Acórdão nº 0003109-05.2014.8.14.0054 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 1ª Turma de Direito Penal, 03-07-2023

Data de Julgamento03 Julho 2023
Órgão1ª Turma de Direito Penal
Número do processo0003109-05.2014.8.14.0054
Classe processualAPELAÇÃO CRIMINAL
AssuntoHomicídio Simples

APELAÇÃO CRIMINAL (417) - 0003109-05.2014.8.14.0054

APELANTE: VAILSON DOS SANTOS

APELADO: JUSTIÇA PUBLICA

RELATOR(A): Desembargadora VÂNIA LÚCIA CARVALHO DA SILVEIRA

EMENTA

APELAÇÃO PENAL. ART. 121, §2º, II, C/C, ART. 157, CAPUT, (POR DUAS VEZES), AMBOS DO CPB E ART. 16, DA LEI N.º 10.826/2003. PRELIMINAR. RECORRER EM LIBERDADE. INVIABILIDADE DA VIA ELEITA. COMPETÊNCIA DA SEÇÃO DE DIREITO PENAL. MÉRITO. PLEITO ANULATÓRIO. DECISÃO CONTRÁRIA ÀS PROVAS DOS AUTOS. LEGÍTIMA DEFESA. TESES RECHAÇADAS. AUSÊNCIA DE AGRESSÃO INJUSTA E IMINENTE. REAÇÃO EXCESSIVA E DESPROPORCIONAL. OPÇÃO DOS JURADOS PELA TESE ACUSATÓRIA. CONDENAÇÃO RESPALDADA EM SUBSÍDIOS PROBATÓRIOS SUFICIENTES. SOBERANIA DOS VEREDICTOS. PENA HOMICÍDIO. QUALIFICADORA MOTIVO FÚTIL. AVENTADO BIS IN IDEM. INOCORRÊNCIA. MOTIVAÇÃO DO CRIME E DIVERSA DA MANEIRA DE EXECUÇÃO. ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. REDUÇÃO EM QUANTUM RAZOÁVEL. PROCEDÊNCIA. MINORAÇÃO DA PENA INTERMEDIÁRIA AO MÍNIMO LEGAL. IMPOSSIBILIDADE DE CONDUÇÃO AQUÉM DO MÍNIMO LEGAL ABSTRATAMENTE PREVISTO. SÚMULA 231 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PENA DE MULTA. NORMA COGENTE. EXCLUSÃO INCABÍVEL. REDUÇÃO IMPERATIVA, EM CORRESPONDÊNCIA À PENA CORPÓREA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. DECISÃO UNÂNIME.

1. O pleito para recorrer em liberdade não poderia ser deduzido na via da apelação, uma vez que, em se tratando de ameaça ou lesão ao direito de ir e vir, decorrente de ato de Juiz de Direito na espécie, prisão decretada por este, o órgão fracionário competente para apreciá-la a Seção de Direito Penal, por meio de habeas corpus, conforme previsão do art. 30, inciso I, alínea ‘a’, do Regimento Interno desta Egrégia Corte.

2. Para que o apelante seja submetido a novo julgamento pelo Tribunal do Júri, sob fundamento de que a decisão dos jurados é manifestamente contrária à prova dos autos, deve haver prova cabal de ser esta totalmente dissociada do conjunto probatório, assim, se houver o acolhimento de uma das teses apresentadas, não se configura a hipótese do artigo 593, inciso III, alínea "d", do Código de Processo Penal.

3. Não há nos autos evidência de o acusado ter repelido uma agressão iminente e inevitável, que expusesse risco à sua vida ou a de terceiros. O modos operandi do caso em testilha revela nuances absolutamente refutadoras da excludente de ilicitude da legítima defesa. De acordo com o Laudo de Exame de Corpo de Delito de Necropsia Médico-Legal, a vítima teve como causa de sua morte “Hemoragia aguda maciça”, provocada por ação pérfuro-contundentes, descrevendo como lesões externas: “52 (cinquenta e duas) perfurações contusas no tórax (dorso e parede anterior esquerda). Medindo 05 (cinco) mm de diâmetro”.

4. O réu não empregou moderadamente os meios de que dispunha para encerrar a suposta contenda. Ao contrário, extrai-se que o recorrente desferiu 52 (CINQUENTA E DUAS) PERFURAÇÕES no corpo da vítima, circunstância reveladora de que excedeu, em muito, o necessário para contenção de qualquer suposta agressão injusta e iminente.

5. A culpabilidade do recorrente é de intensa reprovabilidade social, excedendo o comum para a espécie. Consoante fundamentado pelo Juízo, o réu demonstra ter agido com impulsividade injustificada, além disso, extrai-se que o acusado comportou-se com extrema frieza, saiu em perseguição à vítima, a qual ainda tentou correr para livrar-se da ação, mas foi alcançada por seu algoz, e atingida com diversos golpes de chave de fenda. Tal fundamentação não conduz a bis in idem, em virtude da incidência da qualificadora do motivo fútil, posto que essa refere-se à motivação do ilícito – desentendimento com a vítima, e não ao seu modo de execução.

6. Em que pese a ausência de previsão específica na Lei Substantiva Penal, que estabeleça parâmetros para a minoração da reprimenda na etapa intermediária do cálculo penalógico, em função de causas atenuantes, sendo tal dosagem reservada à discricionariedade do Juízo sentenciante, segundo sua percuciente análise do caso concreto, é necessário que o quantum redutor tenha valor significativo perante a pena-base fixada.

7. No caso, a redução operada em apenas 03 (três) meses, diante de uma reprimenda de 14 (quatorze) anos e 03 (três) meses de reclusão, não revela parâmetro razoável, pelo que, entende-se ser cabível a fixação da pena intermediária no mínimo legal, à míngua de outras causas modificativas de pena.

