Acórdão Nº 0003831-21.2019.8.24.0075 do Terceira Câmara Criminal, 31-03-2020

Número do processo0003831-21.2019.8.24.0075
Data31 Março 2020
Tribunal de OrigemTubarão
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Criminal n. 0003831-21.2019.8.24.0075, de Tubarão

Relator: Desembargador Júlio César M. Ferreira de Melo

APELAÇÃO CRIMINAL (RÉU PRESO). CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO. FURTO QUALIFICADO E MAJORADO PELO REPOUSO NOTURNO (ART. 155, §1º E §4º, INCISO I, DO CP). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO EXCLUSIVO DA DEFESA. PLEITO DE AFASTAMENTO DA QUALIFICADORA DO ARROMBAMENTO, DE APLICAÇÃO DA MINORANTE DA TENTATIVA, DE EXCLUSÃO DA MAJORANTE DO REPOUSO NOTURNO, DE ALTERAÇÃO DO REGIME PRISIONAL E DE AFASTAMENTO DA CONDENAÇÃO EM REPARAÇÃO DE DANOS À VÍTIMA. REGIME PRISIONAL ALTERADO EM RAZÃO DO NOVO QUANTUM DA PENA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

1. QUALIFICADORA DO ARROMBAMENTO. 1.1 Consoante prevê o art. 158 do Código de Processo Penal, "quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado". 1.2 Na hipótese, além de o exame pericial ter se baseado tão somente em imagens digitalizadas recebidas através de correio eletrônico, ele não constatou a presença de vestígios ou danos compatíveis com o arrombamento (fls. 180-182).

2. DA APLICAÇÃO DA MINORANTE DA TENTATIVA. 2.1 O Superior Tribunal de Justiça já firmou entendimento de que a mera inversão da posse é suficiente para a consumação do crime, tornando-se o agente possuidor do objeto subtraído mesmo não tendo sido alcançada a posse mansa e tranquila. 2.2 In casu, quando o Apelante foi abordado pelos vigilantes da empresa de segurança ele já estava na posse do dinheiro e já tinha subtraído um televisor que foi escondido numa lixeira, restando caracterizado o furto consumado.

3. MAJORANTE DE REPOUSO NOTURNO. ALEGADA A INCOMPATIBILIDADE COM O FURTO QUALIFICADO. Esta Câmara, alinhando-se ao entendimento dos Tribunais Superiores e dos órgãos fracionários desta Corte, tem entendido que a majorante prevista no § 1º do art. 155 do Código Penal, referente ao repouso noturno, é aplicável ao furto qualificado. Precedentes STJ e STF: AgRg no REsp 1731115/SC, DJe 24/09/2018 e HC 130952, Dje 20-02-2017.

4. REPARAÇÃO DE DANOS À VÍTIMA. 4.1 A condenação à reparação dos danos causados pela infração (art. 387, inciso IV, do Código de Processo Penal) pressupõe, além do pedido expresso por uma das partes, a indicação do valor devido e a existência de provas suficientes para sustentá-lo, possibilitando ao acusado o direito ao contraditório e à ampla defesa. 4.2 No caso, tendo sido o pedido formulado na denúncia, não há motivos para afastamento.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0003831-21.2019.8.24.0075, da comarca Tubarão 2ª Vara Criminal em que é Apelante Paulo André Abreu dos Santos e Apelado Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

A Terceira Câmara Criminal decidiu, à unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento para afastar a qualificadora de arrombamento e, em razão do quantum da pena consolidada, alterar o regime prisional para o semiaberto. Ex officio, concedo ao Apelante o direito de recorrer em liberdade. Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Des. Getúlio Corrêa e Des. Ernani Guetten de Almeida.

Funcionou como Representante do Ministério Público o Exmo. Sr. Dr. Paulo de Tarso Brandão.

Florianópolis, 31 de março de 2020.

Desembargador Júlio César M. Ferreira de Melo

Presidente e Relator


RELATÓRIO

Denúncia: O Ministério Público ofereceu denúncia contra Paulo André Abreu dos Santos, dando-o como incurso nas sanções do artigo 155, §§1º e 4º, inciso I, do Código Penal, pela prática dos seguintes fatos delituosos (fls. 129-130):

Consta no incluso caderno indiciário que, no dia 22 de julho de 2019 (domingo), por volta das 3 horas (horário de repouso noturno), no interior do estabelecimento de ensino "Escola Infantil Pequenos Encantos", localizado na Rua Wenceslau Braz, s/n., Bairro Vila Moema, Tubarão-SC, o denunciado PAULO ANDRÉ ABREU DOS SANTOS, mediante arrombamento de uma lixeira e janelas do escritório do local, subtraiu para si a quantia de R$ 1.725,00, em espécie e duas folhas de cheques, nos valores de R$ 488,00 e R$ 333,80, escondendo-os em sua cueca, bem como também subtraiu dois televisores de 32", das marcas Panasonic e LG (Auto de Exibição e Apreensão - p. 78), um dos quais depositou na lixeira da parte externa do estabelecimento, voltando para buscar a outra TV, quando foi flagrado e retido por um vigilante do sistema de segurança PROLINCON, o qual acionou a Polícia Militar que, após revista pessoal, efetuou sua prisão em flagrante, recuperando-se a res furtiva.

