Acórdão nº 0003164-04.2016.8.14.0080 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 3ª Turma de Direito Penal, 30-10-2023

Data de Julgamento30 Outubro 2023
Órgão3ª Turma de Direito Penal
Ano2023
Número do processo0003164-04.2016.8.14.0080
Classe processualAPELAÇÃO CRIMINAL
AssuntoHomicídio Qualificado

APELAÇÃO CRIMINAL (417) - 0003164-04.2016.8.14.0080

APELANTE: FLORENT MARCELO DOS SANTOS GEORGES
ADVOGADO DATIVO: LUIZ FELIPE DINIZ SANTA BRIGIDA

APELADO: JUSTIÇA PUBLICA

RELATOR(A): Desembargador JOSÉ ROBERTO PINHEIRO MAIA BEZERRA JUNIOR

EMENTA

Processo n° 0003164-04.2016.8.14.0080

Órgão Julgador: 3ª Turma de Direito Penal

Recurso: Apelação Criminal

Comarca: Bonito/PA

Apelante: Florent Marcelo dos Santos Georges

Relator: José Roberto Pinheiro Maia Bezerra Júnior

EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL DA DEFESA. TRIBUNAL DO JURI. SENTENÇA CONDENATÓRIA. HOMICÍDIO QUALIFICADO. ART. 121, §2°, II, DO CP.

1) Apesar de se verificar que o crime conexo narrado na denúncia não foi objeto de quesito ao Conselho de Sentença e, portanto, não foi submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri, não é possível a decretação de nulidade do julgamento, uma vez que a acusação não recorreu da sentença e a nulidade é desfavorável ao réu. Súmula 160 do STF.

2) Pedido de desclassificação para o homicídio simples. Alegação de que a decisão dos jurados é contrária a prova dos autos no que tange a qualificadora do motivo fútil. Insubsistência.

2.1) Não é qualquer dissonância entre o veredicto e os elementos probatórios constantes dos autos que autorizam a cassação do julgamento. Somente quando a decisão do júri não encontrar nenhum apoio na prova dos autos é que poderá ser invalidada. Do que se depreende do acervo probatório colacionado nestes autos, é possível verificar que há provas capazes de apontar a qualificadora do motivo fútil no crime de homicídio praticado pelo réu, dado que houve comprovação de que a motivação do crime se originou de desavenças banais entre o recorrente a vítima.

3) Dosimetria da Pena. Pedido de Reforma.

3.1) Primeira fase. Pena-base. A fundamentação utilizada pelo juízo ‘a quo’ para valorar negativamente os antecedentes criminais e o comportamento da vítima não são suficientes para esse fim.

3.1.1) Antecedentes Criminais: não é possível agravar a pena-base, tendo por base inquéritos policiais e ações penais em curso, conforme redação da Súmula 444 do STJ. Ausência de anterior condenação transitada em julgado. Circunstância decotada.

3.1.2) Comportamento da Vítima: este vetor apenas deve ser utilizado em benefício do réu, assim, em caso de não interferência do ofendido na prática do crime, esta deve ser neutralizada. Circunstância decotada.

3.2) Segunda fase. Aplicação da atenuante da confissão espontânea. Impossibilidade. Em se tratando da atenuante da confissão espontânea, considerando que os jurados não fundamentam suas decisões, consolidou-se o entendimento de que o acusado fará jus a esta atenuante quando tal tese tenha sido debatida em plenário, seja pela defesa técnica ou alegada pelo réu em seu depoimento. Não verificada no presente caso, notadamente porque o recorrente não compareceu ao julgamento em Plenário.

3.3) Terceira fase mantida. Redimensionamento da pena, fixando-a em 08 (oito) anos e 03 (três) meses de reclusão, a ser cumprida no regime fechado.

4) Recurso conhecido e parcialmente provido a fim de afastar a valoração negativa atribuída ao vetor dos antecedentes criminais e comportamento da vítima, redimensionando a pena.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Componentes da 3ª Turma de Direito Penal deste Egrégio Tribunal de Justiça do Pará, 31ª Sessão Ordinária do Plenário Virtual, ocorrida entre os dias 30/10/2023 e 08/11/2023, à unanimidade, em CONHECER do Recurso e DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO a fim de afastar a valoração negativa atribuída ao vetor dos antecedentes criminais e comportamento da vítima, redimensionando a pena, nos termos do voto do Relator.

Julgamento presidido pela Exmo. Sr Des. Pedro Pinheiro Sotero .

Belém (PA), 09 de novembro de 2023.

JOSÉ ROBERTO PINHEIRO MAIA BEZERRA JÚNIOR

DESEMBARGADOR RELATOR

RELATÓRIO


Trata-se de Apelação Criminal interposta por FLORENT MARCELO DOS SANTOS GEORGES, em face de sentença proferida pelo Tribunal do Júri da Vara Única de Bonito/PA, nos autos da ação n° 0003164-04.2016.8.14.0080, que o condenou como incurso no art. 121, §2°, II do CP, à pena de 09 (nove) anos, 04 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, a ser cumprida no regime fechado.

Em suas razões recursais (Num. 12378683 – Pág. 1/17), o recorrente argumenta que inexistem fundamentos ou provas capazes de afirmar que a prática delitiva se deu em razão de motivo fútil, eis que as testemunhas foram uníssonas no sentido de que a vítima era seu desafeto, tendo inclusive já lhe lesionado anteriormente.

