Acórdão nº 0003419-80.2019.8.14.0039 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 3ª Turma de Direito Penal, 17-04-2023

Data de Julgamento17 Abril 2023
Órgão3ª Turma de Direito Penal
Year2023
Número do processo0003419-80.2019.8.14.0039
Classe processualAPELAÇÃO CRIMINAL
AssuntoSeguida de Morte

APELAÇÃO CRIMINAL (417) - 0003419-80.2019.8.14.0039

APELANTE: RONALDO GREGORIO DA SILVA MAIA

APELADO: JUSTIÇA PÚBLICA

RELATOR(A): Desembargadora KÉDIMA PACIFICO LYRA

EMENTA

APELAÇÃO CRIMINAL. LESÃO CORPORAL QUALIFICADA PELO RESULTADO MORTE E PRIVILEGIADA PELO DOMÍNIO DE VIOLENTA EMOÇÃO. PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO POR LEGÍTIMA DEFESA. IMPOSSIBILIDADE. TESE DEFENSIVA DISSOCIADA DOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS REUNIDOS NOS AUTOS. INEXISTÊNCIA DE INJUSTA AGRESSÃO. DESPROPORCIONALIDADE DOS MEIOS EMPREGADOS.

1. Compete à defesa, no processo penal, a prova das causas excludentes de ilicitude, da culpabilidade, ou das causas extintivas da punibilidade, nos termos do art. 156 do CPP.

2. O reconhecimento da legítima defesa demanda a presença de todos os requisitos listados no art. 25 do CP, de modo que a inexistência de injusta agressão praticada pela vítima impede o reconhecimento da excludente de ilicitude.

3. A reação desproporcional é incompatível com o instituto da legítima defesa, que demanda a utilização moderada dos meios necessários, compreendidos como aqueles que bastam para afastar a agressão injusta.

4. Na espécie, a defesa não se desincumbiu do ônus de provar que o apelante usou moderadamente dos meios necessários para repelir injusta agressão, impossibilitando o reconhecimento da legítima defesa.

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores integrantes da TERCEIRA TURMA DE DIREITO PENAL do Tribunal de Justiça do Estado, em sessão plenária virtual de 17/04/2023 a 25/04/2023, por unanimidade de votos, em CONHECER e NEGAR PROVIMENTO ao recurso, nos termos do voto da Desembargadora Relatora.

Belém (PA), 25 de abril de 2023.

Desembargadora KÉDIMA PACÍFICO LYRA

Relatora

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA KÉDIMA PACÍFICO LYRA (RELATORA):

Trata-se de recurso de APELAÇÃO CRIMINAL interposto em favor de RONALDO GREGORIO DA SILVA MAIA, vulgo “MOTOR”, objetivando reformar a r. sentença proferida pelo MM. Juízo da Vara Criminal da Comarca de Paragominas/PA que condenou o réu à pena de 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, a ser cumprida inicialmente em regime aberto, pela prática do crime encartado no artigo 129, §3º e §4º, do Código Penal (lesão corporal qualificada pelo resultado morte e privilegiada pelo domínio de violenta emoção).

Colhe-se da dinâmica fática desenvolvida na denúncia (ID 6049697), que em 14 de abril de 2019, o denunciado encontrava-se no “Bar do Neguinho” ingerindo bebida alcóolica desde o período matutino até que, no início da noite, desentendeu-se com a vítima João do Nascimento da Silva em decorrência do valor de R$6,00 (seis reais) relativo ao jogo de bilhar. Em razão da desavença, a vítima deixou o local e se dirigiu ao “Bar do Anderson”, sendo seguida pelo denunciado Ronaldo Gregório da Silva Maia, abordando-a de surpresa e atingindo-a com um golpe de faca do tipo canivete na região peitoral, resultando na morte da vítima. Ato contínuo, o denunciado evadiu-se do local, sendo preso no dia seguinte em uma chácara pela autoridade policial. Diante dos fatos, o órgão ministerial promoveu a instauração da competente ação penal, dando o réu como incurso nas sanções punitivas do artigo 121, §2º, II e IV, do Código Penal (homicídio qualificado por motivo fútil e pelo emprego de recurso que dificultou a defesa do ofendido).

Recebida a denúncia, o feito seguiu os trâmites legais, resultando na prolação de sentença que desclassificou o delito de homicídio para lesão corporal para, em sequência, condenar o réu nas sanções previstas no artigo 129, §3º e §4º, do Código Penal (ID 6049714 e 6049715).

Em razões recursais (ID 6049717 e 6049718), a defesa pleiteia a absolvição sob o fundamento de que o recorrente agiu acobertado pela causa excludente de ilicitude da legítima defesa, pugnando pela reforma da sentença objurgada.

Em sede de contrarrazões, o Ministério Público de primeiro grau manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso, com manutenção in totum da sentença recorrida (ID 6049718 - págs. 6/9 e ID 6049719 - pág. 1).

Nesta Superior Instância, a d. Procuradoria de Justiça ofertou parecer pelo conhecimento e desprovimento do recurso apelatório (ID 6049720 - págs. 7/10 e ID 6049721 - págs. 1/2).

É o relatório.

VOTO

Em juízo de admissibilidade verifico a presença dos pressupostos recursais objetivos e subjetivos, de modo que, inexistindo questões preliminares passíveis de apreciação, CONHEÇO da apelação e passo ao exame do meritum causae.

Ultrapassada tal questão, verifico que a pretensão recursal ora deduzida objetiva a reforma da sentença que condenou o apelante pela prática do crime de lesão corporal qualificada pelo resultado morte e privilegiada pelo domínio de violenta emoção capitulado no artigo 129, §3º e §4º, do Código Penal.

A esse propósito, ressalto que o §3º do art. 129 do Código Penal tipifica a conduta daquele que ofende a integridade corporal ou a saúde de outrem dando causa ao indesejado e não assumido resultado morte, caracterizando-se como figura delitiva autenticamente preterdolosa, uma vez que na redação do tipo “o legislador deixou nítida a exigência de dolo no antecedente (lesão corporal) e somente a forma culposa no evento subsequente (morte da vítima), (...) fixando a culpa como único elemento subjetivo possível para o resultado qualificador.” (NUCCI, Guilherme. Manual de Direito Penal. 16ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020. p. 904 – 905 da versão digital).

A causa de diminuição de um sexto a um terço disposta na parte final do §4º do art. 129 do CP, por sua vez, aplica-se ao agente que pratica lesão corporal sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, justificando-se a redução da pena pelo menor grau de reprovação ou censura exigível nestas circunstâncias.

Delimitados os fundamentos jurídicos sobre o tema em julgamento, passo a análise do mérito recursal, diante da inexistência de teses preliminares.

Preambularmente, importa deixar bem vincado que, na espécie, em análise exauriente da prova trazida à baila em sede recursal, a materialidade e a autoria delitivas restaram sobejamente demonstradas por meio do laudo de perícia técnica em objeto...

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