Sentença: Após a regular instrução do processo criminal, o Juízo do primeiro grau proferiu decisão com o seguinte dispositivo (fls. 254-255):

Pelo exposto, JULGO PROCEDENTE a denúncia de fls. 129-130 para CONDENAR o acusado PAULO ANDRÉ ABREU DOS SANTOS ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime fechado, e ao pagamento de 13 (treze) dias-multa, cada qual no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, por infração ao art. 155, §1º e §4º, inciso I, do Código Penal.

NEGO-LHE o direito de recorrer em liberdade, pois permaneceu preso durante toda a instrução criminal, sendo que tal medida se mostra necessária para fins de garantia da ordem pública (art. 312 do CPP), conforme decisão de fls. 54-64. Nesse sentido: "Não se concede o direito ao apelo em liberdade a réu que permaneceu preso durante toda a instrução do processo, pois a manutenção na prisão constitui-se em um dos efeitos da respectiva condenação. Precedentes do STJ." (in HC 217251 / SP, Relator(a) Ministro GILSON DIPP (1111) - QUINTA TURMA, j. em 22/05/2012) [...]

Apelação interposta pela Defesa: Requer a Defesa o afastamento da qualificadora do arrombamento e o reconhecimento do crime de furto em sua modalidade tentada. Na dosimetria, pede pela exclusão da majorante do repouso noturno e pela diminuição da pena em seu grau máximo em razão da tentativa (2/3). Por fim, pleiteia o abrandamento do regime inicial e o afastamento da fixação de valor mínimo para reparação dos danos (fls. 267-278).

Contrarrazões: A acusação impugnou as razões recursais defensivas, requerendo o conhecimento e parcial provimento do recurso apenas para alterar o regime inicial para o semiaberto (fls. 286-302).

Parecer da PGJ: Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Genivaldo da Silva, que opinou pelo conhecimento e parcial provimento do recurso apenas para fixar o regime semiaberto para o início do resgate de pena (fls. 318-330).

Este é o relatório.


VOTO

Trata-se de recurso de apelação criminal interposto pela defesa contra sentença que julgou procedente a denúncia e condenou Paulo André Abreu dos Santos pelo cometimento do delito descrito no artigo 155, §§ 1º e 4º, inciso I, do Código Penal.

Diante das insurgências já detalhadas no relatório, passo ao exame da matéria devolvida a conhecimento desta Câmara.

1. Da qualificadora do arrombamento

Requer a defesa o afastamento da qualificadora do arrombamento (art. 155, §4º, inciso I, do CP), sob a alegação de que o laudo pericial não constatou o arrombamento e de que as declarações das testemunhas não servem para amparar tal conclusão.

Razão assiste à Defesa.

Consoante prevê o art. 158 do Código de Processo Penal, "quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado".

Se desparecidos os vestígios (art. 167, CPP) ou se impossível a sua verificação (por causa não imputável aos órgãos da persecução penal), é certo, torna-se prescindível a realização da perícia.

No caso dos autos, além de o exame pericial ter se baseado tão somente em imagens digitalizadas recebidas através de correio eletrônico, ele não constatou a presença de vestígios ou danos compatíveis com o arrombamento (fls. 180-182).

E, em se verificando que o delito deixou vestígios, cujo exame era plenamente possível de ser realizado, e não havendo nos autos justificativa plausível para a ausência da prova específica, o afastamento da qualificadora é medida que se impõe.

Esse é o entendimento pacífico da Corte Superior. Colaciono recentes precedentes de ambas as Turmas competentes para o julgamento de matéria penal:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DANO QUALIFICADO. INFRAÇÃO QUE DEIXA VESTÍGIOS. EXAME PERICIAL NÃO REALIZADO. IMPRESCINDIBILIDADE. PROVA TESTEMUNHAL. IMPOSSIBILIDADE. JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.

I - Nos crimes que deixam vestígios é imprescindível a realização de corpo de delito, por expressa determinação legal prevista no art. 158 do Código Penal.

II - É pacífica jurisprudência desta Corte Superior no sentido de que o exame de corpo de delito direto, por expressa determinação legal, é indispensável nas infrações que deixam vestígios, podendo apenas supletivamente ser suprido pela prova testemunhal quando os vestígios tenham desaparecido, hipótese não demonstrada na instância de origem.

Agravo regimental desprovido.

(AgRg no REsp 1785868/RS, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 14/05/2019, DJe 21/05/2019) (Grifo nosso).

AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. FURTO QUALIFICADO. ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO. ESCALADA. EXAME DE CORPO DE DELITO. INEXISTÊNCIA. CRIME DE DANO. AUSÊNCIA DE LAUDO PERICIAL. ILEGALIDADES. FALTA DE FUNDAMENTOS CAPAZES DE MODIFICAR O ACÓRDÃO IMPUGNADO. AGRAVO IMPROVIDO.

1. Nos termos da consolidada jurisprudência vigente neste Superior Tribunal de Justiça, o reconhecimento das qualificadoras de rompimento de obstáculo e da escalada, para fins de conferir maior reprovabilidade ao crime de furto, exige, nos termos do art. 158 do CPP, a realização de exame de corpo de delito. Precedentes.

2. No caso em exame,...

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