Acórdão Nº 0003268-19.2014.8.24.0005 do Sétima Câmara de Direito Civil, 17-03-2022

Número do processo0003268-19.2014.8.24.0005
Data17 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSétima Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0003268-19.2014.8.24.0005/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0003268-19.2014.8.24.0005/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ROBERTO DA SILVA

APELANTE: CAIXA SEGURADORA S/A APELADO: ROGERIO ROSA (Espólio) ADVOGADO: Olavo Rigon Filho (OAB SC004117)

RELATÓRIO

Caixa Seguradora S.A. e Espólio de Rogério Rosa interpuseram recurso de apelação e adesivo contra sentença (evento 55, processo judicial 2, p. 14-26) que, nos autos da ação de cobrança de seguro, julgou procedentes os pedidos iniciais.

Para melhor elucidação da matéria debatida nos autos, adota-se o relatório da sentença recorrida:

Espólio de Rogério Rosa, representado pela inventariante Tatiana Schumacker Rosa Cequinel, ajuizou a presente ação de cobrança de cobertura securitária em face de Caixa Seguradora S/A, partes devidamente qualificadas.

Alega, em síntese, que o de cujos, Dr. Rogério Rosa, adquiriu imóvel através de financiamento, e o mesmo foi garantido por apólice securitária emitida pela demandada, assinada pelo requerente na data de 06 de setembro de 2012.

Sustenta que a finalidade do seguro era "garantir a cobertura securitária para os riscos de natureza corporal às pessoas físicas, devedoras em financiamentos imobiliários".

Aduz que no dia 17 de novembro de 2013, o Sr. Rogério Rosa veia a falecer, vítima de suicídio involuntário.

Em virtude da morte, sucedeu-se a solicitação de cobertura securitária, a qual fora negada sob o argumento de suicídio dentro do período de carência.

Assevera o requerente que a contratação foi permeada de lealdade e boa-fé, inexistindo qualquer indício que aponte eventual fraude para o consequente recebimento da cobertura securitária.

Postula pela reparação do prejuízo material que sofreu em decorrência da negativa requerida, uma vez que para evitar as consequências da falta de pagamento do financiamento, as parcelas posteriores ao sinistro foram pagas na data do vencimento.

Valorou a causa, juntou documentos, e, ao final, requereu a procedência dos pedidos, condenando-se a ré ao cumprimento de contrato com a quitação do saldo devedor do financiamento e ao pagamento de indenização a título de danos materiais.

Devidamente citada, a ré apresentou contestação, arguindo, preliminarmente, a ilegitimidade ativa da autora para a causa.

No mérito, alega, em resumo, que a cobertura, em caso de morte, obedece ao disposto nas cláusulas 5ª e 8ª da Apólice de Seguro Habitacional, as quais excluem a cobertura em caso de morte decorrente de suicídio ocorrido nos primeiros dois anos de vigência do contrato, figurando-se desnecessária qualquer discussão acerca da premeditação do segurado.

Ressalta que o suicídio do Sr. Rogério Rosa ocorreu após menos de 02 (dois) anos da celebração do contrato, isto é, na vigência do período de carência, motivo pelo qual, segundo a requerida, a cobertura foi negada.

Frisa a licitude de sua conduta, pois a previsão expressa nas cláusulas supramencionadas está de acordo com os artigos 797 e 798 do Código Civil.

Houve réplica (fls. 249-252).

É o breve relatório.

Da parte dispositiva do decisum, extrai-se a síntese do julgamento de primeiro grau:

Ante o exposto, com fulcro no artigo 269, I, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial e, por consequência:

a) CONDENO a requerida à quitação do saldo devedor do financiamento entabulado pelas partes, em consonância com as cláusulas 5ª, 13ª, 13.1, "b", e 24ª, 24.1, "b", constantes na Apólice de Seguro de Financiamento Habitacional, devendo ser quitado o valor do saldo devedor existente na data desta sentença.

b) CONDENO a requerida à restituição de todos os valores pagos pelo autor após a data do sinistro, a título de indenização por dano material, cujo montante deverá ser apurado em fase de liquidação de sentença, com juros legais a partir da citação e correção monetária a partir de cada desembolso, ante a ausência de notícia nos autos que demonstre a quantidade exata de parcelas que foram pagas, bem como o valor de cada uma.

c) CONDENO a requerida ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em R$ 100.000,00 (cem mil reais), conforme os termos do artigo 20, § 4º, do CPC, ante o proveito econômico a ser auferido pela parte autora, que atinge, aproximadamente, R$ 4.000.000,00 (quatro milhões de reais), e a complexidade da causa.

Em suas razões recursais (evento 55, processo judicial 2, p. 54-91) a seguradora demandada alega inexistir o dever de indenizar, haja vista o segurado ter cometido suicídio no período compreendido entre os dois primeiros anos do contrato de seguro, sendo irrelevante a prova de eventual premeditação, consoante dispõe o art. 798 do Código Civil.

Postula, ainda, o afastamento da condenação ao pagamento dos danos materiais decorrentes das parcelas do seguro pagas após o sinistro.

