Acórdão Nº 0003723-83.2014.8.24.0069 do Quinta Câmara Criminal, 06-02-2020

Número do processo0003723-83.2014.8.24.0069
Data06 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemSombrio
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Apelação Criminal n. 0003723-83.2014.8.24.0069, de Sombrio

Relator: Des. Luiz Cesar Schweitzer

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO. DANO E FURTO QUALIFICADOS, AQUELE PELO EMPREGO DE SUBSTÂNCIA INFLAMÁVEL E ESTE PELO ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO À SUBTRAÇÃO E CONCURSO DE PESSOAS, NA FORMA TENTADA (CÓDIGO PENAL, ARTIGOS 163, PARÁGRAFO ÚNICO, II, E 155, §§ 1º E 4º, I E IV, COMBINADO COM ART. 14, II). SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. INSURGIMENTO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA.

JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE. AUSÊNCIA DO INTERESSE DE AGIR. DECADÊNCIA DO DIREITO DE QUEIXA DA VÍTIMA. PRETÉRITA EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE DA RÉ NA ORIGEM EM RELAÇÃO AO CRIME DO ART. 163, PARÁGRAFO ÚNICO, II.

MÉRITO. PRETENSA CONDENAÇÃO. VIABILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA INCONTESTES. INFRAÇÃO COMETIDA NA CLANDESTINIDADE. ESPECIAL RELEVÂNCIA AOS RELATOS FIRMES E COERENTES DOS POLICIAIS MILITARES RESPONSÁVEIS PELA DILIGÊNCIA QUE CULMINOU COM A PRISÃO EM FLAGRANTE DA AGENTE QUE SE ENCONTRAVA EM POSSE DA RES FURTIVA. CONTRADIÇÕES NO INTERROGATÓRIO PRESTADO PELA ACUSADA E NO DEPOIMENTO DA VÍTIMA, TANTO EM SEDE DE INVESTIGAÇÃO QUANTO EM SOLO JUDICIAL. AUSÊNCIA DE JUSTIFICATIVA IDÔNEA. CONTEXTO APTO A EMBASAR O JUÍZO CONDENATÓRIO.

DOSIMETRIA DA PENA. REPRIMENDA BASILAR FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. DUPLICIDADE DE QUALIFICADORAS. INEXISTÊNCIA DE CIRCUNSTÂNCIAS AGRAVANTES OU ATENUANTES NA SEGUNDA FASE DA OPERAÇÃO. EMENDATIO LIBELLI (CPP, ART. 383). INCIDÊNCIA DA MAJORANTE INSCULPIDA NO ART. 155, § 1º, DO ESTATUTO REPRESSIVO. RECONHECIMENTO DA CAUSA DE ESPECIAL DIMINUIÇÃO DA TENTATIVA NO PATAMAR MÍNIMO.

PRONUNCIAMENTO REFORMADO. RECURSO EM PARTE CONHECIDO E PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0003723-83.2014.8.24.0069, da comarca de Sombrio (2ª Vara), em que é apelante o Ministério Público do Estado de Santa Catarina e apelada Josiane Alves Luiz:

A Quinta Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer em parte do recurso e dar-lhe provimento, para condenar Josiane Alves Luiz às penas de dois anos e seis dias de reclusão, a ser resgatada em regime inicialmente aberto, porém substituída por duas restritivas de direitos, consistentes em prestações pecuniária e de serviços à comunidade, e pagamento de nove dias-multa, cada qual arbitrado em seu mínimo legal, por infração ao preceito do art. 155, §§ 1º e 4º, I e IV, combinado com art. 14, II, ambos do Estatuto Repressivo. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Des. Luiz Neri Oliveira de Souza e Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt Schaefer.

Representou o Ministério Público o Exmo. Sr. Procurador de Justiça Ernani Dutra.

Florianópolis, 6 de fevereiro de 2020.

Luiz Cesar Schweitzer

Presidente e RELATOR


RELATÓRIO

A representante do Ministério Público do Estado de Santa Catarina com atuação perante o Juízo de Direito da 2ª Vara da comarca de Sombrio ofereceu denúncia em face de Josiane Alves Luiz e Maurício Barcelos, dando-os como incursos nas sanções do art. 155, § 4º, I e IV, combinado com art. 14, II, e art. 163, parágrafo único, II, todos do Código Penal, pela prática dos fatos delituosos assim narrados:

No dia 10 de dezembro de 2014, por volta das 00h30min, os denunciados Josiane Alves Luiz e Maurício Barcelos, agindo em unidade de desígnios e comunhão de esforços, mancomunados com terceira pessoa ainda não identificada, objetivando subtrair coisa alheia móvel, dirigiram-se até à residência da vítima Claudionor da Silva Colares, localizada na Rua João Batista Garcia, nº 1700, bairro Jardim Ultramar, na cidade de Balneário Gaivota/SC, ocasião em que, mediante rompimento de obstáculo - destruição do vidro da janela (Laudo Pericial págs. 60/64) -, subtraíram para si 01 (um) aquecedor elétrico a óleo, cor preta, com seis elementos, avaliado em R$ 100,00 (cem reais).

Os denunciados puseram o objeto subtraído no interior do veículo de Josiane, iniciando, assim, a execução do delito, só não consumando o intento criminoso por circunstancias alheias a vontade dos agentes, uma vez que Diogenis Colares Borges e Tiago Schutz Godinho detiveram Josiane até a chegada da Polícia Militar, enquanto o denunciado Maurício evadiu-se do local.

