Acórdão Nº 0002897-09.1998.8.24.0040 do Terceira Câmara de Direito Público, 08-02-2022

Número do processo0002897-09.1998.8.24.0040
Data08 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0002897-09.1998.8.24.0040/SC

RELATOR: Desembargador JAIME RAMOS

APELANTE: MUNICÍPIO DE LAGUNA/SC (EXEQUENTE) APELADO: ALBERTINA MANOEL REMOUR (EXECUTADO)

RELATÓRIO

Na Comarca de Laguna, o respectivo Município, no dia 23/7/1998, propôs execução fiscal contra Albertina Manoel Remour, pretendendo cobrar a dívida tributária inscrita na Certidões de Dívida Ativa ns. 5903, 5904, 5905 e 5906, relativa a IPTU dos exercícios de 1992 a 1996.

A parte executada compareceu aos autos, mas, embora tenha parcelado administrativamente a dívida, não a quitou integralmente nem garantiu o saldo remanescente.

O Município exequente foi intimado da determinação de suspensão do processo (Evento 50, PET61) e, na sequência, os autos foram arquivados.

O MM. Juiz, no dia 23/8/2021, reconheceu a ocorrência da prescrição intercorrente e, com base no arts. 487, inciso II, e 924, inciso V, do Código de Processo Civil, julgou extinto o processo, sem impor condenação ao pagamento de custas e de honorários advocatícios.

Inconformado, o Município interpôs recurso de apelação alegando que haveria nulidade de fundamentação na sentença, na medida em que "o MM Juízo a quo proferiu a decisão reconhecendo a prescrição intercorrente levando em conta apenas e tão somente o tempo de paralização do processo sem analisar, contudo, o motivo que teria ensejado tal paralização, que poderia não ser imputável à parte exequente"; que a decisão recorrida deve ser reformada para prosseguimento da demanda executiva fiscal, haja vista que a Fazenda Pública não foi previamente ouvida antes da decretação da prescrição intercorrente, em clara violação ao disposto no § 4º do art. 40 da Lei Federal n. 6.830/1980 (Lei de execução Fiscal - LEF); e que não se verifica nos autos qualquer lapso quinquenal decorrente de inércia imputável ao município exequente, que pudesse justificar a decretação da prescrição intercorrente. Requereu, no fim, o provimento do recurso a fim de que seja cassada a sentença extintiva, determinando-se o regular prosseguimento da execução fiscal.

Sem contrarrazões, os autos ascenderam a esta Corte de Justiça.

VOTO

Da ausência de intervenção do Ministério Público

Imperativo registrar, inicialmente, que a ausência de intervenção do Ministério Público no feito se deve ao contido no art. 178, do Código de Processo Civil, e nos arts. 127 e 129, da Constituição Federal.

Ademais, de acordo com o enunciado da Súmula 189, do Superior Tribunal de Justiça, "é desnecessária a intervenção do Ministério Público nas execuções fiscais".

Não se pode olvidar, ainda, que a douta Procuradoria-Geral de Justiça do Estado de Santa Catarina, com fundamento no Ato n. 103/04/MP, racionalizou a intervenção do Ministério Público no processo civil, orientando seus membros a intervir somente naqueles casos em que se evidencia o interesse público.

A interpretação que se faz desse Ato, no âmbito do Ministério Público, como se tem visto em diversos processos, é a de que na execução fiscal e respectivos embargos, não há interesse público a justificar a intervenção do órgão ministerial, na medida em que a Fazenda Pública se encontra bem representada por seu Procurador, que tem envidado os necessários esforços para defendê-la na ação.

Por isso, é desnecessária a remessa do recurso à douta Procuradoria-Geral da Justiça.

Da alegada nulidade da sentença

Aduz a parte apelante que a sentença é nula, porque "em descompasso com o disposto no art. 489, §1 do CPC, especialmente o inciso II, conclui-se que o MM. Juízo 'a quo' não fundamentou suficientemente a sentença, eis que decretou a prescrição sem analisar os atos e fatos atrelados especificamente ao processo, utilizando-se de conceitos indeterminados".

Razão não lhe assiste.

