Acórdão Nº 0002986-46.2008.8.24.0019 do Primeira Câmara de Direito Civil, 22-10-2020

Número do processo0002986-46.2008.8.24.0019
Data22 Outubro 2020
Tribunal de OrigemConcórdia
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0002986-46.2008.8.24.0019

Relator: Des. Gerson Cherem II

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL. RECURSO DAS RÉS.

COMPRA E VENDA. MÁQUINA DE BRONZEAMENTO ARTIFICIAL.

1) DEMANDA PROPOSTA EM FACE DAS PESSOAS QUE ALIENARAM O APARELHO À AUTORA. AVENTADA ILEGITIMIDADE PASSIVA DE UMA DAS RÉS. PRELIMINAR QUE SE CONFUNDE COM O MÉRITO.

"A legitimidade da parte está interligada à pertinência subjetiva da ação e, por isso, não pode confundir-se com a matéria de fundo (objeto da ação). Diante disso, a ilegitimidade é de ser reconhecida quando não paire sobre ela qualquer dúvida da pertinência subjetiva da ação proposta. Ou seja, quando existir qualquer indício de que a fundamentação da ilegitimidade será confundida com o mérito, não é de ser reconhecida, devendo sua análise ser postergada.[...]". (AC n. 2009.006734-4, rel. Des. Ricardo Roesler, j. em 29.07.2009).

2) VENDA DE MÁQUINA DE BRONZEAMENTO ARTIFICIAL. EQUIPAMENTO USADO. ALEGADA SUPERVENIÊNCIA DE DEFEITO POR FALTA DE MANUTENÇÃO DA COMPRADORA. DESCABIMENTO. COMPROVAÇÃO DE PROBLEMAS PREEXISTENTES À TRANSAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE FATO IMPEDITIVO, MODIFICATIVO OU EXTINTIVO DO DIREITO DA AUTORA (ART. 373, II, DO CPC/15). DEVER DE INDENIZAR MANTIDO. TESE RECHAÇADA.

3) HONORÁRIOS RECURSAIS EM PROL DA APELADA. ACRÉSCIMO DE 5% (CINCO POR CENTO) NESTE GRAU DE JURISDIÇÃO.

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0002986-46.2008.8.24.0019, da comarca de Concórdia 1ª Vara Cível em que é Apelante Ivanir Cassel e outro e Apelado Nair da Silva.

A Primeira Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, 1) conhecer do recurso e negar-lhe provimento; 2) fixar os honorários sucumbenciais apelatórios em favor da recorrida, no importe de 5% (cinco por cento) do valor atualizado da condenação. Custas pelas apelantes.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido por este Relator, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Raulino Jacó Brüning e o Exmo. Sr. Des. Saul Steil.

Florianópolis, 22 de outubro de 2020.

Gerson Cherem II

PRESIDENTE E RELATOR


RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por Ivanir Cassel e Ana Paula Cassel, irresignadas com a sentença prolatada pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Concórdia que, nos autos da ação de indenização aforada por Nair da Silva, julgou parcialmente procedentes os pleitos iniciais, nos seguintes termos (fl. 405):

Ante o exposto, com fulcro no art. 487, I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por Nair da Silva contra Ivanir Cassel e Ana Paula Cassel, para o fim de condenar as rés, solidariamente, a pagar a autora a quantia de R$ 7.284,80 (sete mil duzentos e oitenta e quatro reais e oitenta centavos), relativamente ao conserto da câmara de bronzeamento marca Solare D. Lapolli-II, valor este que deverá ser corrigido monetariamente pelo INPC a contar de 28/05/2008 (fl. 39), bem como sofrer a incidência de juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação válida (10/06/2008 - fl. 34-verso).

Por outro lado, indefiro o pedido de lucros cessantes.

Considerando que a parte autora decaiu de parte mínima do pedido, levando em conta o montante ganho (danos emergentes) em oposição ao valor que deixou de ter ganho de causa (lucros cessantes), condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais na razão de 50% para cada uma, bem como honorários advocatícios de sucumbência ao procurador da autora, os quais fixo em 15% sobre o valor atualizado da condenação, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC.

Inconformadas, as rés recorreram, arguindo preliminarmente a ilegitimidade passiva de Ana Paula Cassel. No mérito, afirmaram ser de responsabilidade exclusiva da adquirente a manutenção do equipamento. Argumentaram ainda que, por ocasião da avença, a câmara de bronzeamento artificial estava funcionando sem qualquer vício. Eventualmente, pugnaram pela exclusão dos valores empregados na manutenção e reparos obrigatórios da máquina. Ao final, pugnaram pela fixação de honorários recursais (fls. 408/427).

Com contrarrazões (fls. 432/435), ascenderam os autos a este Sodalício.

É o relatório.

VOTO

Presentes os requisitos legais, conhece-se do recurso.

1) Da ilegitimidade passiva 'ad causam':

Arguem as apelantes, em preliminar, a ilegitimidade passiva ad causam da ré Ana Paula Cassel, alegando que "a segunda apelada não detinha posse ou qualquer outra condição ao exercício de propriedade sob a cama de bronzeamento" (fl. 413).

O intento, entretanto, malogra.

No caso, revela-se inconteste o fato de que a Sra. Ana Paula, filha da corré Ivanir, foi a responsável pela entrega do produto e a signatária do recibo de pagamento (fl. 175), possuindo vínculo com o negócio entabulado. Neste norte, subsiste a pertinência subjetiva da ré Ana Paula para responder à ação.

