Acórdão Nº 0003935-72.2019.8.24.0023 do Quinta Câmara Criminal, 20-02-2020

Número do processo0003935-72.2019.8.24.0023
Data20 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemCapital
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Apelação Criminal n. 0003935-72.2019.8.24.0023, da Capital

Relator: Des. Luiz Cesar Schweitzer

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES CONTRA A SAÚDE E A INCOLUMIDADE PÚBLICAS. TRÁFICO ILÍCITO DE SUBSTÂNCIAS ENTORPECENTES E POSSE IRREGULAR DE ARMAS DE FOGO E MUNIÇÕES DE USO PERMITIDO (LEI 11.343/2006, ART. 33, CAPUT, COMBINADO COM § 4º, E LEI 10.826/2003, ART. 12). SENTENÇA CONDENATÓRIA. INSURGIMENTO DA DEFESA.

JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE. APONTADA ILICITUDE DA PROVA DA MATERIALIDADE DELITIVA POR OFENSA AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA INVIOLABILIDADE DO DOMICÍLIO. INOVAÇÃO RECURSAL. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. NÃO CONHECIMENTO. ADEMAIS, CONSENTIMENTO DO DEMANDADO PARA O INGRESSO DOS SERVIDORES ESTATAIS NA RESIDÊNCIA CONFIRMADO PELO PRÓPRIO NA FASE JURISDICIONAL.

PRETENSA ABSOLVIÇÃO ANTE A INEXISTÊNCIA DE SUBSTRATOS DE CONVICÇÃO APTOS PARA EMBASAR O DECRETO CONDENATÓRIO. INVOCADA INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO. IMPOSSIBILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS DEVIDAMENTE COMPROVADAS. RELATOS FIRMES E COERENTES DOS POLICIAIS MILITARES RESPONSÁVEIS PELA DILIGÊNCIA QUE CULMINOU COM A PRISÃO EM FLAGRANTE DO AGENTE, ALIADOS AOS DEMAIS ELEMENTOS CONSTANTES NO FEITO. APREENSÃO DE DOIS REVÓLVERES, MUNIÇÕES, MACONHA E COCAÍNA. CONDENAÇÃO INARREDÁVEL.

AVENTADA DESCLASSIFICAÇÃO DO PRIMEIRO INJUSTO PARA A CONDUTA DO RESPECTIVO ART. 28, CAPUT. INVIABILIDADE. CONTEXTO PROBATÓRIO QUE NÃO DEIXA DÚVIDAS QUANTO À DESTINAÇÃO COMERCIAL DOS ESTUPEFACIENTES.

PRONUNCIAMENTO MANTIDO. RECURSO EM PARTE CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0003935-72.2019.8.24.0023, da comarca da Capital (2ª Vara Criminal), em que é apelante Matheus Carrijo Moreira e apelado o Ministério Público do Estado de Santa Catarina:

A Quinta Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer em parte do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado no dia 20 de fevereiro de 2020, os Exmos. Srs. Des. Luiz Neri Oliveira de Souza e Antônio Zoldan da Veiga.

Representou o Ministério Público o Exmo. Sr. Procurador de Justiça Paulo de Tarso Brandão.

Florianópolis, 28 de fevereiro de 2020.

Luiz Cesar Schweitzer

PRESIDENTE E RELATOR


RELATÓRIO

A representante do Ministério Público do Estado de Santa Catarina com atuação perante o Juízo de Direito da 2ª Vara Criminal da comarca da Capital ofereceu denúncia em face de Matheus Carrijo Moreira, dando-o como incurso nas sanções dos arts. 33, caput, da Lei 11.343/2006 e 12 da Lei 10.826/2003, pela prática dos fatos delituosos assim narrados:

No dia 16 de março de 2019, por volta das 20h, policiais militares realizavam rondas pelo bairro Canasvieiras, nesta Capital, quando, nas proximidades da escola da localidade, visualizaram Matheus Carrijo Moreira, em atitude considerada suspeita. Realizada a abordagem, constatou-se que o denunciado trazia consigo certa quantidade de maconha, para fins de comercialização a terceiros.

Prosseguindo a ação policial até a casa do denunciado, situada à Rodovia Virgílio Várzea, n. 4.515, bairro Canasvieiras, nesta Capital, e realizadas buscas, foram localizados mais entorpecentes e assim constatou-se que Matheus, sem autorização e em desacordo com determinação legal, trazia consigo, guardava e tinha em depósito 21 (vinte e uma) porções da droga Cannabis sativa ou 'maconha', acondicionadas individualmente e com massa bruta de 37,8g (trinta e sete gramas e oito decigramas) e 1 (uma) porção da droga 'cocaína', com massa bruta de 5,3g (cinco gramas e três decigramas) - conforme Auto de Apreensão de p. 8 e Laudo de Constatação n. 0274/19 (p. 13).

As drogas apreendidas são substâncias capazes de causar dependência física e/ou psíquica, têm seu uso proibido em todo o território nacional e se destinavam à comercialização clandestina a terceiros.

Foram apreendidos, ainda, com o denunciado um telefone celular - empregado na prática delitiva e o valor de R$ 453,00 - produto do tráfico de drogas praticado pelo denunciado.

Foi constatado, ainda, diante das buscas na casa, que o denunciado Matheus, possuía e mantinha sob sua guarda, sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar, um revólver da marca Taurus, n. 08202232, calibre .38; um revólver da marca Rossi, n. 148639, calibre .38 e 52 (cinquenta e duas) munições calibre .38 - conforme Auto de Exibição e Apreensão da p. 8 (sic, fls. 48-49).

