Acórdão Nº 0003855-98.2019.8.24.0091 do Quarta Câmara Criminal, 18-05-2023

Número do processo0003855-98.2019.8.24.0091
Data18 Maio 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 0003855-98.2019.8.24.0091/SC



RELATOR: Desembargador SIDNEY ELOY DALABRIDA


APELANTE: PATRICIA TEREZINHA DOS SANTOS DA SILVA (RÉU) ADVOGADO(A): BRUNO VALTER SAGAZ (OAB SC026889) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) OFENDIDO: SANDRA BOENG MARTINS (OFENDIDO) ADVOGADO(A): JACIARA ROCHA PINTO INTERESSADO: MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS (INTERESSADO)


RELATÓRIO


Na comarca da Capital, o órgão do Ministério Público ofereceu denúncia em face de Patrícia Teresinha dos Santos da Silva, imputando-lhe a prática do delito capitulado no art. 329, caput, do Código Penal, pois, segundo consta na inicial:
No dia 16 de abril de 2019, por volta das 10 horas e 19 minutos, na Avenida Governador Gustavo Richard, no Bairro Centro, nesta Capital, a denunciada PATRÍCIA TEREZINHA DOS SANTOS DA SILVA opôs-se à execução de ato legal, mediante ameaça contra a profissional da Secretaria de Assistência Social do Município Sandra Boeng Martins, funcionária competente para executá-lo, ao dizer "vou te matar" e "o que é seu está guardado", "seus dias estão contados" e "cabeças vão rolar"; bem como desacatou a referida funcionária pública, com palavras, dizendo "vagabunda", desrespeitando e ofendendo, na pessoa dela, a função pública que exerce, além de ofender seu decoro e dignidade.
Na ocasião, profissionais da aludida Secretaria efetuavam operação de defesa, orientação e apoio às pessoas em situação de rua. Ocorre que, no momento em que a Assistente Social Sandra Boeng Martins efetuou a abordagem social da denunciada, esta passou a proferir as palavras ameaçadoras e de baixo calão acima transcritas (Evento 67, DENUNCIA68, autos originários).
Embora citada por edital, a ré não apresentou defesa prévia, tampouco constituiu defensor, de modo que, em 20/11/2019, os autos e o curso do prazo prescricional foram suspensos, nos termos do art. 366 do Código de Processo Penal (Evento 100, DEC91). Posteriormente, apresentado novo endereço, foi realizada em 25/9/2020 a citação pessoal de Patricia Terezinha dos Santos da Silva (Evento 124, CERT1, ambos dos autos originários).
Finalizada a instrução, o Magistrado a quo julgou procedente o pedido formulado na denúncia, para condená-la ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 2 (dois) meses de detenção, em regime aberto, concedida a suspensão condicional da pena pelo prazo de 2 (dois) anos, pela prática do crime previsto no art. 329, caput, do CP (Evento 285, SENT1, autos originários).
Inconformada com a prestação jurisdicional, a ré interpôs apelação criminal, mediante a qual sustentou, em preliminar, ofensa ao princípio da paridade de armas, uma vez que oportunizado à acusação manifestação dupla (apresentação das contrarrazões e do parecer da Procuradoria-Geral de Justiça). No mérito, postulou a absolvição, sustentando a insuficiência de provas para embasar o édito condenatório, com base no art. 386, VII, do CPP e princípio in dubio pro reo.
Subsidiariamente, rogou pela aplicação da atenuante da confissão espontânea, com fulcro no art. 65, III, "d", do CP, adequando-se a reprimenda imposta, ao argumento de houve a admissão da conduta em sede policial. Por fim, pleiteou a fixação dos honorários advocatícios ao defensor nomeado (Evento 12, RAZAPELA1).
Apresentadas as contrarrazões (Evento 16, PROMOÇÃO1), a douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio da Exma. Dra. Margaret Gayer Gubert Rotta, manifestou-se pelo conhecimento e não provimento do reclamo (Evento 24, PARECER1)

