Acórdão Nº 0003090-12.2019.8.24.0000 do Primeiro Grupo de Direito Criminal, 26-02-2020

Número do processo0003090-12.2019.8.24.0000
Data26 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemBalneário Camboriú
ÓrgãoPrimeiro Grupo de Direito Criminal
Classe processualEmbargos Infringentes e de Nulidade
Tipo de documentoAcórdão




Embargos Infringentes e de Nulidade n. 0003090-12.2019.8.24.0000, de Balneário Camboriú

Relator: Desembargador Júlio César M. Ferreira de Melo

EMBARGOS INFRINGENTES (RÉU PRESO). CRIME DOLOSO CONTRA A VIDA. HOMICÍDIO TRIPLAMENTE QUALIFICADO E LESÃO CORPORAL (ART. 121, § 2º, II, III E IV, E ART. 129, CAPUT, TODOS DO CÓDIGO PENAL). ACÓRDÃO NÃO UNÂNIME EM RECURSO EM SENTIDO ESTRITO, QUE NEGOU AS TESES DEFENSIVAS E DEU PROVIMENTO AO RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA RESTABELECER A QUALIFICADORA DO ART. 121, § 2º, III, DO CÓDIGO PENAL. VOTO VENCIDO QUE DAVA PROVIMENTO AO PEDIDO DE EXCLUSÃO DA QUALIFICADORA CONCERNENTE AO MEIO CRUEL. EXISTÊNCIA DE ELEMENTOS QUE APONTAM PARA O CRIME CONTRA A VIDA COMO DESCRITO NA DENÚNCIA. INVIABILIDADE DO AFASTAMENTO DA QUALIFICADORA. MANUTENÇÃO DO VOTO VENCEDOR. EMBARGOS CONHECIDOS E REJEITADOS.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Embargos Infringentes e de Nulidade n. 0003090-12.2019.8.24.0000, da comarca de Balneário Camboriú 1ª Vara Criminal em que é Embargante Sebastião Pinheiro e Embargado Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

O Primeiro Grupo de Direito Criminal decidiu, decidiu, à unanimidade, conhecer dos embargos infringentes e negar-lhes provimento. Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Des.Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Desa. Hildemar Meneguzzi de Carvalho, Des. Antônio Zoldan da Veiga, Des. Alexandre d'Ivanenko, Des. Paulo Roberto Sartorato, Des. Sérgio Rizelo, Des. Leopoldo Augusto Brüggemann e Des. Luiz Neri Oliveira de Souza.

Presidiu a sessão o Exmo. Sr. Des. Sérgio Rizelo.

Funcionou como Representante do Ministério Público o Exmo. Sr. Dr. José Eduardo Orofino da Luz Fontes.

Florianópolis, 26 de fevereiro de 2020.

Desembargador Júlio César M. Ferreira de Melo

Relator


RELATÓRIO

Tratam os autos de Embargos Infringentes opostos por Sebastião Pinheiro, com o objetivo de ver reformado acórdão não unânime proferido pela Segunda Câmara Criminal que, por maioria de votos, deu provimento ao recurso do Ministério Público para admitir a qualificadora do § 2º, III, do art. 121, do Código Penal.

Em seu voto divergente, o Des. Volnei Tomazini manifestou-se contrário à incidência da referida qualificadora admitida no segundo grau.

Com base neste argumento, a defesa opôs, tempestivamente, embargos infringentes, buscando a reforma do acórdão.

Admitidos os embargos, lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Paulo Roberto Speck, que opinou pelo seu conhecimento e desprovimento.

Este é o relatório.


VOTO

O voto, adianto, é pelo conhecimento e desprovimento do recurso.

A divergência diz respeito à incidência da qualificadora prevista no § 2º, inciso III, do art. 121, do Código Penal.

Em primeira instância, o Juízo extirpou a majorante.

Em grau recursal, por maioria, a Segunda Câmara Criminal deu provimento ao recurso do Ministério Público para incluir referida agravante.

O Des. Volnei Tomazini, vencido, entendeu pela inaplicabilidade da qualificadora de meio cruel, fundamentando nestes termos:

O recurso do Ministério Público não deve ser provido, porquanto para a incidência da qualificadora do meio cruel não é suficiente a repetição de golpes, reiteração de disparos, a quantidade de explosão e de raiva, ou de exagero no comportamento do agente.

Isso porque o meio cruel é caracterizado quando o agente produz na vítima sofrimento lento, duradouro, vai matando aos poucos, por meio do sofrimento, de padecimento por parte dela.

Acerca do meio cruel, abeberando-se dos ensinamentos de Cezar Roberto Bitencourt, destaca-se: "Meio cruel é a forma brutal de perpetrar o crime, é meio bárbaro, martirizante, que revela ausência de piedade [...] pelo meio cruel o agente objetiva o padecimento de sua vítima; revela sadismo" (Código Penal Comentado. São Paulo: Saraiva. 7ª ed., 2012, p. 418).