8. Na segunda fase do cálculo da pena, onde serão analisadas as circunstâncias agravantes e atenuantes, a pena não pode ser diminuída para aquém do mínimo legal previsto em abstrato, se na primeira fase, aquela já tiver sido fixada no mínimo legal.

9. A pena de multa não é faculdade do juízo, mas é consectário lógico da própria condenação penal. Todavia, de acordo com o princípio da proporcionalidade, a pena de multa deve ser proporcional à sanção corporal, uma vez que, para aplicá-las, são utilizados os mesmos critérios, quais sejam, as circunstâncias do art. 59, do CPB.

10. Necessária a redução da pena de multa, uma vez que não determinada de forma proporcional à reprimenda corpórea.

11. Recurso conhecido e parcialmente provido, para redimensionar a pena atribuída ao recorrente, passando a condená-lo, após somatório decorrente do concurso material de crimes, às penas de 23 (vinte e três) anos de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado, e 30 (trinta) dias-multa, à razão de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente ao tempo da prática criminosa. Decisão unânime.

Vistos, etc.

Acordam os Excelentíssimos Desembargadores componentes da 1ª Turma de Direito Penal, por unanimidade de votos, em conhecer do recurso e lhe dar parcial provimento, nos termos do voto da Desembargadora Relatora.

Sessão do Plenário Virtual do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, iniciada aos três dias e finalizada aos dez dias do mês de julho de 2023.

Julgamento presidido pela Excelentíssima Senhora Desembargadora Kédima Pacifico Lyra.

Belém/PA, 03 de julho de 2023.

Desembargadora VÂNIA LÚCIA SILVEIRA

Relatora

RELATÓRIO

VAILSON DOS SANTOS interpôs recurso de apelação criminal, inconformado com a sentença prolatada pelo Douto Conselho de Sentença da Vara Única da Comarca de São João do Araguaia/PA (ID 12461714), que o condenou, como incurso nos tipos penais elencados nos artigos 121, §2º, inciso II, c/c art. 157, caput (por duas vezes), do Código Penal Brasileiro, e art. 16, da Lei n.º 10.826/2003, após o cômputo do concurso material de crimes, às penas de 25 (vinte e cinco) anos de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado, e 110 (cento e dez) dias-multa, à razão de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente ao tempo da prática delitiva.

Narra a peça incoativa (ID 12461690) que no dia 07 de setembro de 2014, no Município de Brejo Grande do Araguaia/PA, por volta das 22h00min, a Polícia Militar foi acionada para averiguar ocorrência da prática delitiva de homicídio, em que o apelante em epígrafe, após discussão com a vítima Antônio Carlos Gonçalves Dias, em um bar intitulado “Bar do Léo”, no qual estavam fazendo consumo de bebida alcoólica, atingiu o ofendido com cerca de 20 (vinte) golpes, utilizando uma chave Philips, tipo estrela, resultando na morte da vítima.

Ato contínuo, o apelante ainda desferiu golpes contra a vítima Andrade Alves Lima, quando esse tentava socorrer a vítima Antônio Carlos.

Revela que, após, o recorrente, em fuga, dirigiu-se à residência de José Cordeiro Rodrigues, o qual, ameaçado pelo réu, foi compelido a entregar-lhe a arma de fogo da qual detinha a posse. O acusado, em seguida, ainda encaminhou-se até a residência de Antônio Soares Silva, e o coagiu a entregar-lhe a motocicleta, para que pudesse fugir.

Descreve, no entanto, que uma equipe de policiais efetuou todas medidas possíveis para captura do meliante, o qual veio a ser capturado de posse dos objetos subtraídos, bem como da arma de fogo.

Em razões recursais (ID 12461865), sustenta a defesa, em sede preliminar, o direito de recorrer em liberdade, com expedição do competente Alvará de Soltura.

Relativamente ao mérito, salienta que o réu agiu em legítima defesa após forte discussão com a vítima Antônio Carlos Gonçalves Dias, que o atacou e, no calor no momento, por encontrar-se na situação de embriaguez, acreditando que sua vida corria perigo, desferiu os golpes de faca, sem intenção de ceifar a vida de seu desafeto.

Relativamente às facadas desferidas contra o ofendido Andrade Alves Lima, salienta que, igualmente, não tinha intenção de matá-lo ou de agredi-lo, e, ao certo, sequer percebeu que o atingiu.

No tocante à dosimetria da pena do art. 121, §2º, inciso II, do CPB, argumenta que o Juízo a quo procedeu ilegalmente a mensuração concomitante da qualificadora do motivo fútil e da circunstância desabonadora de prática de crime de modo impulsivo, a impor, com isso, indevido bis in idem, por se tratar do mesmo motivo.

Sustenta, no mais, que a redução operada em face da atenuante da confissão espontânea, revelou-se desproporcional, considerando todas as circunstâncias favoráveis ao réu, pelo que, cabível a fixação da pena, nessa etapa, aquém do mínimo legal.

Almeja, por derradeiro, a redução ou a exclusão da pena de multa fixada, diante da situação econômica do recorrente.

Clama pelo conhecimento e provimento do recurso interposto.

Em contrarrazões (ID 12461866), o Ministério Público de 1º Grau manifesta-se pelo conhecimento e improvimento do apelo manejado, com a manutenção in totum da sentença objurgada.

Nesta Superior Instância, o Custos Iuris, representado pela Procuradora de Justiça Cândida de Jesus Ribeiro do Nascimento, opina pelo conhecimento e parcial provimento da apelação, apenas para reanálise da pena-base.

É o relatório.

À douta revisão, com intenção de inclusão em pauta de julgamento da sessão do Plenário Virtual.

VOTO

Atendidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

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