Acórdão nº 0003255-35.2018.8.11.0007 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Primeira Câmara Criminal, 06-04-2021

Data de Julgamento06 Abril 2021
Case OutcomeProvimento
Classe processualCriminal - APELAÇÃO CRIMINAL - CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Número do processo0003255-35.2018.8.11.0007
AssuntoCrimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO


PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL


Número Único: 0003255-35.2018.8.11.0007
Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417)
Assunto: [Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas]
Relator: Des(a).
MARCOS MACHADO


Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS MACHADO, DES(A). ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, DES(A). PAULO DA CUNHA]

Parte(s):
[ROMILDO RIBEIRO DA SILVA - CPF: 062.985.201-47 (APELANTE), ESTADO DE MATO GROSSO - PROCURADORIA GERAL DA JUSTICA (APELADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (REPRESENTANTE), ESTADO DE MATO GROSSO - PROCURADORIA GERAL DA JUSTICA (CUSTOS LEGIS), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (REPRESENTANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)]

A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO.

E M E N T A

EMENTA

APELAÇÃO CRIMINAL - TRÁFICO DE DROGAS PRIVILEGIADO - INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA PARA A CONDENAÇÃO, SUBSTÂNCIAS ENTORPECENTES DESTINADAS AO CONSUMO PRÓPRIO, AUMENTO DA PENA-BASE SEM FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA, RECONHECIMENTO DAS ATENUANTES DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA E MENORIDADE RELATIVA, JUS À REDUÇÃO DA PENA NO PATAMAR DE 2/3 (DOIS TERÇOS) EM RAZÃO DO PRIVILEGIO - PRETENSÃO RECURSAL DE ABSOLVIÇÃO, DESCLASSIFICAÇÃO PARA POSSE DE DROGAS PARA USO PESSOAL OU REDUÇÃO DAS PENAS - DECLARAÇÕES DOS POLICIAS MILITARES E GENITORA DO APELANTE - APREENSÕES DE 5 (CINCO) PORÇÕES DE MACONHA E BALANÇA DE PRECISÃO – DROGAS EM LOCAIS DISTINTOS [MOCHILA, RESIDÊNCIA E VEÍCULO DO APELANTE] - RESIDÊNCIA FREQUENTADA USUÁRIOS – MACONHA QUE POSSIBILITARIA A CONFECÇÃO DE, NO MÍNIMO, 104 (CENTO E QUATRO) CIGARROS - DESTINAÇÃO MERCANTIL - DROGA PERECÍVEL - CONDIÇÃO DE USUÁRIO NÃO ELIDE A RESPONSABILIZAÇÃO DO AGENTE POR COMERCIALIZAR DROGAS - LIÇÕES DOUTRINARIAS - ENUNCIADOS CRIMINAIS 3, 7 E 8 DO TJMT - JULGADO DA PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL DO TJMT - CONDENAÇÃO PRESERVADA - PENA-BASE REDIMENSIONADA AO MÍNIMO LEGAL - ARESTOS DO STJ E TJMT - ENUNCIADOS 12, 15 E 49 DO TJMT - INCIDÊNCIA DA ATENUANTE NÃO PODE CONDUZIR À REDUÇÃO DA PENA ABAIXO DO MÍNIMO LEGAL - SÚMULA 231 DO STJ - NÃO PERTENCIMENTO À ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA - PRIMARIEDADE - BONS ANTECEDENTES - AUSÊNCIA DE PROVAS DA HABITUALIDADE DELITIVA - NOCIVIDADE DA DROGA - PREMISSAS DO STJ - APLICAÇÃO DO REDUTOR DO PRIVILÉGIO NO MÁXIMO LEGAL - 2/3 (DOIS TERÇOS) - JULGADO DO STJ - PREQUESTIONAMENTO - PRECEITOS NORMATIVOS OBSERVADOS E INTEGRADOS À FUNDAMENTAÇÃO - ACÓRDÃO DO TJDF - RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE PARA READEQUAR AS PENAS E ESTABELECER REGIME ABERTO.

