANÇA DE POSICIONAMENTO EM ATENÇÃO AO ENTENDIMENTO MAJORITÁRIO DESTA CORTE. CONTEXTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. CONDENAÇÃO MANTIDA. DECLARAÇÃO, DE OFÍCIO, DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DO ESTADO, NA MODALIDADE RETROATIVA. PENA FIXADA EM 1 (UM) ANO E 2 (DOIS) MESES DE DETENÇÃO. LAPSO TEMPORAL SUPERIOR A 4 (QUATRO) ANOS ENTRE O RECEBIMENTO DA DENÚNCIA (28/04/2015) E O PRESENTE JULGAMENTO. INTELIGÊNCIA DO ARTS. 107, IV, 109, V, e 110, § 1º, DO CP. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO." (TJSC, Apelação Criminal n. 0000244-06.2015.8.24.0083, de Correia Pinto, rel. Des. Leopoldo Augusto Brüggemann, Terceira Câmara Criminal, j. 16-06-2020).

Por fim, aponta-se das Turmas Recusais de Santa Catarina:

"APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME AMBIENTAL (ART. 48, DA LEI N. 9.605/98). LAUDO PERICIAL. REALIZADO POR POLICIAIS MILITARES. LEGALIDADE. MILICIANOS QUE POSSUEM FORMAÇÃO NA ÁREA E EXPERIÊNCIA. AUSÊNCIA DE PROVA EM CONTRÁRIO PELO APELANTE. ÔNUS QUE LHE COMPETIA. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADA. ATENUANTE GENÉRICA. AUSÊNCIA DE PROVAS. SENTENÇA CONFIRMADA PELOS SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. "AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO PENAL. CRIME AMBIENTAL. MATERIALIDADE. LAUDO PERICIAL. PROVA SUPRIDA POR OUTROS MEIOS. AUTORIA. RESPONSABILIDADE PENAL DO SÓCIO ADMINISTRADOR. 1. Resta suficientemente demonstrada a materialidade delitiva com base na notícia de infração penal ambiental, no auto de infração ambiental, no termo de embargo, no levantamento fotográfico, no auto de constatação, bem como nos depoimentos dos policiais militares que evidenciam o corte de arvores nativas do Bioma Mata Atlântica em estágio médio de regeneração, sendo dispensável a elaboração de laudo por perito oficial mormente se os autores provocaram incêndio na floresta para a limpeza do local, comprometendo assim os vestígios deixados pelo delito e impossibilitando ou dificultando a perícia. 2. A responsabilidade penal do sócio-administrador e da pessoa jurídica resta regularmente demonstrada na...

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