VOTO


Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conhece-se do apelo.
1 Ab initio, pretende a apelante que seja determinada "a apresentação de parecer da PGJ - sem, contudo, que se oportunize a elaboração de contrarrazões de apelação pelo Ministério Público de 1º grau, sob pena de ferimento ao princípio da paridade de armas no processo penal, bem como de que a defesa sempre se manifesta por último" (Evento 12, RAZAPELA1, fl. 11).
Entretanto, razão não lhe assiste.
Ressalta-se que, ao proferir parecer em segundo grau de jurisdição, o Procurador de Justiça não atua como parte, e sim como custos legis, conforme preconizado no art. 610 do CPP, ocasião em que o membro do Ministério Público pode, inclusive, manifestar-se favoravelmente aos pedidos do réu.
Nesse sentido, "na segunda instância, o Ministério Público terá vista dos autos para exarar parecer, no prazo de cinco dias (salvo se for o caso de sentença em processo de contravenção ou de processo de habeas corpus - art. 610, caput, CPP), atuando, na hipótese, como custus legis." (TÁVORA. Nestor. ALENCAR, Osmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. Salvador: Juspodivm, 2017. p. 1379).
Colhe-se da jurisprudência:
APELAÇÃO CRIMINAL - RECEPTAÇÃO QUALIFICADA (ART. 180, § 1º, DO CÓDIGO PENAL) E FURTO QUALIFICADO (ART. 155, § 4º, II, DO CÓDIGO PENAL) - SENTENÇA CONDENATÓRIA - RECURSO DE UM DOS ACUSDADOS.PRELIMINAR - PLEITO DE RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA OFERECIMENTO DE ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL - DESNECESSIDADE - INSTITUTO BENÉFICO EDITADO DEPOIS DO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA - APLICAÇÃO RETROATIVA DESCABIDA.Consoante posição externada pelo STJ, é possível a aplicação retroativa do acordo de não persecução penal, introduzido pela chamada 'Lei Anticrime', desde que a denúncia não tenha sido recebida (HC n. 628.647, rel. p/ acórdão Min. Laurita Vaz, j. em 9.3.2021).PRELIMINAR - ALEGAÇÃO DE SUPOSTA VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA PARIDADE DE ARMAS - ACUSADO QUE SE INSURGE CONTRA O OFERECIMENTO DE PARECER PELA PROCURADORIA-GERAL DE JUSTIÇA - TESE NÃO ACOLHIDA - ATUAÇÃO QUE SE DÁ NA CONDIÇÃO DE CUSTO LEGIS E NÃO VINCULA O JULGAMENTO DO FEITO.A atuação da PGJ manifestando-se em processos criminais se dá na condição de custos legis. Inexiste, assim, um "alinhamento" com essa ou aquela parte, mas sim a intenção de aplicação da lei conforme as peculiaridades do caso concreto. Desse modo, se porventura os entendimentos de primeiro e segundo grau vão ao encontro um do outro, é certo que os elementos dos autos permitem tal conclusão e não porque há interesse em beneficiar a acusação.MÉRITO - PLEITO DE ABSOLVIÇÃO - TESE AFASTADA - DESCONHECIMENTO DA ORIGEM ILÍCITA NÃO PROVADO - SIMPLES NEGATIVA GENÉRICA, MARCADA POR INCONGRUÊNCIAS, QUE NÃO SE MOSTRAM CAPAZES DE DERRUIR O ÉDITO CONDENATÓRIO - DOLO EVIDENTE - CONDENAÇÃO MANTIDA.No crime de receptação (CP, art. 180), se a res furtiva houver sido apreendida em poder do acusado, conduzindo o bem, incumbe-lhe apresentar prova da origem lícita do produto, ou comprovar seu absoluto desconhecimento da procedência criminosa do material ilícito, demonstrando cabalmente ignorar o injusto penal levado a efeito; não o fazendo, a condenação deve ser decretada[...]APELO REJEITADO (TJSC, Apelação Criminal n. 0000422-78.2018.8.24.0008, rel. Des. Luiz Antônio Zanini Fornerolli, Quarta Câmara Criminal, j. em 9/9/2021 - grifou-se).