Encerrada a instrução, o Magistrado a quo julgou procedente o pedido formulado na inicial acusatória para condená-lo às penas de um ano e oito meses de reclusão e um ano de detenção, ambas a serem resgatadas em regime inicialmente aberto, porém substituídas por uma restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade, e multa, e pagamento de cento e setenta e seis unidades pecuniárias, individualmente arbitradas à razão de um trigésimo do salário mínimo vigente à época dos fatos, por infração ao preceito dos arts. 33, caput, combinado com § 4º, da Lei de Drogas e 12 do Estatuto do Desarmamento.

Inconformado, interpôs o réu recurso de apelação, arguindo, preliminarmente, a nulidade do procedimento policial por violação ao preconizado no art. 5º, XI, da Constituição da República, diante da inexistência de ordem judicial para adentrar na sua residência, sendo nulas por derivação todas as provas produzidas na instrução. No mérito, almeja sua absolvição, ao argumento de que inexistem nos autos substratos de convicção aptos a embasar o decreto condenatório, devendo incidir o princípio do in dubio pro reo na espécie. Subsidiariamente, requer a desclassificação do delito de tráfico ilícito de substâncias psicotrópicas para a conduta descrita no art. 28, caput, da lei de regência.

Em suas contrarrazões, o Promotor de Justiça oficiante pugna pela preservação da decisão vergastada.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio de parecer da lavra do eminente Procurador de Justiça Gilberto Callado de Oliveira, opinou pelo conhecimento e desprovimento do reclamo.

É o relatório.

VOTO

A irresignação preenche apenas em parte os respectivos requisitos de admissibilidade, de maneira que deve ser conhecida unicamente na correlata extensão.

Preambularmente, alega o recorrente que os policiais militares atuaram de forma arbitrária ao adentrarem na sua residência em situação que não se enquadrava nas hipóteses autorizadas pela Carta Magna, o que tornou ilícita a prova material, maculando, por conseguinte, a apreensão do produto encontrado no local e todos os atos processuais posteriores.

Entretanto, a arguição em exame adveio somente nas razões recursais de fls. 258-274. Ou seja, não foi questionada em resposta à acusação (fls. 99-100), sequer nas alegações finais (fls. 213-220), impossibilitando, portanto, a apreciação do Juízo a quo sobre o assunto.

Desta maneira, sendo inoportuno o momento para sua realização, a postulação está contaminada pela preclusão consumativa.

Por este ângulo, já decidiu este Sodalício:

APELAÇÃO CRIMINAL - FURTO PRATICADO DURANTE O REPOUSO NOTURNO NA FORMA QUALIFICADO PELO ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO E CONCURSO DE PESSOAS (ART. 155, §§1º E 4º, I E IV, DO CÓDIGO PENAL) - SENTENÇA CONDENATÓRIA - RECURSO DA DEFESA.

NULIDADE - INVIOLABILIDADE DE DOMICÍLIO DO ACUSADO EVERTON - NÃO CONHECIMENTO - PRECLUSÃO TEMPORAL - SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA - INOCORRÊNCIA, ADEMAIS, DE QUALQUER ILEGALIDADE - INGRESSO NO RESIDÊNCIA CONSENTIDO PELO INVESTIGADO - AFRONTA NÃO VERIFICADA.

I - A preclusão é um instituto indispensável para a manutenção da segurança jurídica, de modo que devem ser vedadas as condutas extemporâneas, contraditórias ou repetitivas, ainda que na esfera criminal.

II - Não se reveste de ilegalidade a colhida de prova em residência quando o ingresso dos policiais no local é consentido por quem detém tal prerrogativa no momento.

[...]

RECURSO CONHECIDO EM PARTE E PARCIALMENTE PROVIDO. (Apelação Criminal n. 0014576-43.2014.8.24.0008, de Blumenau, rel. Des. Luiz Antônio Zanini Fornerolli, j. 25-7-2019).

Logo, não é de ser conhecida a insurgência neste particular.

Demais disso, ainda que o pedido fosse conhecido não comportaria acolhimento, pois, durante seu interrogatório judicial, o próprio denunciado confirmou que levou os servidores estatais até sua casa por "livre e espontânea vontade" (sic, mídia audiovisual a fls. 181).

Não se olvida, outrossim, que os crimes sob análise são de natureza permanente, cuja consumação se prolonga no tempo, de modo que, enquanto o agente mantiver sob sua guarda material estupefaciente e artefatos bélicos, estará em estado de flagrância, o que permite que a sua prisão ocorra a todo tempo.

Nesse quadro, a entrada no imóvel em que estavam armazenadas as substâncias ilícitas e as armas de fogo e munições não caracterizou a alegada violação de domicílio, pois patente o estado flagrancial, sendo exatamente esta a exceção prevista pela norma constitucional invocada pela defesa. Confira-se:

Art. 5º [...]

XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial;

A respeito da questão, releva transcrever o seguinte julgado do Superior Tribunal de Justiça:

PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ARTIGOS 33, CAPUT, DA LEI N° 11.343/06, E ART. 16, PARÁGRAFO ÚNICO, IV, DA LEI N° 10.826/2003. TRÁFICO DE DROGAS E POSSE DE ARMA DE FOGO COM NUMERAÇÃO SUPRIMIDA. ILICITUDE DA BUSCA E APREENSÃO. ENTRADA EM DOMICÍLIO. INEXISTÊNCIA DE NULIDADE. FUNDADAS RAZÕES. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. O entendimento deste Superior Tribunal de Justiça - STJ consolidou-se no sentido de que o crime de tráfico de entorpecentes na modalidade "ter em depósito" é do tipo permanente, cuja consumação se...

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