A maconha apreendida - 103,8g (cento e três gramas e oito decigramas) - possibilitaria a confecção de, no mínimo, 104 (cento e quatro) cigarros da droga, de modo a confirmar a destinação mercantil, sobretudo porque a maconha é perecível (BARBOZA, Bruna Santos. “Usuário ou Traficante?”. Disponível em: https://brunasbarboza.jusbrasil.com.br).

A condição de usuário não elide a responsabilização do agente por comercializar drogas, pois é comum a figura do traficante-usuário ou usuário-traficante, que vende a substância para sustentar o próprio vício (CONTE, Marta. HENN, Ronaldo César. OLIVEIRA, Carmen Silveira de Oliveira. WOLFF, Maria Palma. “Passes e impasses: lei de drogas”. Revista Latinoam Psicopat Fund., São Paulo, v. 11, n. 4, p. 602-615, dezembro 2008).

“A condição de usuário de drogas não elide a responsabilização do agente pelo delito tipificado no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006.” (TJMT, Enunciado Criminal 3)

As declarações coerentes dos agentes policiais responsáveis pela prisão em flagrante, em harmonia com as demais provas - depoimentos da genitora do apelante e apreensões 5 (cinco) porções de maconha, com peso de 103,8g (cento e três gramas e oito decigramas) e balança de precisão -, são suficientes para caracterizar tráfico de substâncias entorpecentes (TJMT, Enunciado Criminal 8), o qual “classifica-se como crime de ação múltipla ou misto alternativo e, portanto, consuma-se com a prática de qualquer das condutas nele descritas” (TJMT, Enunciado Criminal 7).

“Apresenta-se injustificável os pedidos de absolvição ou desclassificação do delito de tráfico de drogas quando as provas, sendo coerentes e seguras, comprovam a responsabilidade penal atribuída ao agente.” (TJMT, NU 0000848-20.2019.8.11.0040)

A plena consciência sobre ilicitude do fato e a exigência de conduta diversa constituem fundamentos inidôneos para negativação da culpabilidade (TJMT, Enunciado Criminal 12), ao passo que a premeditação, embora possa servir de fundamento para depreciar a culpabilidade (TJMT, Enunciado Criminal 49; TJMT, Ap nº 20137/2018; TJMT, Ap nº 110261/2017), pressupõe a indicação de elementos concretos que revelam planejamento minucioso, atos preparatórios complexos e/ou voltados a dificultar a apuração do crime (TJMT, Ap nº 95641/2015). Caso contrário, mescla-se com a cogitação, a qual sequer é punível, ou mesmo com o dolo de ímpeto, não revelando, em si, maior gravidade da conduta.

A fase de cogitação não se confunde “com a premeditação. Todo crime doloso é cogitado, mas nem todo crime doloso é premeditado. A premeditação pressupõe também uma cogitação, porém com uma fase de maturação e reflexão sobre a conduta criminosa relevantemente maior” (FLORES, Andrea. LOPES, Jodascil Gonçalves. Manual de Direito Penal. 2ª ed., São Paulo: Saraiva, 2016, Capítulo VI, 2.1), do modo que não se identifica fundamentação idônea para a depreciação da culpabilidade.

As consequências sociais geradas pelo tráfico de drogas - desestrutura familiar e causa de grande parte dos delitos de natureza patrimonial - são inerentes ao tipo penal, não podendo ser consideradas como vetor negativo da culpabilidade para agravamento da pena-base. (STJ, REsp nº 1135435/ES ; STJ, HC nº 356.554/RS; TJMT, AP N.U 0000947-60.2018.8.11.0028)

“As elementares do tipo penal e consequências naturais da consumação do crime não podem ser consideradas circunstâncias judiciais desfavoráveis.” (TJMT, Enunciado Criminal 15)

