Acórdão Nº 0003097-65.2019.8.24.0012 do Terceira Câmara Criminal, 01-12-2020

Número do processo0003097-65.2019.8.24.0012
Data01 Dezembro 2020
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão
Recurso em Sentido Estrito Nº 0003097-65.2019.8.24.0012/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0003097-65.2019.8.24.0012/SC

RELATOR: Desembargador ERNANI GUETTEN DE ALMEIDA

RECORRENTE: DONIVIR ROSA (RECORRENTE) ADVOGADO: LUDMILA GRADICI CARVALHO DRUMOND (DPE) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (RECORRIDO) INTERESSADO: ELIAS MEDIAEL ALVES ADVOGADO: SANDRO DA SILVA DE OLIVEIRA INTERESSADO: FABIANO DE OLIVEIRA GONCALVES ADVOGADO: SANDRO DA SILVA DE OLIVEIRA

RELATÓRIO

Na comarca de Caçador, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Elias Mediael Alves (vulgo "Tubarão"), Fabiano de Oliveira Gonçalves e Donivir Rosa (vulgo "Polaco") pela suposta prática dos delitos previstos no art. 121, § 2º, incisos I e IV c/c art. 14, inciso II (vítima Osmar), e no art. 121, caput c/c art. 14, inciso II (vítima Jean), todos do Código Penal, em virtude dos seguintes fatos narrados na exordial acusatória (fls. 7/9 do evento 266):

[...] Osmar Hament Gonçalves, no dia 30 de agosto de 2011, registrou boletim de ocorrência na Delegacia de Polícia de Caçador, em razão de cobrança indevida de dívida objetivando recuperar seu veículo que estaria na posse de seu filho Fabiano de Oliveira Gonçalves, fato este que despertou a ira do denunciado Fabiano contra seu pai desde então.

Assim sendo, no dia 27 de novembro de 2011, por volta das 20 horas, os denunciados Elias Mediael Alves, Donivir Rosa e mais 5 (cinco) indivíduos não identificados, em comunhão de esforços e vontades, aderindo ao propósito criminoso de Fabiano de Oliveira Gonçalves em ceifar a vida de seu pai Osmar Hament por conta da situação acima referida, armaram-se com facas e canivetes e se deslocaram até a Rua Aristiliano Ramos (Beira-Rio), Centro, em Caçador, pois sabiam que a vítima sempre caminhava com seus familiares naquele lugar. Chegando no local, Fabiano, Elias, Donivir e os outros cinco elementos permaneceram sentados próximos de um trevo, aguardando a chegada de Osmar.

Assim sendo, aproximadamente às 21h30min, momento em que a vítima e seus familiares passavam caminhando no local, Fabiano, Elias e Donivir foram ao encontro de Osmar, sendo que Fabiano segurou-o fortemente para que Donivir, utilizando uma faca com aproximadamente 20cm de lâmina, desferisse um golpe na região malar esquerda e outros dois golpes na região dorsal de Osmar, produzindo no ofendido os ferimentos descritos no exame de corpo de delito de fl. 7, sendo que o resultado morte somente não ocorreu pelo fato de a vítima conseguir desvencilhar-se dos agressores e se evadir do local.

Nesse momento, o "enteado" da vítima, Jean Lucas Pereira, que também caminhava juntamente com Osmar, a fim de defender seu padrasto, foi de encontro aos denunciados, ocasião na qual foi agredido por Elias que, com evidente animus necandi, tentou desferir um golpe de faca contra o peito de Jean (região de alta letalidade), não alcançando êxito por circunstâncias alheias à sua vontade, pois a vítima, para se defender do golpe, levantou o braço esquerdo, local onde foi ferido pela faca, conforme laudo pericial de fl. 11.

Salienta-se que os denunciados, em relação à vítima Osmar Hament Gonçaves, agiram de forma abjeta, desprezível, pois cometeram o crime, tão somente, porque Osmar registrou boletim de ocorrência na Delegacia de Polícia de Caçador, em razão de cobrança indevida de dívida, objetivando recuperar seu veículo que estaria na posse de seu filho Fabiano de Oliveira Gonçalves.

Agiram, também, mediante surpresa, dificultando a defesa das vítimas, pois os denunciados e os cinco comparsas não identificados atacaram a vítima Osmar de maneira repentina, sem que a vítima pudesse esperar tal investida no momento em que caminhava com a família pela Avenida Beira-Rio [...],

Encerrado o sumário da culpa, foi tida como admissível a denúncia para pronunciar Elias Mediael Alves, Fabiano de Oliveira Gonçalves e Donivir Rosa, com fulcro no art. 413 do Código de Processo Penal, como incurso nas sanções do art. 121, § 2º, incisos I e IV c/c art. 14, inciso II (vítima Osmar), e no art. 121, caput c/c art. 14, inciso II (vítima Jean), todos do Código Penal (evento 296).

Irresignada com a prestação jurisdicional entregue, a defesa de Donivir interpôs recurso em sentido estrito (evento 1 do RESE), em cujas razões requer, exclusivamente quanto ao crime de tentativa de homicídio qualificado (art. 121, § 2º, incisos I e IV c/c art. 14, inciso II, ambos do Código Penal), a impronúncia (art. 414 do Código de Processo Penal) ou a absolvição sumária ante o reconhecimento da excludente de ilicitude da legítima defesa (art. 415, inciso IV, do Código de Processo Penal).