Tocante à responsabilidade da demandada, a proemial aventada confunde-se com o mérito, e, por esta razão, ambos serão apreciados conjuntamente, pois o objeto do presente recurso cuida de verificar quem seria responsável pelo dano material.

Julgou o Tribunal, mutatis mutandis:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM ÓRGÃO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. EXTINÇÃO DA AÇÃO POR ILEGITIMIDADE PASSIVA. AUSÊNCIA DE CERTEZA SOBRE POSSÍVEL RESPONSABILIDADE DA RÉ/APELANTE, NO QUE SE REFERE AOS FATOS ARTICULADOS NA INICIAL. QUESTÃO QUE EXTRAPOLA O LIMITE DA CONDIÇÃO DA AÇÃO. MATÉRIA QUE SE CONFUNDE COM O MÉRITO (RESPONSABILIDADE CIVIL). RECONHECIMENTO PREMATURO DA SUPOSTA ILEGIMIDADE PASSIVA. RECURSO PROVIDO. SENTENÇA ANULADA.

A legitimidade da parte está interligada à pertinência subjetiva da ação e, por isso, não pode confundir-se com a matéria de fundo (objeto da ação). Diante disso, a ilegitimidade é de ser reconhecida quando não paire sobre ela qualquer dúvida da pertinência subjetiva da ação proposta. Ou seja, quando existir qualquer indício de que a fundamentação da ilegitimidade será confundida com o mérito, não é de ser reconhecida, devendo sua análise ser postergada[...]" (AC n. 2009.006734-4, rel. Des. Ricardo Roesler, j. em 29.07.2009).

Vencida a prefacial, passa-se, então, ao exame do mérito apelatório.

2) Da responsabilidade civil das rés:

As insurgentes sustentam ser indevida a indenização, porque o equipamento foi vistoriado pela compradora quando da aquisição e encontrava-se em "ótimo estado de funcionamento" (fl. 411). A partir daí, cabia exclusivamente à adquirente sua manutenção. Alegam ainda que a garantia de três meses, anotada no recibo (fl. 175), foi inserida pela autora posteriormente ao negócio. Pontuaram que, malgrado a declaração unilateral e extrajudicial do técnico, inexistia vício no produto (fls. 408/427).

Buscam, assim, ver afastada a responsabilidade pelo ressarcimento dos valores gastos pela demandante com o conserto, argumentando que "não possuem o dever legal de indenizar as manutenções da cama de bronzeamento realizadas posteriormente à entrega do produto, posto que os documentos juntados à inicial trata-se de meras manutenções " (fl. 426).

Razão, contudo, não lhes assiste.

Na espécie, resta incontroverso que a postulante adquiriu, no dia 06.02.2008 (fl. 410), uma câmara de bronzeamento artificial pelo valor de R$ 12.000,00 (doze mil reais), negociada com Ivanir Cassel e entregue à adquirente em sua residência por Ana Paula Cassel (fl. 411). Neste local, foi efetuado o pagamento e firmado o recibo de quitação (fl. 175).

Esclarece a recorrida que o produto vendido, embora funcionasse (audiovisual - fl. 309), apresentou problemas um mês após a compra, ensejando a necessidade de reparos da ordem de R$ 7.284,00 (sete mil ,duzentos e oitenta e quatro reais - fl. 12).

Sem que as rés promovessem o conserto, a autora ajuizou a presente demanda para reaver aquele prejuízo.

Em abono à pretensão, a demandante trouxe aos autos recibo de quitação (fls. 11), nota fiscal dos valores pagos para a reparação do equipamento (fl. 39), além de informe emitido pelo técnico que prestava o serviço de manutenção (fl. 13).

Da declaração emitida pelo profissional, extrai-se:

Declaro para fins de direito e ponho-me a disposição do juízo para quáquer melhor esclarecimento que a máquina de bronzeamento adquirida pela Sra. Nair da Silva, das Sras. Ivanir Cassel e Ana Paula Cassel, em data de 06 de fevereiro de 2008, já possuía problemas em seu funcionamento na placa e nos reatores, bem como as lâmpadas estavam com sua capacidade funcional exaurida.

Tais problemas foram constatados em vistoria realizada ainda quando a referida máquina pertencia a Sra. Ivanir Cassel e Ana Paula Cassel. Esta situação lhes foi informada quando visitei seu estabelecimento para dar assistência a referida máquina, na cidade de Arabutã, SC. (Grifou-se).

Emerge inconcusso, portanto, que a máquina apresentava problemas preexistentes à venda, os quais, de acordo com o relato do técnico, eram conhecidos pelas rés.

Reza o Código Civil:

Art. 441. A coisa recebida em virtude de contrato comutativo pode ser enjeitada por vícios ou defeitos ocultos, que a tornem imprópria ao uso a que é destinada, ou lhe diminuam o valor.

Parágrafo único. É aplicável a disposição deste artigo às doações onerosas.

Art. 442. Em vez de rejeitar a coisa, redibindo o contrato ( art. 441 ), pode o adquirente reclamar abatimento no preço.

Art. 443. Se o alienante conhecia o vício ou defeito da coisa, restituirá o que recebeu com perdas e danos; se o não conhecia, tão-somente restituirá o valor recebido, mais as despesas do contrato.

Art. 444. A responsabilidade do alienante subsiste ainda que a coisa pereça em poder do alienatário, se perecer por vício oculto, já existente ao tempo da tradição.

Art. 445. O adquirente decai do direito de obter a redibição ou abatimento no preço no prazo de trinta dias se a coisa for móvel, e de um ano se for imóvel,...

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