Acórdão Nº 0003760-13.2014.8.24.0069 do Quarta Turma de Recursos - Criciúma, 05-12-2017

Número do processo0003760-13.2014.8.24.0069
Data05 Dezembro 2017
Tribunal de OrigemSombrio
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão



ESTADO DE SANTA CATARINA

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA

Quarta Turma de Recursos - Criciúma



Apelação n. 0003760-13.2014.8.24.0069, de Sombrio

Relatora: Juíza Miriam Regina Garcia Cavalcanti

1- APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO QUALIFICADO (CP, ART. 150, § 1º). SENTENÇA QUE CONDENA O RÉU AO CUMPRIMENTO DE 6 (SEIS) MESES DE DETENÇÃO, A SER RESGATADO EM REGIME ABERTO. CONTUDO, PORQUE PREENCHIDOS OS REQUISITOS LEGAIS (CP, ART. 44), HOUVE A SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR UMA PENA RESTRITIVA DE DIREITOS, CONSISTENTE NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE.

2- INSURGÊNCIA RECURSAL DA DEFESA. PLEITO ABSOLUTÓRIO. ALEGADA AUSÊNCIA DE DOLO. DELITO PRATICADO EM ESTADO DE EMBRIAGUEZ. ALEGAÇÃO RECHAÇADA. EMBRIAGUEZ VOLUNTÁRIA QUE NÃO IMPLICARIA EM EXCLUDENTE DE IMPUTABILIDADE (CP, ART. 28, II).

3- RECONHECIMENTO DE INÉPCIA DA DENÚNCIA, EIS QUE A PEÇA ACUSATÓRIA NÃO DESCREVE QUEM É O PROPRIETÁRIO DA CASA "INVADIDA" (VÍTIMA), TAMPOUCO SE A RESIDÊNCIA É HABITADA. DESCUMPRIMENTO DO ART. 41, DO CPP DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. DECLARAÇÃO EX OFFICIO.

Sabe-se que que o delito de violação de domicílio é crime formal, ou seja, a consumação ocorre com o ingresso do agente em domicílio alheio sem a devida permissão/consentimento.

Contudo, tal crime está inserido no título "Dos Crimes Contra a Pessoa", razão pela qual o objeto tutelado é a preservação da intimidade/vida privada dos indivíduos que ali habitam; assim, para fins de configuração do delito, mostra-se necessário que, na peça inicial, haja a indicação do proprietário da casa (vítima) e a comprovação de sua habitação, sob pena de atipicidade da conduta, já que a casa desabitada não é alvo desse tipo penal.

SENTENÇA REFORMADA, PARA RECONHECER, DE OFÍCIO, A INÉPCIA DA PEÇA ACUSATÓRIA.


Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0003760-13.2014.8.24.0069, da comarca de Sombrio (2ª Vara), em que é Apelante Ronaldo Arminda Moraes, e Apelado o Ministério Público do Estado de Santa Catarina.


A Quarta Turma de Recursos - Criciúma decidiu, por unanimidade, nos termos do voto da relatora, rejeitar a denúncia, decretar a nulidade do feito e seu subsequente arquivamento.


VOTO


Cuida-se de apelação criminal interposta pelo réu em face da decisão do magistrado de 1º grau que lhe condenou ao cumprimento de 6 (seis) meses de detenção, em regime aberto, por ter cometido o delito previsto no art. 150, § 1º, do Código Penal.


O delito de invasão de domicílio está assim tipificado no Código Penal:


Art. 150 - Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas dependências:

(...) § 1º - Se o crime é cometido durante a noite, ou em lugar ermo, ou com o emprego de violência ou de arma, ou por duas ou mais pessoas:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, além da pena correspondente à violência.

(...) § 4º - A expressão "casa" compreende:

I - qualquer compartimento habitado;

II - aposento ocupado de habitação coletiva;

III - compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade. (...)


Por outro lado, a denúncia apresentada pelo órgão ministerial (págs. 24/26) assim descreveu a conduta delituosa perpetrada, em tese, pelo réu:


(...) No dia 22 de agosto de 2014, durante a madrugada, assim, no período noturno, o denunciado Ronaldo Arminda Moraes danificou a janela lateral, entrou clandestinamente na residência de responsabilidade do vigilante Luis Ricardo Aguirre de Azeredo, localizada na Rua C, s/n, bairro Praia Ultramar, na cidade de Balneário Gaivota/SC, e lá permaneceu por certo tempo, nitidamente contra a vontade de Luis, mais precisamente até a chegada dos policiais militares no local.

Assim agindo, o denunciado Ronaldo Arminda Moraes praticou a conduta descrita no preceito primário da norma penal incriminadora prevista no art. 150, §1º, do Código Penal, (...).


Observa-se, portanto, que a peça acusatória não descreveu quem é, de fato, o proprietário da residência, tampouco se tal domicílio era habitado, requisitos necessários para a configuração do delito previsto no art. 150, § 1º, do Código Penal.


Como dito acima, além de não haver a indicação daqueles requisitos, extrai-se do interrogatório do réu, que "(...) que o depoente quebrou um vidro da residência para poder entrar; que a residência não tinha móveis dentro, estava vazia; (...)" (audiência audiovisual, cuja mídia repousa à pág. 41; grifo nosso), além disso a única testemunha ouvida – o policial militar MARCELO BOFF RECK, afirmou que "(...) que parece que tinha uma janela quebrada na residência; que o depoente não se recorda se a residência era mobiliada; que o réu estava dentro de casa; (...)" (audiência audiovisual, cuja mídia repousa à pág. 41).


Na mesma esteira, retira-se da jurisprudência:


APELAÇÃO CRIMINAL. VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. EX-MARIDO. DISCUSSÃO ACERCA DO IMÓVEL SOMENTE NO ÂMBITO CIVIL. IMÓVEL DESABITADO. ATIPICIDADE. ABSOLVIÇÃO. RECURSO PROVIDO.

1- O crime de violação de domicílio está inserido no título dos crimes contra a pessoa, assim o objeto tutelado não é o patrimônio, ou seja, o imóvel invadido, mas sim, a privacidade daqueles que ali se residem.

2- O objeto jurídico do crime de violação de domicílio é o sossego, a intimidade e a vida privada conferidas pelo domicílio, tendo como sujeito passivo o morador; portanto, a violação de casa desabitada não fere este objeto.

3- Recurso provido. (TJDF, Apelação Criminal n. 2013.06100237-57, rel. Des. Silvânio Barbosa dos Santos, j. 27-3-2014).


Desse modo, entendo que a peça inicial da presente ação penal não trouxe as circunstâncias necessárias para caracterização do delito, nos termos do art. 41 do Código de Processo Penal1

Isso posto, vota-se pela rejeição da denúncia, por ser inepta, decretando-se a nulidade do feito desde o início.


DECISÃO


A Quarta Turma de Recursos decidiu, por unanimidade,...

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