Sendo assim, requer seja afastada a qualificadora do motivo fútil, dado que a decisão dos jurados foi manifestamente contrária às provas, nos termos do art. 593, III, ‘d’ do CPP, de modo que lhe deve ser imputado a pena do crime de homicídio simples.

Ademais, pugna pela redução da pena-base fixada pelo Juiz Presidente, por entender que o vetor dos antecedentes criminais, conduta social e comportamento da vítima foram valorados negativamente tendo por base fundamentação inidônea.

Na segunda fase da dosimetria, requer seja reconhecida a atenuante da confissão espontânea, com fulcro no art. 65, III, ‘d’, do CP

Em sede de contrarrazões, o Ministério Público requereu o conhecimento do recurso e, no mérito, seu parcial provimento apenas para aplicar a existência de bons antecedentes na análise da conduta social e a atenuante da confissão espontânea (Num. 12378687 – Pág. 1/14).

Nesta instância superior, a Procuradoria de Justiça do Ministério Público, por meio do Dr. Hamilton Nogueira Salame, se pronunciou pelo conhecimento do recurso e, no mérito, pelo parcial provimento do recurso para seja afastada a valoração negativa atribuída ao vetor dos antecedentes criminais, bem como seja reconhecida a atenuante da confissão espontânea em favor do recorrente (Num. 13645914 – Pág. 1/5).

É o relatório que submeto à revisão.

Sugiro inclusão em pauta de julgamento no Plenário Virtual.

VOTO


O recurso sob análise deve ser conhecido, em razão do atendimento dos pressupostos e condições para sua admissibilidade, mormente em relação à adequação e tempestividade.

Destaco, inicialmente, que analisando os autos, observou-se que o acusado fora denunciado como incurso no art. 121, §2°, II do CP e art. 244-B do ECA (Num. 12378513 – Pág. 1/5), em razão de ter matado a vítima em concurso com um adolescente.

Em decisão de pronúncia (Num. 12378522 – Pág. 1/5), o magistrado narrou o delito referente à corrupção de menor, contudo, analisou a admissibilidade da acusação apenas no que tange ao homicídio qualificado, pronunciando o recorrente pelo art. 121, §2º, II do CP.

Veja-se que tal conduta se mostrou acertada, eis que não cabe ao magistrado, elaborando o juízo de admissibilidade da acusação em relação ao crime doloso contra a vida, no rito do procedimento do júri, analisar se é procedente ou não a imputação feita no tocante ao delito conexo. Uma vez pronunciado o réu, deve o juiz remeter os crimes conexos ao Tribunal do Júri, que é o juiz natural da causa.

Sendo assim, no presente caso, o Tribunal do Júri deveria julgar tanto o crime doloso contra a vida (homicídio qualificado) quanto o crime conexo (corrupção de menor).

Apesar disso, analisando a Ata do Tribunal do Júri (Num. 12378589 – Pág. 13/15), denota-se que não foi quesitado ao Conselho de Sentença o crime de corrupção de menor, isto é, o crime conexo não foi submetido a julgamento pelo Tribunal do Juri, tendo a sentença restado silente quanto a um dos delitos narrados na denúncia.

Resta evidente, portanto, a nulidade do julgamento. No entanto, constata-se que tal decretação é desfavorável ao réu, que poderá ter sua pena agravada se submetido a novo julgamento.

E, considerando que a acusação não recorreu da sentença e, com isso, tal nulidade não foi arguida em peça recursal, entendo ser inviável o reconhecimento de tal nulidade nesse momento processual, por força da Súmula 160 do STF[1].

Passo ao mérito da apelação criminal ora interposta, cuja análise está adstrita aos fundamentos de sua interposição, em obediência ao comando da Súmula 713 do STF[2].

Nesse viés, insurge-se o recorrente quanto a capitulação jurídica dada ao fato apurado nos autos, defendendo que a decisão dos jurados é contrária a prova dos autos no que tange a qualificadora do motivo fútil, pelo o que requer a desclassificação da condenação para o homicídio simples.

É sabido que a Constituição Federal submete os crimes dolosos contra a vida ao Tribunal do Júri e confere soberania ao seu veredicto (art. 5º, XXXVII, alínea "c"). Lado outro, o Código de Processo Penal permite a declaração de nulidade deste veredicto quando manifestamente contrário à prova dos autos, consoante art. 593, inciso III, alínea "d", do Código de Processo Penal.

Sendo que, a incidência do art. 593, inciso III, alínea "d", do Código de Processo Penal, para que seja respeitada a soberania do Tribunal do Júri, deve operar-se de forma excepcional, em situações de incontestável incompatibilidade entre o veredicto e as provas.

Portanto, não é qualquer dissonância entre o veredicto e os elementos probatórios constantes dos autos que autorizam a cassação do julgamento. Somente quando a decisão do júri não encontrar nenhum apoio na prova dos autos é que poderá ser invalidada, o que não é a hipótese dos autos.

Note-se que o Conselho de Sentença entendeu pela condenação do recorrente no crime de homicídio qualificado pelo motivo fútil (art. 121, §2°, II do CP).

Com efeito, analisando os autos, observa-se que as testemunhas arroladas perante o Tribunal do Júri, declararam que já existia uma rixa entre o acusado, ora recorrente, e a vítima, a qual teria se originado de um fato pretérito, em que a vítima teria acertado o acusado com uma faca, quando esta tentava tomar seu celular (Sr. José Silvano Barcelar de Sousa – Num. 12378602 – Pág. 1 – 00:01:59 e Num. 12378603 – Pág. 1 –...

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