Isso porque a sentença combatida foi clara ao definir que, "compulsando os autos, verifica-se que estes se encontram administrativamente arquivados, sem qualquer impulso ou manifestação das partes, há mais de cinco anos, permanecendo sem qualquer garantia do juízo, até a presente data. Assim, considerando que o prazo de suspensão do artigo 40 da Lei 6.830/80 inicia-se automaticamente a partir do momento da não localização dos bens penhoráveis, com base no julgado extraído do Recurso Especial n. 1.340.553/RS (submetido à sistemática repetitiva), configurada está a ocorrência da prescrição intercorrente, a qual pode inclusive ser declarada de ofício".

Tal fundamentação, embora sucinta, é clara o suficiente para indicar os motivos que levaram à extinção do processo em razão da nítida caracterização da prescrição intercorrente no caso em concreto.

Por isso é que não há como falar em nulidade da sentença decorrente de ausência de fundamentação válida, na medida em que não veicula qualquer tipo de mácula capaz de nulificá-la, pois os pontos necessários à formação e entrega da prestação jurisdicional foram devidamente observados.

Consoante o art. 93, inciso IX, da Carta Magna, "todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade [...]".

Em relação aos elementos da sentença, o art. 489, § 1º, inciso IV, determina que:

Art. 489. São elementos essenciais da sentença:(...)§ 1o Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:(...)IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;

Afere-se do dispositivo processual acima transcrito que constitui elemento obrigatório da sentença o enfrentamento de "todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador", no sentido de que "tem como objetivo afastar da exigência de enfrentamento os argumentos irrelevantes e impertinentes ao objeto da demanda, liberando o juiz da atividade valorativa inútil" (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Processo Civil Comentado. Salvador: Editora JusPodivm, 2016; p. 811 - grifou-se).

E, como se observa da sentença objurgada, o MM. Juiz apreciou adequadamente todos os pontos cruciais colocados em campo para a devida apreciação da causa e formação da prestação jurisdicional, sendo despiciendo que não tenham sido apreciados todo os pontos arguidos pela parte demandante em suas manifestações nos autos, até porque "é importante perceber, porém, que o art. 489, § 1.º, IV, não visa a fazer com que o juiz rebata todo e qualquer argumento invocado pelas partes no processo. O Poder Judiciário tem o dever de dialogar com a parte a respeito dos argumentos capazes de determinar por si só a procedência ou improcedência de um pedido - ou de determinar por si só o conhecimento, não conhecimento, provimento ou desprovimento de um recurso. Isso quer dizer que todos os demais argumentos só precisam ser considerados pelo juiz com o fim de demonstração de que não são capazes de determinar conclusão diversa daquela adotada pelo julgador" (MARINONI. Luis Guiherme. O novo processo civil. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016; p. 324).

DANIEL AMORIM ASSUMPÇÃO NEVES complementa:

Entendo que o Novo Código de Processo Civil manteve o sistema da valoração do livre convencimento motivado, anteriormente previsto no art. 131 do CPC/1973 e atualmente consagrado no art. 371 do Novo CPC, não me impressionando com a supressão de todas as referências ao termo livre convencimento e outras expressões em sentido parelho.Há certa confusão nesse entendimento porque o sistema de livre convencimento motivado tradicionalmente é vinculado à parte fática da decisão, de forma que as novas exigências de fundamentação quanto à parte jurídica não têm aptidão para alterar o sistema de valoração de provas adotado por nosso sistema processual.Afirmar que a mudança legislativa leva ao respeito às decisões dos tribunais superiores ou a exigência de que o juiz enfrente todas as questões arguidas pelas partes demonstram bem a confusão entre a valoração da prova e a fundamentação jurídica da decisão (Novo Código de Processo Civil Comentado. Salvador: Editora JusPodivm, 2016; p. 650).

Nesse rumo, escorados nas diretrizes do livre convencimento motivado, os fundamentos devem estar firmados a partir dos argumentos dialéticos apresentados pelas partes, que constituem necessária relevância para a análise interpretativa necessária à formação da prestação jurisdicional, não se podendo entender por nula a sentença que, de modo conciso e suficiente, aprecia todos os pontos relevantes necessários à resolução da causa colocada à apreciação do Poder Judiciário.

A propósito, colhe-se da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. PROCESSUAL CIVIL. NULIDADE DE SENTENÇA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. ARTIGO 93, IX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INOCORRÊNCIA. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DESTE TRIBUNAL. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO (STF, AG. REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO...

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