No mesmo contexto fático, ainda quando saíam da residência, os denunciados Josiane Alves Luiz e Maurício Barcelos, agindo em unidade de desígnios e comunhão de esforços, com o nítido intuito em danificar patrimônio alheio, com emprego de substância inflamável (gasolina), atearam fogo no cercado da propriedade da vítima Claudionor, deteriorando-a, consoante ta,mbém faz prova o Laudo Pericial algures mencionado (sic, fls. 87).

Foi declarada extinta a punibilidade do segundo em decorrência de seu falecimento e da primeira, com relação ao crime de dano qualificado, em virtude da decadência do direito de queixa (fls. 147).

Encerrada a instrução, o Magistrado a quo julgou improcedente o pedido formulado na inicial acusatória para absolver a primeira das imputações delitivas, com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal.

Inconformado, interpôs o Promotor de Justiça oficiante recurso de apelação, almejando a reforma da sentença para condenar a ré pela prática das condutas irrogadas na denúncia.

Seguiu-se a intimação da apelada, que ofereceu suas contrarrazões, manifestando-se pela manutenção da decisão profligada, após o que os autos ascenderam a este grau de jurisdição.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio de parecer da lavra do eminente Procurador de Justiça Paulo Roberto Speck, opinou pelo parcial conhecimento e provimento do reclamo.

É o relatório.

VOTO

A irresignação preenche apenas em parte os respectivos requisitos de admissibilidade, de maneira que deve ser conhecida unicamente na correlata extensão.

Isso porque constatou-se, de plano, a ocorrência da extinção da punibilidade da ré em relação ao crime do art. 163, parágrafo único, II, do Código Penal, devido ao advento da decadência do direito de queixa da vítima (fls. 147). Logo, inviável o conhecimento da irresignação no ponto.

Neste sentido é o entendimento desta Corte:

APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO QUALIFICADO PELO ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO, NA MODALIDADE TENTADA (ART. 155, § 4º, INCISO I, C/C ART. 14, INCISO II, AMBOS DO CÓDIGO PENAL). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DEFENSIVO. PLEITO DE RECONHECIMENTO DA DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA. ACOLHIMENTO. APELANTE QUE, POR VONTADE PRÓPRIA, DEIXA DE PROSSEGUIR NA PRÁTICA DELITUOSA. AGENTE QUE RESPONDE TÃO SOMENTE PELOS ATOS ATÉ ENTÃO PRATICADOS, OS QUAIS, NO CASO CONCRETO, CONFIGURAM O DELITO DE DANO. RECONHECIMENTO, ENTRETANTO, DA EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. CRIME DE AÇÃO PENAL DE INICIATIVA PRIVADA. NÃO OFERECIMENTO DA QUEIXA NO PRAZO LEGAL. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 107, INCISO IV, DO CÓDIGO PENAL. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO (Apelação Criminal n. 0000058-41.2016.8.24.0020, de Criciúma, rel. Des. Norival Acácio Engel, j. 19-11-2019).

Ademais, por se tratar de matéria de ordem pública, possível seu conhecimento a qualquer tempo e grau de jurisdição, nos termos do art. 61, caput, do CPP.

Por outro lado, a despeito da capitulação alvitrada pelo órgão ministerial em sua peça vestibular, "o juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em conseqüência, tenha de aplicar pena mais grave", como estabelece o art. 383, caput, do Código de Processo Penal.

O dispositivo em comento cuida da denominada emendatio libelli, instituto que permite ao magistrado conferir ao agir irrogado ao réu capitulação divergente daquela indicada na inicial acusatória, desde que não altere os fatos, sem a necessidade de oitiva da partes.

Ao ensejo, leciona Julio Fabbrini Mirabete:

Permite o Código que a sentença possa considerar na capitulação do delito dispositivos penais diversos dos constantes na denúncia, ainda que tenha de aplicar pena mais grave. Não há no caso uma verdadeira mutatio libelli mas, simplesmente uma corrigenda da peça acusatória (emendatio libelli). Estando os fatos descritos na denúncia, pode o juiz dar-lhe definição jurídica diversa, inclusive quanto às circunstâncias da infração penal porquanto o réu se defendeu daqueles fatos e não de sua capitulação inicial. Podem ser reconhecidas então qualificadoras, causas de aumento de pena, evidentemente com aplicação de pena mais grave, ou até mesmo por outro crime, não capitulado na inicial. Não há na hipótese do art. 383 necessidade de ser aberta vista à defesa para manifestar-se a respeito. Por outro lado, se o fato ou circunstância não está descrita na inicial, não pode o juiz considerá-lo na sentença em detrimento do acusado (Código de processo penal interpretado. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 982).

O increpado, no processo penal, defende-se dos fatos que lhe são imputados. Por tal motivo, considerando, também, que na emendatio libelli não há alteração desse escopo fático, a sua incidência não viola os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório.

São os termos exarados na denúncia:

No dia 10 de dezembro de 2014, por volta das 00h30min, os denunciados Josiane Alves Luiz e Maurício Barcelos, agindo em unidade de desígnios e comunhão de esforços, mancomunados com terceira pessoa ainda não identificada, objetivando subtrair coisa alheia móvel, dirigiram-se até à residência da vítima Claudionor da Silva Colares, localizada na Rua João Batista Garcia, nº 1700, bairro Jardim Ultramar, na cidade de Balneário Gaivota/SC, ocasião em que, mediante rompimento de obstáculo - destruição do vidro da janela (Laudo Pericial págs. 60/64) - , subtraíram para si 01 (um) aquecedor elétrico a óleo, cor preta, com seis elementos, avaliado em R$ 100,00 (cem reais) (sic, fls. 87).

Exsurge da narrativa que o ilícito ocorreu em horário noturno, fato provado pelo auto...

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