E mais:
APELAÇÕES CRIMINAIS. CRIME CONTRA A INCOLUMIDADE PÚBLICA. POSSE IRREGULAR DE MUNIÇÕES (ART. 12 DA LEI N. 10.826/2003). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSOS DEFENSIVOS. PRELIMINAR. RECURSOS DE B.L.C. E F.A.L. NULIDADE POR VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA PARIDADE DAS ARMAS. PRETENSA MANIFESTAÇÃO APENAS DA PROCURADORIA-GERAL DE JUSTIÇA. NÃO ACOLHIMENTO. INTERVENÇÕES DO MINISTÉRIO PÚBLICO COMO PARTE, NA APRESENTAÇÃO DE CONTRARRAZÕES, E COMO FISCAL DA LEI (CUSTOS LEGIS) COM FUNDAMENTOS, FINALIDADES E VALORES PROCESSUAIS DIVERSOS. PREFACIAL RECHAÇADA. [...] RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS.(Apelação Criminal n. 0007072-69.2014.8.24.0045, de Palhoça, rel. Des. Ernani Guetten de Almeida, Terceira Câmara Criminal, j. em 19/6/2018) (grifou-se).
APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES DE POSSE ILEGAL DE MUNIÇÕES DE USO RESTRITO (ART. 16, CAPUT, DA LEI N. 10.826/2003) E CONTRA A SAÚDE PÚBLICA. DEPÓSITO DE MEDICAMENTOS PARA VENDA OU, DE FORNECIMENTO A CONSUMO O PRODUTO FALSIFICADO (ART. 273, § 1º, C/C § 1º-B, INC. I, DO CP). PRELIMINAR. AVENTADA NULIDADE DO FEITO ARGUIDA POR LUIZ FERNANDO. AFRONTA AO PRINCÍPIO DA PARIDADE DE ARMAS, SOB A JUSTIFICATIVA DE QUE A MANIFESTAÇÃO DA PROCURADORIA-GERAL DE JUSTIÇA DA MAIOR VIGOR AO PODER PUNITIVO DO ESTADO E DESEQUILIBRA A BALANÇA DA JUSTIÇA. INOCORRÊNCIA. ATUAÇÃO DO ÓRGÃO MINISTERIAL COMO CUSTOS LEGIS. ADEMAIS, ÓRGÃO JULGADOR QUE NÃO FICA VINCULADO AO PARECER EXARADO PELA PGJ. PREJUDICIAL AFASTADA. [...] RECURSOS CONHECIDOS EM PARTE E DESPROVIDOS (Apelação Criminal n. 0039304-06.2014.8.24.0023, da Capital, rel. Des. Alexandre d'Ivanenko, Quarta Câmara Criminal, j. em 13/12/2018 - grifou-se).
Dessa forma, afasta-se a preliminar arguida.
2 No mérito, a defesa requer a absolvição por falta de provas, invocando a aplicação do princípio in dubio pro reo.
Para tanto, sustenta que, "diante do conjunto probatório produzido não é possível extrair a efetiva autoria do delito imputado a recorrente, sobretudo em razão da ausência de obrigatoriedade em submeter-se a intervenção" (Evento 12, RAZAPELA1, fl. 8).
Todavia, razão não a socorre.
No caso, a materialidade e autoria delitivas encontram-se comprovadas por meio do termo circunstanciado (Evento 1, TERMO_CIRCUNST1-10, autos originários), especialmente do boletim de ocorrência (Evento 1, TERMO_CIRCUNST3-4, autos originários), além da prova oral coligidas em ambas as fases procedimentais.
A vítima Sandra Boeng Martins, assistente social, quando ouvida na Delegacia de Polícia,...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT