Acórdão Nº 0003106-88.2017.8.24.0079 do Sexta Turma de Recursos - Lages, 29-11-2018

Número do processo0003106-88.2017.8.24.0079
Data29 Novembro 2018
Tribunal de OrigemVideira
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão



ESTADO DE SANTA CATARINA

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA

Sexta Turma de Recursos - Lages


APELAÇÃO CRIMINAL N. 0003106-88.2017.8.24.0079, DE VIDEIRA [VARA CRIMINAL]

RELATOR: JUIZ SÍLVIO DAGOBERTO ORSATTO


APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA SAÚDE PÚBLICA. PORTE DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. CONSUMO PRÓPRIO. CANNABIS SATIVA LINNEU [MACONHA]. TENTATIVAS INFRUTÍFERAS DE RESOLUÇÃO DA DEMANDA POR MEIO DE APLICAÇÃO DE MEDIDAS DESPENALIZADORAS. NATUREZA DO DELITO. INEFICÁCIA DA PENA. CUSTO DO PROCESSO. DESPROPORCIONALIDADE. PRINCÍPIO DA ECONOMIA PROCESSUAL. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA.

O princípio da economia processual impõe desconsiderar a oportunidade de atuação estatal nas hipóteses de delitos de menor gravidade nas quais as tentativas de resolução da demanda mediante aplicação de medidas despenalizadoras restem infrutíferas, tornando socialmente insustentável a manutenção do processo judicial.

DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. COMPETÊNCIA DO STF PARA EXAME DA [IN]CONSTITUCIONALIDADE DA CRIMINALIZAÇÃO SEM PREJUÍZO DO EXAME DIFUSO DE INCONSTITUCIONALIDADE PELO JUIZ DE PRIMEIRO GRAU. RECURSO EXTRAORDINÁRIO (RE) 635.659. JULGAMENTO DA REPERCUSSÃO GERAL. RELATORIA DO MINISTRO GILMAR MENDES PELA DESCRIMINALIZAÇÃO E VOTOS COM O RELATOR PELOS MINISTROS EDSON FACHIN E LUÍS ROBERTO BARROSO. PORTE DE ATÉ 25 GRAMAS DE MACONHA. PARÂMETRO TÉCNICO-JUDICIAL DE REFERÊNCIA PARA DIFERENCIAR CONSUMO E TRÁFICO. CRITÉRIOS TÉCNICO-CIENTÍFICO, TODAVIA PROVISÓRIO. CRIMINALIZAÇÃO QUE VIOLA O ARTIGO 5º, INCISO X, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRINCÍPIO DA INTIMIDADE E DA VIDA PRIVADA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DEPROVIDO.

1. Para o STF, em julgamento pendente, a suposta despenalização incide em inconstitucionalidade, desafiando a sua declaração, com redução de texto, da parte do artigo 28 da Lei nº 11.343/2006, o qual prevê a pena de prestação de serviços à comunidade, por se tratar de pena restritiva de direitos, para extirpá-la. Assim, o tipo penal transmuda-se para uma infração administrativa, sem nenhum efeito penal.

2. Tal interpretação seja pelo viés constitucional, seja pelo viés da política criminal, da sociologia e da segurança pública parece-me mais adequada do que aquele decorrente do atual cenário de criminalização com estigmatização do usuário e comprometedor das medidas de prevenção e redução de danos.

JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA. ADVOGADO. NOMEAÇÃO DE DEFENSOR DATIVO EM PROCESSO CRIMINAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ARBITRAMENTO. ÔNUS DA FAZENDA ESTADUAL. FIXAÇÃO EM VALOR DESSARAZOADO AOS SERVIÇOS PRESTADOS. NECESSIDADE DE ARBITRAMENTO DE FORMA CRITERIOSA E COM MODERAÇÃO. LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL N. 155/97 E REGRAMENTO PROCESSUAL CIVIL. PARÂMETROS. ORIENTAÇÃO. DELIBERAÇÃO N. 01/2013, DA SEÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA. PRINCÍPIOS DA ADEQUAÇÃO, DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. EX OFFICIO.

1. O arbitramento de honorários pela prestação de serviços de defensoria dativa observará como parâmetro os valores obtidos com a conversão em pecúnia do número de URHs, na forma do Anexo Único da própria Lei Complementar Estadual n. 155/97, ainda que o STF a tenha declarado inconstitucional; 2. Matéria pacifica em múltiplos precedentes da 6ª. Turma de Recursos.


VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0003106-88.2017.8.24.0079, de Videira [Vara Criminal], em que é Apelante Ministério Público do Estado de Santa Catarina e Apelado Jeferson Bisol.


ACORDAM, em sessão da Sexta Turma de Recursos de Lages, por unanimidade, conhecer da Apelação Criminal e, no mérito, por maioria, negar-lhe provimento.


I – VOTO


Trata-se de Apelação Criminal interposto pelo Ministério Público de Santa Catarina em desfavor de Jeferson Bisol em face da sentença a quo que aplicou a teoria da antieconomicidade, deixando de receber a denúncia, considerando que o delito imputado ao acusado é de menor gravidade, e que as tentativas de resolução da demanda por meio de aplicação de medidas despenalizadoras restaram infrutíferas.


Almeja o representante do Ministério Público a reforma da sentença, a fim de serem os acusados condenados como incurso no art. 28, caput da Lei n. 11.343/06 (pp. 40/49).


O acusado em suas contrarrazões pugna pela manutenção da sentença (pp. 63/67).


Em segundo grau, o representante do Ministério Público do Estado de Santa Catarina, manifestou-se pelo conhecimento do recurso, ante o preenchimento dos pressupostos legais de admissibilidade e, no mérito, pelo provimento do recurso para cassar a decisão (pp. 36/37), para condenar Jeferson Bisol como incurso nas sanções do art. 28, caput da Lei n. 11.343/06 (pp. 71/76).


Com estas digressões, registro que a denúncia imputou os seguintes fatos (pp. 32/34): "No dia 06 de setembro de 2017, por volta das 22h18min, na Rua Luís Strapazzon, n. 400, Bairro De Carli, em Videira-SC, o denunciado, Jeferson Bisol, dolosamente e ciente da ilicitude de sua conduta, trazia consigo, no interior do seu veículo VW/Saveiro, placas AHV-3042, atrás do banco do caroneiro, para consumo pessoal, em desacordo com determinação legal ou regulamentar, 1,3 g (um grama e três decigramas) de maconha (conforme o Laudo Pericial n. 9207.17.01012, fls. 16-18), substância capaz de causar dependência física e psíquica e de uso proscrito em todo o território nacional, por força da Portaria n. 344/98, da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde".


Apenas para constar, na época dos fatos, o acusado contava com 25 anos.


O recurso imerece provimento, porém por outro fundamento.


Com a Lei n. 11.343/2006 foi despenalizada a referida conduta, com abrandamento da sanção penal, sem prever a pena privativa de liberdade. Não obstante, nesta última década, tornou-se notória a influência proeminente do papel das drogas na gênese da criminalidade no Brasil, ocasionando, com efeito secundário, superlotação das prisões, inclusive femininas, a deterioração das condições de vida nos presídios e, como efeito motor da criminalidade o favorecimento ao aliciamento de pessoas pelas organizações criminosas que atuam dentro das prisões, causando a infiltração do crime por toda a sociedade brasileira e uma segregação dos aliciados e de suas famílias aos chefes do crime.


O Min. Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), relator do Recurso Extraordinário n. 635659, com repercussão geral reconhecida, votou pela inconstitucionalidade do art. 28 (crime a porte de drogas para uso pessoal) da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006), sob o fundamento que a criminalização “afeta o livre desenvolvimento da personalidade, em suas diversas manifestações”, aos “diferentes modos de desenvolvimento do sujeito, como o direito à autodeterminação, à autopreservação e à autorepresentação”, ofendendo “de forma desproporcional, o direito à vida privada” e a “margem de autonomia do indivíduo”.


Adverte, ainda, que o reconhecimento da inconstitucionalidade não deve ser interpretado como legalização do porte de drogas para consumo pessoal, pois medidas restritivas de natureza não penal deverão dispor sobre a “administrativização” (do art. 28) mediante a transformação de norma penal em regra de direito administrativo, com base em uma necessária reforma legislativa.


Por fim, entende que a criminalização acaba interferindo no direito de construção da personalidade dos usuários, principalmente os jovens, mais sujeitos à rotulação imposta pelo tipo penal, classificados como criminosos por uma conduta que, se tanto, implica apenas autolesão: “Tenho que a criminalização da posse de drogas para uso pessoal é inconstitucional, por atingir, em grau máximo e desnecessariamente, o direito ao desenvolvimento da personalidade em suas várias manifestações, de forma, portanto, claramente desproporcional”, afirma.


Portanto, injustificável todo o acionamento do sistema judicial quando o crime ou ato infracional é de uso de ínfima...

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