A apreensão de 103,8g (cento e três gramas e oito decigramas) de maconha não autoriza a exasperação da pena-base acima do mínimo legal, notadamente porque essa quantidade não se revela expressiva, segundo entendimento do c. STJ e desta e. Câmara (STJ, HC 427.253/SP; TJMT, AP nº 83937/2018 - 9.11.2018), sobretudo porque a espécie de droga apreendida - maconha - não possui efeitos tão nocivos e destrutivos como outras substâncias entorpecentes, tanto que inexiste, na literatura médica, “um caso sequer de morte por overdose dos princípios ativos (THC e canabidiol) presentes na cannabis sativa” (SANTOS JUNIOR. Rosivaldo Toscano. Maconha na Guerra às Drogas: (In)Constitucionalidade e (In) Convencionalidade. Revista Direito e Liberdade - RDL - ESMARN - v. 19, n. 1, p. 227-261, jan./abr. 2017, p. 227/261).

Registre-se, ainda, que a legalização da maconha, com controle estatal da comercialização e posse para uso, está se tornando, gradativamente, uma tendência mundial (TAFFARELLO, Rogério Fernando. Drogas: Falência do Proibicionismo e Altenativas de Política Criminal. São Paulo, 2009, REIS. Eline Matos. A Trajetória Legal da Cannabis na Espanha, no Uruguai e Nos Estados Unidos: Uma Análise da Regulamentação da Maconha à Luz da Corrente Ecossocialista, Salvador, 2017).

“A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal.” (STJ, Súmula 231).

Sopesados a relativa toxicidade da maconha, o não pertencimento à associação criminosa, a primariedade, os bons antecedentes, a ausência de provas da habitualidade delitiva, impõe-se a aplicação da fração redutora máxima relativa a minorante do tráfico privilegiado. (TJ, AgRg no HC 552076/SP; STJ, HC nº 529.408/SP).

Se os preceitos normativos foram observados e integrados à fundamentação, afigura-se “desnecessário que o julgador esmiúce cada um dos argumentos e dispositivos legais tidos por violados, bastando que esclareça os motivos que o levaram à determinada conclusão” (TJDF, RESE nº 20120510091147).

R E L A T Ó R I O

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

APELAÇÃO Nº 0003255-35.2018.8.11.0007 - CLASSE CNJ - 417- COMARCA DE ALTA FLORESTA

APELANTE(S): ROMILDO RIBEIRO DA SILVA

APELADOS(S): MINISTÉRIO PÚBLICO

R E L A T Ó R I O

Apelação criminal interposta por ROMILDO RIBEIRO DA SILVA contra sentença proferida pelo Juízo da 5ª Vara Criminal da Comarca de Alta Floresta, nos autos de ação penal (NU 0003255-35.2018.8.11.0007), que o condenou por tráfico de drogas privilegiado a 6 (seis) anos e 15 (quinze) dias de reclusão e 541 (quinhentos e quarenta e um) dias-multa, em regime inicial semiaberto - art. 33, caput, § 4º, da Lei nº 11.343/2006 - (ID 69496025).

O apelante sustenta que: 1) as provas seriam insuficientes para a condenação; 2) as substâncias entorpecentes seriam destinadas ao consumo próprio; 3) o aumento da pena-base em 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 200 (duzentos) dias-multa não possui fundamentação idônea; 4) as atenuantes da confissão espontânea e menoridade relativa deveriam ser reconhecidas; 5) faria jus à redução da pena no patamar de 2/3 (dois terços), em relação à minorante do tráfico privilegiado, por ser primário, ter bons antecedentes, não se dedicar a atividades criminosas e nem integrar organização criminosa.

Pede o provimento para que seja absolvido ou desclassificado o tráfico para posse de drogas para uso pessoal. Subsidiariamente, reduzidas as penas (ID 69496484).

Prequestiona o art. 5º LVII, art. 93, IX, ambos da CF, art. 59, art. 68, art. 65, I, e III, ‘d’, todos do CP, art. 28 e art. 33, caput, § 4º, ambos da Lei nº 11.343/2006.

A 1ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA CRIMINAL DE ALTA FLORESTA pugna pelo...

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