O demandante, beneficiário da apólice em discussão, por sua vez, em seu arrazoado adesivo (evento 55, processo judicial 2, p. 100-102), requer a majoração dos honorários sucumbenciais devidos pela parte ré, para que sejam fixados em no mínimo 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da condenação.

Com as contrarrazões (evento 55, processo judicial 2, p. 106-118), ascenderam os autos a esta Corte de Justiça.

Na sessão de 17 de março de 2022 este relator ficou vencido nos termos que seguem, após os votos do desembargador Saul Steil, do desembargador André Carvalho e da desembargadora Haidée Denise Grin acompanhando a divergência inaugurada pelo desembargador Álvaro Luiz Pereira de Andrade designando para o acórdão.

Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação e adesivo interpostos contra sentença que julgou procedentes os pedidos inaugurais.

Porque presentes os pressupostos de admissibilidade, conhece-se dos reclamos interpostos.

De início, destaca-se que a decisão recorrida foi publicada quando ainda vigente o Código de Processo Civil de 1973 (8-5-2015 - evento 55, processo judicial 2, p. 27), motivo pelo qual a referida norma regerá a presente decisão, por incidência do princípio tempus regit actum (teoria do isolamento dos atos processuais), nos moldes do art. 1.046 do novo Código de Ritos.

Tem-se como fato incontroverso, porque reconhecido expressamente pelas partes, ter o finado Rogério Rosa aderido ao contrato de seguro de vida e proteção financeira firmado diretamente com a parte ré nos termos da apólice n. 10610000002, na data de 6-12-2012 (evento 55, processo judicial 1, p. 93).

Igualmente indubitável o fato de o segurado ter falecido em 17-11-2013 tendo como causa da morte "traumatismo cardíaco, projetil de arma de fogo" (evento 55, processo judicial 1, p. 89), em razão de disparo que efetuou contra si próprio.

Desse modo, inconteste ter o segurado cometido suicídio dentro do prazo de carência de dois anos previsto nas cláusulas gerais do pacto.

A controvérsia, portanto, cinge-se em averiguar o direito da parte autora ao recebimento de indenização securitária, bem como a título de danos materiais e, por fim, analisar os ônus sucumbenciais.

Sobre tais pontos, então, debruçar-se-á a presente decisão.

Adianta-se, desde já, que o apelo comporta parcial acolhimento, enquanto o recurso adesivo não será conhecido, porque prejudicado.

I - Da preliminar das contrarrazões:

Em suas contrarrazões o recorrido/autor sustenta que o apelo não pode ser conhecido por ofensa ao princípio da dialeticidade, uma vez que, em síntese, não haveria correlação entre os argumentos lançados na sentença e aqueles aviados no recurso.

A prefacial, contudo, não prospera.

A respeito da temática em voga, colhe-se da lição de Fredie Didier Jr. e Leonardo José Carneiro da Cunha:

Conforme entendimento consolidado da doutrina e da jurisprudência, deve a parte, ao recorrer, expor com objetividade os motivos de seu inconformismo, demonstrando as razões de fato e de direito do interesse recursal, homenageando o princípio da dialeticidade, de acordo com o qual: exige-se que todo recurso seja formulado por meio de petição na qual a parte, não apenas manifeste sua inconformidade com o ato judicial impugnado, mas, também e necessariamente, indique os motivos de fato e de direito pelos quais requer o novo julgamento da questão nele cogitada. Na verdade, trata-se de princípio ínsito a todo processo, que é essencialmente dialético (Curso de direito processual civil, 6ª ed, vol. 3. Salvador: Podium, 2008, p. 60).

No presente caso, é possível verificar que a apelante elucidara, de forma suficiente, os motivos de fato e de direito pelos quais entende que a sentença objurgada deve ser modificada, permitindo-se a análise das teses suscitadas, como adiante serão enfrentadas, em consonância com o disposto no art. 1.010, II e III, do CPC, não havendo falar em ausência de requisitos legais no recurso interposto.

Por outro lado, nota-se que o recorrido conseguiu exercer o contraditório e a ampla defesa, não havendo qualquer prejuízo para à manifestação.

Por tais motivos e fundamentos, rejeita-se o pleito formulado em contrarrazões.

II - Do apelo da seguradora ré:

Inicialmente, importante consignar que restou plenamente caracterizada a ocorrência do evento suicídio, porquanto a própria parte autora postula na inicial "a cobertura securitária em caso de suicídio" (evento 55, processo judicial 1, p. 5), sendo descabido qualquer argumento no sentido de que o infortúnio teria decorrido de doença psicológica.

Passada tal premissa, insurge-se a seguradora apelante em relação à sentença objurgada, sob o argumento de que inexiste o dever de indenizar, já que o segurado cometeu suicídio - fato este incontroverso nos autos - durante o prazo de carência estipulado no art. 798 do Código Civil. Aduz que, diferentemente do que entendeu o Juízo a quo, não há falar em necessidade de prova da premeditação.

De fato, razão socorre à parte apelante.

Não se desconhece a existência das Súmulas 105 do Supremo Tribunal Federal e 61 do Superior Tribunal de Justiça, as quais foram utilizadas pela Togada de primeiro grau para fundamentar a procedência da demanda:

Salvo se...

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