Acórdão nº 0003065-62.2015.8.11.0012 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Primeira Câmara Criminal, 15-12-2022

Data de Julgamento15 Dezembro 2022
Case OutcomeProvimento em Parte
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Data de publicação18 Dezembro 2022
Classe processualCriminal - APELAÇÃO CRIMINAL - CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS
Número do processo0003065-62.2015.8.11.0012
AssuntoEstupro de vulnerável

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL


Número Único: 0003065-62.2015.8.11.0012
Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417)
Assunto: [Estupro de vulnerável]
Relator: Des(a).
MARCOS MACHADO


Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS MACHADO, DES(A). ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, DES(A). PAULO DA CUNHA]

Parte(s):
[MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (REPRESENTANTE), JOAO VITOR ALVES DOS REIS - CPF: 484.830.956-53 (APELANTE), JOAO BATISTA CAVALCANTE DA SILVA - CPF: 086.628.191-68 (ADVOGADO), SEBASTIAO CARLOS TOLEDO - CPF: 510.750.248-20 (ADVOGADO), H. H. R. D. O. (VÍTIMA), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)]

A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
MARCOS MACHADO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO.

E M E N T A

EMENTA

APELAÇÃO CRIMINAL - ESTUPRO DE VULNERÁVEL MAJORADO [AVÔ POR AFINIDADE] EM CONTINUIDADE DELITIVA - INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA PARA CONDENAÇÃO - DECLARAÇÃO DA VÍTIMA E DEPOIMENTOS JUDICIAIS DOS INFORMANTES - RELATÓRIO DE ESTUDO PSICOSSOCIAL - ESTUPRO DE VULNERÁVEL ATRIBUÍDO AO APELANTE COMPROVADO - CONDENAÇÃO PRESERVADA - CAUSA DE AUMENTO - PARENTESCO POR AFINIDADE - APELANTE E VÍTIMA NÃO RESIDIAM NO MESMO ENDEREÇO - APELANTE NÃO RECEBIA TRATAMENTO COMO AVÔ PELA VÍTIMA - EFETIVO EXERCÍCIO DE AUTORIDADE OU INFLUÊNCIA DO VÍNCULO DE PARENTESCO PARA A EXECUÇÕES DOS CRIMES NÃO EVIDENCIADO - PENA IMPOSTA - REGIME FECHADO - JULGADOS DO STJ, TJMT E TJDFT - RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE PARA READEQUAR A PENA DO APELANTE.

A narrativa infantil tem valor probante quando se mostrar consistente e harmônica com outros elementos de provas (TJMT, Ap nº 5553/2010; AP NU 0004804-59.2010.8.11.0040) e somente deve ser relativizada ou até desconsiderada quando: a) a imaturidade orgânica da criança implicar em imaturidade funcional, ocasionando desenvolvimento psíquico incompleto; b) a imaginação atuar de forma dúplice, como meio de defesa (mentira defensiva ou interesseira) ou de satisfação de desejos (brinquedos fantasiosos); c) houver sugestibilidade acentuada das crianças; d) existir imaturidade moral. (TJDFT, AP nº 20090111884089)

“Não se olvida que nos crimes às ocultas, sobretudo nos delitos sexuais, a palavra da vítima possui fundamental importância, como elemento de convicção do magistrado, quando em consonância com as demais provas existentes nos autos. Deve ser valorada a palavra da vítima que, apesar da pouca idade, se mostrou firme e coerente em todas as oportunidades em que foi inquirida. Não sendo verossímil a versão apresentada pelo réu, não pode ela ser considerada para fins de absolvição.” (AP NU 0005223-05.2017.8.11.0050)

“A materialidade e a autoria restaram suficientemente comprovadas pelo depoimento da vítima, a qual foi amparada pelas demais provas carreadas aos autos, que confirmam o constrangimento a que foi submetida pelo réu. Ademais, o depoimento do ofendido se mostra consistente, despidos de incertezas ou indícios de que a menor teria qualquer motivo de vingança, antipatia, interesse econômico ou outros menos honrosos para imputar ao acusado a prática de crime tão grave.3 - Nos crimes contra a dignidade sexual a palavra da vítima assume especial relevância, se coerente e em consonância com as demais provas coligidas nos autos, como é o caso da hipótese vertente. Precedentes do STJ.” (AP NU 0001892-57.2011.8.11.0007)

O “parentesco por afinidade limita-se aos ascendentes, aos descendentes e aos irmãos do cônjuge ou companheiro” (CC, art. 1.595, § 1º) e as leis penais incriminadoras devem ser interpretadas restritivamente, sob pena de incorrer na proibida analogia in malam partem” (STJ, AgRg no REsp 1548522/DF; TJDFT, Ap nº 0010879-61.2018.8.07.0003)

“Incabível cogitar regime inicial de cumprimento de pena diverso do fechado, haja vista que a pena definitiva do paciente é superior a 8 (oito) anos, nos termos do art. 33, § 2º, ‘a’, do Código Penal.” (STJ, HC nº 328.063/MG)

R E L A T Ó R I O

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

APELAÇÃO Nº 0003065-62.2015.8.11.0012 - CLASSE CNJ - 417- COMARCA DE NOVA XAVANTINA

APELANTE(S): JOAO VITOR ALVES DOS REIS

APELADOS(S): MINISTÉRIO PÚBLICO

R E L A T Ó R I O

Apelação criminal interposta por JOAO VITOR ALVES DOS REIS contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Nova Xavantina, nos autos de ação penal (Código 75432), que o condenou por estupro de vulneravel majorado [avô por afinidade da vítima], em continuidade delitiva [três vezes], a 14 (quatorze) anos, 4 (quatro) meses e 24 (vinte e quatro) dias de reclusão, em regime inicial fechado - art. 217-A c/c art. 226, II, c/c art. 71, todos do CP - (ID 138783734 - 273/286).