Assim, a crueldade, como requinte de execução de um crime, somente se entende com o propósito deliberado de aumentar o sofrimento da vítima, o que é diverso do que ocorreu nos presentes autos. Segundo narra a denúncia (fls. 644-647), os recorrentes/recorridos partiram para cima da vítima, agredindo-a com socos, chutes e cadeiradas de forma descontrolada, mas não com o propósito de fazer com que a mesma sofresse além do tipo penal comum, de modo que se revela improcedente a manutenção da referida qualificadora para os recorridos/recorrentes por não encontrar respaldo nos autos.

Nesse sentido, em caso análogo, é posicionamento do Superior Tribunal de Justiça:

[...] I. As qualificadores somente podem ser excluídas na fase do iudicium accusationis, se manifestamente improcedentes (precedentes do STF e do STJ).

[...] II. O meio cruel, previsto no art. 121, 2º, III, do CP, é aquele em que o agente, ao praticar o delito, provoca um maior sofrimento à vítima. Vale dizer, quando se leva à efeito o crime com evidente instinto de maldade, objetivando impor à vítima um sofrimento desnecessário. Dessa maneira, a multiplicidade de atos executórios (in casu, reiteração de facadas), por si só, não configura a qualificadora do meio cruel. (STJ REsp 743.110 MG Rel. Min. Felix Ficher. DJU de 27-03-2016, fl. 322).

Em que pese a respeitável divergência, o entendimento majoritário deve ser confirmado, cujo acórdão, da lavra do eminente Des. Norival Acácio Engel, restou assim ementado (fls. 905-906):

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (RÉUS PRESOS). CRIME DOLOSO CONTRA A VIDA. HOMICÍDIO TRIPLAMENTE QUALIFICADO E LESÃO CORPORAL (ART. 121, §2º, INCISOS II, III E IV, E ART. 129, "CAPUT", TODOS DO CÓDIGO PENAL). ACOLHIMENTO PARCIAL DA DENÚNCIA. RECURSOS DAS DEFESAS E DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

[...].

APELO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. PLEITO DE RESTABELECIMENTO DA QUALIFICADORA DO ARTIGO 121, § 2º, INCISO III, DO CÓDIGO PENAL. POSSIBILIDADE. LAUDO PERICIAL QUE ATESTA A EXISTÊNCIA DE INÚMERAS LESÕES ORIUNDAS DO ATAQUE PERPETRADO, EM TESE, PELOS RECORRENTES/RECORRIDOS. ELEMENTOS QUE INDICAM O SOFRIMENTO ALÉM DO ESPERADO.

INCIDÊNCIA DA QUALIFICADORA A SER EXAMINADA PELO CONSELHO DE SENTENÇA.

RECURSOS CONHECIDOS, PROVIDO TÃO SOMENTE AQUELE INTERPOSTO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO.

No corpo extrai-se (fls. 919-920):

Do recurso do Ministério Público

Pugna, o Órgão ministerial, pelo restabelecimento da qualificadora prevista no artigo 121, § 2º, inciso III, do Código Penal, sob o argumento de que "houve considerável número de golpes desferidos contra a vítima, a maioria na região da face e cabeça, provocando até mesmo afundamento de crânio, circunstâncias essas que elevam sobremaneira a dor e a angústia na morte" (fl. 827).

Ao afastar a incidência da referida qualificadora, assim fundamentou o Magistrado de origem:

Entendo que deve ser afastada da pronúncia, porque o meio cruel, conforme vêm decidindo os nossos Tribunais, e aqui cito uma decisão do Superior Tribunal de Justiça, que diz o seguinte: "O meio cruel, previsto no artigo 121, § 2º, inciso III, do Código Penal, é aquele em que o agente, ao praticar o delito, provoca um maior sofrimento a vítima, vale dizer, quando se leva a efeito o crime com evidente instinto de maldade, objetivando impor à vítima um sofrimento desnecessário. Desta maneira, a multiplicidade de atos executórios, em caso, reiteração de facadas, por si só, não configura a qualificadora do meio cruel" (STJ, REsp 743.110/MG, rel. Min. Felix Fischer).

Então, na situação dos autos, a vítima efetivamente recebeu múltiplos golpes, que estão atestados no laudo pericial cadavérico. Porém, a sua morte foi imediata, e foi causada pelos meios que naquele momento estavam a disposição dos acusados, que podem ter sido socos, chutes e com pedaços de madeira decorrentes de cadeiras.

Então, o sofrimento aqui, eu não vejo que houve maldade, que houve um motivo abjeto, que a vítima foi levada a morte por sofrimento além daquele causado por aquelas agressões. (34'56'')

No caso, entende-se que razão assiste ao Ministério Público. Isso porque, consoante se extrai do laudo pericial cadavérico (fls. 530/533), bem como da prova oral amealhada, há indícios de que o óbito do ofendido decorreu da grande quantidade de golpes praticados, em tese, pelos Recorrentes.

Aliás, não obstante o Juízo a quo tenha sustentado que a morte da vítima ocorreu de forma imediata, deve-se destacar que a informante A. A. C., quando ouvida em Juízo, relatou ter visto V. respirando após a cessação das agressões.

Assim, por haver elementos aptos a indicar que a vítima, antes de falecer, foi atingida por diversos chutes e socos, situação...

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