Apresentadas as contrarrazões (evento 9 do RESE) e proferido o despacho de manutenção da decisão (evento 13 do RESE), os autos ascenderam a este Tribunal, oportunidade em que a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Aurino Alves de Souza, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso (evento 8 - 2º grau).

Este é o relatório.

VOTO

O recurso, como próprio e tempestivo, deve ser conhecido.

A defesa almeja, exclusivamente quanto ao crime de tentativa de homicídio qualificado (art. 121, § 2º, incisos I e IV c/c art. 14, inciso II, ambos do Código Penal), a impronúncia (art. 414 do Código de Processo Penal) pela ausência de indícios suficientes de autoria ou a absolvição sumária ante o reconhecimento da excludente de ilicitude da legítima defesa (art. 415, inciso IV, do Código de Processo Penal).

Razão, contudo, não lhe assiste.

De início, cumpre destacar que a pronúncia é um mero juízo de admissibilidade da acusação, de modo que o feito deve ser remetido a julgamento pelo Tribunal do Júri quando estiver comprovada a materialidade do crime e houver indícios suficientes de autoria, nos termos do art. 413 do Código de Processo Penal.

Ao final da etapa do judicium accusationis, após cognição sumária do caso, deve o Magistrado realizar apenas um juízo de probabilidade.

A respeito do tema, anota a doutrina (DEMERCIAN, Pedro Henrique; MALULY, Jorge Assaf. Curso de Processo Penal. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 509):

Em síntese, no judicium accusationis ou sumário da culpa, examina-se a admissibilidade da acusação, para se evitar que alguém seja levado à presença dos jurados (Conselho de Sentença) de maneira temerária, sem que haja um mínimo de viabilidade fática. Sua finalidade é, portanto, exclusivamente processual, pois dela emerge apenas a possibilidade de ser instaurada a fase procedimental do judicium causae, em que, então, se decidirá sobre o conteúdo da acusação, ou pretensão punitiva, isto é, o próprio meritum causae.

Portanto, "para a pronúncia não são exigidos os mesmos critérios valorativos dispensados à formação da convicção condenatória. A existência de indícios consistentes, apontando o acusado como autor do delito, é suficiente para autorizar o envio do feito à sessão plenária do júri" (TJSC, Recurso Criminal n. 2013.028277-4, de Itajaí, rel. Des. José Everaldo Silva, j. 24.09.2013).

Sob essa premissa, segundo a denúncia, no dia 27 de novembro de 2011, por volta das 21h30min, o recorrente Donivir Rosa (vulgo "Polaco"), em comunhão de esforços e desígnios com os corréus Elias Mediael Alves (vulgo "Tubarão") e Fabiano de Oliveira Gonçalves e com outros indivíduos não identificados, deslocaram-se até a Rua Aristiliano Ramos (Beira-Rio), bairro Centro, no município de Caçador e, com evidente animus necandi e por motivação torpe, surpreenderam as vítimas Osmar Hament Gonçalves e Jean Lucas Pereira, desferindo golpes de armas brancas contra ambos os ofendidos, não consumando o intento criminoso por circunstâncias alheias as suas vontades.

A materialidade do crime tentado contra a vida está devidamente comprovada por meio do boletim de ocorrência (fls. 12/13 do evento 266), laudos periciais (fls. 18 e 22 do evento 266), auto de exibição e apreensão (fl. 81 do evento 266), e da prova oral colacionada nas fases policial e judicial.

Os indícios de autoria, por sua vez, exsurgem dos depoimentos colhidos tanto na Delegacia de Polícia quanto em juízo, de onde se extraem elementos suficientes para pronunciar o recorrente pela prática dos crimes contra a vida narrados na exordial.

Sem a análise aprofundada das provas, incabível nesta fase processual, cumpre transcrever os trechos dos depoimentos que indicam a prática das condutas supramencionadas pelo recorrente.

Acerca dos fatos, a vítima Osmar Hament Gonçalves contou na Delegacia de Polícia:

[...] que o depoente encontrava-se no dia 27/11.2011, por volta das 21hs30min caminhando pela Beira Rio, juntamente com seus familiares e enteado, bem como um conhecido e sua esposa; que o declarante e demais estavam indo a um Posto de Gasolina, próximo a sinaleira, quando foram surpreendidos por cerca de 8 (oito) masculinos; que o declarante foi puxado pelo vulgo "Tubarão" e separado dos demais, quando seu filho Fabiano de Oliveira, portando uma faca, acertou o rosto do declarante e em seguida duas vezes nas costas; que seu enteado foi ajudar o declarante e acabou sendo agredido também, mas esse pelo "Tubarão"; que o declarante então foi socorrido pela PM e Bombeiros; que "Tubarão" continuou no local como se não tivesse envolvimento algum com os fatos; que o declarante foi socorrido e encaminhado ao hospital onde levou 18 pontos e no rosto 6 pontos; que o declarante relata-nos que seu filho o agrediu pelo fato de que o declarante fez um BO contra ele, para poder recuperar seu veículo, que estaria de posse de Fabiano, pois o declarante estava sendo cobrado pela dívida do carro que não estaria com ele; que o filho então se juntou com os demais para agredir o declarante; que o declarante acredita que se não tivesse fugido ou tivesse diversas pessoas passando pelo local, onde criou-se um tumulto, o declarante acredita que Fabiano o teria matado; que um dos masculinos era um branco, que também portava uma faca; que mostrado a foto do...

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