O apelante sustenta “que não há prova suficiente para a condenação, devendo ser aplicado o princípio do in dubio pro réu”.

Pede o provimento para que seja absolvido (ID 138783744).

A PROMOTORIA DE JUSTIÇA CRIMINAL DE NOVA XAVANTINA pugna pelo desprovimento do apelo (ID 138783747).

A i. 9ª Procuradoria de Justiça Criminal opina pelo desprovimento, em parecer assim sintetizado:

Recurso de apelação criminal - Crime de estupro de vulnerável - RECURSO DEFENSIVO - Defesa pugna pela absolvição do apelante nos termos do art. 386, inc. VII, do CPP - Improcedência - Materialidade e autoria delitiva devidamente demonstradas nos autos - Palavra da vítima que toma maior relevância probatória - Parecer pelo DESPROVIMENTO do apelo.” (Rosana Marra, procuradora de Justiça - ID 143055153)

É o relatório.


V O T O R E L A T O R

V O T O (MÉRITO)

EXMO. SR. DES. MARCOS MACHADO (RELATOR)

Egrégia Câmara:

O recurso é cabível (CPP, art. 593, I), manejado por quem tem interesse (CPP, art. 577) e não se verifica hipótese de extinção de punibilidade (CP, art. 107).

Consta da denúncia que:

“[...]em data indeterminada, na Rua Tapajós, n°618, Bairro Tonetto, do município de Nova Xavantina, o denunciado JOÃO VITOR ALVES DOS REIS, praticou conjunção carnal, na forma tentada, bem como, praticou atos libidinosos diversos da conjunção carnal com a criança Hyngradh Haélly Rezende de Oliveira, à época com 09 (nove) anos de idade, consoante se observa na Certidão de nascimento encartado às fls. 15. [...]

Ante o exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO denuncia JOÃO VITOR ALVES DOS REIS, com incurso no artigo 217-A (por duas vezes) com a incidência do artigo 226, inciso II, ambos do Código Penal [...].(Marcelo Linhares Ferreira, promotor de Justiça – ID 138783710)

O Juízo singular reconheceu a reponsabilidade penal e dosou as penas nos seguintes termos:

“[...] Por sua vez o crime em questão pode e deve ser imputado ao Réu JOÃO VITOR ALVES DOS REIS, havendo provas robustas e suficientes de que foi o autor dos fatos descritos na denúncia.

De saída, destaco que a vítima Hyngradh Haelly Rezende de Oliveira foi ouvida em duas oportunidades (tanto na delegacia quanto em Juízo), e em ambas, deu um depoimento coerente, em que relatou como o crime foi cometido pelo réu, sendo que, em Juízo, confirmou quase tudo o que havia dito na delegacia, chamando a atenção o fato de que demonstrou bastante emoção ao rememorar e relatar o ocorrido. Vejamos: [...]

Nota-se que as declarações da vítima em juízo são condizentes e coerente com seu depoimento colhido ainda na delegacia (fl. 22/23-pdf), que também confirma a prática do crime pelo acusado. E nesse sentido, analisando-se ambos os depoimentos, chega-se à conclusão de que as declarações da vítima foram sustentadas em base sólida, percebendo-se que são harmônicas, consistentes, e coerentes entre si, exceto, exclusivamente, no que diz respeito à quantidade de vezes em que a vítima teria sofrido o abuso, o que é natural em virtude do trauma e do grande lapso temporal entre os fatos e o depoimento em Juízo. Porém, o restante do depoimento da vítima em delegacia foi integralmente corroborado com o que ela disse em Juízo, inclusive no que diz respeito à alguns detalhes que circundam o fato, a exemplo do episódio do ‘churros’, ‘do dinheiro’ (2 reais), ‘que foi abusada no mato’, etc. [...]

Ou seja, percebe-se, deste mesmo modo, que as declarações judiciais das referidas testemunhas e informantes também estão em harmonia com os demais depoimentos angariados na delegacia, principalmente da vítima, sendo também verossímil com o Relatório de Atendimento Psicológico, que atestam a violação sexual sofrida pela vítima Hyngradh Haelly Rezende de Oliveira pelo companheiro da avó materna JOÃO VITOR WALVES DOS REIS, ora réu.

Não bastasse, chamou bastante atenção também o fato de que Marilda Rezende da Silva (avó materna da vítima), em que pese ter negado os fatos atribuídos a seu companheiro, ora réu, afirmou em juízo que, desde a época dos fatos, a vítima nunca mais quis dormir em sua residência na cidade de Nova Xavantina. (ID’s. 75597844 e 75597848)

Nessa mesma linha, também deve ficar destacado o fato de a testemunha Valéria Rezende de Souza (tia da vítima), ter dito em juízo que, na maioria das vezes, as crianças (Hyngradh e Hillary) não ficavam sozinhas na casa com o Acusado. No entanto, ao ser questionada se de fato tinha certeza disso, ela confirmou que o Réu pode ter ficado sozinho com a vítima em algum momento. (ID. 75597848).

Por fim, registre-se que o réu foi interrogado, e muito embora tenha negado a autoria dos delitos, percebe-se claramente que suas declarações destoam totalmente do conjunto probatório, se revelando em ato isolado.

Desse modo, à vista da comprovação material do fato e de sua autoria, dúvidas não pairam sobre a responsabilidade criminal do réu JOÃO VITOR ALVES DO REIS, havendo conteúdo probatório seguro e suficiente que respalda a sua condenação, devendo-lhe recair a imputação prevista na denúncia do...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT